domingo, outubro 05, 2025

MALIKA MOKEDDEM, EWA LIPSKA, ZADIE SMITH, ARTE NA ESCOLA & SUBLIME SEMBLANTE

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Ao som de Vista, para orquestra (2019) e Semafor, para grupo instrumental (2020), da compositora finlandesa Kaija Saariaho (1952-2023). Veja mais aqui.

 

Reca de bichos & cabeças de prego... O que Zeca Biu colecionava de bichos, tinha de furúnculos. Tudo começou ainda menino juntando minhocas: era gogo por todo canto do quintal, pois ensaiava pescador no brejo limítrofe. Depois foram as lagartixas, teiús e calangos; uma compilação de formigas e saúvas, acumulação de aranhas e até uma caranguejeira sinistra. Dali pra agrupamentos de cobras, preás, gafanhotos, cururus, lesmas, morcegos, ah, foi um salto. Chegou ao ponto de ter uma banda de grilos amestrados, um balé de borboletas e vagalumes, um aquário de cundundas, um viveiro cantante de passarinhos e não só: coligiu tudo num tomo taxonômico improvisado, no qual reuniu uma variedade de cassacos e ruminantes; um guenzo rouco fedorento que se inquietava com as estripulias dum tatu-bola de estimação; um ganso zarolho assombrando o marreco que dava voltas ao redor da cacimba; uma arara tagarela negociando frutas; uma cigarra com recados das nuvens; um quati mentiroso denunciando catitas foragidas; um leitãozinho fuçando segredos do chão; uma coruja doida rodando a cabeça sem parar; um cabrito gago mangando dum cágado enamorado por uma filhote de jacaré; uma rã esnobe acocorada no lombo dum marreco desajeitado; um burrico anão soltando lorotas com as baratas tontas avexadas; um perdigueiro cheleléu que só abanava o rabo; um bezerro molenga abestalhado com um peru gozador que grugulejava ao final de cada piada caçoando do pavão enrustido; um galo carijó propondo noivado pra uma guiné vitalina; um presepeiro sagui-do-nordeste que vivia enfiando o dedo no cu dos outros; um carcará atrepado na viga arremedando um papagaio pornográfico; um gato maracajá enfezado que namorava uma jaguatirica; um tamanduá amancebado com uma lontra; uma perereca-verde fofoqueira e comadre de uma preguiça enredeira; uma capivara que desfilava com a amiga paca; e um gambá pra enxotar desafetos, tudo embelezando o ambiente fétido das onomatopeias cagadas e mijadas da bicharada. Como era um menino solitário – tudo fez pra se enturmar, sempre desprezado. Crescia e se desapontou com a primeira paixão depois da professora. Daí procurou fazer amizades: foi onanista coletivo com os coleguinhas de classe, trocou cavalo-mago, agradava um e outro, mas era sempre preterido nas escolhas dos pariceiros. Dedicou-se, então, a uma obsessiva paixão pelos animais e os queria a todos, como uma Arca de Noé só sua, parecida com aquela do colecionador do Fowles. Na adolescência ele já se via ufano proprietário de vasto zoológico particular. Todo dia 18 de novembro era ele na maior farra de comemoração e, como tinha do muito, vendia e trocava, envolvendo-se com traficantes, o que deu a maior bronca. Evidente, o seu colecionismo saiu do saudável e começou a dar problemas pra ele e a vizinhança. Uma cascavel picou a filha do vizinho, o papagaio ofendeu a esposa de outro, o sagui dava dedada no furico de todos os passantes, até que um abaixo-assinado rolou no bairro esfregado às suas fuças, num estrondoso escândalo. Não era só a atitude de salvar os bichos das queimadas, ataques ou abandono, o seu colecionismo compulsivo habilitava o sujeito a uma futura profissão, pra ele, alvissareira: alentava o sonho de se tornar bicheiro, já que não levava jeito para veterinário, nem entomólogo ou ictiólogo, muito menos taxidermista ou zootecnista, vez que só era um Animall Collector - acumulador de animais vivos! Isso é um vitupério! Reclamações viraram escarcéu e estouraram a boca do balão. Claro que sua negligência foi coibida por malcriadas acusações de tráfico e de cativeiro clandestino, além de graves problemas com a legislação ambiental, até ser submetido a tratamentos psiquiátricos para dar cabo de sua patologia. Tô ferrado, meu! Pura perda de tempo, mas isso é outro assunto. Pois, desbaratado o seu zoo particular e antes de vê-lo trilhar os passos do Barão de Drummond, durante todo o período, ele foi acometido por excruciantes cabeças de prego. Caramba! A primeira apareceu logo no quadril esquerdo: não aguentava ceroula, cueca ou calças, andava nu pelo meio da casa, balançando os cachos pra cima e pra baixo. Pode? Puxa! Isso é um atentado à moral! Botaram compressa de água benta quente, banha de galinha, folhas de mato, rezas e benzedeiras, tudo para que o dodói dele estourasse logo para acabar com aquela pouca vergonha. Dói, meu! Que é que posso fazer? Teve que sajar. Sofreu dolorosamente com o apertão, de estourar e sair fora o carnegão, melando tudo. Um sofrimento. Eita, esse foi um abscesso macho! Tanto pus num negocinho de nada! Foi o primeiro. Não demorou muito e logo apareceu outro no sovaco direito: vivia sem camisa e de braço estirado. Vai pra onde, traste? Pensavam dele descarado caroneiro pedindo parada para qualquer transporte. Oh! Um atrapalho de vida. Lá se foram 17 dias insuportáveis de ais e uis, desaparecendo sem mais nem menos. Eita, tô bom! Sumiu. Logo deu lugar a outro, no antro nasal, não podia nem espirrar! Dormia de papo pro ar porque tudo que roçasse as ventas magoava. Lá se ia ele com o focinho inchado, 10 dias de deus-me-acode! Danou-se! Quase morre sufocado, só respirando pela boca. Mal melhorou e um terçol gigantesco tapou-lhe as vistas. Temia cegar de vez. Dum olho passou pro outro, pronto! É karma! Só sendo. Quase enxergando achou que estava tudo em ordem e veio o mais doloroso de todos os furúnculos - no ânus e duplo: de um lado e outro entre as pregas do boga. Ih! Peidinho de nada e ele via estrelas em pleno meio dia. Um sufoco! De manhã ficava ciscando dentro de casa esperando o aperto da cagada matinal! Valei-me! Era aos berros no trono, demorava pra se aliviar. E pra sentar? Só de bandinha sem poupar desconforto: Tá acendendo a fluorescente, nego? Já era zambeta e andava de pernas abertas: Isso é uma rotônica desgracenta! Foi ao proctologista e, naquela posição vergonhosa de bunda pra lua, ouviu desolado: É embutido! Como assim? Tapou tudo. Aí tomou todo tipo de cachete, cada um maior que o outro, de ter trabalho pra engolir e, às vezes, enganchando na garganta. Tome copos d’água! Engasgou-se não se sabe quantas vezes. Foram 21 dias de tormento. Quando menos esperava, no meio da maior multidão, só sentiu o ploft! Deu um carreirão com a catinga atrás, desvestiu-se às pressas melando tudo e se atolou numa privada, assoprando que só locomotiva. Mais de hora depois, o alívio. Afora o trabalhão pra lavar tudo empestado com a inhaca desgraçada. Depois saiu-se com a cara mais lisa: Hem, hem... Acabou-se o zoológico, tive tudo isso e nem morri! Ainda vou ser bicheiro! S’assunte, meu! Ah. Até mais ver.

 


Rumiko Takahashi: O puro tornou-se impuro. O impuro agora se tornou puro. O bem agora se tornou mau. O mal tornou-se maligno. Viver é morrer, morrer é viver... Eu sou o vento. Um dia voarei livre... Veja mais aqui.

Jody Williams: Para mim, a diferença entre uma pessoa “comum” e “extraordinária” não é o título que essa pessoa pode ter, mas o que eles fazem para tornar o mundo um lugar melhor para todos nós... Veja mais aqui, aqui & aqui.

Nicole Maines: Espero que minha história possa inspirar as pessoas e tudo mais, mas o mais importante para mim é que as pessoas vejam minha história como ela realmente é: nunca tive problemas com minha identidade como pessoa trans, mas tenho problemas com a forma como outras pessoas me percebem desde que eu era criança... Veja mais aqui.

 

NÚMERO UM

Imagem: Acervo ArtLAM.

E é por isso \ que nosso planeta \ é reservável. \ A lua consta nos registros de propriedade. \ O sol consta em uma escritura autenticada em cartório. \ Cidades numeradas. Ruas hipotecadas. \ Destino multidigital. \ Novas guerras \ garantidas \ pela propriedade do Decálogo. \ Quantias exorbitantes de esperança em leilões públicos. \ E então, \ quando o amor \ é um galho levado pelo vento, \ ele é sempre o Número Um \ e se inclina em nossa direção.

Poema da poeta polonesa Ewa Lipska, integrante da geração da "Nova Onda". Veja mais aqui & aqui.

 

O TRANSE DOS REBELDES - [...] O acesso à solidão e aos livros foram as conquistas inestimáveis ​​daquela época. Eles lançaram as bases para o que mais tarde chamaria de meu primeiro exílio: o conhecimento [...]. Trecho extraído da obra La transe des insoumis (Grasset, 2003), da escritora argelina Malika Mokeddem, que, nascida em uma família nômade lutou ao longo da sua adolescência pelo acesso à educação, conseguindo, com isso, estudar medicina em Orã e depois no exílio em Paris, quando teve que evitar um casamento arranjado entre famílias. Para ela: O conhecimento é o primeiro dos exílios. Minha vida é meu primeiro trabalho. E a escrita, seu sopro constantemente entregue. Veja mais aqui & aqui.

 

SINTA-SE LIVRE – [...] Sou tomada por dois sentimentos contraditórios: há tanta beleza no mundo que é incrível que sejamos infelizes por um momento; há tanta merda no mundo que é incrível que sejamos felizes por um momento. [...] As bibliotecas não estão falhando "porque são bibliotecas". Bibliotecas negligenciadas são negligenciadas, e esse ciclo, com o tempo, fornece a desculpa para fechá-las. Bibliotecas bem administradas estão lotadas porque o que uma boa biblioteca oferece não se encontra facilmente em outro lugar: um espaço público interno onde você não precisa comprar nada para permanecer. [...] A escrita existe (para mim) na intersecção de três elementos precários e incertos: a linguagem, o mundo, o eu. O primeiro nunca é inteiramente meu; o segundo, só posso conhecer em um sentido parcial; o terceiro é uma resposta maleável e improvisada aos dois anteriores. [...] Entre a propriedade e a alegria, escolha a alegria. [...] Se o objetivo é ser apreciado por mais e mais pessoas, tudo o que é incomum em uma pessoa é eliminado. [...] o progresso nunca é permanente, sempre será ameaçado, deve ser redobrado, reafirmado e reimaginado se quiser sobreviver. [...] Se há algo que os romancistas sabem é que os cidadãos são internamente plurais: eles carregam consigo toda a gama de possibilidades comportamentais. São como partituras musicais complexas das quais certas melodias podem ser extraídas e outras ignoradas ou suprimidas, dependendo, pelo menos em parte, de quem as rege. [...]. Trechos extraídos da obra Feel Free: Essays ( Penguin Press, 2018), da escritora inglesa Zadie Smith, autora de obra tais como: Changing My Mind: Occasional Essays (2009), On Beauty (2005), The Autograph Man (2002) e White Teeth (2000).

 

ARTE NA ESCOLA

Os alunos dos  6º anos B, C, D e E do Colégio Municipal Fernando Augusto Pinto Ribeiro, realizaram atividades de Fantoche & Teatro, coordenados pelas professoras de Artes, Hércilia Vasconcelos e Maria José Gomes da Silva. E a aluna do 5º ano A, do Colégio Dimensão, Lunna Sophia, de 11 anos de idade, escreve demonstrando os seus pendores literários. Confira a arte da estudantada palmarense aqui & aqui.

&

POEMAS & PROSAS DE TONY ANTUNES

Veja mais aquí, aqui, aqui, aqui & aqui.

&

SUBLIME SEMBLANTE DE TCHELLO D’BARROS

O curta Sublime Semblante, do poeta e artista visual Tchello d’Barros, apresenta um poema narrado que se mescla com olhares sugestivos, semblantes fotografados, miradas subjetivas em uma atmosfera onírica que nos remete ao mundo dos sonhos, aquele lugar onde tudo pode ser intenso, surreal e sublime. O curta com direção do próprio Tchello, edição de Jozefo Roza, a modelo & autorretratos da amazônida Lua Miranda, a voz da atriz e dubladora Telma da Costa & música autoral de Delayne Brasil. Veja mais aqui, aqui & aqui.

 

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quarta-feira, outubro 01, 2025

ASSATA SHAKUR, ANA MARIA MACHADO, TERESA COLOMER & USINA GASTRÔ

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Ao som dos álbuns Anavitória (2016), O tempo é agora (2018), N (2019), Cor (2021) e Esquinas (2024), do duo musical Anavitória, formada em 2014, dupla formada pela cantora, atriz, compositora e multi-instrumentista Ana Caetano (Ana Clara Caetano Costa) e pela cantora e atriz Vitória Falcão (Vitória Fernandes Falcão).

 

Uma vez o amor... ou a maldição de Kalypso!... - Era uma vez e só agora, quantos desastres: o milagre da vida aos solavancos. Sequer cogitava: fui condenado ao naufrágio pelas moiras. Podia ser, talvez a pior coisa do mundo - dilacerado pelos dilemas com os farrapos de tudo que ficou para trás. Havia me perdido das rotas e fiquei à deriva por uma novena. A sobrevivência por calafrios e frêmitos imensuráveis: havia sofrido uma devastação demolidora, maior adversidade. A sorte fora do alcance, ali pereceria inevitavelmente. Inesperadamente, uma bela sílfide sedutora materializou-se; engatinhava nua para me salvar do precipício de Poelenburgh. Confiei nos seus gestos generosos, deram-me a impressão duma sacerdotisa guardiã de sagrados mistérios. Refeito da agonia, ela recepcionou-me descalça, já com as vestes de Westall. Tomou-me pelas mãos e me guiou por uma espetacular paisagem: era o éden terrestre. A entrada da sua morada era cercada por um bosque com uma fonte e, para quem nunca usufruiu de milagres caídos do céu, ali era tudo colossal. Adentramos numa gruta profunda com amplos salões abertos para jardins paradisíacos, um bosque sagrado com grandes árvores e fontes sinuosas entre a relva. Logo fui envolvido pelas fragrâncias do cedro, sândalo e zimbro que dali emanavam. Pude ver ninfas em todas as dependências e cantavam enquanto fiavam e teciam. Fui, enfim, acolhido em sua morada. Acomodou-me, estava exausto. Logo senti seu vulto ao meu redor e lambeu minhas feridas, acariciou minhas contusões, serviu-me ambrosia. Onde estou? Ogígia. Sim? Você naufragou, Odisseu. Quem? Você penou demais, perdeu a memória, relaxe. E quedei inebriado por um sonho enfeitiçante. Despertei com o perfume de suas carícias benfazejas. Quem é você? Sou Kalypso, a ninfa do mar. Sabia: o seu nome escondia a deusa fiandeira e o seu poder sobre a vida e a morte de todos os seres e coisas. Sua beleza encobria a prisioneira da Titanomaquia. Seus olhos ocultavam o banimento das Oceânides e a solidão eterna. Não resisti à sua tentação. Fui impelido aos regalos e em seus braços nus muito apetecia a vida flutuante nas nuvens. Nossos corpos eclipsaram embalados pelo amor na Gruta de Brueghel. Ela espalmada sobre mim, como se eu fosse as águas de Oxer. E em mim mergulhou como na cena de Vecchiato por muitos dias e noites infindas. Repleta de satisfação, ela estirou o braço e alcançou uma estrela de 6 pontas para me presentear: era a promessa de me seguir aonde fosse e por todos os confins. E mais: prometeu a juventude eterna e a imortalidade. Escolheu-me por consorte e ao violino me embalou seminua na pose de Baecker. E me ofertou as costas na pose de Golovin, na Isle de Draper, na verdade seminua com as vestes de Styka. Enquanto tecia e fiava, ela cantava e me seduzia como na Odisseia de Homero. Passados sete anos e, numa tarde mormaçada, me dissera que Poseidon acalmara a sua ira. Nada entendia, nem queria entender. Saímos do meu refúgio na ilha e ela me levou pelo Estreito de Gibraltar, extremo norte marroquino. Ao chegarmos ao monte de Jbel Musa, suas vestes eram pentimentos reveladores, um caleidoscópio de minhas vivências passadas. O que tudo aquilo queria dizer? Disse-me atender o pedido de Athena e, abruptamente, a vi enfurecer-se, afastando-se à beira da loucura, a ponto de tentar se matar. Que foi que houve? Socorri. Fitou-me compenetrada: Sou imortal, só sofro a saudade de amor não correspondido. Não é verdade! Revelou-me sua maldição, o coração partido de divindade abandonada. Como? Não recorreu aos feitiços e obrigou-se a me despedir de nossos filhos: Nausítoo, Nausínoo e Latino. O que é isso? Ofereceu-me jangada e provisões, um retorno em segurança. Por que? Caí na real: eu não era Odisseu nem Telêmaco de Fénelon. Então, depus meu confiteor: Sapere aude e Horácio apareceu para me mostrar o ônfalo: Aqui é o centro da Terra, a ilha de lugar nenhum. E desapareceu imediatamente. Ela então mostrou-me a ponta aguda do infinito: estava condenado à esperança. Obstinei e me perdi pela grandeza do sonho: pensei por ela e todas as coisas. Seja lá o que for, a cada um a sua provação e um grande amor. Até mais ver.

 

Violeta Parra: Não chore quando o sol se for, porque as lágrimas não deixarão você ver as estrelas... Somente o amor com sua ciência nos torna tão inocentes... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

Anne Rice: Ignore qualquer perda de coragem, ignore qualquer perda de autoconfiança, ignore qualquer dúvida ou confusão. Siga em frente acreditando no amor, na paz, na harmonia e em grandes realizações. Lembre-se de que a alegria não é estranha a você. Você está vencendo e é forte. Ame. Ame primeiro, ame sempre, ame para sempre... Veja mais aqui & aqui.

Heather Thomas: O que a escrita faz é permitir que você crie o mundo inteiro, crie uma história inteira, um ponto de vista, uma mensagem, uma experiência... Criar algo completamente diferente acontecendo... Veja mais aqui.

 

DOIS POEMAS

Imagem: Acervo ArtLAM.

AFIRMAÇÃO - Eu acredito no viver. \ Eu acredito no espectro \ dos dias Beta e do povo Gama.\ Eu acredito no brilho do sol. \ Em moinhos de vento e cachoeiras, \ triciclos e cadeiras de balanço. \ E eu acredito que sementes tornam-se brotos. \ E brotos tornam-se árvores. \ Eu acredito na mágica das mãos. \ E na sabedoria dos olhos. \ Eu acredito na chuva e nas lágrimas. \ E no sangue do infinito. \ Eu acredito na vida. \ E eu vi o desfile da morte \ marchando pelo torso da terra, \ esculpindo corpos de lama em seu caminho. \ Eu vi a destruição da luz do dia, \ e vi vermes sedentos de sangue \ sendo adorados e saudados. \ Eu vi os dóceis tornarem-se cegos \ e os cegos tornarem-se prisioneiros \ num piscar de olhos. \ Eu andei sobre cacos de vidro. \ Eu admiti meus erros e engoli derrotas \ e respirei o fedor da indiferença. \ Eu fui trancafiada pelos injustos. \ Algemada pelos intolerantes. \ Amordaçada pelos gananciosos. \ E, se tem alguma coisa que eu sei, \ é que um muro é apenas um muro \ e nada além disso. \ Ele pode ser posto abaixo. \ Eu acredito no viver. \ Eu acredito no nascimento. \ Eu acredito na doçura do amor \ e no fogo da verdade \ E eu acredito que um navio perdido, \ conduzido por navegantes cansados e mareados, \ ainda pode ser guiado à casa \ para atracar.

AMOR - Amor é contrabando no Inferno, \ porque amor é um ácido \ que corrói grades. \ Mas você, eu e amanhã \ damos as mãos e fazemos promessa \ que a luta irá multiplicar. \ A serra possui duas lâminas. \ A espingarda possui dois canos. \ Nós estamos grávidas da liberdade. \ Nós somos uma conspiração.

Poemas da escritora e ativista estadunidense Assata Olugbala Shakur (JoAnne Deborah Byron – 1947-2025), que foi ex-membro dos Panteras Negras (BPP) e do Exército de Libertação Negra (BLA).

 

O CANTO DA PRAÇA - [...] As palavras podem ser tudo [...] A expedição que resgatou esse material era formada por curiosos, de boa vontade, mas sem qualquer conhecimento arqueológico especializado. Por isso, não chegaram a anotar direito o local de sua descoberta, que permanecerá ignorado para sempre. Outra coisa que também nunca foi devidamente esclarecida a respeito desse achado é a sua época. É claro que tudo foi cuidadosamente estudado. Quando a caixa chegou, os sábios foram chamados a examiná-la e resolveram levar tudo — caixa e conteúdo — para seus gabinetes de trabalho, para que pudessem analisar a descoberta com todos os recursos de que dispõem. Fizeram os testes de carbono, carvão, açúcar e diamante. Mas os resultados foram, no mínimo, desconcertantes. Acabaram chegando à conclusão de que havia objetos de épocas tão distintas que se tornava impossível precisar a ocasião exata em que tinham sido enterrados. Na caixa havia recortes de jornal, velhos pergaminhos, máscaras de carnaval, um filme de Carlitos, uma flauta de madeira, uma caixa de lápis de cor, sapatilhas de balé, um lenço bordado, um violino, um sintetizador, um cavalo de carrossel, um cocar de índio, uma máquina fotográfica, uma caixinha de música, revistas em quadrinhos, uma pombinha de barro. Na tentativa de compreender o significado de todos esses objetos, os sábios consumiram semanas em ininterruptas discussões e especulações. Como não chegaram a nenhuma conclusão, decidiram introduzir todo o conteúdo da caixa, além da própria embalagem, numa engenhoca fantástica que estão desenvolvendo, uma espécie de aparelho mágico, máquina mirabolante, instrumento maravilhoso, algo assim. Mesmo com o risco de destruir tudo na experiência. Só que não se destruiu. Construiu. Quando a engenhoca foi ligada, nela se acenderam luzes belíssimas, dela saíram vapores de perfumes deliciosos, em volta dela se ouviram sons que só podem ser as tais harmonias celestiais de que tanto se fala. E, de repente, por uma abertura da máquina, como se ela fosse uma mulher parindo, saiu um livro. [...]. Trechos extraídos da obra O canto da praça (Salamandra, 1993), da escritora, jornalista, professora e pintora Ana Maria Machado (Ana Maria Martins Machado), autora de obras como Alice e Ulisses (1984), Aos quatro ventos (1993), A audácia dessa mulher (1999), Canteiros de Saturno (1991), Contra corrente (1999), Democracia (1983), O mar nunca transborda (1995), Para sempre (2001), Recado do nome (1976), Tropical sol da liberdade (1988), Um mapa todo seu (2015) e Vestígios (2021), entre outros. Veja mais aquí.

 

ANDAR ENTRE LIVROS - [...] não deixei de confiar nos livros como os melhores colaboradores dos professores na educação leitora e literária de seus alunos. A leitura de livros é o ponto de intersecção entre leitura, literatura infantil e juvenil e ensino de literatura [...] esclarecer as discussões, as interrogações e os critérios que influenciaram a presença, a seleção e a leitura de livros nas aulas [...] Interessa-nos a escola como instituição que outorga um sentido específico à leitura de obras [...] Também nos interessam os leitores como pessoas, que desenvolvem suas capacidades e competências literárias [...] nos interessam os livros da perspectiva de seu apoio a esse percurso [...]. Estimular a leitura e planejar o desenvolvimento das competências infantis são os dois eixos da tarefa escolar no acesso à literatura. [...] deve responder à conexão entre a capacidade de recepção e de produção literária, entre a recepção do texto e a elaboração de um discurso analítico e valorativo sobre ele, entre a interpretação do leitora e os conhecimentos que a tornam possível, entre a educação linguística e a educação literária, entre os aspectos linguísticos e os aspectos culturais que configuram o fenômeno literário ou entre a literatura e os restantes sistemas artísticos e funcionais que existem nas sociedades atuais. A leitura de obras literárias integrais é uma atividade que se situa no centro da tarefa de alcançar esses objetivos do modo mais amplo possível, tanto em profundidade quanto em extensão social. E o desejo de todos é que os ivros e os professores trabalhem juntos para consegui-lo. [...]. Trechos extraídos da obra Andar entre livros: a leitura literária na escola (Global, 2007), da premiada professora espanhola Teresa Colomer, coautora da obra Ensinar a ler, ensinar a compreender (Penso, 2003). Veja mais aqui, aqui & aqui.

 

FESTIVAL USINA GASTRÔ

&

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MALIKA MOKEDDEM, EWA LIPSKA, ZADIE SMITH, ARTE NA ESCOLA & SUBLIME SEMBLANTE

    Imagem: Acervo ArtLAM . Ao som de Vista , para orquestra (2019) e Semafor , para grupo instrumental (2020), da compositora finlandesa ...