TODO
DIA É DIA DA MULHER: A MULHER NA IDADE MÉDIA – No período compreendido historicamente
como a Era do Obscurantismo, ler e escrever era um privilégio dos mosteiros,
mantendo-se a igreja cristã a consideração de que a mulher era um zero,
desprezadas tanto pelos homens como por elas mesmas, mantendo a condução
secular de Eva como a arquiteta responsável pela queda do homem. Contudo, após
mais de cinco mil anos de inferioridade da mulher, começou-se a perceber o que
era vigente desde os tempos aristotélicos: o homem não era o elemento crucial
na procriação. Isso se deve à descoberta de que em Bizâncio, a Virgem Maria era
devotada, promovendo o surgimento da Mariolatria, no século XII, pela devoção de
Bernard de Clairvaux da Ordem Cisterciense. Também ocorre no século XIII, Tomás
de Aquino, o Doctor Angelicus, definir a mulher de então: como ela tinha sido
criada da costela de Adão, era destinada à união social com o homem e,
portanto, era sua companheira, mas somente em assuntos para os quais se tornava
biologicamente indispensável, ou seja, a procriação. Com a Mariolatria, surgem
as Martas, aquelas que vivem e morrem nas cidades, e o culto à Maria Madalena
que era a figura da prostituta que se arrependera para seguir Jesus, dando-se
oportunidade à construção de lares para arregimentar e converter as decaídas
que haviam reconhecido o erro de sua trajetória. A mulher secularmente
desdenhada se transformava em dama honorável pelo jogo do amor palaciano,
oriundo do amor puro dos árabes e da importação do culto à Virgem Maria de
Bizâncio. Tratava-se de uma condução em que era honrada apenas por sua virtude
de dama pura, inatingível, virtuosa, admirável. Surgia, então, na Idade da
Grosseria a dama da Idade da Cavalaria que passou a ser o grande tema da
literatura e da vida da classe superior, resultado das Cruzadas, nas quais muitas
mulheres se viram na necessidade de cuidar das propriedades e administrar terras,
impostos, dízimos e até a política, além de descobrirem os prazeres de serem
cantadas por poetas e trovadores, como Mocadem de Córdoba, Ibn Sara e Ibn Hazn,
com canções de amor de um romântico herói que lutaria com o mundo para merecer o
amor da amada. Esses eventos tiravam-nas da vida monótona com seu senhor e seu
séquito fora de casa: a vida imitava a arte. Exemplo disso foi Eleanor de
Aquitânia que ajudou a estabelecer o ideal do amor palaciano, ao casar-se com
Luiz VII em 1137, cultuando o roman,
um romance contando uma história em versos rimados sobre as maravilhosas
aventuras no amor e na guerra. Quando ela se casou com Henrique II da Normandia
e Inglaterra, patrocinava muitos trovadores notáveis, entre os quais Bernart de
Ventadom. Suas filhas, principalmente Marie de Champagne, convenceram Chrétien
de Troyes a fundir histórias de amor com ação, surgindo a partir de então a
cavalaria: a dama era a insígnia do comando. Foi daí que surgiu o romance que
se tornou lenda, dando conta do amor de Jaufré Rudel pela condessa de Trípole,
na Síria, uma legendária beldade sobre quem ele ouvira falar através de
peregrinos que retornavam da Terra Santa, ou da Graça Divina, buscando a
felicidade de expirar nos braços de sua dama bem-amada. Também Guillaume de
Larris exaltara a ideia alegórica da mulher virtuosa e Jean de Meun que
desclassificava aquelas que não eram suficientemente nobres, ricas ou belas,
para serem qualificadas como heroínas do amor palaciano. É durante esse período
que surgem os demônios, súcubus e íncubus que, segundo Hinemar, bispo de Reims,
atormentavam e tentavam homens e mulheres. Assinalam ser o demônio que aparecia
para tentar as mulheres, ao tomar aparência do homem que ela amava, como o caso
de uma freira atormentada pelas visitas de um íncubo até o exorcismo. Bernard
de Chivaux diz que lidou com um caso de uma mulher que fora visitada todas as
noites, durante seis anos, por um demônio que extraía dela o seu prazer, sem ao
menos despertar-lhe o marido. Ocorre, porém, que o costume das damas em terem
amantes foi transformado de um devaneio literário para uma visão noturna,
clássica fantasia feminina da visita de homens, propagando que os demônios
estavam em ação, como a súcubo visitava um homem e recebia sua semente; então
transformado em íncubo visitaria uma mulher para transmitir-lhe aquela semente.
Foi por essa razão que surgiu o Malleus
Maleficarum, em 1486, o primeiro grande manual dos inquisidores de
feitiçaria, para reprimir os desejos femininos e seus envolvimentos os demônios.
Ocorre, por fim, no século XIV, que Eva finalmente cedeu lugar a Maria, com seu
culto entre os franciscanos dos séculos XIV e XV, tornando-se uma cálida e
compassiva mãe dos pobres e infelizes da terra. A crescente popularidade de
Maria deveu-se muito aos trovadores, aos cistercienses e franciscanos, aos
nobres, mercadores e burgueses, passando a ser ela a terna, amorosa e bondosa. Ao
mesmo tempo, surgem os livros de cortesia, os quais passam a ser adotados pelas
mulheres burguesas para aperfeiçoamento, como também os cintos de castidade que
era usado para proteção contra estupro e para coibir a libertinagem da mulher. Como
visto, na Idade Média o processo de desvalorização, sedimentado pela Primeira
Mulher, se transformava com a visão da Virgem Maria como um meio de renovação,
continuando, mesmo assim, a serem as mulheres consideradas
pelo clero como criaturas débeis e suscetíveis às tentações do diabo, logo,
deveriam estar sempre sob a tutela masculina. (Luiz Alberto Machado).
Veja mais:
PICADINHO
Imagem: Prostitute, do pintor do Expressionismo e Fauvismo francês, Georges Rouault (1871-1958).
Curtindo o álbum Flutes Sonatas (Flötensonaten nº 272-277 – Naxos, 2006), com obras
do compositor alemão Johann Joachim
Quantz (1697-1773), com a flautista Verena
Fischer, o cello de Klaus-Dieter Brandt e o cembalo de Leon Berben.
EPÍGRAFE – Quem
olha para uma montanha distante não repara na beleza de um dente-de-leão que
está bem na sua frente. E quem se aproxima para olhar o dente-de-leão não vê
como é bela a montanha ao longe. Para nós, as vozes das pessoas são mais ou
menos assim, frase extraída do livro O
que me faz pular (Intrínseca, 2014), do premiado jovem escritor autista
japonês Naoki Higashida. Veja mais
aqui.
A MULHER, O PATRIARCADO E A
ESCRAVIDÃO – No livro Mulheres: o gênero
nos une, a classe nos divide (Sunderman,
2008), de Cecília Toledo, encontro
que no processo de origem do patriarcado, a esposa passou a ser uma
propriedade do marido, como os outros bens, confirmadas por descobertas
antropológicas que permitiram afirmar que a mulher não nasceu oprimida, mas
passou a sê-lo devido a inúmeros fatores, dentre os quais, os decisivos foram
as relações econômicas, que depois determinaram toda a superestrutura
ideológica de sustentação dessa opressão: as crenças, os valores, os costumes,
a cultura em geral. Nesse sentido, autora assinala que [...] a opressão da mulher está vinculada à
existência da propriedade privada dos meios de produção, e apenas poderá ser
superada com uma mudança total na infraestrutura das sociedades assentadas
neste tipo de relação. Tal fato sinaliza diretamente um regime escravocrata
que submetia à mulher aos mandos do homem. Pensamento similar é encontrado no
livro Ser
humana: quando a mulher está em discussão
(DP&A, 2002), de Marcia Moraes,
ao observar que no período da escravidão [...] desde os tempos mais remotos, exercitava o extremo sexismo necessário
às praticas patriarcais, e essa foi a forma pela qual nasceu a diferenciação
das classes sociais [...] As mulheres
eram escravizadas não apenas pela força do trabalho, mas também pelos serviços
sexuais prestados aos seus donos e pela reprodução”. Tal fato define que a
exploração de mulheres de classes sociais baixas pelos homens de classe alta
pode ser facilmente observada em toda história humana, incluindo o feudalismo e
os tempos atuais. Veja mais aqui e aqui.
A CIDADE DE ULISSES – No livro Cidade de Ulisses (Sextante, 2011), da escritora portuguesa Teolinda Gersão, destaco os trechos:
[...] Expor-se é também esconder-se. E
também no disfarce os criadores são mestres [...]. Ao longo dos séculos também nós vivemos essa
história de mulheres esperando, sozinhas, de filhos crescendo sem pai. Foi
assim nas cruzadas, nos Descobrimentos, na guerra colonial, na emigração, até
ao século XX. [...] Penelópe cansa de esperar
por Ulisses e cede aos pretendentes, sobretudo a um deles, Anfínomo. Ulisses
regressa e mata-a, ao saber dos seus amores com Anfínomo; [...] Penélope cansa-se de esperar por Ulisses e
deita-se com os cento e vinte e nove pretendentes. Desses amores nasce o grande
deus Pã; Mas não existia nenhuma versão em que Penélope escolhesse um dos
pretendentes, que se tornaria rei de Ítaca, e ela rainha a seu lado. E em
nenhuma versão se tornava ela própria rainha de Ítaca, no lugar de Ulisses,
dissemos. No entanto seria provavelmente assim que hoje contaríamos a história.
Veja mais aqui.
POEMEL & MULHER – A poeta e professora Maisa
Vibancos, que também se assina Maísa Pupila, já foi selecionada e publicada
no Painel Brasileiro de Novos Talentos, da Câmara Brasileira de Jovens
Escritoas, foi moderadora do Fórum do
Guia de Poesia do Projeto SobreSites – RJ e edita o excelente blog Olhares poéticos... não poesias – Maísa Pupila. Dela destaco inicialmente o Poemel: Mistura/ sem culpas / servido
em versos, / adoçam o tempo / e vem tictacteando; / o mel cai e inspira /
sinestesicamente... / o poema transpira / - grudam-se os sabores: / Poemel
nascente. E também o seu poema Mulher: Mulher
/ sinfonia constante - / em silêncio / ou no último volume, / música eterna /
de todas as idades, / calma ou estressada / sempre mulher; / companheira, mãe,
namorada, / amiga, avó, serena ou descontrolada - /afaga qualquer momento, /
acaba com qualquer solidão. / Mulher / Sempre Grande, / Intensa e Única, / é como
a natureza, / não desperdiça nada / recicla valores, / e em suas raízes
eterniza / o milagre do amor. Veja mais aqui.
MLLE
DUMESNIL – Marie Dumesnil,
pseudônimo de Marie-Françoise Marchand (1713-1803), foi uma grande atriz
francesa que estreou na Comédie Française, como Clitemnestra, em
Iphigénie em Aulide, de Racine. Foi uma das principais intérpretes de Voltaire,
de quem fez Mérope (1743), seu maior sucesso. Garrick apreciou com entusiasmo
seu talento dramático, fruto mais de instinto e sensibilidade que de estudo. Em
1800, depois de abandonar o teatro, ela publica suas memórias escritas que
contem importantes informações sobre declamação. Veja mais aqui.
BLUE GARDÊNIA – O filme Blue Gardênia (A Gardênia Azul, 1953), do cineasta
austríaco Fritz Lang (1890-1976), é
baseado na história homônima de Vera Caspary, contando a historia de um
assassinato sensacional que representa uma imagem da vida norte-americana,
quando uma garota ingênua torna-se suspeita desse crime, em mais uma análise
das origens do mal. O destaque é para premiada atriz estadunidense Anne Baxter (1923-1985).
Veja mais aqui.
IMAGEM DO DIA
Sonhando (1985), do artista plástico Siron Franco.
DEDICATÓRIA
A edição de hoje é dedicada à escritora e
contadora de história Benita Prieto.
Veja aqui.
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
E veja mais Mahatma Gandhi, Educação, Michelangelo
Antonioni, Vanessa Redgrave, Genesis & Phil Collins, Carlos Zéfiro,
Jennifer R. Hale, Maria Luísa Mendonça & muito mais aqui.