quarta-feira, julho 17, 2019

VANDANA SHIVA. KLIMT, ESOPO, ANA VITÓRIA & BILHETE JOGADO


BILHETE JOGADO - Saí de casa, tinha de. Sem ter para onde ir, a esmo. Por intuição rumei pro Leste, o Sol e o tempestuoso Atlântico. O mar que sou nascente e vida. A convulsão, vibrações extremas. Renascia: a placidez em mim. Um reencontro, prazer real: sou em mim e em tudo. Contemplo e interajo. Nunca fui tão imenso, da aurora ao crepúsculo. Veio o céu estrelado e tinha de ir. Para onde? Não sabia. Comecei a andar e segui pro Sul, sem bússola nem hora de chegada. Pés na areia, não havia tempo, apenas terras lavadas que vi e não sabia: quase matas, rios quase secos, vida devastada. Andanças que deu na Terra do Fogo Antártico, a correr o risco de morrer de fome ou de frio no centro de duplo polo inacessível, sem fuso e com pinguins dançando na aurora austral por lagos subglaciais e sangue na geleira de Taylor. Tudo passa e passei. Ah se pudesse voar, pervígil caminhar, errâncias, sina até onde desse o fim do mundo ali. Não havia e, sem perceber, ia já pro Oeste à deriva continental pelo círculo de fogo do Pacífico, ah namoro de El Niño com La Niña, cordilheiras que sonhei a dar com mistérios incas, maias e astecas, altos das quimeras, solidões de nunca mais, até me ver no Glacial Ártico e as Valquírias com seus elmos e lanças, passavam montadas em seus cavalos e traziam a aurora boreal com os relâmpagos de arenque, os fogos de raposa da Lapônia e os espíritos dos altos reinos que rodeiam o oceano – os ancestrais dos agonquinos que dançam para que os esquimós me mostrem a oscilação de Chandler e os ursos polares pelo cluster do Monte Qaf, o purgatório de Dante e Virgílio; no trajeto do Capitão Hatteras de Verne, avistei os seres da Hiperbórea e sequer imaginei na ilha de Bathurst, em Nunavut. Era preciso voltar entre as almas dos guerreiros mortos da Letônia. Cenas que vi e esqueci, agora rondando minha cabeça, reprises das estações e renascimentos do que fui pro que sou. Só vivia andejo, os esplendores do dia, muito pôr do Sol, ventanias, os que vagavam e se perderam circunspectos, aclives de ontens, declives íngremes, a periferia das coisas, tremores e meus estremecimentos. Logo dei nos bosques de Walden, lá estavam, às gargalhadas, Thoreau e o barão de Münchhausen. Ouvi suas conversas, discernia, relaxava: preciso aprender a puxar meu próprio cabelo. Nem havia me dado conta de horas, dias, meses, anos, passaram. Thoreau falou pro barão: Só resta a você, a mim e a quem quer que seja, viver. Nunca desistir. Ah, sim, persistir, perseverar. Tinha de ir, voltar para casa. Como, se não tinha mais paradeiro, do íntimo para qualquer lugar, o aprendizado de ver as coisas, a América continental e senti-las, amá-las como são e sou, reaprender com o visto por todo trajeto desde que saí da minha rua, passadas pelo inesperado de arregalar os olhos, de bater nos peitos e segurar a onda, escapei por árvores e coisas que se transformavam em mulheres que falavam de algo da alma, o vento e os sons da noite que contavam do raiar do dia, caminhos nas mãos feitos para os pés. Sabia que não era louco nem herói, nem sei quem sou e o que faço entre círculos e recomeços, livre para renunciar das convenções e gozar de ser livre. Não mais descontente de si e de nada porque livre, não mais ombros pesados, cabeça baixa, olhar perdido, acanhado, estranho no seu próprio lar, tudo tão vazio, o Caribe, a Barreira do Inferno, o chão da minha terra e retomar o caminho. Nesse minimalismo me descobri supérfluo, um a mais, qualquer; uma carta de um imenso baralho e descartável, um entre tantos uns e zeros que pulam e rolam, inútil quanto contar e ser. Mas sou eu e como posso, sozinho na verdadeira vida para quem me ama. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

DITOS & DESDITOS:
[...] A cegueira que nos impede de ver tanto a riqueza da diversidade quanto a própria diversidade é o que chamo de monocultura da mente. A monocultura da mente é, literalmente, a raiz da ditadura sobre a Terra. É um instrumento de poder e controle. Não produz mais. Controla mais. [...] As monoculturas da mente fazem a diversidade desaparecer da percepção e, consequentemente, do mundo. O desaparecimento da diversidade corresponde ao desaparecimento das alternativas – e leva à síndrome FALAL (falta de alternativas). Com que frequência, nos tempos de hoje, o extermínio completo da natureza, tecnologia, comunidades e até de uma civilização inteira não é justificado pela “falta de alternativas”? As alternativas existem, sim, mas foram excluídas. Sua inclusão requer um contexto de diversidade. Adotar a diversidade como uma forma de pensar, como um contexto de ação, permite o surgimento de muitas opções. [...] Proteger as sementes nativas é mais que uma questão de preservar a matéria-prima para a indústria da biotecnologia. As diversas sementes que agora estão fadadas à extinção carregam dentro de si sementes de outras formas de pensar sobre a natureza e de outras formas de produzir para satisfazer nossas necessidades. [...] a uniformidade e a diversidade não são apenas maneiras de usar a terra, são maneiras de pensar e de viver. [...] a expansão das monoculturas tem mais a ver com política e poder do que com sistemas de enriquecimento e melhoria da produção [...] a uniformidade anda de mãos dadas com a centralização, enquanto a diversidade requer um controle descentralizado [...] A silvicultura “científica” e a agricultura “científica” dividem artificialmente a planta em domínios separados sem partes em comum, com base nos mercados isolados de bens aos quais fornecem matéria-prima e recursos. [...] o mundo vegetal não é artificialmente dividido entre uma floresta que fornece madeira comercial e terra cultivável que fornece mercadorias em forma de alimentos. A floresta e o campo são um continuum ecológico. [...] As monoculturas ocupam primeiro a mente e depois são transferidas para o solo. As monoculturas mentais geram modelos de produção que destroem a diversidade e legitimam a destruição como progresso, crescimento e melhoria. [...] A expansão das monoculturas tem mais a ver com política e poder do que com sistemas de enriquecimento e melhoria da produção biológica. Isso se aplica tanto à Revolução Verde quanto à revolução genética ou às novas biotecnologias. E ainda: As monoculturas da mente fazem a diversidade desaparecer da percepção e, consequentemente, do mundo. O desaparecimento da diversidade corresponde ao desaparecimento das alternativas. Adotar a diversidade como uma forma de pensar, como um contexto de ação, permite o surgimento de muitas opções. [...].
Trechos extraídos da obra Monoculturas da mente: perspectivas da biodiversidade e da biotecnologia (Gaia, 2003), da Ph.D em Filosofia, física, ecofeminista e ativista ambiental indiana, Vandana Shiva. Veja mais aqui e aqui.

FÁBULA DE ESOPO
Uma lebre, perseguida pela águia, pediu refúgio na casa de um besouro. O besouro, valente e generoso, decidiu defender a lebre e disse à águia: ‘Em nome de Júpiter, você deve respeitar o direito de exílio. A lebre agora é minha hóspede.’ Ignorando a argumentação, a águia jogou o besouro a um lado e devorou a lebre de imediato. Magoado, o besouro decidiu não dar trégua à opressão da águia.  Ele  foi até o ninho da águia e jogou os  ovos dela no chão, um a um.  Não havia nisso uma vingança pessoal, mas uma luta em favor dos mais fracos. A águia construiu um segundo ninho, bem mais alto, mas o besouro foi até lá e repetiu a operação. Diante disso, a águia procurou Júpiter  para buscar  um acordo com o besouro.  O chefe dos deuses  tentou acalmar o besouro, mas foi inútil. Pediu a ele que pensasse em uma conciliação, e a ideia foi rejeitada. O último recurso encontrado por Júpiter para evitar a extinção da águia foi mudar a época da sua reprodução para uma estação do ano em que os besouros não estão em atividade. Moral da história: “o carma do abuso de poder é pesado, e os opressores cedo ou tarde devem reencontrar-se com a justiça e o equilíbrio”.
A águia e o besouro, fábula extraída da obra Esopo: fábulas completas (Cosac Naify, 2013), do escritor grego Esopo (620 a.C. - 564 a.C.), contada pelo autor por ocasião de sua defesa perante Perístrato, dirigente de Atenas que era inimigo da liberdade de pensamento, por conta da acusação de sacrílego pelo oráculo de Delfos, em razão de seu discurso irreverente na defesa dos mais fracos e da verdade, reafirmando que os privilegiados devem respeitar os direitos dos mais fracos, porque os abusos de poder são sempre punidos pelos deuses. Veja mais aqui, aqui & aqui.

A ARTE DA BAILARINA ANA VITÓRIA
Minhas coreografias se concentram no movimento, na pesquisa do gesto. Não gosto de formatar conceitos, não utilizo recursos literários ou teatrais, tampouco construo personagens. Do cinema e da literatura retiro apenas ideias técnicas, que aplico à estrutura da coreografia. Elementos da cultura brasileira, como o candomblé e a capoeira, podem se inserir em minha escritura coreográfica, mas de forma apenas referencial. Da ginástica rítmica conservo a precisão e a exploração energética. Acima de tudo, é da dinâmica dos movimentos que surge a minha poética.
A arte da bailarina, coreógrafa e diretora artística da companhia que leva seu nome, Ana Vitória, que é doutora em artes cênicas e desenvolve junto às instituições universitárias, grupos de dança e companhias de dança, a sua pedagogia de investigação criativa a partir dos estudos autobiográficos, da memória e dos afetos. Seu trabalho como intérprete-criadora se deu desde cedo apontando já sua inquieta curiosidade pela busca do trabalho autoral, da escrita de si e a diversidade de potências expressivas no universo artístico. Seu exercício cênico foi gradualmente se aprofundando, desde a linguagem gestual à ocupação dos espaços de suas apresentações, ao buscar cada vez mais, tocar e estar mais próxima do seus interlocutores/espectadores, como atestam suas três últimas criações que assumem a presença do objeto e seu próprio corpo como instalações performáticas. Veja mais aqui.

A OBRA DE KLIMT
A arte é uma linha em torno de seus pensamentos. Toda arte é erótica.
A obra do pintor simbolista austríaco Gustav Klimt (1862-1918) aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
&
Pela proteção das Florestas aqui, aqui, aqui & aqui.
 

KARIMA ZIALI, ANA JAKA, AMIN MAALOUF & JOÃO PERNAMBUCO

  Poemagem – Acervo ArtLAM . Veja mais abaixo & aqui . Ao som de Sonho de magia (1930), do compositor João Pernambuco (1883-1947), ...