domingo, dezembro 14, 2025

YANICK LAHENS, VENEZIA MAY, SOPHIA KIANNI & FACILITA GONZAGA!

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Chegou a hora de nos adorarmos, de dizermos isso em voz alta, chegou a hora de criarmos memórias... O amor, como eu, parte em uma jornada. Um dia eu o encontrarei. Assim que eu vir seu rosto, eu o reconhecerei imediatamente... É preciso tanto, e tantas lágrimas, para ter o direito de amar... Cada besteira que você fizer nesta vida, você terá que pagar por ela... Use suas falhas, use seus defeitos; então você vai ser uma estrela... Não peço desculpas pela falta de cronologia nas minhas lembranças, pois um incidente evoca outro, então eu as anotei... Não me arrependo de nada!...

Pensamento recolhido da obra The Wheel of Fortune: The Autobiography of Edith Piaf (Chilton, 1958) & ao som do album Edith Piaf: 25 chansons (1982), da cantora e atriz francesa Édith Piaf. Veja mais aqui & aqui.

 

Olha a hora! Lá vai ela... - O frio de junho no reino do presente contínuo de Ftinoporão. Ainda é cedo e a preocupação transcende o cansaço, entre a vigília e o estupor, o insistente choro de um bebê na vizinhança, queimando nas vísceras da madrugada. Lá fora o galo cantou alhures e era como a obrigação de pôr as coisas em dia: quem tem contas pra pagar jamais poderá dar-se ao luxo de folga – logo quem sempre errava na conta e o cálculo se perdia no prazo encurtado, sabe-se lá como. Foi preciso o ânimo de Ferusa e os gemidos de uma gata no cio: difícil é segurar a onda contra o aluamento fortuito noutras elucubrações. Afazeres sumários davam conta da goteira no teto, o pingado na pia e cadê velas e fósforos, a luz apagou subitamente, ampliando as trevas proutras fantasmagorias. É preciso fechar as janelas, um chuvisco demorado alagava o ataque dos insetos que picavam e isso dói e como! E Anatole escondia Auge sob carregadas nuvens e me trazia a lembrança de Laura que lia Virgínia e vivia sufocada pelas circunstâncias das cenas da Dalloway de Marleen Gorris e as frustrações repisadas como em The Hours de Cunningham. Mas, que dia é mesmo hoje? Precisava fechar a torneira, a vasilha enchia a esborrar pra todo lado. A chaleira esquentava no fogão e era só uma semana como outra qualquer. Sim, nublada manhã de Quimão, os encharcados escondiam Talo e não mais brotavam esperanças, nem poderiam, impediram Carpo emergir de Damia e coibiram Auxo e Auxesia, inviabilizações extemporâneas. Nossa! Como podia, a ventania escancarou a porta, ah, emporcalhava tudo e as intrometidas rãs invadiam pro atrapalho do chocho matinal de Acte. Já chuva torrencial anunciando o atraso da saída de casa, difícil assim encarar tumultos e lodaçais, como se sucumbisse ao noticiário: a zoada das tevês, o som violento dos filmes de ação; a liberdade perdida e dela a infância – quebrou o pé pulando muro; a adolescência destruída – cortou-se aparando flores no jardim, o primeiro beijo na esquina, a festa do dia 8, as risadas espalhafatosas e ela se confundia aos buracos e desníveis das calçadas empoçadas, quase voçorocas, prest’enção, doido! Um tombo, nada demais. Segura! Os vazamentos são os mijos da Terra. Será? E o horror destampava a panela cozinhando ódios e mágoas. Parecia trágico sorrir se havia violência iminente – o déjà vu de sempre, a sensação vicariante e as bravatas desmioladas traziam as muitas faces de Virgínia, desde a madrugada. E via Clarissa carregando seu fardo e, com isso, intuía: a gente quer mesmo mais que o impossível, além do extremo, dane-se tudo! E ela evocava peremptória de que estou devendo e muito à Ginastique, quase obeso aos estorvos. Chegava Mesembria insinuando Eiar, enquanto reaparecia Acte sinalizando o estômago carente no meio do caminho e só dava direito à metade de quase nada, para valer-me entre a sanidade e a loucura. Ainda pra onde, vai saber, ardido pelas trapaças e percalços; a censura velada aplacando futuro; e se tudo era meio, como festa/tragédia, riqueza/pobreza, assassinatos, corrupção, precisava mesmo era agarrar a sorte pelos chifres e segurar firme Euporia, quem dera. Assoviava então o tempo passava tapiando o calor esbaforido, o suor pingando testa abaixo e a resignação com as peçonhas recônditas nos olhares vistosos, aquilo tudo mais parecia matagais tomando conta de quintais tão bonitos, terrenos baldios com arame farpado amarrado direito, coisa, hem, pra desvalido: tudo ao tempo vagava e era preciso divergir do exagero - se ganhou o que perdeu, ou era uma vez o ganhado, recombinava o olho no alvo e a mira, o inédito da coisa. Bulhufas! Nem adiantava tapar os ouvidos, evitando o diverso da ventura. E soerguia os trunfos duma insólita mania inglória que vinha desde antes e lá longe acenava remoques. Só podia e valia agora, o imediato; descuido, a vida troçava, danada! Precaver-se aos desembestos, doido varrido, e se esmorecia além do mais com as escolhas, o antes do depois, já era. Convviria precauções e atinava de governança desajeitada com os desacertos: prazeres e pesares. Larga de ser desatento, manzanza! Pensando que o céu é perto? Era comigo, fundo respirado contando até 10 e 20 e 100... – e não era pra nada, como quem jogasse Leão no bicho e desse papalégua, arre égua! É um sinal, será, se avie. Mas, teco! Parece mais aquele mato morrido pela pisada, jamais o ar da graça de Ortosia, porque Disse foi subjugada desde que invocaram Eunomia e se escafederam evadidas. Quase nem sabia do sorriso de Hesperis atarantando a melancolia de Disis, passando a limpo o que fiz de tudo e era nada, noves fora zero e sem café da manhã nem mesmo almoço, e Acte já cobrava o jantar. Refazia a rota estiada de volta como num asco de Teros pelas muitas faces de Virgínia orbitando abantesmas inusitados. Como embaraçado de todo passava batido outra vez, o regaço já prestes e a porta emperrava, a vidraça quebrada, embassou o tempo e quem podia incriminar, se não adiantava maldizer a própria caricatura: dei-me ao aloprado, parece, a careta por conta da mosca na sopa, babau! Uma hora dessas e o grilo cricrilava infinito, com a imposição de Ninfe e a latrina podre, a inhaca de comida estragada, maior catinga de aprisionado na própria obscuridade e data alguma delatava o impostor: se puxasse pelo adágio não ia adiantar nada; se subisse nas tamancas para rodar à baiana, muito menos: só perdia a compostura. Melhor, digitígrado, sair de fininho, murcho. Esse negócio de trancar rua e arrasar quarteirões são coisas de causa perdida de quem não tem a menor noção dos estrupícios. O que era de gosto não só esfolava o peito como deixoava pereba arranhando no couro. E findasse, sei lá, com um tapa-olho daqueles murros bem dados, da roncha na vista inchada, da pestana à bochecha, nada atraente. Melhor seguir em frente maneirando no rebolado, pisando firme o traçado como quem dava triunfal volta por cima, não ligando pra cheleléu, caboeta ou pariceiro, sal grosso no revertério: Saia logo desse atoleiro e pega o bigu que seja na sorte, trepeça! Tem gente que só atina aos empurrões, tropeços do muito pelos catombos: não se afrouxe, nem dê mole, não! Segura a touca como puder, não vestindo alegria com amarguras, nem como a flor em vão despetalada:  fechar a boca é dar-se por si. Já era tarde, ligou, véspera de viagem: quando foi a última vez? A incompletude pinicando quando era pra relaxar com Musique e na libação de Esponde, celebrando ignota Vênus/Afrodite e o domínio distante de Eros, pelo saboreado de Oporá nos júbilos de Teoria, afinal, também sou filho do Universo e ela, oxe, reaparecesse na veneta escapando das cenas de Daldry, porque estava prestes a hora de dormir e não havia nenhum rio Ouse por perto e podia se livrar daquela que desceu o rio como Alfonsina Storni se lançou ao mar... Suspeitávamos ciosos: ninguém ficará pra semente. Todos morremos disso ou daquilo, hora certa; quando não, todo dia. Pra quê se descascar todo se a chuva caia e lavava, o Sol enxugava, assim ia e a doidice sempre comum para todos - só o bicho humano é duro de lascar e o incompreensível era porque dava-se quando a ligeira hestória se alongava e não dava outra: era a morte pertinho sem cochilado, enquanto esquecíamos a pacífica Irene, aos pinotes em pé de guerra, com Elete genuflexa e não se falava mais nisso, ora. Ademais os sonhos sumiram pelos degraus infinitos do horizonte: quem foi, faz tempo; quem vai, apraza; não esqueça de se lembrar: entender-se consigo mesmo e já. Eu mesmo virei a página: escolhi viver - a vida inventada e a se reinventar moto contínuo. Até mais ver.

 

Agnès Varda: O ato de decidir olhar, de decidir que o mundo não é definido por como as pessoas me veem, mas por como eu as vejo... A felicidade é uma fruta linda que tem gosto de crueldade... Veja mais aqui, aqui & aqui.

Blanca Varela: Deixei a porta entreaberta \ sou um animal que não se resigna \ a morrer a eternidade \ na escura dobradiça que cede \ um pequeno ruído na noite \ da carne \ sou a ilha que avança sustentada \ pela morte ou uma cidade \ ferozmente cercada \ pela vida \ ou talvez não sou nada \ só a insônia \ e a brilhante indiferença dos astros \ deserto destino inexorável o sol dos \ vivos se levanta reconheço essa porta \ não há outra gelo primaveril e um \ espinho de sangue no olho da rosa... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

Nazik al-Mala'ika: Nunca saberemos quais mistérios as dobras da vida escondem... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

SE MOISÉS FOSSE FILIPINO

Imagem: Acervo ArtLAM.

Marnie me conta que é nadadora \ que desde que se lembra, \ flutua em águas de enchentes \ que às vezes, quando isso acontece, imagina-se como o bebê Moisés \ flutuando pelo Nilo, \ à espera de uma rainha que a encontre. \ Sob um telhado de metal ondulado enferrujado \ pelas torrentes devastadoras, \ o único refúgio para ela e suas filhas pequenas, \ ela me mostra seu equipamento de natação: \ sua roupa de mergulho para dermatite de contato, \ as cicatrizes de cortes de vidro emoldurando seus olhos \ como um snorkel, seus pés enrugados que, segundo ela, são quase palmados. \ Ela me diz: \ Quando há enchentes na região metropolitana de Manila \ todos os anos e você tem sete anos, \ você fica feliz. \ As aulas acabaram e tudo o que você pensa é em pular na água vermelho-tijolo, \ lutar na lama com a filha da vizinha, \ pular, brincar de sapo para se pendurar nas cestas de basquete \ que você finalmente consegue alcançar. \ Há baratas agarradas à gola da sua camisa, \ ratos se enterrando nos seus bolsos \ e você se imagina como a arca de Noé. \ Mas quando Manila sofre com enchentes todos os anos \ e você se torna mãe de duas filhas de sete anos, \ aprende a guardar tudo o que é precioso em seu corpo. \ Marnie dorme com os pulsos presos \ às tranças das filhas, \ passaportes enfaixados no sutiã esportivo, \ os membros da família tatuados em sua caixa torácica \ — uma filha, um peixinho dourado; outra, um crocodilo — \ todos são animais aquáticos. \ É assim que ela se acalma ao acordar sufocada por seus sonhos, \ sabendo que elas podem nadar. \ Ela imagina suas cicatrizes se transformando em guelras \ e finalmente começa a respirar. \ Quando Manila sofre com enchentes todos os anos, \ você aprende a guardar tudo o que é precioso em seu corpo. \ E qualquer outra coisa que você memorize, \ como a realidade anual dos filipinos na região metropolitana de Manila \ é a luta desesperada para subir do colchão ao telhado, carregando \ uma cadeira \ um bebê, \um bule de chá, uma urna, \ enquanto observam um furioso Faraó líquido \ engolir tudo o que possuem, \ liberando seu mar de homens \ e escravizando-os em sua própria terra. \ Mas Marnie ainda me diz que é nadadora, \ me diz que desde que se lembra, \ flutua em águas de enchente, \ me diz que às vezes, quando isso acontece, \ imagina-se como Moisés \ diante do Mar Vermelho \ e, desta vez, consegue abri-lo.

Poema da ecopoeta e artista singapurense Venezia May.

 

BANHO DE LUA - [...] Ela poderia ter escutado por horas essas palavras arrancadas da avalanche de dias. Porque o tempo gasto conversando assim não é tempo, é luz. O tempo gasto conversando assim é água que lava a alma, o anjo da guarda. [...]. Trecho extraído da obra Bain de lune (Sabine Wespieser, 2014), da escritora haitiana Yanick Lahens, também autora de Moonbath (Deep Vellum Publishing, 2017), no qual expressou que: […] Perdoar, de imediato, naquele instante, com o ódio ardendo como um coração na mão? Não, eles não conseguiam. Porque o ódio fazia você se sentir bem por dentro. Confortava como a fé em Deus. Eles não tinham tempo para julgar. Estavam matando. […]. Sobre o seu país ela afirma: Apesar da pobreza, das convulsões políticas e da falta de recursos, o Haiti não é um lugar periférico. Sua história o transformou em um centro.

 

A CRISE CLIMÁTICA É UMA CRISE DE DIREITOS HUMANOS - [...] Alguns governos e líderes empresariais dizem uma coisa, mas fazem outra. Em que linguagem precisamos colocar os dados climáticos para você agir? Por favor, diga-nos. Porque eu tenho que acreditar que a única razão pela qual você não está tomando medidas climáticas no ritmo e escala necessária é que você não tem a informação. Porque se você tivesse a informação e estivesse apenas fingindo agir que seria imperdoável. Ou nas palavras do secretário-geral, isso seria mentir. Pare de mentir. [...] O que me deu esperança foi ver todos aqueles jovens, que se importam tanto que vieram até o Egito para serem ouvidos. E ser o veículo para comunicar esse entusiasmo. Ter uma plataforma como essa para comunicar como os jovens se sentem para as pessoas que podem implementar e mudar. É um grande passo em frente para a inclusão significativa da juventude. [...] Há tanto trabalho para fazer na alfabetização climática. Veja o painel intergovernamental de referência sobre mudanças climáticas, relatório climático do IPCC. [...] A maioria das informações científicas é em inglês. Essa não é a língua principal para a maioria das pessoas do mundo. O pote de dinheiro ainda está vazio. Somente quando virmos compromissos tangíveis – quando virmos o financiamento começar a ser distribuído – é que eu acho que esses acordos têm sido um sucesso. [...] A crise climática é uma crise de direitos humanos. [...] Tem havido má gestão governamental da água. O que está acontecendo no Irã é uma revolta histórica, liderada por mulheres. A crise climática – particularmente a seca – exacerba a instabilidade no Oriente Médio. Contribui para as lutas de poder e os conflitos. Todas essas coisas estão ligadas. Os direitos humanos são agravados pela crise climática. E a crise climática tem um efeito desproporcional na nossa metade da população. As estatísticas mostram que 80% dos refugiados climáticos – as pessoas que são deslocadas – são mulheres. Um dos meus maiores focos é a moda sustentável A moda rápida é um grande problema para a geração Z. Essas empresas têm como alvo mulheres jovens. Precisamos alavancar a tecnologia para encontrar soluções. Para tornar a moda de segunda mão mais acessível. Estou trabalhando nisso com amigos de Stanford. [...] Trechos da entrevista (CIWEM - The Chartered Institution of Water and Environmental Management, 2023), concedida pela ativista estadunidense Sophia Kianni, que defende: O medo do fracasso é o que impede que as pessoas se envolvam. Precisamos de ativistas climáticos mais imperfeitos. (National Wildlife Federation, 2023).

 

FACILITA, GONZAGÃO: TATARITARITATÁ

Comadre Joana sempre reclamou \ Da mini saia que a filha tem \ O namorado se invocou também \ E certo dia pra ela falou \ Tua saia, Bastiana, termina muito cedo \ Tua blusa, Bastiana, começa muito tarde \ \ Mas ela respondeu, oi facilita \ Pra dançar o xenhenhém, (oi, facilita) \ Pra peneirar o xerém, (oi facilita) \ Pra dançar na gafieira, (oi facilita) \ Pra mandar pra lavadeira, (oi facilita) \ Pra correr na capoeira, (oi facilita) \ Pra subir no caminhão, (oi facilita) \ Pra passar no ribeirão, (oi facilita) \ Tataritaritátá (oi facilita ) \ Pra brincar na cachoeira (oi facilita) \ Rã rã rã rã rãrã (oi facilita) \ Pra dançar na gafieira, (oi facilita) \ Pra correr na capoeira, (oi facilita) \ Pra mandar pra lavadeira, (oi facilita)...

Música do compositor, bibliotecário e professor Luiz Ramalho (1931-1981), inserido no álbum Luiz Gonzaga (Odeon, 1973), do cantor, compositor e multi-instrumentista Luiz Gonzaga (Luiz Gonzaga do Nascimento – 1912-1989), o Rei do Baião. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

ITINERARTE – COLETIVO ARTEVISTA MULTIDESBRAVADOR:

Veja mais sobre MJ Produções, Gabinete de Arte & Amigos da Biblioteca aqui.



domingo, dezembro 07, 2025

ADÉLIA PRADO, CLARICE LISPECTOR, JAMIE MARGOLIN, RICARDO AIDAR & ARTE NA ESCOLA

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Nunca senti que ser mulher me tenha impedido de algo ou que tenha feito qualquer diferença... Tem muito a ver com o papel da mulher na família e com o que também carregamos e assumimos... Se você sabe que é isso que realmente quer fazer, porque é difícil entrar nesse mercado, persista e persista....

Trechos da entrevista (Classic FM, 2017) ao som das trilhas sonoras de The Cider House Rules (1999) e Chocolate (2000), da compositora britânica Rachel Portman (Rachel Mary Berkeley Portman). Veja mais aqui.

 

Fábula das cores coevas... - Era Julie introspectiva inaugurando o amanhecer, a imensidão azul do céu no teto do quarto; a lâmpada apagada, o Sol e as estrelas. No seu desamparo de viúva, o pensamento invasivo de uma cena: um troglodita à saída de uma caverna se deslumbra ao avistar um ser - como se visse o Sol da primeira manhã, ou o raio primevo rasgando o céu do seu mundo. Não era, mas muito lhe apetecia. Era ela e os olhos dele cheios de ternura. Arrebatado, ele então demonstrou sua afeição exibindo sua musculosa virilidade, ao suspender uma enorme fraga sobre a cabeça e, logo em seguida, às mesuras jogou-a contra ela, como se dissesse: toma, segura! Coitada, era o modo da aptidão dele para o amor. Não! Viu-se ali esmagada pela brutalidade de todas as milenares coações punitivas das leis de deuses estúpidos, cultuadas por sacerdotes cretinos e implementadas legalmente dos pais para os maridos detentores do Código de Hamurabi, das Leis de Manu e de toda insensata legislação dos humanos. Ao mesmo tempo, viu-se invadida por lembranças e a enredaram às tramas, as quais negou o quanto pode: foi tomada pela insolência de Antígona e enfrentou a si mesma e a todos. E teve raiva por que viu-se Hypátia tombando diante da fanática fúria cristã. E barganhou por ser apenas uma costela inútil e portadora do pecado de Eva, só para ganhar tempo. E se deprimiu porque era Juliette na pele do sofrimento Claudel. Não adiantava chorar, lamentava-se questionando o quanto era livre se estava diante de tantos flagelos seculares. Despertou assustada aceitando, enfim, seu pesadelo: adotou o nome de solteira, a sua vulnerável armadura, a luta contra o chão e a silenciosa depressão, a sanidade recuperada. Não dispunha de corrimão ou mãos solidárias. Sofria: a filha morta, as perdas, a vida esvaziada. Dispôs-se a se safar das armadilhas, sobrevivente do azul triste da queda absoluta. Estava disposta até a matar, se fosse preciso, um mero alívio, não fazia nada, a não ser revolver-se a si própria na sua autorreclusa estagnada, quando precisava escapar do passado, desligar a tomada. Aí fechou os olhos: a sinfonia inacabada, a liberdade vazia era o fundo de um poço azul. Já era Dominique prisioneira numa cela branca de um dia nublado. Novas rememorações a tomaram e, no meio delas, viu-se Joana d’Arc entre vozes ocultas e condenada pela Inquisição. Viu-se Ana Bolena executada inexoravelmente. Viu-se Isabella Morra sob golpes dos irmãos. Viu-se vagando nas trevas da caça às bruxas, súcubus às fogueiras e na perseguição da imposta culpa judaico-cristã às pecadoras da boceta maldita; o suicídio de Dandara, Francelina Maria degolada, e todos olvidavam de Olympe de Gouges porque prosperava o Código Napoleônico. Viu-se Bridget Cleary abatida pela misoginia, enquanto formava coro entre histéricas loucas com suas doenças insanas. E repassava a sua vida entrecortada por golpes históricos levando-a surpreendida pela vingança de Karol, humilhado perdedor, parvo apaixonado. Ah, havia perdido a química, não o queria mais: a Polônia jamais seria França, o amor e o ódio, o desejo e a fome, o desigual e a infelicidade de abrir mão do amor, a punição severa e a constatação em riste: o ama. E nesse sentimento ali o branco de todas as cores, juntas, iguais. Fechou-se em si e já era Valentine: o sangue da memória, as paixões, o mundo e as ilusões. Atordoada por atropelar uma cadela desamparada de um cínico e amargo juiz aposentado – na verdade, um espião da vida alheia. E assim o julgamento de Rosa Luxemburgo condenada, de Olga capturada, de Sharon Tate grávida, de Dian Fossey na cabana, das feiticeiras da Papua-Nova Guiné, das crianças e mães do Congo, dos feminicídios de Ciudad Juárez; de Dorothy Stang na floresta, da Chiara Páez espancada e a revolta #NiUnaMenos, o protesto sufocado de Marisela Escobedo: estão matando muitas mulheres! E as manchetes jornalísticas coetâneas: vereadora é abatida a tiros, juíza é morta pela polícia, militar assassinada pelo marido soldado, dona de casa esfaqueada pelo cônjuge, professora é alvejada por pai de aluno, servidoras são trucidadas por colega de trabalho, psicóloga estrangulada por suposto paciente, deputada é escalpelada em matagal, miss é tragicamente morta por perseguidor, e todas não menos humilhadas, estupradas, perseguidas, vilipendiadas, lançadas do alto de edifícios, queimadas vivas e forçadas ao silêncio eterno da matança, de penas infligidas por homicidas autoritários, extremistas, fundamentalistas, toscos com seu deus odioso e enlouquecido carrasco: o machismo mata! E corrói a humanidade. Então ela precisava rever as suas boas intenções diante da barbárie, temia e os seus medos estavam por trás dos acontecimentos, seus receios esgarçando elos esfarrapados que se reagarravam uns aos outros pelos horrores das coincidências e nada disso nunca foi nem será por acaso, tudo se repete, o eterno retorno. E sangrava com a mão escondida, o semblante trancado, o olhar indiferente de existir quando queria viver, com a sua amabilidade nos relâmpagos da boca e o coração atormentado: a injustiça é a maior escuridão das leis lesadas. Era o xadrez da morte: a vida não era só uma trilogia de Kieslowski - a dança letal era a desgraça ocidental, entre o medo e a metáfora: a confluência de devires e absurdos, as contradições e o paradoxo. Até mais ver.

 

Mayim Bialik: Eu não quero dizer que tudo acontece por uma razão, mas todos os dias estão alinhados ao lado do outro por uma razão. O melhor que você pode fazer é fazer cada dia bem com bondade e como uma boa pessoa... Veja mais aqui, aqui & aqui.

Michèle Lamont: Penso que as reivindicações de reconhecimento devem ser levadas muito a sério pelos decisores políticos e cientistas sociais. Ainda temos que entender como a desigualdade e a estigmatização se articulam umas com as outras... Veja mais aqui, aqui, aqui & aqui.

Sophie Kinsella: Pensando bem, o que é mais importante? Roupas ou o milagre de uma nova vida?... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

ANTES DO NOME

Imagem: Acervo ArtLAM.

Não me importa a palavra, esta corriqueira. \ Quero é o esplêndido caos de onde emerge a sintaxe, \ os sítios escuros onde nasce o “de”, o “aliás”, \ o “o”, o “porém” e o “que”, esta incompreensível \ muleta que me apóia. \ Quem entender a linguagem entende Deus \ cujo Filho é Verbo. Morre quem entender. \ A palavra é disfarce de uma coisa mais grave, surda-muda, \ foi inventada para ser calada. \ Em momentos de graça, infrequentíssimos, \ se poderá apanhá-la: um peixe vivo com a mão. \ Puro susto e terror.

Poema da poeta, professora, filósofa e escritora Adélia Prado (Adélia Luzia Prado de Freitas), destacando-se o texto Erótica é a alma, da autora: Todos vamos envelhecer... Querendo ou não, iremos todos envelhecer. As pernas irão pesar, a coluna doer, o colesterol aumentar. A imagem no espelho irá se alterar gradativamente e perderemos estatura, lábios e cabelos. A boa notícia é que a alma pode permanecer com o humor dos dez, o viço dos vinte e o erotismo dos trinta anos. O segredo não é reformar por fora. É, acima de tudo, renovar a mobília interior: tirar o pó, dar brilho, trocar o estofado, abrir as janelas, arejar o ambiente. Porque o tempo, invariavelmente, irá corroer o exterior. E, quando ocorrer, o alicerce precisa estar forte para suportar. Erótica é a alma que se diverte, que se perdoa, que ri de si mesma e faz as pazes com sua história. Que usa a espontaneidade pra ser sensual, que se despe de preconceitos, intolerâncias, desafetos. Erótica é a alma que aceita a passagem do tempo com leveza e conserva o bom humor apesar dos vincos em torno dos olhos e o código de barras acima dos lábios. Erótica é a alma que não esconde seus defeitos, que não se culpa pela passagem do tempo. Erótica é a alma que aceita suas dores, atravessa seu deserto e ama sem pudores. Aprenda: bisturi algum vai dar conta do buraco de uma alma negligenciada anos a fio. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

UMA REVOLTAQuando o amor é grande demais torna-se inútil: já não é mais aplicável, e nem a pessoa amada tem a capacidade de receber tanto. Fico perplexa como uma criança ao notar que mesmo no amor tem-se que ter bom-senso e medida. Ah, a vida dos sentimentos é extremamente burguesa. Texto extraído da coleção Clarice Lispector: crônica para jovens (4 vols., Rocco, 2011), da escritora e jornalista Clarice Lispector (Chaya Pinkhasivna Lispector – 1920-1977). Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

A CRISE CLIMÁTICA NÃO EXISTE NO VÁCUO - [...] Cada coisa linda que vejo é como um triste lembrete de tudo o que estamos perdendo. É doloroso porque você sabe que está indo embora. [...] Sempre foi uma realidade aterrorizante para mim, algo pairando sobre toda a minha vida. [...] Eu vejo um lugar bonito, mas é agridoce porque está sendo destruído e não vai estar lá quando eu crescer. [...]. Trecho da entrevista (BBC/LifeGate Daily, 2019), concedida pela ativista climática estadunidense Jamie Margolin.

 

ARTE NA ESCOLA:

NÓS CRIAMOS O MUNDO, SÓ ESQUECERAM DE CONTAR.

Numa iniciativa das professoras Fátima Portela e Luciana Flávia, os alunos do 6º ao 9º, da Escola CAIC José do Rego Maciel, de Palmares (PE), apresentaram no último dia 27 de novembro, a culminância do projeto Afro-Indígena, com a temática “Nós criamos o mundo, só esqueceram de contar”.  A exposição contou com apresentações da linha do tempo com a história e arte afro-indígena, leituras, capoeira e um destaque para a obra Quarto de Pensão, da escritora Carolina Maria de Jesus. Veja mais aqui, aqui, aqui & aqui.

&

VERNISSAGE RICARDO BERTACIN AIDAR

Ocorreu neste domingo, 07 de dezembro, a abertura no Espaço RGAOBE – Arte Ofício e Bem Estar, em São Paulo, da vernissagem do artista plástico e engenheiro civil Ricardo Bertacin Aidar. Ele participou com suas obras da publicação Dareladas (CriaArt, 2024), é integrante do Gentamiga Ateliê (SP) e participa da plataforma Ubqub (SP). Veja mais aqui, aqui & aqui.

 

ITINERARTE – COLETIVO ARTEVISTA MULTIDESBRAVADOR:

Veja mais sobre MJ Produções, Gabinete de Arte & Amigos da Biblioteca aqui.

 


segunda-feira, dezembro 01, 2025

ROSA MECHIÇO, ČHIRANAN PITPREECHA, ALYSON NOEL, INDÍGENAS & DITADURA MILITAR

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Ao som de Uma Antologia do Violão Feminino Brasileiro (Sesc Consolação, 2025), da violonista, cantora, compositora e arranjadora Helô Ferreira. Ela é bacharela e mestre em violão, produtora do Samba das Mulheres e do Festival Cancioneiras: Música Feminina em Primeira Pessoa, além de consultora do Instituto OuvirAtivo.

 

De festa em tragédia se desfaz e refaz... – Era dia de boi do barão, o mais festivo de Alagoinhanduba, eructação extravagante do bafo pros pipocos louvadores do maioral arrojado. Não só, girândolas de atrativos demorados, mais de semana no giro de roda gigante, montanha russa, tobogãs, escorregos, barcaças, tiro ao alvo, barracas de fogos e jogos, artistas variados no palanque e, embaixo, o desfile vistoso de curau do muito com domingueira nos trinques, dentes no quarador de bumba-meu-boi, mesuras adiantadas pra matuta bonita dos olhos vivos nas tranças de sonsa: Roda a saia, fulô, pro aroma do amor. De todo canto, caravanas; comitivas das lonjuras mais ignotas. Era gente como a praga! Chega dava gosto de ver, maior arrocho, entre transeuntes de fisionomia ignorada. Zeca Biu mesmo queria era se aproveitar dos muitos festejos, dava uma de vaqueiro aos traques para render o Espácio, tudo no faz de conta, peido-de-véia nos cascos do que foi Surubim, batia pé no Rabicho da Geralda, ou vaias pro Mão-de-pau, danças do Boi-Barroso que não tolerava apartação, nem vaquejada; e o mimoso Pintadinho na queda de rabo da mucica ou de vara pra virar o mocotó e o pescoço quebrado: Hê, Zebedeu, ô boi do cu cagado! Aboio do tanto pro ABC do Boi Prata, aplausos pra décima do Bico Branco, claque convocada pro romance do Boi Liso, qual boi-de-mamão, se passando por calemba, de fita ou de reis, ou vai na-vara quem não foi boi-santo, o zebu Mansinho do Padre Cícero; e praquele que morreu na boiada, mandava logo buscar outro lá no Piauí, pra festa de solfas e gestas, no meio dum feixe de capim verde, jogado num roçado qualquer pra ouvir aqueles da conversa de Rosa. Um primor de variedades. De repente, maior rebuliço! O que foi? Corre! E pé na bunda, saia na cabeça, zigue-zague, puxavanques, barruada de fuças, pernas enganchadas, a roda virou e girou os assustados, correria em todas as direções. A confusão exorbitou de quase ninguém sair do lugar, travados de pavor. O pânico formou alarido, assombrados metiam-se dentro de loca que fosse escapando do obnóxio. Esconderijos impossíveis arranjados na hora, escondidos no desembesto. Que droga é nove? Trancados e trêmulos, onde estavam apavorados, nem podiam sequer falar, nem se entendiam. Zeca Biu coração saindo pela boca, tremia mais que vara verde, os dentes chacoalhavam no queixo. Via-se gente desmaiando, morto carregando vivo, todos na carreira pra se abrigar, menino que perdeu os pais, mulher à procura do marido, quem perdeu a fé desgraçado, quem escafedeu de nunca mais voltar, quem perdeu a coragem paralisado, quem perdeu o norte e se desencontrou, quem cegou de vez, ou emudecia pra sempre, ou endoidava, como se safar daquela tragédia, um escarcéu. Oxe! O que foi? Não viu o boi brabo da venta fumaçando? Quem viu nada não. Balbuciou-se: Será a volta do feroz Jauaraicica que saiu do remoinho do Uirapiá? Danou-se! Cadê um vaqueiro bom nessa hora? Era. Tanger como? Perigava era mais penar. Parece mais o touro de Pasifae! Vixe! Isso é peta! Quem não soubera da fúria majestosa dum bicho desse pelos arredores, hem? Mesmo. E agora? O desencontro tamanho de nem darem fé de armas, espingardas, rifles, pistolas, garruchas que espoletas, pólvoras, coisas do tipo: Cadê moral pra mira? Brabo perdia a homência ofendendo a coragem com o serviço efetivo de dar cabo daquela rumorosa situação vexatória; certificava-se a frouxidão, o que de enorme se fizera. Isso não tem cabimento! O povo amuava. Alguém afirmou solene e saiu: É Ápis! Quem? Um boi endemoninhado! Como assim? Oxe, o cara foi lá no boi! Quem é esse lelé? Eis que um incipiente anônimo discípulo do doutor Zé Gulu esclareceu respostante: É Apolônio. O marido da Maria Biruteia? Não, o de Tiana. Ficou no mesmo, nunca vi mais gordo! Parece mais um metido a Jesus! Pois é, o mundo é muito grande para um único salvador... Essa é boa, conta outra! Ora, vamos tomar pé da situação, gente! E quem é esse tal de Ápis tão brabo? Um deus egípcio associado com Ptah e que personifica a Terra! Entendi nada, de novo. Como é que é? Simboliza a vida e a morte, era venerado em Mênfis! Pronto. Conversa! Pelo jeito quer matar a gente tudinho! Será? E tem muitos outros nomes! E quem és tu, cara pálida falador? George de Wells. Quem? Deixa pra lá, ouça! Num pode! Veja! E o medo virou curiosidade e, desta, expectativa: O que vai fazer aquele embirutado ali? Ouve-se um berrante, o boi se aquieta diante da presença daquele estranho: O boi sentou-se sobre o silêncio de Deus... Pronto, agora é o Touro Sentado. Chi! Silêncio. E explicou a cena: Apascentou a fera. Vixe! E era hora vagarosa, o barbatão moroso, os chifres retiniam afoiceados, o focinho estremecedor, o mugido trovejado, bulia as ventas estarrecedor, afinal refestelava com aquele que parecia domá-lo, estalando os dedos e, ambos, pareciam numa amizade antiga e tomaram apaziguada direção de sumirem por léguas. Aaaaaaahhhhhhh! Aos poucos cabeças apareciam às portas que se abriam furtivas, janelas escancaravam com esmaecidas luzes acesas, conversagens, remoques, corajosos atrasados e o converseiro tomou conta: havia quem quisesse pegar aquele que escapava de todas as emboscadas, não temia nem vaqueiro nem cavalo, mas cadê coragem? Daria um bom repasto! Heresia! Oxe! Quem não quer? Aquele porte, que lombo! Sequiosos, lambiam os beiços: o coração, fígado, os quartos, saborosos. E queriam o sebo pra temperar feijão e fazer sabão; queriam o couro vacum pra fazer surrão e carregar farinha; queriam a língua fritada pros comensais; queriam os miolos pruma panelada, os cascos pra canoa, os olhos pro botão das casacas, os chifres para colher temperar banquetes, as costelas pro cavador de cacimbas, as canelas pra mão pisar milho, a pá pra tamborete, o rabo pra bastão nas mãos das velhas, o esterco pra estrume embelezar florada, a baba pra remédio, os pelos pra amuleto, a urina pra remédios, o sangue pra cabidela, o nome pras gestas e solfas e o resto que sobrasse pras relíquias de sortilégios do beato Zé Lourenço. E depois colocar um boi Ápis de barro numa manjedoura encantada pros milagres cotidianos. Doer de bicho é graça! Desalmado, o boi também é gente, também sofre o sentimento. Os temores se dissipavam, ressabiados iam íntimos pras suas casas. Foram então surpreendidos pelos retardatários capangas do barão à caça do fabuloso boi, agora já era tarde. Zeca Biu ainda tomado pelo susto, seguia mais que impressionado, a ponto de não conseguir pregar os olhos: a imagem viva do perigo e a desgraça de quase morrer. Cochilava aos sobressaltos, com pesadelos recorrentes. Passou a noite dorminhoco, assaltado pela ameaça dum ataque, de ver o dia amanhecer e não dormir quase nada. Enfim, despertou sonolento, ainda tomado pelo susto. Abriu a porta e fez menção de ir pro quintal, cismou, bateu os pés e paralisou aterrorizado: o boi estava lá, entre os seus tantos outros bichos, maior intimidade. E agora? Até mais ver.

 

Florbela Espanca: O meu mundo não é como o dos outros, quero demais, exijo demais, há em mim uma sede de infinito, uma angústia constante que eu nem mesmo compreendo, pois estou longe de ser uma pessimista; sou antes uma exaltada, com uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que se não sente bem onde está, que tem saudades... sei lá de quê!... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

Willa Cather: Os tolos acreditam que ser sincero é fácil; só o artista, o grande artista, sabe o quão difícil é... Há coisas que se aprendem melhor na calmaria e outras na tempestade... Os mortos bem que poderiam tentar falar com os vivos, assim como os velhos com os jovens... Veja mais aqui, aqui, aqui & aqui.

Camille Claudel: Caí num abismo. Vivo num mundo tão curioso, tão estranho. Do sonho que era a minha vida, isto é o meu pesadelo... Há sempre alguma coisa que falta e que me atormenta... Não quero dizer nada porque sei que não posso protegê-lo do mal que vejo... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

A REBELDIA DE UMA FLOR

Imagem: Acervo ArtLAM.

A mulher tem duas mãos \ Agarrar com força a essência da vida \ Os tendões retorcidos são dilacerados pelo trabalho. \ Não se enfeitando com sedas brilhantes. \ A mulher tem dois pés. \ Para alcançar seus sonhos, \ Para permanecermos unidos, firmes \ Não se alimentar do trabalho alheio. \ A mulher tem olhos \ Em busca de uma nova vida. \ Para olhar para longe, através da Terra. \ Não lançar olhares amorosos em tom de flerte. \ Mulher de coração, \ Uma chama constante \ Aumentar a força, criar uma massa, \ Porque ela, ela é uma pessoa. \ A mulher tem uma vida. \ Apagar os vestígios do mal com a razão. \ Ela tem valor como pessoa livre. \ Não como servo da luxúria. \ Uma flor tem espinhos afiados. \ Não desabrochando para um admirador \ Ela floresce para criar \ A glória da terra.

Poema da premiada poeta e feminista tailandesa Čhiranan Pitpreecha (Čhiranan Prasertkul ou Phitprīchā).

 

EM BUSCA DA ETERNIDADE – [...] Fico impressionada com o fato de que o que antes parecia uma revelação devastadora e transformadora agora é apenas mais um evento infeliz em uma longa série deles. O tempo e a clareza têm o poder de suavizar as arestas. [...] Às vezes, a explicação mais simples é aquela que está bem na sua frente. [...] O amor não te enlouquece. Não é drama, caos e insegurança. Não quando é verdadeiro. O amor é ancorador, curador, a força mais estabilizadora do mundo. [...]. Trechos extraídos da obra Chasing Eternity (Entangled Publishing, LLC, 2024), da escritora estadunidense Alyson Noel, que na sua obra Ruling Destiny (Entangled Publishing, LLC 2023), ela expressou que: […] Não importa o que nos separe — oceanos, continentes ou até mesmo o próprio tempo — sempre encontraremos o caminho de volta um para o outro. [...] Ao longo da história, são os inconformistas que realmente desbravam o mundo em seu tempo. [...] Homens fracos sempre foram aterrorizados pelo poder inato das mulheres fortes — de todas as mulheres, na verdade. E mulheres que temem seu próprio poder sempre apoiaram esses mesmos homens fracos. Um ciclo vicioso. [...]. Também noutro de seus livros, o Stealing Infinity (Entangled: Teen, 2022), ela menciona que: […] A combinação inebriante de extremo conforto e luxo, aliada à monotonia da rotina, faz com que os dias se misturem tão perfeitamente que é fácil esquecer a que mundo realmente pertenço. [...]. Ela é autora de obras como Saving Zoë (2019), Dark Flame (2010), Evermore (2009), Blue Moon (2009) e Shadowland (2009). Veja mais aqui, aqui, aqui & aqui.

 

A BANALIZAÇÃO DA VIDA HUMANA - [...] por que será que se banaliza a vida humana? Por qual razão os homens optam pela violência para reivindicar o que quer que seja ao invés de optarem pela via do diálogo e consenso? O que move e/ou motiva um ser humano a tirar a vida de outro humano? Por que Deus, sendo um Deus Bondoso, Omnipotente, e com todos os atributos belos que tem, conforme os meus pais e os catequistas me ensinavam, permite ou deixa que tais atrocidades aconteçam? Por que será que um Deus Justo consente tanta injustiça sobre os inocentes? Por que será que ele, sendo um Deus Bom, fez homens bons e dobem e, de modo igual, em contrapartida, homens maus, adeptos do mal e, em função disso, impendiosos? O que impede que os homens vivam em paz e em harmonia uns com os outros? Qual será a raiz da maldade e da violência existente no interior do homem e, por conseguinte, no mundo? Se sou ensinada que Deus fez-nos (criou-nos) à sua imagem e semelhança será que, pelo facto de existirem homens bons e maus, ele também é, simultaneamente, bom e mau, bondoso e maldoso, justiceiro e vingativo? Afinal quem é esse Deus, ou que Deus é esse, tão poderoso, que admite e/ou autoriza os maus a tomarem conta dos bons, que permite que a maldade (o mal e o mau) prevaleça sobre a bondade (bem e bom) e não o contrário? Será por isso que, após a morte, existe o paraíso como recompensa para os bons e o inferno como castigo para os maus? Estas e outras questões, de forma recorrente, atravessavam o meu juízo, se quisermos pensamentos e, de certo modo, pelo facto de, intrinsecamente, constituírem uma preocupação, sobretudo pela incapacidade de, na altura, poder ter ou dar uma resposta cabal às mesmas, mais do que me interessavam, lamentavelmente, acabavam sufocando e perturbando o meu juízo. Talvez, no fundo, o que realmente me interessava era que nós, o povo moçambicano, vivêssemos em paz e harmonia. Era o fim da guerra. Era, mais do que a possibilidade, a necessidade premente de termos uma vida digna, uma vida isenta de todo o tipo de escassez. [...] Cada país subdesenvolvido/pobre assume uma função produtiva. Os subdesenvolvidos ficam responsáveis com a parte de produção sem muito valor agregado e os desenvolvidos/ricos ficam responsáveis pela marca, montagem e venda do produto e com o lucro final, que é a “maior parte do bolo”. Assim, seria oportuno notarem (os estudantes) que este panorama marcou o início das transnacionais, cuja sede é, por via de regra, estabelecida no país rico e as filiais, quase sempre, nos países pobres. O país rico somente tem o controle da economia e da indústria. É a hegemonia globalizada. [...] Trechos da entrevista Relatos de uma Filósofa: Entrevista com Rosa Mechiço (Abatirá - Revista de Ciências Humanas e Linguagens, 2021), concedida pela filósofa e professora moçambicana Rosa Mechiço.

 

INDÍGENAS & DITADURA MILITAR

O livro Indígenas e ditadura: crimes e corrupção no SPI e na FUNAI (Telha, 2024), do historiador e professor da Rede Estadual de Pernambuco, Rodrigo Lins Barbosa, é a continuidade dos estudos realizados para a dissertação de mestrado O Estado e a questão indígena: crimes e corrupção no SPI e na FUNAI (1964-1969) (UFPE,2016), na qual trata sobre a política indigenista no Serviço de Proteção aos Índios, o governo militar e a questão indígena, a violência contra indígenas e corrupção no SPI e na FUNAI, concluindo que: [...] os crimes contidos no extenso Relatório Figueiredo, que se situa em torno dos 20 anos finais do SPI, envolvendo a existência de casos de abandono e de violência contra indígenas em várias regiões do Brasil, principalmente, na Amazônia e no Centro-Oeste. Observamos que os indígenas, muitas vezes, resistiram na defesa de suas terras contra fazendeiros, seringueiros, grileiros, garimpeiros, madeireiros e à instalação de empresas seringalistas, mineradoras e madeireiras. Entre os casos, nos chama à atenção a existência de funcionários e diretores do SPI que se omitiram aos casos de violência e invasões em terras indígenas, sendo coniventes e até participantes das negociações e delitos. [...] Casos de violências contra índios ocorreram ao mesmo tempo do avanço das frentes de expansão nas regiões da Amazônia e do Centro-Oeste, observando várias formas de usurpação e exploração das terras indígenas. Algo que provocaria mudanças drásticas nos modos de vida e na cultura dos índios [...] as violências contra indígenas existiram e continuam existindo independente se o governo tem uma postura ditatorial ou democrática, porque os interesses econômicos sempre tem se sobressaído aos Direitos e garantias desses povos, que almejam viver em suas terras e manterem seus costumes. Os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade tiveram o papel de trazer para a visibilidade estas “violações de direitos humanos por agentes do Estado na repressão aos opositores”. Cabe ao Estado apurar as denúncias e investigar os casos de violências, em especial, às comunidades e indivíduos indígenas, mas não apenas a esses, bem como às pessoas mortas porque recusavam os ditames negligentes, repressivos e autoritários do Governo Militar, coadunado com os interesses das corporações agroindustriais. No Brasil, as questões econômicas sempre influenciaram a realidade dos povos indígenas, por interesses de fazendeiros, seringalistas, grileiros, empresas mineradoras, madeireiras, bem como políticos e o próprio Estado com a implantação de projetos governamentais, como a recente construção da Hidrelétrica Belo Monte que, se concluída, além de trazer danos ambientais, como a inundação das matas com o desvio do rio Xingu, e a escassez de animais nativos para a caça e a pesca das populações locais que sobrevivem da terra, mas também o desalojamento de comunidades pertencentes à terra. No momento, a Hidrelétrica Belo Monte está sendo debatida e criticada por ambientalistas, antropólogos, promotores públicos e pelos índios. [...]. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

 

&

USINA DE ARTE

Veja mais aqui.

 

ITINERARTE – COLETIVO ARTEVISTA MULTIDESBRAVADOR:

Veja mais sobre MJ Produções, Gabinete de Arte & Amigos da Biblioteca aqui.


 


YANICK LAHENS, VENEZIA MAY, SOPHIA KIANNI & FACILITA GONZAGA!

    Imagem: Acervo ArtLAM . Chegou a hora de nos adorarmos, de dizermos isso em voz alta, chegou a hora de criarmos memórias... O amor, co...