domingo, dezembro 14, 2025

YANICK LAHENS, VENEZIA MAY, SOPHIA KIANNI & FACILITA GONZAGA!

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Chegou a hora de nos adorarmos, de dizermos isso em voz alta, chegou a hora de criarmos memórias... O amor, como eu, parte em uma jornada. Um dia eu o encontrarei. Assim que eu vir seu rosto, eu o reconhecerei imediatamente... É preciso tanto, e tantas lágrimas, para ter o direito de amar... Cada besteira que você fizer nesta vida, você terá que pagar por ela... Use suas falhas, use seus defeitos; então você vai ser uma estrela... Não peço desculpas pela falta de cronologia nas minhas lembranças, pois um incidente evoca outro, então eu as anotei... Não me arrependo de nada!...

Pensamento recolhido da obra The Wheel of Fortune: The Autobiography of Edith Piaf (Chilton, 1958) & ao som do album Edith Piaf: 25 chansons (1982), da cantora e atriz francesa Édith Piaf. Veja mais aqui & aqui.

 

Olha a hora! Lá vai ela... - O frio de junho no reino do presente contínuo de Ftinoporão. Ainda é cedo e a preocupação transcende o cansaço, entre a vigília e o estupor, o insistente choro de um bebê na vizinhança, queimando nas vísceras da madrugada. Lá fora o galo cantou alhures e era como a obrigação de pôr as coisas em dia: quem tem contas pra pagar jamais poderá dar-se ao luxo de folga – logo quem sempre errava na conta e o cálculo se perdia no prazo encurtado, sabe-se lá como. Foi preciso o ânimo de Ferusa e os gemidos de uma gata no cio: difícil é segurar a onda contra o aluamento fortuito noutras elucubrações. Afazeres sumários davam conta da goteira no teto, o pingado na pia e cadê velas e fósforos, a luz apagou subitamente, ampliando as trevas proutras fantasmagorias. É preciso fechar as janelas, um chuvisco demorado alagava o ataque dos insetos que picavam e isso dói e como! E Anatole escondia Auge sob carregadas nuvens e me trazia a lembrança de Laura que lia Virgínia e vivia sufocada pelas circunstâncias das cenas da Dalloway de Marleen Gorris e as frustrações repisadas como em The Hours de Cunningham. Mas, que dia é mesmo hoje? Precisava fechar a torneira, a vasilha enchia a esborrar pra todo lado. A chaleira esquentava no fogão e era só uma semana como outra qualquer. Sim, nublada manhã de Quimão, os encharcados escondiam Talo e não mais brotavam esperanças, nem poderiam, impediram Carpo emergir de Damia e coibiram Auxo e Auxesia, inviabilizações extemporâneas. Nossa! Como podia, a ventania escancarou a porta, ah, emporcalhava tudo e as intrometidas rãs invadiam pro atrapalho do chocho matinal de Acte. Já chuva torrencial anunciando o atraso da saída de casa, difícil assim encarar tumultos e lodaçais, como se sucumbisse ao noticiário: a zoada das tevês, o som violento dos filmes de ação; a liberdade perdida e dela a infância – quebrou o pé pulando muro; a adolescência destruída – cortou-se aparando flores no jardim, o primeiro beijo na esquina, a festa do dia 8, as risadas espalhafatosas e ela se confundia aos buracos e desníveis das calçadas empoçadas, quase voçorocas, prest’enção, doido! Um tombo, nada demais. Segura! Os vazamentos são os mijos da Terra. Será? E o horror destampava a panela cozinhando ódios e mágoas. Parecia trágico sorrir se havia violência iminente – o déjà vu de sempre, a sensação vicariante e as bravatas desmioladas traziam as muitas faces de Virgínia, desde a madrugada. E via Clarissa carregando seu fardo e, com isso, intuía: a gente quer mesmo mais que o impossível, além do extremo, dane-se tudo! E ela evocava peremptória de que estou devendo e muito à Ginastique, quase obeso aos estorvos. Chegava Mesembria insinuando Eiar, enquanto reaparecia Acte sinalizando o estômago carente no meio do caminho e só dava direito à metade de quase nada, para valer-me entre a sanidade e a loucura. Ainda pra onde, vai saber, ardido pelas trapaças e percalços; a censura velada aplacando futuro; e se tudo era meio, como festa/tragédia, riqueza/pobreza, assassinatos, corrupção, precisava mesmo era agarrar a sorte pelos chifres e segurar firme Euporia, quem dera. Assoviava então o tempo passava tapiando o calor esbaforido, o suor pingando testa abaixo e a resignação com as peçonhas recônditas nos olhares vistosos, aquilo tudo mais parecia matagais tomando conta de quintais tão bonitos, terrenos baldios com arame farpado amarrado direito, coisa, hem, pra desvalido: tudo ao tempo vagava e era preciso divergir do exagero - se ganhou o que perdeu, ou era uma vez o ganhado, recombinava o olho no alvo e a mira, o inédito da coisa. Bulhufas! Nem adiantava tapar os ouvidos, evitando o diverso da ventura. E soerguia os trunfos duma insólita mania inglória que vinha desde antes e lá longe acenava remoques. Só podia e valia agora, o imediato; descuido, a vida troçava, danada! Precaver-se aos desembestos, doido varrido, e se esmorecia além do mais com as escolhas, o antes do depois, já era. Convviria precauções e atinava de governança desajeitada com os desacertos: prazeres e pesares. Larga de ser desatento, manzanza! Pensando que o céu é perto? Era comigo, fundo respirado contando até 10 e 20 e 100... – e não era pra nada, como quem jogasse Leão no bicho e desse papalégua, arre égua! É um sinal, será, se avie. Mas, teco! Parece mais aquele mato morrido pela pisada, jamais o ar da graça de Ortosia, porque Disse foi subjugada desde que invocaram Eunomia e se escafederam evadidas. Quase nem sabia do sorriso de Hesperis atarantando a melancolia de Disis, passando a limpo o que fiz de tudo e era nada, noves fora zero e sem café da manhã nem mesmo almoço, e Acte já cobrava o jantar. Refazia a rota estiada de volta como num asco de Teros pelas muitas faces de Virgínia orbitando abantesmas inusitados. Como embaraçado de todo passava batido outra vez, o regaço já prestes e a porta emperrava, a vidraça quebrada, embassou o tempo e quem podia incriminar, se não adiantava maldizer a própria caricatura: dei-me ao aloprado, parece, a careta por conta da mosca na sopa, babau! Uma hora dessas e o grilo cricrilava infinito, com a imposição de Ninfe e a latrina podre, a inhaca de comida estragada, maior catinga de aprisionado na própria obscuridade e data alguma delatava o impostor: se puxasse pelo adágio não ia adiantar nada; se subisse nas tamancas para rodar à baiana, muito menos: só perdia a compostura. Melhor, digitígrado, sair de fininho, murcho. Esse negócio de trancar rua e arrasar quarteirões são coisas de causa perdida de quem não tem a menor noção dos estrupícios. O que era de gosto não só esfolava o peito como deixoava pereba arranhando no couro. E findasse, sei lá, com um tapa-olho daqueles murros bem dados, da roncha na vista inchada, da pestana à bochecha, nada atraente. Melhor seguir em frente maneirando no rebolado, pisando firme o traçado como quem dava triunfal volta por cima, não ligando pra cheleléu, caboeta ou pariceiro, sal grosso no revertério: Saia logo desse atoleiro e pega o bigu que seja na sorte, trepeça! Tem gente que só atina aos empurrões, tropeços do muito pelos catombos: não se afrouxe, nem dê mole, não! Segura a touca como puder, não vestindo alegria com amarguras, nem como a flor em vão despetalada:  fechar a boca é dar-se por si. Já era tarde, ligou, véspera de viagem: quando foi a última vez? A incompletude pinicando quando era pra relaxar com Musique e na libação de Esponde, celebrando ignota Vênus/Afrodite e o domínio distante de Eros, pelo saboreado de Oporá nos júbilos de Teoria, afinal, também sou filho do Universo e ela, oxe, reaparecesse na veneta escapando das cenas de Daldry, porque estava prestes a hora de dormir e não havia nenhum rio Ouse por perto e podia se livrar daquela que desceu o rio como Alfonsina Storni se lançou ao mar... Suspeitávamos ciosos: ninguém ficará pra semente. Todos morremos disso ou daquilo, hora certa; quando não, todo dia. Pra quê se descascar todo se a chuva caia e lavava, o Sol enxugava, assim ia e a doidice sempre comum para todos - só o bicho humano é duro de lascar e o incompreensível era porque dava-se quando a ligeira hestória se alongava e não dava outra: era a morte pertinho sem cochilado, enquanto esquecíamos a pacífica Irene, aos pinotes em pé de guerra, com Elete genuflexa e não se falava mais nisso, ora. Ademais os sonhos sumiram pelos degraus infinitos do horizonte: quem foi, faz tempo; quem vai, apraza; não esqueça de se lembrar: entender-se consigo mesmo e já. Eu mesmo virei a página: escolhi viver - a vida inventada e a se reinventar moto contínuo. Até mais ver.

 

Agnès Varda: O ato de decidir olhar, de decidir que o mundo não é definido por como as pessoas me veem, mas por como eu as vejo... A felicidade é uma fruta linda que tem gosto de crueldade... Veja mais aqui, aqui & aqui.

Blanca Varela: Deixei a porta entreaberta \ sou um animal que não se resigna \ a morrer a eternidade \ na escura dobradiça que cede \ um pequeno ruído na noite \ da carne \ sou a ilha que avança sustentada \ pela morte ou uma cidade \ ferozmente cercada \ pela vida \ ou talvez não sou nada \ só a insônia \ e a brilhante indiferença dos astros \ deserto destino inexorável o sol dos \ vivos se levanta reconheço essa porta \ não há outra gelo primaveril e um \ espinho de sangue no olho da rosa... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

Nazik al-Mala'ika: Nunca saberemos quais mistérios as dobras da vida escondem... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

SE MOISÉS FOSSE FILIPINO

Imagem: Acervo ArtLAM.

Marnie me conta que é nadadora \ que desde que se lembra, \ flutua em águas de enchentes \ que às vezes, quando isso acontece, imagina-se como o bebê Moisés \ flutuando pelo Nilo, \ à espera de uma rainha que a encontre. \ Sob um telhado de metal ondulado enferrujado \ pelas torrentes devastadoras, \ o único refúgio para ela e suas filhas pequenas, \ ela me mostra seu equipamento de natação: \ sua roupa de mergulho para dermatite de contato, \ as cicatrizes de cortes de vidro emoldurando seus olhos \ como um snorkel, seus pés enrugados que, segundo ela, são quase palmados. \ Ela me diz: \ Quando há enchentes na região metropolitana de Manila \ todos os anos e você tem sete anos, \ você fica feliz. \ As aulas acabaram e tudo o que você pensa é em pular na água vermelho-tijolo, \ lutar na lama com a filha da vizinha, \ pular, brincar de sapo para se pendurar nas cestas de basquete \ que você finalmente consegue alcançar. \ Há baratas agarradas à gola da sua camisa, \ ratos se enterrando nos seus bolsos \ e você se imagina como a arca de Noé. \ Mas quando Manila sofre com enchentes todos os anos \ e você se torna mãe de duas filhas de sete anos, \ aprende a guardar tudo o que é precioso em seu corpo. \ Marnie dorme com os pulsos presos \ às tranças das filhas, \ passaportes enfaixados no sutiã esportivo, \ os membros da família tatuados em sua caixa torácica \ — uma filha, um peixinho dourado; outra, um crocodilo — \ todos são animais aquáticos. \ É assim que ela se acalma ao acordar sufocada por seus sonhos, \ sabendo que elas podem nadar. \ Ela imagina suas cicatrizes se transformando em guelras \ e finalmente começa a respirar. \ Quando Manila sofre com enchentes todos os anos, \ você aprende a guardar tudo o que é precioso em seu corpo. \ E qualquer outra coisa que você memorize, \ como a realidade anual dos filipinos na região metropolitana de Manila \ é a luta desesperada para subir do colchão ao telhado, carregando \ uma cadeira \ um bebê, \um bule de chá, uma urna, \ enquanto observam um furioso Faraó líquido \ engolir tudo o que possuem, \ liberando seu mar de homens \ e escravizando-os em sua própria terra. \ Mas Marnie ainda me diz que é nadadora, \ me diz que desde que se lembra, \ flutua em águas de enchente, \ me diz que às vezes, quando isso acontece, \ imagina-se como Moisés \ diante do Mar Vermelho \ e, desta vez, consegue abri-lo.

Poema da ecopoeta e artista singapurense Venezia May.

 

BANHO DE LUA - [...] Ela poderia ter escutado por horas essas palavras arrancadas da avalanche de dias. Porque o tempo gasto conversando assim não é tempo, é luz. O tempo gasto conversando assim é água que lava a alma, o anjo da guarda. [...]. Trecho extraído da obra Bain de lune (Sabine Wespieser, 2014), da escritora haitiana Yanick Lahens, também autora de Moonbath (Deep Vellum Publishing, 2017), no qual expressou que: […] Perdoar, de imediato, naquele instante, com o ódio ardendo como um coração na mão? Não, eles não conseguiam. Porque o ódio fazia você se sentir bem por dentro. Confortava como a fé em Deus. Eles não tinham tempo para julgar. Estavam matando. […]. Sobre o seu país ela afirma: Apesar da pobreza, das convulsões políticas e da falta de recursos, o Haiti não é um lugar periférico. Sua história o transformou em um centro.

 

A CRISE CLIMÁTICA É UMA CRISE DE DIREITOS HUMANOS - [...] Alguns governos e líderes empresariais dizem uma coisa, mas fazem outra. Em que linguagem precisamos colocar os dados climáticos para você agir? Por favor, diga-nos. Porque eu tenho que acreditar que a única razão pela qual você não está tomando medidas climáticas no ritmo e escala necessária é que você não tem a informação. Porque se você tivesse a informação e estivesse apenas fingindo agir que seria imperdoável. Ou nas palavras do secretário-geral, isso seria mentir. Pare de mentir. [...] O que me deu esperança foi ver todos aqueles jovens, que se importam tanto que vieram até o Egito para serem ouvidos. E ser o veículo para comunicar esse entusiasmo. Ter uma plataforma como essa para comunicar como os jovens se sentem para as pessoas que podem implementar e mudar. É um grande passo em frente para a inclusão significativa da juventude. [...] Há tanto trabalho para fazer na alfabetização climática. Veja o painel intergovernamental de referência sobre mudanças climáticas, relatório climático do IPCC. [...] A maioria das informações científicas é em inglês. Essa não é a língua principal para a maioria das pessoas do mundo. O pote de dinheiro ainda está vazio. Somente quando virmos compromissos tangíveis – quando virmos o financiamento começar a ser distribuído – é que eu acho que esses acordos têm sido um sucesso. [...] A crise climática é uma crise de direitos humanos. [...] Tem havido má gestão governamental da água. O que está acontecendo no Irã é uma revolta histórica, liderada por mulheres. A crise climática – particularmente a seca – exacerba a instabilidade no Oriente Médio. Contribui para as lutas de poder e os conflitos. Todas essas coisas estão ligadas. Os direitos humanos são agravados pela crise climática. E a crise climática tem um efeito desproporcional na nossa metade da população. As estatísticas mostram que 80% dos refugiados climáticos – as pessoas que são deslocadas – são mulheres. Um dos meus maiores focos é a moda sustentável A moda rápida é um grande problema para a geração Z. Essas empresas têm como alvo mulheres jovens. Precisamos alavancar a tecnologia para encontrar soluções. Para tornar a moda de segunda mão mais acessível. Estou trabalhando nisso com amigos de Stanford. [...] Trechos da entrevista (CIWEM - The Chartered Institution of Water and Environmental Management, 2023), concedida pela ativista estadunidense Sophia Kianni, que defende: O medo do fracasso é o que impede que as pessoas se envolvam. Precisamos de ativistas climáticos mais imperfeitos. (National Wildlife Federation, 2023).

 

FACILITA, GONZAGÃO: TATARITARITATÁ

Comadre Joana sempre reclamou \ Da mini saia que a filha tem \ O namorado se invocou também \ E certo dia pra ela falou \ Tua saia, Bastiana, termina muito cedo \ Tua blusa, Bastiana, começa muito tarde \ \ Mas ela respondeu, oi facilita \ Pra dançar o xenhenhém, (oi, facilita) \ Pra peneirar o xerém, (oi facilita) \ Pra dançar na gafieira, (oi facilita) \ Pra mandar pra lavadeira, (oi facilita) \ Pra correr na capoeira, (oi facilita) \ Pra subir no caminhão, (oi facilita) \ Pra passar no ribeirão, (oi facilita) \ Tataritaritátá (oi facilita ) \ Pra brincar na cachoeira (oi facilita) \ Rã rã rã rã rãrã (oi facilita) \ Pra dançar na gafieira, (oi facilita) \ Pra correr na capoeira, (oi facilita) \ Pra mandar pra lavadeira, (oi facilita)...

Música do compositor, bibliotecário e professor Luiz Ramalho (1931-1981), inserido no álbum Luiz Gonzaga (Odeon, 1973), do cantor, compositor e multi-instrumentista Luiz Gonzaga (Luiz Gonzaga do Nascimento – 1912-1989), o Rei do Baião. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

ITINERARTE – COLETIVO ARTEVISTA MULTIDESBRAVADOR:

Veja mais sobre MJ Produções, Gabinete de Arte & Amigos da Biblioteca aqui.



YANICK LAHENS, VENEZIA MAY, SOPHIA KIANNI & FACILITA GONZAGA!

    Imagem: Acervo ArtLAM . Chegou a hora de nos adorarmos, de dizermos isso em voz alta, chegou a hora de criarmos memórias... O amor, co...