quinta-feira, março 07, 2013

MARIANNE MOORE, NEAL CASSADY, ROSA PARKS, IDA LUPINO, BRICUSSE, BABBITT, RUTKIEWICZ & A FILOSOFIA DE SÓCRATES

 


APRENDIZADO COTIDIANO – UMA DE MUITAS – Esta eu guardei da adolescência e até hoje tenho comigo. É da alpinista lituano-polonesa Wanda Rutkiewicz (1943-1992): Todo mundo tem seu próprio Everest para escalar... A história desta montanhista começa quando ela se tornou a primeira mulher a escalar o topo K2, considerada a segunda montanha mais alta do mundo e isso sem oxigênio suplementar. Ela desapareceu ao escalar o Kangchenjunga aos 49 anos de idade, o que seria a nona montanha de mais de 8 mil metros a ser escalada, fisicamente debilitada e incapaz de tomar uma decisão para salvar sua vida. O seu corpo jamais encontrado e dela a lembrança do que dissera: O que está para trás é esquecido. Você não consegue se lembrar do perigo e da dificuldade quando já passou... DUAS: TODO MUNDO É IDIOTA – Cá comigo: admito que todos somos muitas vezes na vida verdadeiros idiotas. E mesmo que tenhamos a sabedoria do dramaturgo e compositor britânico, Leslie Bricusse (1931-2021), que teve a clarividência de assinalar que: Quando você vive em um mundo de imaginação, sua imaginação não envelhece necessariamente com você. Não acredito em ceder à velhice... Nem eu. E mesmo com essa sapiência, ele foi capaz de admitir: Que tipo de idiota eu sou? Eu nunca me apaixonei. O homem doce pode... TRÊS DE TANTAS OUTRAS: Quando não é a idiotice são os medos que atrapalham a vida da gente. Quem não alcançou a grandeza, por exemplo, do compositor e educador estadunidense, Milton Babbitt (1916-2011) que sabia: A música é aquela grande linguagem onde muito pode ser dito e pouco pode ser provado... foi maior ainda ao declarar: As novas limitações são as humanas da percepção... E vamos aprumar a conversa!!!

 


DITOS & DESDITOS - O racismo ainda está conosco. Mas cabe a nós preparar nossos filhos para o que eles terão pela frente e, com sorte, vamos superar... Acredito que estamos aqui no planeta Terra para viver, crescer e fazer o possível para tornar este mundo um lugar melhor para que todas as pessoas desfrutem de liberdade... Pensamento da ativista estadunidense Rosa Parks (1913-2005). Veja mais aqui e aqui.

 

ALGUÉM FALOU: Eu não me vi como qualquer guarda-avanço ou feminista... Manter uma abordagem feminina é vital - os homens odeiam fêmeas mandonista... Pensamento da atriz e cineasta inglesa Ida Lupino (1918-1995), agraciada com a biografia póstuma Ida Lupino: Beyond the Camera  (BearManor, 2011), publicada por Mary Ann Anderson.

 

PRIMEIRO TERÇO - [...] Às vezes eu sento e penso. Outras vezes eu sento e bebo, mas na maioria das vezes eu apenas sento. [...] Chegou a hora, todos deitem para não se machucarem quando o sol raiar. [...]. Trechos extraídos da obra First Third & Other Writings (City Lights, 2001), do escritor estadunidense Neal Cassady (1926-1968), autor da frase: A arte é boa quando nasce da necessidade. Este tipo de origem é a garantia do seu valor; não há outros...

 

UM POEMAPOESIA: Também não gosto: há coisas mais importantes que toda essa baboseira.\ Lendo-a, no entanto, com total desprezo, a gente acaba descobrindo\ nela, afinal de contas, um lugar para o genuíno.\ Mãos que agarram, olhos\ que se dilatam, cabeleira que se eriça\ quando preciso, são coisas importantes, não porque se \ lhes pode impor pomposa interpretação mas por serem\ úteis. Quando se tornam tão derivativas que ficam ininteligíveis,\ o mesmo se pode dizer de todos nós, pois\ não admiramos aquilo que\ somos incapazes de compreender: o morcego\ pendurado de ponta-cabeça ou em busca de algum \ alimento, elefantes em marcha, um cavalo selvagem a se espojar, um lobo\ infatigável embaixo\ de uma árvore, o crítico impassível a crispar a pele como um cavalo mordido\ por pulga, o fã do\ beisebol, o estatístico \ — nem é válido \ ter preconceito contra “documentos comerciais e \ livros didáticos”; \ todos esses fenômenos são importantes. Contudo, a gente deve \ fazer uma \ distinção: se um semipoeta os realça à força, o resultado não é poesia, \ nem, enquanto nossos poetas não forem “literalistas \ da imaginação” — acima \ da insolência e da trivialidade — e não apresentarem \ para inspeção “jardins imaginários com sapos de verdade”, teremos acesso a \ ela. Até lá, se exigir, por um lado, \ a matéria-prima da poesia em\ toda a sua primariedade e\ aquilo que é, por outro lado,\ genuíno, então você tem interesse por poesia. Poema da premiada escritora, editora e professora modernista estadunidense Marianne Moore (1887-1972). Veja mais aqui, aqui e aqui.

 



PERÍODO SISTEMÁTICO: A SOFÍSTICA – O segundo período da história do pensamento grego é o chamado período sistemático. Com efeito, nesse período realiza-se a sua grande e lógica sistematização, culminando em Aristóteles, através de Sócrates e Platão, que fixam o conceito de ciência e de inteligível, e através também da precedente crise cética da sofística.
O interesse dos filósofos gira, de preferência, não em torno da natureza, mas em torno do homem e do espírito; da metafísica passa-se à gnosiologia e à moral. Daí ser dado a esse segundo período do pensamento grego também o nome de antropológico, pela importância e o lugar central destinado ao homem e ao espírito no sistema do mundo, até então limitado à natureza exterior.
Esse período esplêndido do pensamento grego - depois do qual começa a decadência - teve duração bastante curta. Abraça, substancialmente, o século IV a.C., e compreende um número relativamente pequeno de grandes pensadores: os sofistas e Sócrates, daí derivando as chamadas escolhas socráticas menores, sendo principais a cínica e a cirenaica, precursoras, respectivamente, do estoicismo e do epicurismo do período seguinte; Platão e Aristóteles, deles procedendo a Academia e o Liceu, que sobreviverão também no período seguinte e além ainda, especialmente a Academia por motivos éticos e religiosos, e em seus desenvolvimentos neoplatônicos em especial - apesar de o aristotelismo ter superado logicamente o platonismo.
O Sofismo estabelece uma nova e ampla concepção da idéia da educação, é a origem da educação no sentido estrito da palavra: a paidéia um movimento espiritual de incalculável importância para a posterioridade que foi no iniciada no tempo de Sófocles por volta do século IV.
O conceito de arete esteve desde o início estreitamente vinculado à questão educativa. Com o desenvolvimento histórico. Porém, o ideal da arete humana sofreu as mudanças da evolução do todo social e também nelas influiu.
Desde a mais antiga concepção aristocrática da arete até o ideal político do homem está vinculado a um Estado Jurídico.
O forma de fundamentação da arete tinha de ser completamente distinta para as classes nobres, para os camponeses de Hesíodo e para os cidadãos da polis.
Havia uma grande desvantagem em relação às sociedades aristocrática e a nova sociedade civil e urbana, porque embora possuísse um ideal de Homem e de cidadão e o julgasse, em princípio, muito superior ao da nobreza, carecia de um sistema consciente de educação para atingir aquele ideal. A educação profissional, herdada do pai pelo filho que lhe seguia o ofício ou a indústria, não se podia comparar à educação total de espírito e de corpo no nobre, baseada numa concepção total do Homem.
O nascimento da paidéia grega é o exemplo e o modelo deste axioma capital de toda a educação humana. A sua finalidade era a superação dos privilégios da antiga educação para a qual a arete só era acessível aos que tinham sangue divino.
A arete política não podia nem devia depender da nobreza do sangue, se não se quisesse considerar caminho falso a admissão da massa no Estado.
Foi das necessidades mais profundas da vida do Estado que nasceu a idéia da educação, a qual reconheceu no saber a nova e poderosa força espiritual daquele tempo para a formação de homens, e a pôs a serviço dessa tarefa.
O caminho do movimento educacional, depois de descrever um amplo círculo, volta de novo a ligar-se, em Platão, Isócrates e Xenofonte, à velha tradição aristocrática e à sua idéia de arete, que adquirem vida nova sobre um fundamento muito mais espiritualizado.
Xenófanes mostra o quanto a "força espiritual" e a política se enlaçavam vigorosamente já desde o início da idéia da arete e se baseavam na ordem e no bem-estar da comunidade estatal.
O movimento sofístico pela primeira vez estende-se a vastos círculos e dá publicidade total à exigência de uma arete baseada no saber – se a própria comunidade não tivesse sentido já necessidade de ampliar os horizontes citadinos pela educação espiritual do indivíduo. Esta necessidade fez-se sentir mais desde a entrada de Atenas no mundo internacional, com a economia, o comércio e a política subseqüentes às guerras contra os Persas. Atenas ficou devendo a salvação a um só homem e à sua superioridade espiritual.
Assim, por uma evolução lógica, chegou-se à convicção de que a manutenção da ordem democrática do Estado dependia cada vez mais da justa eleição da personalidade dirigente.

HISTÓRIA - Após as grandes vitórias gregas, atenienses, contra o império persa, houve um triunfo político da democracia, como acontece todas as vezes que o povo sente, de repente, a sua força. E visto que o domínio pessoal, em tal regime, depende da capacidade de conquistar o povo pela persuasão, compreende-se a importância que, em situação semelhante, devia ter a oratória e, por conseguinte, os mestres de eloqüência. Os sofistas, sequiosos de conquistar fama e riqueza no mundo, tornaram-se mestres de eloqüência, de retórica, ensinando aos homens ávidos de poder político a maneira de consegui-lo.
Diversamente dos filósofos gregos em geral, o ensinamento dos sofistas não era ideal, desinteressado, mas sobejamente retribuído. O conteúdo desse ensino abraçava todo o saber, a cultura, uma enciclopédia, não para si mesma, mas como meio para fins práticos e empíricos e, portanto, superficial.
A época de ouro da sofística foi - pode-se dizer - a segunda metade do século V a.C. O centro foi Atenas, a Atenas de Péricles, capital democrática de um grande império marítimo e cultural. Os sofistas maiores foram quatro. Os menores foram uma plêiade, continuando até depois de Sócrates, embora sem importância filosófica. Protágoras foi o maior de todos, chefe de escola e teórico da sofística.

OS SOFISTAS – O século de Péricles (V a.c), constitui o período áureo da cultura grega, quando a democrática Atenas desenvolve intensa vida cultural e artística. Os pensadores do período clássico, embora ainda discutam questões referentes à natureza, desenvolvem o enfoque antropológico, abrangendo a moral e a política.
Os sofistas vivem nessa época, e alguns deles são interlocutores de Sócrates. Os mais famosos sofistas foram: Protágoras de Abdera (48 – 411 a.C.); Górgias, de Leôncio, na Sicília (485 – 380 a.C.), Hippias, de Élis; e ainda Trasímaco, Pródico, Hipódamos, entre outros. Tal como ocorreu com os Pré-socráticos, dos sofistas só nos restam fragmentos de suas obras, além das referências muitas vezes tendenciosas feitas por filósofos posteriores.
A palavra sofista, etimologicamente, vem de sophos, que significa "sábio" ou melhor "professor de sabedoria". Posteriormente adquiriu o sentido pejorativo de "homem que emprega sofismas", ou seja, alguém que usa de raciocínio capcioso, de má-fé, com intenção de enganar. Sóphisma significa "sutileza de sofista".
Os sofistas sempre foram mal interpretados devido às criticas que sobre eles fizeram Sócrates e Platão. A imagem de certa forma caricatural da sofistica tem sido reelalaborada no sentido de procurar resgatar a verdadeira importância do seu pensamento. Desde que os sofistas foram reabilitados por Hegel no século XIV, o período por eles iniciado passou a ser denominado Aufklärung grega (imitando a expressão alemã que designa o iluminismo europeu do século XVIII.).
Trata-se de um conjunto de oradores e pensadores gregos surgidos na Grécia na segunda metade do séc. V a.C. Itinerantes, exerciam o ensino de forma profissional e remunerada. Na maioria eram professores itinerantes que encaminhavam os jovens na vida pública e gozavam de grande prestígio social. A sofística propôs, então, uma "humanização" da cultura, na qual o estudo de ciências teóricas e práticas estivesse encaminhado para a busca da virtude, entendida como adequação à ordem social.
Os sofistas maiores foram quatro e os menores foram uma plêiade, continuando até depois de Sócrates, embora sem importância filosófica. Protágoras foi o maior de todos, chefe de escola e teórico da sofística.
Em coerência com o ceticismo teórico, destruidor da ciência, a sofística sustenta o relativismo prático, destruidor da moral. Como é verdadeiro o que tal ao sentido, assim é bem o que satisfaz ao sentimento, ao impulso, à paixão de cada um em cada momento. Ao sensualismo, ao empirismo gnosiológicos correspondem o hedonismo e o utilitarismo ético: o único bem é o prazer, a única regra de conduta é o interesse particular. Górgias declara plena indiferença para com todo moralismo: ensina ele a seus discípulos unicamente a arte de vencer os adversários; que a causa seja justa ou não, não lhe interessa. A moral, portanto, - como norma universal de conduta - é concebida pelos sofistas não como lei racional do agir humano, isto é, como a lei que potência profundamente a natureza humana, mas como um empecilho que incomoda o homem.
Os sofistas estabelecem uma oposição especial entre natureza e lei, quer política, quer moral, considerando a lei como fruto arbitrário, interessado, mortificador, uma pura convenção, e entendendo por natureza, não a natureza humana racional, mas a natureza humana sensível, animal, instintiva. Quanto ao direito e à religião, a posição da sofística é extremista também, naturalmente, como na gnosiologia e na moral. Direito natural -, bem como a moral natural, segundo os sofistas, não é o direito fundado sobre a natureza racional do homem, e sim sobre a sua natureza animal, instintiva, passional. Religião e a divindade - os sofistas não só trilham a mesma senda dos filósofos racionalistas gregos do período precedente e posterior, mas - de harmonia com o ceticismo deles - chegam até o extremo, até o ateísmo, pelo menos praticamente. Os sofistas, pois, servem-se da injustiça e do muito mal que existe no mundo, para negar que o mundo seja governado por uma providência divina.
Os sofistas dirigiram-se antes de mais nada a uma escola, e só a ela. Era a eles que acorriam os que desejavam formar-se para a política e tornar-se um dia dirigentes do Estado. É certo que as qualidades fundamentais de um homem de Estado não se podem adquirir.
A faculdade oratória situa-se em plano idêntico ao da inspiração das musas aos poetas. Reside antes de mais nada na judiciosa aptidão para proferir palavras decisivas e bem fundamentadas. No Estado democrático, as assembléias públicas e a liberdade de palavra tornaram indispensáveis os dotes oratórios e até os converterem em autêntico leme nas mão do homem de Estado. Sendo que na idade clássica chama-se de orador o político meramente retórico.
O empenho em ensinar a arete política é a imediata expressão da mudança fundamental que se opera na essência do Estado.
A alto apreço do saber e da inteligência, que Xenófanes tinha introduzido e propugnado, cinqüenta anos antes, como um novo tipo de humanidade, tornou-se geral, principalmente na vida social e política. É o tempo em que o ideal da arete do Homem recolhe em si todos os valores que a ética aristotélica reúne mais tarde como prerrogativas espirituais, e que, com os valores éticos do Homem, procura juntar numa unidade mais alta. Era a primeira vez que o aspecto intelectual do Homem se situava vigorosamente no centro. Foi daqui que brotou a tarefa educativa que os sofistas buscaram resolver. Só assim se explica que tenham acreditado poder ensinar a arete.
O objetivo da educação sofista, a formação do espírito, encerra uma extraordinária multiplicidade de processos e de métodos. Podendo encarar essa diversidade pelo ponto de vista da formação do espírito.
De acordo com dois aspectos (espírito e conteúdo objetivo) depara-se com os sofistas em duas modalidades distintas de educação do espírito: a transmissão de um saber enciclopédico e a formação do espírito nos seus diversos campos. Claramente se vê que o antagonismo espiritual destes dois métodos de educação só pode alcançar unidade no conceito superior de educação espiritual.
É na política e na ética que mergulham as raízes desta terceira forma de educação sofística. Distingue-se da formal e da enciclopédica, porque já não considera o homem abstratamente, mas como membro da sociedade. É desta maneira que coloca a educação em sólida ligação com o mundo dos valores e insere a formação espiritual na totalidade da arete humana. Também sob esta forma é educação espiritual; simplesmente o espírito não é considerado através do ponto de vista puramente intelectual, formal, ou de conteúdo, mas sim em relação com as suas condições sociais.
Não podemos deixar de citar a riqueza dos novos e perenes conhecimentos educativos que os sofistas trouxeram ao mundo. Foram os criadores da formação espiritual e da arte educativa que a ela conduz. É claro que, em contrapartida, a nova educação, precisamente porque ultrapassava o meramente formal e material e atacava os problemas mais profundos da moralidade e do Estado.
O conhecimento trazido pelos sofistas geralmente está ligado com a vida e com a prática, e não com a ciência. Além disso, é importante ressaltar a filosofia, na qual há um interesse cada vez maior pelos problemas do homem, em cujo objetivo determina-se com exatidão progressivamente maior, é mais uma prova da necessidade histórica do advento dos sofistas.
Os sofistas deram o último passo. Transplantaram para a nova prosa artística, em que eram mestres, os vários gêneros de poesia parenética onde o elemento pedagógico se revelava com maior vigor, e entraram assim em consciente emulação, na forma e no conteúdo, com a poesia.
Os sofistas são, com efeito, as individualidades mais representativas de uma época que na sua totalidade tende para o individualismo. Constituem também um capítulo inesgotável e insuficientemente utilizado da "sociologia do saber".
Podemos pois considerá-los um estágio da maior importância no desenvolvimento do humanismo.
A obra dos sofistas pertence sobretudo à esfera formal. Mas a retórica achou na ciência, assim que se separou dela e reclamou os seus direitos, uma fecunda oposição e uma emulação vigorosa. Assim, a educação sofística encerra na sua rica multiplicidade o germe da luta pedagógica da centúria seguinte: o duelo entre a filosofia e a retórica.
Daí vê-se que os sofistas foram considerados os fundadores da ciência da educação. Com efeito, estabeleceram os fundamentos da pedagogia, que ainda hoje a formação intelectual trilha, em grande parte, os mesmos caminhos.
O sofista mediano dava-se por satisfeito em transmitir a sabedoria. Para avaliar com justiça a totalidade do movimento é preciso estudar os seus representantes mais vigorosos, sendo que um dos seus principais propósitos é o humanista, que consiste na ordenação da educação humana por sobre todo o reino da técnica, separando o poder e o saber teórico e a cultura propriamente dita converte-se no fundamento do humanismo. O que para os sofistas é decisivo é a idéia consciente da educação como tal, tornando-se assim muito natural que os sofistas tenham vinculado o ideal da educação às antigas criações do espírito grego e as tenham considerado como conteúdo próprio dele.
São também os sofistas que criaram a consciência cultural em que o espírito grego alcançou o seu telos e a íntima segurança da sua própria forma de orientação. Adquirir consciência é uma grandeza, mas é a grandeza da posterioridade. É este um outro aspecto do fenômeno sofístico. Talvez não seja preciso justificar a afirmação de que o período que vai da sofística a Platão e Aristóteles alcança uma vasta e permanente elevação na evolução do espírito grego; ainda assim, porém, conserva-se toda a sua força a frase de Hengel que diz que a coruja de Atenas só levanta vôo ao declinar o dia.
Foi precisamente com os sofistas que ganhamos íntima consciência de que a "continuidade" dos estágios primitivos na estrutura histórica da cultura não é uma palavra vazia, pois não podemos afirmar e admirar os novos estágios sem que neles estejam assumidos os primeiros. Só a partir dos fundamentos teóricos da sua educação é que podemos estudar. Tem importância essencial para o nosso objetivo a sua íntima ligação da elaboração consciente do ideal de educação com a execução consciente do processo educativo.
A natureza humana geralmente está apta para o bem. O homem desgraçado ou inclinado ao mal constitui exceção.
A prática educativa e o mundo das idéias dos sofistas surgem nele numa grande unidade histórica, e revelam-se da maneira incontestável os seus pressupostos políticos e sociais.
É digno de nota que os sofistas nunca tenham propugnado a oficialização da educação embora esta exigência esteja muito próxima do ponto de vista de Protágoras.
O jovem é mais tarde levado à escola de ginástica, onde os paidotribes lhe fortalecem o corpo, para que seja servo fiel de um espírito vigoroso e para que o homem nunca fracasse na vida por culpa da debilidade do corpo.
Protágoras limita-se ao ensino elementar do conteúdo da poesia que, como vimos, não se dirige à forma, ao ritmo e à harmonia do espírito, mas sim à regra moral e ao exemplo histórico.
A lei já não é uma descoberta de antigos e notáveis legisladores, mas sim uma criação de circunstâncias.
De qualquer modo, é certo que no tempo de Platão pensava-se que a sofística era uma arte intimamente vinculada às condições políticas do tempo.
Plutarco juntou às interações sofísticas doutrinas posteriores à sofística. Assim, procede talvez de Platão o conceito da plasticidade da alma juvenil; e a bela idéia de que a arte compensa as deficiências da natureza provém de Aristóteles, embora tenham ambas antecedentes sofísticos.
A união da pedagogia com a filosofia da cultura, atribuída pela tradição aos sofistas e principalmente a Protágoras, correspondia a uma necessidade interior.
Infelizmente, é extraordinariamente deficiente o nosso conhecimento destas grandes realizações dos sofistas. Perderam-se os seus escritos gramaticais; mas os gramáticos posteriores, peripatéticos e alexandrinos, os reelaboraram.
O sistema grego de educação superior, tal como os sofistas o estruturaram, impera atualmente em todo o mundo civilizado.
Não sabemos em que sentido orientaram os sofistas o ensino da Matemática. Uma objeção capital da crítica pública contra esse aspecto da educação sofista era a inutilidade das matemáticas para a vida prática.
Foi pelo valor teórico que apreciaram a Matemática e a Astronomia, ainda que na maior parte dos casos não tenham sido investigados fecundos e originais.
Foi com a introdução do ensino científico e teórico que se deve Ter levantado o problema de saber até que ponto estes estudos se deviam estender. Onde quer se fale da educação científica naquela época, em vemos sempre o reflexo desse problema.

PROTÁGORAS DE ABDERA - Protágoras nasceu em Abdera - pátria de Demócrito, cuja escola conheceu - pelo ano 480. Viajou por toda a Grécia, ensinando na sua cidade natal, na Magna Grécia, e especialmente em Atenas, onde teve grande êxito, sobretudo entre os jovens, e foi honrado e procurado por Péricles e Eurípedes. Acusado de ateísmo, teve de fugir de Atenas, onde foi processado e condenado por impiedade, e a sua obra sobre os deuses foi queimada em praça pública. Refugiou-se então na Sicília, onde morreu com setenta anos (410 a.C.), dos quais, quarenta dedicados à sua profissão. Dos princípios de Heráclito e das variações da sensação, conforme as disposições subjetivas dos órgãos, inferiu Protágoras a relatividade do conhecimento. Esta doutrina enunciou-a com a célebre fórmula; o homem é a medida de todas as coisas. Esta máxima significava mais exatamente que de cada homem individualmente considerado dependem as coisas, não na sua realidade física, mas na sua forma conhecida. Subjetivismo, relativismo e sensualismo são as notas características do seu sistema de ceticismo parcial. Platão deu o nome de Protágoras a um dos seus diálogos, e a um outro o de Górgias.

GÓRGIAS DE LEÔNCIO - Górgias nasceu em Abdera, na Sicília, em 480-375 a.C - correlacionado com Empédocles - representa a maior expressão prática da sofística, mediante o ensinamento da retórica; teoricamente, porém, foi um filósofo ocasional, exagerador dos artifícios da dialética eleática. Em 427 foi embaixador de sua pátria em Atenas, para pedir auxílio contra os siracusanos. Ensinou na Sicília, em Atenas, em outras cidades da Grécia, até estabelecer-se em Larissa na Tessália, onde teria morrido com 109 anos de idade. Menos profundo, porém, mais eloqüente que Protágoras, partiu dos princípios da escola eleata e concluiu também pela absoluta impossibilidade do saber. É autor duma obra intitulada "Do não ser", na qual desenvolve as três teses: Nada existe; se alguma coisa existisse não a poderíamos conhecer; se a conhecêssemos não a poderíamos manifestar aos outros. A prova de cada uma destas proposições e um enredo de sofismas, sutis uns, outros pueris.
No Górgias de Platão, Górgias declara que a sua arte produz a persuasão que nos move a crer sem saber, e não a persuasão que nos instrui sobre as razões intrínsecas do objeto em questão. Em suma, é mais ou menos o que acontece com o jornalismo moderno. Para remediar este extremo individualismo, negador dos valores teoréticos e morais, Protágoras recorre à convenção estatal, social, que deveria estabelecer o que é verdadeiro e o que é bem!

SÓCRATES - Quem valorizou a descoberta do homem feita pelos sofistas, orientando-a para os valores universais, segundo a via real do pensamento grego, foi Sócrates. Nasceu Sócrates em 470 ou 469 a.C., em Atenas, filho de Sofrônico, escultor, e de Fenáreta, parteira. Aprendeu a arte paterna, mas dedicou-se inteiramente à meditação e ao ensino filosófico, sem recompensa alguma, não obstante sua pobreza. Desempenhou alguns cargos políticos e foi sempre modelo irrepreensível de bom cidadão. Combateu a Potidéia, onde salvou a vida de Alcebíades e em Delium, onde carregou aos ombros a Xenofonte, gravemente ferido. Formou a sua instrução sobretudo através da reflexão pessoal, na moldura da alta cultura ateniense da época, em contato com o que de mais ilustre houve na cidade de Péricles.
Inteiramente absorvido pela sua vocação, não se deixou distrair pelas preocupações domésticas nem pelos interesses políticos. Quanto à família, podemos dizer que Sócrates não teve, por certo, uma mulher ideal na quérula Xantipa; mas também ela não teve um marido ideal no filósofo, ocupado com outros cuidados que não os domésticos.
Quanto à política, foi ele valoroso soldado e rígido magistrado. Mas, em geral, conservou-se afastado da vida pública e da política contemporânea, que contrastavam com o seu temperamento crítico e com o seu reto juízo. Julgava que devia servir a pátria conforme suas atitudes, vivendo justamente e formando cidadãos sábios, honestos, temperados - diversamente dos sofistas, que agiam para o próprio proveito e formavam grandes egoístas, capazes unicamente de se acometerem uns contra os outros e escravizar o próximo.
Entretanto, a liberdade de seus discursos, a feição austera de seu caráter, a sua atitude crítica, irônica e a conseqüente educação por ele ministrada, criaram descontentamento geral, hostilidade popular, inimizades pessoais, apesar de sua probidade. Diante da tirania popular, bem como de certos elementos racionários, aparecia Sócrates como chefe de uma aristocracia intelectual. Esse estado de ânimo hostil a Sócrates concretizou-se, tomou forma jurídica, na acusação movida contra ele por Mileto, Anito e Licon: de corromper a mocidade e negar os deuses da pátria introduzindo outros. Sócrates desdenhou defender-se diante dos juizes e da justiça humana, humilhando-se e desculpando-se mais ou menos. Tinha ele diante dos olhos da alma não uma solução empírica para a vida terrena, e sim o juízo eterno da razão, para a imortalidade. E preferiu a morte. Declarado culpado por uma pequena minoria, assentou-se com indômita fortaleza de ânimo diante do tribunal, que o condenou à pena capital com o voto da maioria.
Tendo que esperar mais de um mês a morte no cárcere - pois uma lei vedava as execuções capitais durante a viagem votiva de um navio a Delos - o discípulo Criton preparou e propôs a fuga ao Mestre. Sócrates, porém, recusou, declarando não querer absolutamente desobedecer às leis da pátria. E passou o tempo preparando-se para o passo extremo em palestras espirituais com os amigos. Especialmente famoso é o diálogo sobre a imortalidade da alma - que se teria realizado pouco antes da morte e foi descrito por Platão no Fédon com arte incomparável. Suas últimas palavras dirigidas aos discípulos, depois de ter sorvido tranqüilamente a cicuta, foram: "Devemos um galo a Esculápio". É que o deus da medicina tinha-o livrado do mal da vida com o dom da morte. Morreu Sócrates em 399 a.C. com 71 anos de idade.

O MÉTODO SOCRÁTICO – É a parte polêmica. Insistindo no perpétuo fluxo das coisas e na variabilidade extrema das impressões sensitivas determinadas pelos indivíduos que de contínuo se transformam, concluíram os sofistas pela impossibilidade absoluta e objetiva do saber. Sócrates restabelece-lhe a possibilidade, determinando o verdadeiro objeto da ciência.
O objeto da ciência não é o sensível, o particular, o indivíduo que passa; é o inteligível, o conceito que se exprime pela definição. Este conceito ou idéia geral obtém-se por um processo dialético por ele chamado indução e que consiste em comparar vários indivíduos da mesma espécie, eliminar-lhes as diferenças individuais, as qualidades mutáveis e reter-lhes o elemento comum, estável, permanente, a natureza, a essência da coisa. Por onde se vê que a indução socrática não tem o caráter demonstrativo do moderno processo lógico, que vai do fenômeno à lei, mas é um meio de generalização, que remonta do indivíduo à noção universal.
Praticamente, na exposição polêmica e didática destas idéias, Sócrates adotava sempre o diálogo, que revestia uma dúplice forma, conforme se tratava de um adversário a confutar ou de um discípulo a instruir. No primeiro caso, assumia humildemente a atitude de quem aprende e ia multiplicando as perguntas até colher o adversário presunçoso em evidente contradição e constrangê-lo à confissão humilhante de sua ignorância. É a ironia socrática. No segundo caso, tratando-se de um discípulo (e era muitas vezes o próprio adversário vencido), multiplicava ainda as perguntas, dirigindo-as agora ao fim de obter, por indução dos casos particulares e concretos, um conceito, uma definição geral do objeto em questão. A este processo pedagógico, em memória da profissão materna, denominava ele maiêutica ou engenhosa obstetrícia do espírito, que facilitava a parturição das idéias.
DOUTRINAS FILOSÓFICAS - A introspecção é o característico da filosofia de Sócrates. E exprime-se no famoso lema conhece-te a ti mesmo - isto é, torna-te consciente de tua ignorância - como sendo o ápice da sabedoria, que é o desejo da ciência mediante a virtude. E alcançava em Sócrates intensidade e profundidade tais, que se concretizava, se personificava na voz interior divina do gênio ou demônio.
Como é sabido, Sócrates não deixou nada escrito. As notícias que temos de sua vida e de seu pensamento, devemos especialmente aos seus dois discípulos Xenofonte e Platão, de feição intelectual muito diferente. Xenofonte, autor de Anábase, em seus Ditos Memoráveis, legou-nos de preferência o aspecto prático e moral da doutrina do mestre. Xenofonte, de estilo simples e harmonioso, mas sem profundidade, não obstante a sua devoção para com o mestre e a exatidão das notícias, não entendeu o pensamento filosófico de Sócrates, sendo mais um homem de ação do que um pensador. Platão, pelo contrário, foi filósofo grande demais para nos dar o preciso retrato histórico de Sócrates; nem sempre é fácil discernir o fundo socrático das especulações acrescentadas por ele. Seja como for, cabe-lhe a glória e o privilégio de ter sido o grande historiador do pensamento de Sócrates, bem como o seu biógrafo genial. Com efeito, pode-se dizer que Sócrates é o protagonista de todas as obras platônicas embora Platão conhecesse Sócrates já com mais de sessenta anos de idade. "Conhece-te a ti mesmo" - o lema em que Sócrates cifra toda a sua vida de sábio. O perfeito conhecimento do homem é o objetivo de todas as suas especulações e a moral, o centro para o qual convergem todas as partes da filosofia. A psicologia serve-lhe de preâmbulo, a teodicéia de estímulo à virtude e de natural complemento da ética.
Em psicologia, Sócrates professa a espiritualidade e imortalidade da alma, distingue as duas ordens de conhecimento, sensitivo e intelectual, mas não define o livre arbítrio, identificando a vontade com a inteligência.
Em teodicéia, estabelece a existência de Deus: a) com o argumento teológico, formulando claramente o princípio: tudo o que é adaptado a um fim é efeito de uma inteligência; b) com o argumento, apenas esboçado, da causa eficiente: se o homem é inteligente, também inteligente deve ser a causa que o produziu; c) com o argumento moral: a lei natural supõe um ser superior ao homem, um legislador, que a promulgou e sancionou. Deus não só existe, mas é também Providência, governa o mundo com sabedoria e o homem pode propiciá-lo com sacrifícios e orações. Apesar destas doutrinas elevadas, Sócrates aceita em muitos pontos os preconceitos da mitologia corrente que ele aspira reformar.
A Moral é a parte culminante da sua filosofia. Sócrates ensina a bem pensar para bem viver. O meio único de alcançar a felicidade ou semelhança com Deus, fim supremo do homem, é a prática da virtude. A virtude adquiri-se com a sabedoria ou, antes, com ela se identifica. Esta doutrina, uma das mais características da moral socrática, é conseqüência natural do erro psicológico de não distinguir a vontade da inteligência. Conclusão: grandeza moral e penetração especulativa, virtude e ciência, ignorância e vício são sinônimos. "Se músico é o que sabe música, pedreiro o que sabe edificar, justo será o que sabe a justiça".
Sócrates reconhece também, acima das leis mutáveis e escritas, a existência de uma lei natural - independente do arbítrio humano, universal, fonte primordial de todo direito positivo, expressão da vontade divina promulgada pela voz interna da consciência.
Sublime nos lineamentos gerais de sua ética, Sócrates, em prática, sugere quase sempre a utilidade como motivo e estímulo da virtude. Esta feição utilitarista empana-lhe a beleza moral do sistema.
Como Sócrates é o fundador da ciência em geral, mediante a doutrina do conceito, assim é o fundador, em particular da ciência moral, mediante a doutrina de que eticidade significa racionalidade, ação racional. Virtude é inteligência, razão, ciência, não sentimento, rotina, costume, tradição, lei positiva, opinião comum. Tudo isto tem que ser criticado, superado, subindo até à razão, não descendo até à animalidade - como ensinavam os sofistas. É sabido que Sócrates levava a importância da razão para a ação moral até àquele intelectualismo que, identificando conhecimento e virtude - bem como ignorância e vício - tornava impossível o livre arbítrio. Entretanto, como a gnosiologia socrática carece de uma especificação lógica, precisa - afora a teoria geral de que a ciência está nos conceitos - assim a ética socrática carece de um conteúdo racional, pela ausência de uma metafísica. Se o fim do homem for o bem - realizando-se o bem mediante a virtude, e a virtude mediante o conhecimento - Sócrates não sabe, nem pode precisar este bem, esta felicidade, precisamente porque lhe falta uma metafísica. Traçou, todavia, o itinerário, que será percorrido por Platão e acabado, enfim, por Aristóteles. Estes dois filósofos, partindo dos pressupostos socráticos, desenvolverão uma gnosiologia acabada, uma grande metafísica e, logo, uma moral.

A GNOSIOLOGIA - O interesse filosófico de Sócrates volta-se para o mundo humano, espiritual, com finalidades práticas, morais. Como os sofistas, ele é cético a respeito da cosmologia e, em geral, a respeito da metafísica; trata-se, porém, de um ceticismo de fato, não de direito, dada a sua revalidação da ciência. A única ciência possível e útil é a ciência da prática, mas dirigida para os valores universais, não particulares. Vale dizer que o agir humano - bem como o conhecer humano - se baseia em normas objetivas e transcendentes à experiência. O fim da filosofia é a moral; no entanto, para realizar o próprio fim, é mister conhecê-lo; para construir uma ética é necessário uma teoria; no dizer de Sócrates, a gnosiologia deve preceder logicamente a moral. Mas, se o fim da filosofia é prático, o prático depende, por sua vez, totalmente, do teorético, no sentido de que o homem tanto opera quanto conhece: virtuoso é o sábio, malvado, o ignorante. O moralismo socrático é equilibrado pelo mais radical intelectualismo, racionalismo, que está contra todo voluntarismo, sentimentalismo, pragmatismo, ativismo.
A filosofia socrática, portanto, limita-se à gnosiologia e à ética, sem metafísica. A gnosiologia de Sócrates, que se concretizava no seu ensinamento dialógico, donde é preciso extraí-la, pode-se esquematicamente resumir nestes pontos fundamentais: ironia, maiêutica, introspecção, ignorância, indução, definição. Antes de tudo, cumpre desembaraçar o espírito dos conhecimentos errados, dos preconceitos, opiniões; este é o momento da ironia, isto é, da crítica. Sócrates, de par com os sofistas, ainda que com finalidade diversa, reivindica a independência da autoridade e da tradição, a favor da reflexão livre e da convicção racional. A seguir será possível realizar o conhecimento verdadeiro, a ciência, mediante a razão. Isto quer dizer que a instrução não deve consistir na imposição extrínseca de uma doutrina ao discente, mas o mestre deve tirá-la da mente do discípulo, pela razão imanente e constitutiva do espírito humano, a qual é um valor universal. É a famosa maiêutica de Sócrates, que declara auxiliar os partos do espírito, como sua mãe auxiliava os partos do corpo.
Esta interioridade do saber, esta intimidade da ciência - que não é absolutamente subjetivista, mas é a certeza objetiva da própria razão - patenteiam-se no famoso dito socrático "conhece-te a ti mesmo" que, no pensamento de Sócrates, significa precisamente consciência racional de si mesmo, para organizar racionalmente a própria vida. Entretanto, consciência de si mesmo quer dizer, antes de tudo, consciência da própria ignorância inicial e, portanto, necessidade de superá-la pela aquisição da ciência. Esta ignorância não é, por conseguinte, ceticismo sistemático, mas apenas metódico, um poderoso impulso para o saber, embora o pensamento socrático fique, de fato, no agnosticismo filosófico por falta de uma metafísica, pois, Sócrates achou apenas a forma conceptual da ciência, não o seu conteúdo.
O procedimento lógico para realizar o conhecimento verdadeiro, científico, conceptual é, antes de tudo, a indução: isto é, remontar do particular ao universal, da opinião à ciência, da experiência ao conceito. Este conceito é, depois, determinado precisamente mediante a definição, representando o ideal e a conclusão do processo gnosiológico socrático, e nos dá a essência da realidade.

ESCOLAS SOCRÁTICAS MENORES - A reforma socrática atingiu os alicerces da filosofia. A doutrina do conceito determina para sempre o verdadeiro objeto da ciência: a indução dialética reforma o método filosófico; a ética une pela primeira vez e com laços indissolúveis a ciência dos costumes à filosofia especulativa. Não é, pois, de admirar que um homem, já aureolado pela austera grandeza moral de sua vida, tenha, pela novidade de suas idéias, exercido sobre os contemporâneos tamanha influência. Entre os seus numerosos discípulos, além de simples amadores, como Alcibíades e Eurípedes, além dos vulgarizadores da sua moral (socratici viri), como Xenofonte, havia verdadeiros filósofos que se formaram com os seus ensinamentos. Dentre estes, alguns, saídos das escolas anteriores não lograram assimilar toda a doutrina do mestre; desenvolveram exageradamente algumas de suas partes com detrimento do conjunto.
Sócrates não elaborou um sistema filosófico acabado, nem deixou algo de escrito; no entanto, descobriu o método e fundou uma grande escola. Por isso, dele depende, direta ou indiretamente, toda a especulação grega que se seguiu, a qual, mediante o pensamento socrático, valoriza o pensamento dos pré-socráticos desenvolvendo-o em sistemas vários e originais. Isto aparece imediatamente nas escolas socráticas. Estas - mesmo diferenciando-se bastante entre si - concordam todas pelo menos na característica doutrina socrática de que o maior bem do homem é a sabedoria. A escola socrática maior é a platônica; representa o desenvolvimento lógico do elemento central do pensamento socrático - o conceito - juntamente com o elemento vital do pensamento precedente, e culmina em Aristóteles, o vértice e a conclusão da grande metafísica grega. Fora desta escola começa a decadência e desenvolver-se-ão as escolas socráticas menores.
São fundadores das escolas socráticas menores, das quais as mais conhecidas são: a escola de Megara, fundada por Euclides (449-369), que tentou uma conciliação da nova ética com a metafísica dos eleatas e abusou dos processos dialéticos de Zenão; a escola cínica, fundada por Antístenes (n. c. 445), que, exagerando a doutrina socrática do desapego das coisas exteriores, degenerou, por último, em verdadeiro desprezo das conveniências sociais. São bem conhecidas as excentricidades de Diógenes; a escola cirenaica ou hedonista, fundada por Aristipo, (n. c. 425) que desenvolveu o utilitarismo do mestre em hedonismo ou moral do prazer. Estas escolas, que, durante o segundo período, dominado pelas altas especulações de Platão e Aristóteles , verdadeiros continuadores da tradição socrática, vegetaram na penumbra, mais tarde recresceram transformadas ou degeneradas em outras seitas filosóficas. Dentre os herdeiros de Sócrates, porém, o herdeiro genuíno de suas idéias, o seu mais ilustre continuador foi o sublime Platão. Veja mais aquiaqui.

FONTES:
ARANHA, Maria Lucia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 1994.
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Atica, 2002.
MARCONDES, Danilo. Iniciação à história da filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
PADOVANI, Umberto; CASTAGNOLA, Luis. Historia da Filosofia. São Paulo: Melhoramentos, 1978.
PESSANHA, José Américo Motta (Org). Os pré-socraticos. São Paulo: Abril, 1978.
REALI, Giovani e ANTESERI, Dário. História da Filosofia. São Paulo: Paulus, 1990.
SOUZA, José Cavalcante. Os pré-socrático. São Paulo: Abril, 1978.
WEATE, Jeremy. Filosofia para jovens. São Paulo - Callis, 1999.




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