CARTA DE JUNHO - Tudo se pode dizer e é muito cedo, eu sei, escolhi na encruzilhada e às duras
penas fiz o que pude para seguir a esperança e enfrentar outras possíveis opções
perdidas depois de choros e risos, a renunciar o que passará como antes passou
e agora, a dor coagulada dos recomeços. Tudo passa. Não há como dizer outra
coisa na banalidade dos que pensam que o instante é eterno e que hoje será para
sempre, tudo tão provisório onde vivo tal e qual a hebetude do presente inumano,
o fracasso do ocidente e a derrocada da humanidade na glória dos vencedores. Tudo
passará. Quanto custa perdas e ganhos no semblante exposto ao abandono e aos
gestos repetidos confinados à angustiante hipocrisia, pouco ou quase nada sabe,
porque acreditei pulando num pé só pelos infernos. Foi preciso dar fé de tantos
dilúvios, não foram poucos os naufrágios e o céu caiu um tanto de vezes com
furiosas borrascas para o desastre do dia, quando pervertido pela nódoa do
exílio de um mundo com a frase tentadora da infâmia e louros, vi o que pegou carona
na correnteza, a vida no relógio para decadência e malogro. Mas não, sou dessas
nascentes manhãs: o passado é o poema do presente inventando amanhãs. Só preciso
refazer a mim e a vida, a metamorfose e a surpresa, não há tempo a perder, eu já
vou. © Luiz Alberto Machado.
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DITOS & DESDITOS:
[...] A história
das mulheres teve o seu inicio no movimento feminista da década de 1960, a
partir das manifestações inflamadas das mulheres que lutavam por seus direitos
de igualdade no mercado de trabalho, na vida sexual, na sociedade. [...] Atualmente, a história das mulheres tem
cedido espaço, com frequência, aos estudos de Gênero, os quais surgiram como
proposta de se estudar um conjunto de categorias que apresentam conexões com os
diferentes papeis sociais que, no entanto, são convencionais e arbitrários,
variando de uma cultura à outra. O estudo gênero, diferente da história das
mulheres, engloba tanto o masculino quanto o feminino, como estes se
relacionam, o que se tornou norma e o que é imposto, e como esse conjunto todo
varia de uma cultura para outra. Lembrando que, além de ser o Gênero um
elemento constitutivo de relações sociais, é uma forma primeira de significar
relações de poder. [...].
Trechos de As
rainhas de Amarna, extraídos da obra Nefertiti:
sacerdotisa, deusa e faraó (Madras, 2012), da historiadora Anna Cristina Ferreira de Souza. Veja
mais aqui e aqui.
A MULHER DOS CABELOS DE OURO
Era uma vez uma mulher lindíssima, mas muito
estranha, de longos cabelos dourados, finos como fios de ouro. Ela era pobre e
não tinha nem pai nem mãe. Morava sozinha no bosque e tecia num tear feito
de galhos de nogueira- preta. Um brutamontes, que era filho do carvoeiro,
tentou forçá-la a se casar com ele, e ela, numa tentativa para se livrar
dele, lhe deu uma mecha de cabelos dourados. Ele, no entanto, não sabia ou não
se importou em saber se o ouro que ela lhe dera tinha valor monetário ou
espiritual. Assim, quando ele tentou trocar o cabelo por mercadorias no
mercado, as pessoas zombaram dele e o consideraram louco. Furioso, ele voltou à
noite à cabana da mulher, matou-a com suas próprias mãos e enterrou o
corpo junto ao rio. Por muito tempo, ninguém notou a ausência
dela. Ninguém perguntava por sua casa, nem por sua saúde. Na sua cova,
porém, os cabelos dourados não paravam de crescer. A linda cabeleira abriu
o solo negro para subir em curvas e espirais e foi crescendo cada vez mais, em
arcos e volteios, crescendo até que sua cova se cobrisse de ondulantes
juncos dourados. Uns pastores cortaram os juncos anelados para fazer flautas e,
quando foram tocá-las, as flautinhas começaram a cantar sem parar: Aqui jaz a mulher dos cabelos dourados / assassinada
e enterrada, / morta pelo filho do carvoeiro / porque tinha vontade de viver. E
foi assim que o homem que havia tirado a vida da mulher dos cabelos dourados
foi descoberto e levado à justiça para que quem vive nos bosques
selvagens do mundo, como nós vivemos, pudesse mais uma vez estar em
segurança.
Extraído da obra Mulheres
que correm com os lobos: mitos e histórias do arquétipo da mulher selvagem
(Rocco, 1994), da escritora e psicóloga Clarissa
Pinkola Estés. Veja mais aqui e
aqui.
A ARTE DE
MANAHO SHIMOKAWA
Pela primeira vez dancei descalça e percebi que era assim. Eu fui
atraída pelo fato da liberdade de expressão. No balé, você desempenha um papel.
Você é talvez uma princesa, um rei, um palhaço... E a história é uma lei de
ferro, escrita por Shakespeare, ou outra pessoa há séculos atrás. Mas na dança
moderna, você dança a si mesmo. Você construiu a história da arte, não seguindo
a história. Nós dançamos para espelhar a era em que vivemos agora. Em vez de um
espartilho, estamos nus. Em vez de sapatos de dedo, estamos descalças. Eu continuo vivendo neste planeta pensando que (talvez)
morra amanhã. Quem disse que a
morte é algo para se ter medo? Eu estarei lá para abraçar e sorrir.
A arte da bailarina, modelo & artista performática
japonesa Manabo Shimokawa. Veja mais aqui.
A OBRA DE MURILO MENDES
Eu sou o olhar que penetra nas camadas do
mundo,
ando debaixo da pele e sacudo os sonhos.
Não desprezo nada que tenha visto,
todas as coisas se gravam pra sempre na minha
cachola.
Toco nas flores, nas almas, nos sons, nos
movimentos,
destelho as casas penduradas na terra,
tiro os cheiros dos corpos das meninas
sonhando.
A obra do
poeta e prosador do Surrealismo brasileiro, Murilo Mendes (1901-1975)
aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.