quinta-feira, março 07, 2013

PAULO FREIRE, FERNANDA AMPUERO, EVA CANEL, RADUAN NASSAR, CARMEN DE BURGOS & MANZONI

A arte da pintora Maria Auxiliadora da Silva (1935-1974).

 

FURICO, FILHO DA PUTA – Deuzinara cresceu órfã como Narinha, serviçal numa casa de família. Ficou por lá até o dia que ganhou o olho da rua: a patroa flagrou o primogênito totalmente zarolho montado com a língua de fora num enfiado avexado na sua garupa proeminente. Um escândalo! Com uma mão na frente e outra atrás, depois de muito encher a rua de perna foi, finalmente, acolhida pelo padrinho Asmodeu, que reunia outras meninas na sua congregação suspeitável. Paparicada no recinto, nem se dava conta o protetor lambendo os beiços pra sua banda. E foi dele que ela emprenhou pela primeira vez: foi estuprada numa manhã de domingo, na cozinha escura do lupanar. A partir daí, não tinha hora que ele não a dominasse, fodesse e seviciasse, escrava de fungados e metidas. Ao dar com a língua nos dentes, ele teve um piripaque e bateu as botas. A assumida então chefe do convento que era amásia do defunto decretou seu exílio. Sem ter para onde ir, caiu quase morta e pariu: Esse rebento filho da puta quase me rasgou toda! -, deixando-a deformada sobre a cama, inchada e quase imobilizada por um bom tempo, razão pela qual o bruguelo que crescia a olhos vistos ganhar o apelido de Furico, o treloso Furiquinho – isto nas horas ternas; Ô seu Furico desgraçado, nas horas das cipoadas pelas arteirices. Como a mãe não tinha filiação nem documentos, assinava “de Tal”, assim ele: Furico de Tal, a sua graça completa. Entre furtos e presepadas foi ficando taludo embaixo das maiores lamboradas, tomando jeito na vida depois de mil e umas utilidades nos balcões de bodegas, boticas e jogos de azar. Ganhou notoriedade mesmo por conta da pontaria no tiro ao alvo e na perícia de domar bichos inusitados. Esse cabra é bom! -, diziam uns mais simpáticos. Mas logo o asco cobria-lhe por conta de um vício feio: gostava de enfiar o dedo nas ventas e ficar amolegando a catota. Nojento! No meio de rela bucho, bundacanascas e babaovice ganhou a simpatia do escrivão seu Rube, empregando-se formalmente como cheleleu, depois recadista, promovido a copista e sair galgando degraus de quase escrevente ao ser alfabetizado sem professor: Foi, aprendeu sem se ensinar. Daí prestou concurso público e tornou-se juramentado, um sujeito dito por todos como de bem, apesar da vida pregressa. Aí levantou a focinheira e adquiriu prestigio com rei na barriga até se tornar vereador pela sigla partidária de menor representação local. Candidatou-se a prefeito, só não logrando êxito por conta da campanha antipática promovida pelos casacudos da situação, que usaram seu nome para destroná-lo de qualquer dignidade: Furico, filho da puta! A coisa pegou e ganhou o opróbrio popular. Não se fez de rogado e com o rabinho escondido entre as pernas não demorou muito a obrar milagres e salvar gente como a praga, quer dizer, realmente sua dedicação e presteza salvou muita gente da peste que quase dizimou a si e a toda gente da face da terra. Não deu outra: entrou na moda porque apesar de ter um nome abjeto, era um sujeito decente. Preso um tanto de vezes por atentado ao pudor, quando não por engano, mesmo assim construiu uma trajetória de injustiças muitas. Levou tanta porta na cara que assumiu o apelido Furico-não. E isso promoveu o maior disparate eleitoral: o mais votado reeleito. Não evoluiu na carreira, mas tornou-se o hors-concurs em todo lugarejo e adjacências. Já falou com Furico-não, ele resolve! É isso de boca em ouvido o tempo todo. Quem não o conhece é porque não mora pela redondeza, ou vive no mundo da lua. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui e aqui.

 


DITOS & DESDITOS Uma das coisas que de preferência deve atrair a atenção da sociedade, devido à sua grande importância e necessidade, é a cultura e a educação das mulheres, das quais dependem a civilização e o progresso dos povos. Cuidar da educação das mulheres é cuidar da regeneração e progresso da humanidade. O mal social vem da ignorância e obscurantismo, a salvação está na educação e no trabalho. Você tem que viver na paisagem interior de nossas almas. O verdadeiro progresso dos povos está na ética. Eu acho que o futuro nos pertence. Pensamento da escritora, jornalista e ativista espanhola, Carmen de Burgos e Seguí (1867-1932), que fez parte da Geração de 98 e assinou alguns de seus escritos com os pseudônimos de Colômbia, Perico el Palotes, Marianela e Honorine.

 

ALGUÉM FALOU: Quanto mais diziam que os escritos não eram meus, mais provas eu dava de que não havia homem que me superasse em coragem moral... Frase da escritora cubana Eva Canel (Agar Eva Infanzón Canel - 1857-1932), autora da obra Oremus (Impr. La Tipografía, 1893), numa época em que era de completa desaprovação a abordagem de certos temas pelas mulheres, a ponto de ser acusada de não ter sido ela a autora do que escrevera. O romance é repleto de conflitos como adultério, relações incestuosas, hipocrisia da sociedade e da religião, razão pela qual ela enfrentou com coragem e audácia, contando a história de uma jovem submissa que foi criada em um convento, de onde vêm suas fortes convicções religiosas. Quando ela saiu, já adulta, ela se viu em uma situação impossível de assumir com base em suas crenças morais, logo percebendo que a realidade não é uma estrutura imóvel que ela pudesse controlar apenas com suas orações. Questões filosóficas como essas serão as que colocarão a protagonista em sérios apuros e a colocarão em uma posição delicada e inacessível para sua piedosa educação.

 

LAVOURA ARCAICA – [...] sempre ouvia nos sermões do meu pai que os olhos são a candeia do corpo, e que se eles eram bons é porque o corpo tinha luz, e seus olhos não eram limpos é que eles revelavam um corpo tenebroso [...] sabia que meus olhos eram dois caroços repulsivos [...] eu estava era escuro por dentro, não conseguia sair da carne dos meus sentimentos [...] rico não é o homem que coleciona e se pesa no amontoado de moedas, e nem aquele, devasso, que se estende, mãos e braços, em terras largas; rico só é o homem que aprendeu, piedoso e humilde, a conviver com o tempo [...] só a justa medida do tempo dá a justa natureza das coisas [...] a vítima ruidosa que aprova seu opressor se faz duas vezes prisioneira [...] Estranho é o mundo, pai, que só se une se desunindo; erguida sobre acidentes [...] dar as costas para o mundo, ou alimentar a expectativa da destruição de tudo[...]. Trechos extraídos da obra Lavoura arcaica (Companhia das Letras, 1999), do escritor Raduan Nassar. Veja mais aqui e aqui.

 

OS NOIVOS - [...] que há muito de inverossímil que, somente para o Agente ter ocasião de trabalhar muito e ele Depoente de vender sua poção tenham causado, besuntando as portas, a destruição e morte de pessoas; por isso diga com que finalidade e por qual motivo ambos procederam assim, por um interesse tão leviano [...]. Trecho extraído da obra Os noivos: história milanesa do século XVII (Nova Alexandria, 2012), do poeta, romancista e filósofo italiano Alessandro Manzoni (1785-1873), autor da frase: Dever-se-ia pensar mais em fazer o bem do que em estar bem: e assim também se acabaria por estar melhor. A vida é o paradigma das palavras.

 

RINHAS DE GALO - [...] Era nisso que consistia ser uma prostituta: apreciar o gosto. [...] Eu me formei também, comecei a faculdade, terminei, continuei dizendo sim para os homens, quebrando como vidro barato contra as paredes de várias casas. [...] Dizem que Deus escuta mais os pobres porque ama mais os pobres, então a merda de ser pobre tinha que servir para alguma coisa [...]A primeira profecia que você cumpriu foi "você é igual a sua mãe". Eles batem em você para que você não seja igual à sua mãe enquanto eles gritavam com você, você é igual à sua mãe [...]. Trechos extraídos da obra Pelea de gallos (Páginas de Espumas, 2013), da escritora equatoriana María Fernanda Ampuero é uma escritora e jornalista feminista equatoriana.

 

TRÊS POEMAS - SORVETE DE MORANGO - Começo pelas bordas a sentir teu sabor, \Passeio minha língua em toda a extensão, \ Vou em busca desse sabor que eu anseio, \ Perdida em sensualidade e luxúria. \ Volto ao sorvete explorando-o todo, \ Sentindo o paladar do morango que me delicia, \ Devagar, bem devagar e silenciosamente, \Fecho os olhos para curtir teu doce acre. \ Desço para que possa aproveitar o momento, \ Enfio com carinho todo em minha boca, \ Deixando que minha língua goze o prazer, \ E que fios de morango  fluam entre meus lábios. \ E depois retiro com carinho ainda fascinada, \ Pelo passeio que me excita e umedece, \ E deixo que novamente me penetre e escorra, \ Agora em profundidade e depois se derreta. QUERO BEIJAR-TE - Quero beijar-te, beijar-te e nunca acabar, \ O delírio que me alucina a todo o momento, \ Nessas horas entendo tudo que é amar,\ E para ficar a teu lado motivos eu invento. \ Quero tê-lo em meus braços eternamente, \ Sentir a riqueza do momento que se reproduz, \ Acariciando cada parte de teu corpo lentamente, \ Absorvendo aquela loucura que me seduz. \ Quero em teu peito repousar cheia de luxúria, \ Enquanto tuas mãos me afagam com paixão, \ Entrelaçar nossos corpos em volúpia, \ Beber na fonte de teu calor com sofreguidão. \ Quero sentir-te transtornado e enlouquecido, \ Aspirar o lúdico cheiro que me inebria, \ No momento culminante contigo vivido, \ Lembrando das imagens que antes eu não via. \ Quero usufruir esse instante de prazer,\ Enquanto a vida lá fora flui normalmente\ Desligando-me de tudo que é não ser, \ O objeto de desejo intenso e veemente. MOMENTO DE AMOR - Quero nosso momento de amor, \ Quero encontrar nele a doçura, \ Quero sentir o fascínio do calor \ E comemorar nossa ventura.\ Quero te sentir pleno e sedutor, \ Em cada movimento uma loucura,\ Antecipar o magnífico esplendor,\ E curtir o prazer que não se cura.\ Quero tocar-te e entrar na escuridão,\ Ver as brumas que se condensam, \ Entender todo o significado da emoção \ E sentir que as mágoas não compensam. \ Quero fazer dessas horas o meu mundo, \ Amor sem mistério e tão vibrante, \ Que sem querer a minha alma circundo, \ Em toda a magnitude daquele instante. \ Quero louvar com exagero essa paixão, \ Sentir a vida que se abre como pétala de flor, \ Amanhecer ainda fugidia e sem razão, \ Impressionada com a visão de tanta cor. \ Quero sentir nesse momento só prazer, \ Nada entender de soluções e acalentar \ O corpo que de vibração me faz viver \ E jamais nessa hora discernir ou me orientar. Poemas da escritora Vânia Moreira Diniz. Veja mais aqui.

 



PAULO FREIRE: PEDAGOGIA DO OPRIMIDO – “Ninguém se liberta sozinho, ninguém liberta ninguém: os homens se libertam em comunhão”. A obra Pedagogia do Oprimido, do educador e filosofo pernambucano, Paulo Freire, traz a contradição opressores-primidos e sua superação, a situação concreta da opressão e os opressores, a situação concreta de opressão e os oprimidos, a concepção bancária da educação como instrumento de opressão, a concepção problematizadora da educação e a libertação, seus pressupostos, a concepção bancária e a contradição educador-educando, a concepção problematizadora e a superação da contradição educador-educando, o homem como ser inconcluso, consciente de sua inconclusão e seu permanente movimento de busca do ser mais, a dialogicidade como essência da educação como pratica da liberdade, a dialogicidade e o diálogo, as relações homens-mundo, os temas geradores e o conteudo programático da educação, a investigação dos temas geradores e sua metodologia, a significação conscientizadora da investigação dos temas geradores, os vários momentos da investigação, a antidialogicidade e a dialogiidade como matrizes teóricas da ação cultural antagôpnicas, a teoria da ação antidialógica e suas características, a conquista, dividir para dominar, a manipulação, a invasão cultural, a teoria da ação dialógica e suas características, a co-laboração, a união, a organização e a síntese cultural. Paulo Reglus Neves Freire (1921-1997), se destacou por seu trabalho na área da educação popular, voltada tanto para a escolarização como para a formação da consciência. É autor de “Pedagogia do Oprimido”, um método de alfabetização dialético, se diferenciou do "vanguardismo" dos intelectuais de esquerda tradicionais e sempre defendeu o diálogo com as pessoas simples, não só como método, mas como um modo de ser realmente democrático. É considerado um dos pensadores mais notáveis na história da pedagogia mundial, tendo influenciado o movimento chamado pedagogia crítica.



FONTE:
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.




PEDAGOGIA DA AUTONOMIA – O livro Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire, aborda questões como não há docência sem discência, tratando que ensinar exige rigorosidade metódica, pesquisa.respeito aos saberes dos educandos, criticidade, estética e ética, corporeificação das palavras pelo exemplo, risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação, reflexão critica sobre a prática e o reconhecimento e a assunção da identidade cultural. Aborda ainda que ensinar não é transferir conhecimento, mas que exige consciência do inacabamento, reconhecimento do ser condicionado, respeito à autonomia do ser do educando, bom senso, humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos educadores, apreensão da realidade, alegria e esperança, convicção de que a mudança é possível e curiosidade. Trata, por fim, de que ensinar é uma especificidade humana que exige segurança, competência profissional, generosidade, comprometimento, compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo, liberdade e autoridade, tomada consciente de decisões, saber escutar, reconhecer que a educação é ideológica, disponibilidade para o diálogo e querer bem aos educandos.



FONTE:
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à pratica educativa.São Paulo: Paz e Terra, 1996. Veja mais Paulo Freire aqui, aqui, aquiaqui, aqui e aqui.




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