Imagem: AcervoLAM.
Ao som de The House of Bernarda Alba (Festival Ballet Providence,
2016), Band of Sisters (2012), Spinning Plates (2012), The
Boat Builder (2015) e The Witcher (2019), da pianista e compositora russa Sonya
Belousova.
O QUE DA VIDA
SENÃO O OUTRO – Quisera não houvesse clamores e alheios padecimentos orbitando
a minha solitude, outro seria o ânimo na louca gangorra das horas tão minguantes
quanto abissais. Quase desencorajado sigo anônimo a inspecionar o que ninguém
levaria a sério na manducação de sonhos, quem dera a minha vida ínfima, inexplicável
e sem sentido entre nomes estranhos e a serendipidade. Para quem acha solidão,
nunca se está verdadeiramente sozinho, vai que cai das nuvens altiva Leila Guerriero: Aqui estou, mais uma vez longe de casa, esperando
por alguém que não conheço numa esquina que nunca mais verei. E esta é exatamente a
vida que quero ter... Sorrir foi a nossa repectiva saudação, era o que
me restara àquela hora e, diante dela, longe de
mim a modorra audaciosa e insana de liquidar, esmagar ou mesmo repelir, enquanto
paramixovírus & Nipah & e sei lá mais o quê anunciam de longe a tragédia
anunciada. Necessário encará-la com um misto de entusiasmo e perplexidade, isso
para dizer o mínimo, melhor me arriscar provocador e sem qualquer pretexto, melhor
ouvir aquela ali ao meu lado tal Anne Rice: Nenhum de nós realmente
muda com o tempo. Nós só nos tornamos mais o que somos... Poucas pessoas realmente
procuram o conhecimento neste mundo. Mortais ou imortais,
poucas perguntas de fato. Pelo contrário, eles tentaram
arrancar à força do desconhecido as respostas que já formaram em suas mentes…
justificativas, confirmações, fórmulas de consolo sem as quais não podem
continuar. A pergunta de fato é abrir uma porta
para um furacão. A resposta pode aniquilar a pergunta
e quem fez... Ouvi-la ladeando seus passos e atravessamos a noite de uma rua erma
irreconhecível, talvez à beira do inferno, ninguém sabe – melhor seria fosse
ali um istmo crepuscular, passeio plácido pelo arrebol estival, ou coisa que
valha, sintoma houvesse para outro esperançar. Ela, então, duma sofreada e um punhado de palavras não deixou por menos Violeta Parra: São teus olhos que
busco, não os encontro. São teus lábios que eu quero ver sorrir, mas eles são
tão ingratos comigo, mais eles zombam de mim. O ser humano é formado por um
espírito e um corpo, por um coração que bate ao som dos sentimentos. O amor é
um turbilhão de pureza original... Não fosse calor para lá de 50 graus, o
colapso oceânico, o enfraquecimento de Amoc e a glacialização humana, bastaria
viver tão simples como um beijo de amor, um abraço terno e um coração batendo
mútuo. Sonhar vale a pena, talvez mais que a vida. Até mais ver.
POVOS DA TERRA
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AcervoLAM.
Povos da
Terra \ vocês, com a força do desconhecido\ firmamento, envoltos como rolos de
fios, \ vocês, que costuram e de novo desfazem o cosido,\ vocês, que adentram o
embaraçado das línguas \ como em colmeias, \ para picar o açúcar\ e ser picados
–\ Povos da Terra, \ não destrocem o universo das palavras,\ nem retalhem com
as facas do ódio\ o som, que nasceu com o sopro.\ Povos da Terra, \ ah, que
ninguém pense em morte ao dizer vida – \ e não em sangue, ao falar berço –\ Povos
da Terra,\ fiquem as palavras na origem,\ pois são elas que podem\ aproximar os
horizontes dos céus verdadeiros\ e, pelo seu avesso,\ como a noite bocejando
atrás da máscara,\ ajudar as estrelas a nascer –.
Poema da escritora alemã Nelly Sachs
(1891-1970). Veja mais aqui, aqui e aqui.
A MULHER
PROIBIDA - […] Eu não gostaria de ser uma mulher aqui. Não gostaria de carregar constantemente o peso desses olhares, da sua
violência múltipla, alimentada pela frustração. Pela primeira vez, percebo que o ato
mais banal de uma mulher na Argélia é imediatamente carregado de símbolos e
heroísmo porque a animosidade masculina é tão grande e pouco saudável. [...].
Trecho extraído da obra The Forbidden Woman (University of Nebraska Press, 1998), da escritora argelina Malika
Mokeddem, autora de obras como: estão Os homens que caminham (1990),
O século das lagostas (1992), Sonhos e assassinos (1995), La
nuit de la lézarde (1998), N'zid (2001) e La transe des insoumis
(2006).
TEMPOS NIILISTAS –
[...] A sabedoria popular contemporânea de
que a educação em artes liberais está obsoleta só é verdadeira na medida em que
a igualdade social, a liberdade e o desenvolvimento mundano da mente e do
carácter estão obsoletos e foram substituídos por outro conjunto de métricas:
fluxos de rendimento, rentabilidade, inovação tecnológica. [...] À medida que o neoliberalismo trava uma guerra contra os bens públicos e
contra a própria ideia de um público, incluindo a cidadania para além da
adesão, ele reduz dramaticamente a vida pública sem matar a política. As lutas permanecem pelo
poder, pelos valores hegemónicos, pelos recursos e pelas trajetórias futuras. Esta persistência da
política no meio da destruição da vida pública e especialmente da vida pública
educada, combinada com a mercantilização da esfera política, é parte do que
torna a política contemporânea peculiarmente desagradável e tóxica – cheia de
discursos e posturas, esvaziada de seriedade intelectual, favorecendo a um eleitorado sem
instrução e manipulável e uma mídia corporativa faminta por celebridades e
escândalos. O neoliberalismo gera uma condição
de política sem instituições democráticas que apoiariam um público democrático
e tudo o que esse público representa no seu melhor: paixão informada,
deliberação respeitosa, soberania aspiracional, forte contenção de poderes que
o poderiam anular ou minar. [...] Trechos extraídos da obra Undoing the Demos: Neoliberalism’s Stealth Revolution (Zone Books, 2015), da professora e
pesquisadora estadunidense Wendy L. Brown, que no estudo Nihilistic
Times: Thinking with Max Weber (Belknap Press, 2023),
expressou que: […] a vida política formal é um teatro do niilismo: a
esfera política é onde o niilismo é representado em sua forma bruta e também um
local para superar ou resistir ao niilismo através da busca de causas mundanas. Em nossa época, ambos os
potenciais estão presentes e colidem rotineiramente. [...]. Dela também a
frase: Não há nada que valha mais a pena fazer do que tentar ser humano num
mundo cada vez mais desumanizado. Veja mais aqui, aqui e aqui.
TTTTT & ATELIÊ
VIRTUAL GENTAMIGA NO UBQUB
&
Luiza (Ases da Literatura, 2023), da jovem escritora Ana Júlia Pereira
Carneiro & Una & Unari: a saga (Rascunhos, 2023), da
escritora e professora Rute Costa. Veja mais aqui, aqui e aqui.