segunda-feira, dezembro 01, 2025

ROSA MECHIÇO, ČHIRANAN PITPREECHA, ALYSON NOEL, INDÍGENAS & DITADURA MILITAR

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Ao som de Uma Antologia do Violão Feminino Brasileiro (Sesc Consolação, 2025), da violonista, cantora, compositora e arranjadora Helô Ferreira. Ela é bacharela e mestre em violão, produtora do Samba das Mulheres e do Festival Cancioneiras: Música Feminina em Primeira Pessoa, além de consultora do Instituto OuvirAtivo.

 

De festa em tragédia se desfaz e refaz... – Era dia de boi do barão, o mais festivo de Alagoinhanduba, eructação extravagante do bafo pros pipocos louvadores do maioral arrojado. Não só, girândolas de atrativos demorados, mais de semana no giro de roda gigante, montanha russa, tobogãs, escorregos, barcaças, tiro ao alvo, barracas de fogos e jogos, artistas variados no palanque e, embaixo, o desfile vistoso de curau do muito com domingueira nos trinques, dentes no quarador de bumba-meu-boi, mesuras adiantadas pra matuta bonita dos olhos vivos nas tranças de sonsa: Roda a saia, fulô, pro aroma do amor. De todo canto, caravanas; comitivas das lonjuras mais ignotas. Era gente como a praga! Chega dava gosto de ver, maior arrocho, entre transeuntes de fisionomia ignorada. Zeca Biu mesmo queria era se aproveitar dos muitos festejos, dava uma de vaqueiro aos traques para render o Espácio, tudo no faz de conta, peido-de-véia nos cascos do que foi Surubim, batia pé no Rabicho da Geralda, ou vaias pro Mão-de-pau, danças do Boi-Barroso que não tolerava apartação, nem vaquejada; e o mimoso Pintadinho na queda de rabo da mucica ou de vara pra virar o mocotó e o pescoço quebrado: Hê, Zebedeu, ô boi do cu cagado! Aboio do tanto pro ABC do Boi Prata, aplausos pra décima do Bico Branco, claque convocada pro romance do Boi Liso, qual boi-de-mamão, se passando por calemba, de fita ou de reis, ou vai na-vara quem não foi boi-santo, o zebu Mansinho do Padre Cícero; e praquele que morreu na boiada, mandava logo buscar outro lá no Piauí, pra festa de solfas e gestas, no meio dum feixe de capim verde, jogado num roçado qualquer pra ouvir aqueles da conversa de Rosa. Um primor de variedades. De repente, maior rebuliço! O que foi? Corre! E pé na bunda, saia na cabeça, zigue-zague, puxavanques, barruada de fuças, pernas enganchadas, a roda virou e girou os assustados, correria em todas as direções. A confusão exorbitou de quase ninguém sair do lugar, travados de pavor. O pânico formou alarido, assombrados metiam-se dentro de loca que fosse escapando do obnóxio. Esconderijos impossíveis arranjados na hora, escondidos no desembesto. Que droga é nove? Trancados e trêmulos, onde estavam apavorados, nem podiam sequer falar, nem se entendiam. Zeca Biu coração saindo pela boca, tremia mais que vara verde, os dentes chacoalhavam no queixo. Via-se gente desmaiando, morto carregando vivo, todos na carreira pra se abrigar, menino que perdeu os pais, mulher à procura do marido, quem perdeu a fé desgraçado, quem escafedeu de nunca mais voltar, quem perdeu a coragem paralisado, quem perdeu o norte e se desencontrou, quem cegou de vez, ou emudecia pra sempre, ou endoidava, como se safar daquela tragédia, um escarcéu. Oxe! O que foi? Não viu o boi brabo da venta fumaçando? Quem viu nada não. Balbuciou-se: Será a volta do feroz Jauaraicica que saiu do remoinho do Uirapiá? Danou-se! Cadê um vaqueiro bom nessa hora? Era. Tanger como? Perigava era mais penar. Parece mais o touro de Pasifae! Vixe! Isso é peta! Quem não soubera da fúria majestosa dum bicho desse pelos arredores, hem? Mesmo. E agora? O desencontro tamanho de nem darem fé de armas, espingardas, rifles, pistolas, garruchas que espoletas, pólvoras, coisas do tipo: Cadê moral pra mira? Brabo perdia a homência ofendendo a coragem com o serviço efetivo de dar cabo daquela rumorosa situação vexatória; certificava-se a frouxidão, o que de enorme se fizera. Isso não tem cabimento! O povo amuava. Alguém afirmou solene e saiu: É Ápis! Quem? Um boi endemoninhado! Como assim? Oxe, o cara foi lá no boi! Quem é esse lelé? Eis que um incipiente anônimo discípulo do doutor Zé Gulu esclareceu respostante: É Apolônio. O marido da Maria Biruteia? Não, o de Tiana. Ficou no mesmo, nunca vi mais gordo! Parece mais um metido a Jesus! Pois é, o mundo é muito grande para um único salvador... Essa é boa, conta outra! Ora, vamos tomar pé da situação, gente! E quem é esse tal de Ápis tão brabo? Um deus egípcio associado com Ptah e que personifica a Terra! Entendi nada, de novo. Como é que é? Simboliza a vida e a morte, era venerado em Mênfis! Pronto. Conversa! Pelo jeito quer matar a gente tudinho! Será? E tem muitos outros nomes! E quem és tu, cara pálida falador? George de Wells. Quem? Deixa pra lá, ouça! Num pode! Veja! E o medo virou curiosidade e, desta, expectativa: O que vai fazer aquele embirutado ali? Ouve-se um berrante, o boi se aquieta diante da presença daquele estranho: O boi sentou-se sobre o silêncio de Deus... Pronto, agora é o Touro Sentado. Chi! Silêncio. E explicou a cena: Apascentou a fera. Vixe! E era hora vagarosa, o barbatão moroso, os chifres retiniam afoiceados, o focinho estremecedor, o mugido trovejado, bulia as ventas estarrecedor, afinal refestelava com aquele que parecia domá-lo, estalando os dedos e, ambos, pareciam numa amizade antiga e tomaram apaziguada direção de sumirem por léguas. Aaaaaaahhhhhhh! Aos poucos cabeças apareciam às portas que se abriam furtivas, janelas escancaravam com esmaecidas luzes acesas, conversagens, remoques, corajosos atrasados e o converseiro tomou conta: havia quem quisesse pegar aquele que escapava de todas as emboscadas, não temia nem vaqueiro nem cavalo, mas cadê coragem? Daria um bom repasto! Heresia! Oxe! Quem não quer? Aquele porte, que lombo! Sequiosos, lambiam os beiços: o coração, fígado, os quartos, saborosos. E queriam o sebo pra temperar feijão e fazer sabão; queriam o couro vacum pra fazer surrão e carregar farinha; queriam a língua fritada pros comensais; queriam os miolos pruma panelada, os cascos pra canoa, os olhos pro botão das casacas, os chifres para colher temperar banquetes, as costelas pro cavador de cacimbas, as canelas pra mão pisar milho, a pá pra tamborete, o rabo pra bastão nas mãos das velhas, o esterco pra estrume embelezar florada, a baba pra remédio, os pelos pra amuleto, a urina pra remédios, o sangue pra cabidela, o nome pras gestas e solfas e o resto que sobrasse pras relíquias de sortilégios do beato Zé Lourenço. E depois colocar um boi Ápis de barro numa manjedoura encantada pros milagres cotidianos. Doer de bicho é graça! Desalmado, o boi também é gente, também sofre o sentimento. Os temores se dissipavam, ressabiados iam íntimos pras suas casas. Foram então surpreendidos pelos retardatários capangas do barão à caça do fabuloso boi, agora já era tarde. Zeca Biu ainda tomado pelo susto, seguia mais que impressionado, a ponto de não conseguir pregar os olhos: a imagem viva do perigo e a desgraça de quase morrer. Cochilava aos sobressaltos, com pesadelos recorrentes. Passou a noite dorminhoco, assaltado pela ameaça dum ataque, de ver o dia amanhecer e não dormir quase nada. Enfim, despertou sonolento, ainda tomado pelo susto. Abriu a porta e fez menção de ir pro quintal, cismou, bateu os pés e paralisou aterrorizado: o boi estava lá, entre os seus tantos outros bichos, maior intimidade. E agora? Até mais ver.

 

Florbela Espanca: O meu mundo não é como o dos outros, quero demais, exijo demais, há em mim uma sede de infinito, uma angústia constante que eu nem mesmo compreendo, pois estou longe de ser uma pessimista; sou antes uma exaltada, com uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que se não sente bem onde está, que tem saudades... sei lá de quê!... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

Willa Cather: Os tolos acreditam que ser sincero é fácil; só o artista, o grande artista, sabe o quão difícil é... Há coisas que se aprendem melhor na calmaria e outras na tempestade... Os mortos bem que poderiam tentar falar com os vivos, assim como os velhos com os jovens... Veja mais aqui, aqui, aqui & aqui.

Camille Claudel: Caí num abismo. Vivo num mundo tão curioso, tão estranho. Do sonho que era a minha vida, isto é o meu pesadelo... Há sempre alguma coisa que falta e que me atormenta... Não quero dizer nada porque sei que não posso protegê-lo do mal que vejo... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

A REBELDIA DE UMA FLOR

Imagem: Acervo ArtLAM.

A mulher tem duas mãos \ Agarrar com força a essência da vida \ Os tendões retorcidos são dilacerados pelo trabalho. \ Não se enfeitando com sedas brilhantes. \ A mulher tem dois pés. \ Para alcançar seus sonhos, \ Para permanecermos unidos, firmes \ Não se alimentar do trabalho alheio. \ A mulher tem olhos \ Em busca de uma nova vida. \ Para olhar para longe, através da Terra. \ Não lançar olhares amorosos em tom de flerte. \ Mulher de coração, \ Uma chama constante \ Aumentar a força, criar uma massa, \ Porque ela, ela é uma pessoa. \ A mulher tem uma vida. \ Apagar os vestígios do mal com a razão. \ Ela tem valor como pessoa livre. \ Não como servo da luxúria. \ Uma flor tem espinhos afiados. \ Não desabrochando para um admirador \ Ela floresce para criar \ A glória da terra.

Poema da premiada poeta e feminista tailandesa Čhiranan Pitpreecha (Čhiranan Prasertkul ou Phitprīchā).

 

EM BUSCA DA ETERNIDADE – [...] Fico impressionada com o fato de que o que antes parecia uma revelação devastadora e transformadora agora é apenas mais um evento infeliz em uma longa série deles. O tempo e a clareza têm o poder de suavizar as arestas. [...] Às vezes, a explicação mais simples é aquela que está bem na sua frente. [...] O amor não te enlouquece. Não é drama, caos e insegurança. Não quando é verdadeiro. O amor é ancorador, curador, a força mais estabilizadora do mundo. [...]. Trechos extraídos da obra Chasing Eternity (Entangled Publishing, LLC, 2024), da escritora estadunidense Alyson Noel, que na sua obra Ruling Destiny (Entangled Publishing, LLC 2023), ela expressou que: […] Não importa o que nos separe — oceanos, continentes ou até mesmo o próprio tempo — sempre encontraremos o caminho de volta um para o outro. [...] Ao longo da história, são os inconformistas que realmente desbravam o mundo em seu tempo. [...] Homens fracos sempre foram aterrorizados pelo poder inato das mulheres fortes — de todas as mulheres, na verdade. E mulheres que temem seu próprio poder sempre apoiaram esses mesmos homens fracos. Um ciclo vicioso. [...]. Também noutro de seus livros, o Stealing Infinity (Entangled: Teen, 2022), ela menciona que: […] A combinação inebriante de extremo conforto e luxo, aliada à monotonia da rotina, faz com que os dias se misturem tão perfeitamente que é fácil esquecer a que mundo realmente pertenço. [...]. Ela é autora de obras como Saving Zoë (2019), Dark Flame (2010), Evermore (2009), Blue Moon (2009) e Shadowland (2009). Veja mais aqui, aqui, aqui & aqui.

 

A BANALIZAÇÃO DA VIDA HUMANA - [...] por que será que se banaliza a vida humana? Por qual razão os homens optam pela violência para reivindicar o que quer que seja ao invés de optarem pela via do diálogo e consenso? O que move e/ou motiva um ser humano a tirar a vida de outro humano? Por que Deus, sendo um Deus Bondoso, Omnipotente, e com todos os atributos belos que tem, conforme os meus pais e os catequistas me ensinavam, permite ou deixa que tais atrocidades aconteçam? Por que será que um Deus Justo consente tanta injustiça sobre os inocentes? Por que será que ele, sendo um Deus Bom, fez homens bons e dobem e, de modo igual, em contrapartida, homens maus, adeptos do mal e, em função disso, impendiosos? O que impede que os homens vivam em paz e em harmonia uns com os outros? Qual será a raiz da maldade e da violência existente no interior do homem e, por conseguinte, no mundo? Se sou ensinada que Deus fez-nos (criou-nos) à sua imagem e semelhança será que, pelo facto de existirem homens bons e maus, ele também é, simultaneamente, bom e mau, bondoso e maldoso, justiceiro e vingativo? Afinal quem é esse Deus, ou que Deus é esse, tão poderoso, que admite e/ou autoriza os maus a tomarem conta dos bons, que permite que a maldade (o mal e o mau) prevaleça sobre a bondade (bem e bom) e não o contrário? Será por isso que, após a morte, existe o paraíso como recompensa para os bons e o inferno como castigo para os maus? Estas e outras questões, de forma recorrente, atravessavam o meu juízo, se quisermos pensamentos e, de certo modo, pelo facto de, intrinsecamente, constituírem uma preocupação, sobretudo pela incapacidade de, na altura, poder ter ou dar uma resposta cabal às mesmas, mais do que me interessavam, lamentavelmente, acabavam sufocando e perturbando o meu juízo. Talvez, no fundo, o que realmente me interessava era que nós, o povo moçambicano, vivêssemos em paz e harmonia. Era o fim da guerra. Era, mais do que a possibilidade, a necessidade premente de termos uma vida digna, uma vida isenta de todo o tipo de escassez. [...] Cada país subdesenvolvido/pobre assume uma função produtiva. Os subdesenvolvidos ficam responsáveis com a parte de produção sem muito valor agregado e os desenvolvidos/ricos ficam responsáveis pela marca, montagem e venda do produto e com o lucro final, que é a “maior parte do bolo”. Assim, seria oportuno notarem (os estudantes) que este panorama marcou o início das transnacionais, cuja sede é, por via de regra, estabelecida no país rico e as filiais, quase sempre, nos países pobres. O país rico somente tem o controle da economia e da indústria. É a hegemonia globalizada. [...] Trechos da entrevista Relatos de uma Filósofa: Entrevista com Rosa Mechiço (Abatirá - Revista de Ciências Humanas e Linguagens, 2021), concedida pela filósofa e professora moçambicana Rosa Mechiço.

 

INDÍGENAS & DITADURA MILITAR

O livro Indígenas e ditadura: crimes e corrupção no SPI e na FUNAI (Telha, 2024), do historiador e professor da Rede Estadual de Pernambuco, Rodrigo Lins Barbosa, é a continuidade dos estudos realizados para a dissertação de mestrado O Estado e a questão indígena: crimes e corrupção no SPI e na FUNAI (1964-1969) (UFPE,2016), na qual trata sobre a política indigenista no Serviço de Proteção aos Índios, o governo militar e a questão indígena, a violência contra indígenas e corrupção no SPI e na FUNAI, concluindo que: [...] os crimes contidos no extenso Relatório Figueiredo, que se situa em torno dos 20 anos finais do SPI, envolvendo a existência de casos de abandono e de violência contra indígenas em várias regiões do Brasil, principalmente, na Amazônia e no Centro-Oeste. Observamos que os indígenas, muitas vezes, resistiram na defesa de suas terras contra fazendeiros, seringueiros, grileiros, garimpeiros, madeireiros e à instalação de empresas seringalistas, mineradoras e madeireiras. Entre os casos, nos chama à atenção a existência de funcionários e diretores do SPI que se omitiram aos casos de violência e invasões em terras indígenas, sendo coniventes e até participantes das negociações e delitos. [...] Casos de violências contra índios ocorreram ao mesmo tempo do avanço das frentes de expansão nas regiões da Amazônia e do Centro-Oeste, observando várias formas de usurpação e exploração das terras indígenas. Algo que provocaria mudanças drásticas nos modos de vida e na cultura dos índios [...] as violências contra indígenas existiram e continuam existindo independente se o governo tem uma postura ditatorial ou democrática, porque os interesses econômicos sempre tem se sobressaído aos Direitos e garantias desses povos, que almejam viver em suas terras e manterem seus costumes. Os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade tiveram o papel de trazer para a visibilidade estas “violações de direitos humanos por agentes do Estado na repressão aos opositores”. Cabe ao Estado apurar as denúncias e investigar os casos de violências, em especial, às comunidades e indivíduos indígenas, mas não apenas a esses, bem como às pessoas mortas porque recusavam os ditames negligentes, repressivos e autoritários do Governo Militar, coadunado com os interesses das corporações agroindustriais. No Brasil, as questões econômicas sempre influenciaram a realidade dos povos indígenas, por interesses de fazendeiros, seringalistas, grileiros, empresas mineradoras, madeireiras, bem como políticos e o próprio Estado com a implantação de projetos governamentais, como a recente construção da Hidrelétrica Belo Monte que, se concluída, além de trazer danos ambientais, como a inundação das matas com o desvio do rio Xingu, e a escassez de animais nativos para a caça e a pesca das populações locais que sobrevivem da terra, mas também o desalojamento de comunidades pertencentes à terra. No momento, a Hidrelétrica Belo Monte está sendo debatida e criticada por ambientalistas, antropólogos, promotores públicos e pelos índios. [...]. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

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USINA DE ARTE

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ITINERARTE – COLETIVO ARTEVISTA MULTIDESBRAVADOR:

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ROSA MECHIÇO, ČHIRANAN PITPREECHA, ALYSON NOEL, INDÍGENAS & DITADURA MILITAR

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