CRÔNICA
DE AMOR POR ELA: QUANDO TE VI (Imagem:
arte de Meimei Corrêa) - Quando te vi pela primeira vez uma imensa luz surgiu
no firmamento para iluminar o abismo das trevas predominante nas minhas
errâncias pelo caos. Foi como se eu estivesse à deriva pelas tormentas de todos
os naufrágios e, desse fé, na iminência do fim de último instante com terra à
vista. Assim foi a sua chegada: um instante em que tudo mudou de figura. O que
era noite tenebrosa deu em manhã ensolarada; o que era uma eterna emboscada,
tornou-se tentáculos múltiplos de oportunidades; o que premia a desesperança,
deu-se terreno fértil para o mais promissor dos territórios. E dos seus olhos
surgiram dois grandes luzeiros: um para luz de cada noite e, o outro, para que
eu aprendesse das trevas e pudesse discernir o que é da vida e da morte para a
excelência do amor. E dos seus lábios emergiram os beijos que se fizeram rotas para
que eu me desse conta do caminho de casa para não mais me perder à toa por aí.
E dos seus seios brotaram todos os alimentos da maior fartura para matar a
minha fome de séculos. E do seu ventre eclodiram cachoeiras de gozo e prazeres
para que eu pudesse matar a minha sede de sempre. E do seu corpo toda
abundância fez-se mais do que merecida para que eu não mais tenha que padecer
das minhas mil mortes. E assim foi até que da segunda vez que eu te vi o mundo
fez-se em festa com coros angelicais a saudar nossas vidas na promessa do amor
eterno. E de menino fez-me homem probo e viril para todos os tuas mais enlouquecidas
formas múltiplas de se expressar, a confundir-se criatura e criadora, até
ser-me lua reluzente que se faz rosa da alma para, enfim, ser meu quinhão no
presente da vida. (Luiz Alberto Machado. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui).
PICADINHO
Imagem: Nu, do artista plástico húngaro Asztalos Gyula (1900-1972).
Curtindo o álbum Stabat Mater, Gloria & Litanies à la Vierge noire (Deutsche Grammophon, 2012), do compositor francês Francis Poulenc (1899-1963), com a
soprano coloratura francesa Patrícia
Petibon & Choeurs de l'Orchestre de Paris Orchestre de Paris,
regência de Paavo Järvi.
EPÍGRAFE
– A ilusão conveniente é sorvida de um só gole; a verdade
amarga, a conta-gotas -,
do livro A ilusão da alma: biografia de
uma ideia fixa (Companhia das Letras, 2010), do professor do Instituto de
Ensino e Pesquisa (Insper) e PhD pela Universidade de Cambridge, Eduardo
Giannetti. Veja mais aqui, aqui e aqui.
A
MUDANÇA – No livro Espelho partido: a mudança (Nova
Fronteira, 1984), o segundo volume da trilogia O espelho partido (I – O trapicheiro,
1959; e III – A guerra está em nós, 1968), do escritor e jornalista brasileiro Marques
Rebelo (1907-1973), destaco o trecho: [...] Havia camisolas de dormir, caras. Frescas, de linho, guardadas para os
casos de doença. Enfiou-me numa, cheirando a malva, inspecionou-me as orelhas,
mudou lençol, mudou a fronha do travesseiro por uma com monograma, ajeitou-o
para que eu repousasse melhor a cabeça, atacou a limpeza, uma que outras vez me
olhando de esguelha. Em poucos o quarto ganhava outro aspecto, os livros e
cadernos arrumados na mesa, o tapete batido e esticado, as roupas guardadas no
armário, as coisas nos seus lugares. Mas doutor Vitor demorou. Antes do almoço
não apareceu, e mamãe, inquieta rondava a minha cama. Papai veio para o almoço,
tomou conhecimento do meu estado, animou-me com palavras, olhando-me por cima
dos óculos, e ficou esperando doutor Vitor. Chegou ofegante, se desculpando,
pôs-me o termômetro, viu minha língua, abaixando-a com uma colher viu a
garganta, gracejou, examinou minhas pálpebras, auscultou-me, apalpou-me a
barriga com mão de ferro – doi? Doi? – depois do que coçou o queixo: - Meus
compadres, francamente não encontro nada suspeito. Nada, nada. Para mim o que
tem esse pequeno é manha – riu. – Enfim, vamos esperar. Nem vou receitar nada.
De noite passo aqui novamente para desencargo de consciência. Papai e mamãe se
entreolharam. Doutor Vitor fechou a maleta com o conhecido estalo e papai
adiantou-se: - Mas, Vitor, será que este menino não tem nada? – Para mim não
tem nada! E eu tinha. [...] Veja aqui.
ESFOLHANDO
O AMADO CORPO – No livro
Poesia viva do Recife: 100 poetas amam e
eternizam a cidade (CEPE, 1996), organizada pelo poeta e editor Juhareiz
Correya, destaco o poema Esfolhando o
amado corpo, da escritora e professora Luzilá
Gonçalves: Percorro o Recife como
quem percorre o corpo amado: / que ruazinha, que curva de repente, que cheiro
de flor / em jardim antigo, despertarão os sentidos / aspectos ignorados e
insuspeitados do meu amor? / Uma fachada na rua da Aurora, uma casa / entre
palmeiras na Várzea, no Poço. Um prédio perto / do porto, que a luminosidade
faz vibrar / - e o encontro se faz, corpo que descobre o corpo, / coisa viva e
inteira, alegria que se transforma / em algo mais do que ela própria. Amar o
Recife / como se quer o Amado, espaço onde me espraio / e respiro, onde me
perco e me realizo, prolongamento / de mim que no outro se reconhece / e se
constrói, eu a salvo. Tudo cabe aqui: uma / menina magrinha retoma o caminho do
colégio / pelas ruas do Espinheiro e a adolescência se refaz / no Parque 13 de
Maio, onde a gente festejava a vida / depois das aulas. Aqui reencontro amigos,
/ naquela praça ouvi meu primeiro “eu te amo”, naquele / cais chorei o amor
desesperadamente perdido, / o Capibaribe por testemunha. / Outras cidades serão
mais belas – o mundo está / cheio de corpos lindos – mas nenhuma delas me daria
/ esta sensação de permanente surpresa e descobertas, / ser único e
insubstituível, cuja forma, odores, maciez, / eu reconheceria de olhos fechados
Recife, corpo amado. Veja mais aqui.
TEATRO
SHAKESPEREANO – No livro
Texto/Contexto (Perspectiva, 1976) do crítico e teórico de teatro
germano-brasileiro Anatol Rosenfeld (1912-1973), encontro um trecho que
fala sobre o teatro do poeta, dramaturgo e ator inglês William Shakespeare
(1564-1616): Na época de Shakespeare
havia os que seguiam a tradição estoica, segundo a qual todas as paixões são
perniciosas; preponderava, todavia, a tradição aristotélico-cristã, segundo a
qual a maioria das paixões é considerada nociva somente quando não governadas
pela razão. A virtude depende, em essência, do controle temperado exercido pela
vontade racional. O homem virtuoso distingue-se, conforme o pensamento
aristotélicos, por um comportamento médio, moderado, igualmente distante dos
extremos e excessos. Assim, a coragem, enquanto virtude, é igualmente distanciada
da precipitação furiosa e da covardia. As paixões veementes tendem a alterar,
por mediação dos espíritos, a composição dos humores, como de outro lado o
individuo, conforme sua compleição e seu temperamento particulares, tende a ser
vitima de determinadas paixões excessivas, por intermédio dos espíritos
desequilibrados pelos humores alterados. A alegria, por exemplo, paixão úmida e
quente, é natural nos temperamentos sanguíneos, enquanto os melancólicos tendem
à tristeza, que é fria e seca. A tristeza, por sua vez, engendra facilmente um
desequilíbrio de humores que fazem preponderar o humor melancólico, fato que
por sua vez intensifica a tristeza, de modo que ocorre uma mútua indução e
intensificação do desequilíbrio. Pesquisas recentes mostram que Shakespeare era
um conhecedor minucioso dessas concepções. Uma obra como Hamlet pode ser
explicada, em certa medida, como a tragédia do luto e da aflição profundos,
resultando em melancolia patológica, com total desequilíbrio dos humores e
elementos, fato que possua vez aumenta o teor mórbido da aflição, já de antemão
relacionada com o seu tipo psicofísico. Otelo seria um estudo psicológico
aprofundado do ciúme, segundo a teoria dos humores e das paixões da época. Rei
Lear seria a tragédia da cólera em idade avançada, ao passo que Macbeth se
afiguraria como a análise exta da angustia mórbida. Este estudo [...] prova ponto por ponto que os heróis
correspondem a certa compleição e mistura de humores, daí se explicando o
desequilíbrio psíquico e o rumo patológico de suas paixões e vidas. [...].
Veja aqui, aqui e aqui.
ANÉSIA – O documentário Anésia, um voo no tempo (2000), dirigido e produzido por Ludmilla
Ferolla, conta a história de vida e as aventuras de Anésia Pinheiro Machado, a primeira aviadora brasileira. Aos 93
anos de idade, pouco antes de sua morte, ela relembra seus primeiros e
arriscados voos conduzindo o espectador a uma viagem pelo século XX, mostrando
como apaixonou-se pela aviação e as dificuldades que teve em conseguir se
infiltrar em um meio recém nascido e até então, dominado pelos homens. Anésia,
nas entrevistas gravadas para o filme, relata suas experiências como pioneira
na aviação. O destaque do filme foca por conta da atriz Marcela Rafea. Veja mais aqui.
IMAGEM DO DIA
A arte do ilustrador e pintor austríaco Franz von Bayros (1866-1924).
DEDICATÓRIA
Eu queria ser, / um pontinho no teu coração / para me envaidecer, / e viver com emoção. / Eu queria cantar tua poesia / para me refugiar em teu universo, / encher minh’alma de alegria / cantando tua rima e verso. / Ah! Sentir o dilúvio do teu peito, / aguçando teu desejo não feito. / deleitar-me com teus delírios. / Eu queria o teu mundo encantado, / para dizer obrigado / pela essência dos teus lírios. (Coração de poeta, de Magda Zallio para Luiz Alberto Machado).
Eu queria ser, / um pontinho no teu coração / para me envaidecer, / e viver com emoção. / Eu queria cantar tua poesia / para me refugiar em teu universo, / encher minh’alma de alegria / cantando tua rima e verso. / Ah! Sentir o dilúvio do teu peito, / aguçando teu desejo não feito. / deleitar-me com teus delírios. / Eu queria o teu mundo encantado, / para dizer obrigado / pela essência dos teus lírios. (Coração de poeta, de Magda Zallio para Luiz Alberto Machado).
A edição de hoje é dedicada à jornalista Magda Zallio.
TODO
DIA É DIA DA MULHER
Veja as homenageadas aqui.