segunda-feira, fevereiro 22, 2016

INUTESSÊNCIA


INUTESSÊNCIA – (Imagem da artista plástica Maria Luísa Persson). Olho pros lados e todos os quadrantes se confundem: sou nave desgovernada ladeira abaixo. Nenhuma direção visível, os segundos são aversivos óbices embaraçadores e abissais. O que sou em essência vale nada diante do açodamento e da velocidade dos passos apressados carregando desafetos. Só me resta espiar atento entre o sarcasmo e o desespero, à margem do fascínio encantatório e fatal das sereias de Odisseu e a deferência indispensável para os que são indiferentes ao tédio e ao desencanto. Da minha parte eu levo em conta o impalpável no apogeu dos sequiosos da acumulação de dejetos e desfaçatez. Tenho o que é mais urgente que minha vida no que sou de tão desimportante quanto as festas espalhafatosas e as efemérides dos caudatários que findam na lata do lixo com todos os seus monturos e escombros. Nunca tive a índole para oba-oba e a indulgência bem comportada do traquejo social, a manter a inevitável mecânica da cega obediência aos regulamentos, quanto mais empulhado com a degenerescência da mesmice estéril e a deterioração de efígies na decadência ética. Só a poesia é o meu escrutínio e ela é como uma planta teimosa que irrompe radiante e inupta por entre a rachadura do concreto à beira do asfalto: o flagrante da imagem no momento horagá. A vida resiste. E como não vale mais o amor jurado, pactuado, a fila anda, dores e remorsos tapeados pelo primeiro afago da novidade romântica surgida da fragilidade, simulacros na vera, em que ficam só o que for útil quando valer trocados e minguados no preço do olho da cara e o irresistível glamour do amor empoderado pela volatilidade do umbigo. Sou mais que a feira dos desejos na oferta promocional de uma gôndola de supermercados. Sou mais que os faróis sismográficos da tesão que eclodem das famélicas grifes e cosméticos sedutores. Sou apenas o imo na nascença da carne e faço-me em você o que sou de mais efervescente para romper com o calor da plena vida transbordante. (Luiz Alberto Machado). Veja mais aqui.


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 Imagem: arte de Maria Luisa Persson
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