UM DIA & OUTRO, A VIDA - UMA: PRONTO PRA VIVER – Meu coração
amanheceu inchado. Apesar do sorriso, dói esse tempo triste de tantas
incertezas. Enquanto alguns tantos dormem para nunca mais nas garras da
celerada pandemia, outros vão apreensivos sem saber para onde, enquanto estúpidos
sonegam a vida evocando irresponsavelmente por uma treva totalitária. Não há o
que dizer diante disso tudo. Resta o alento da canção e Nina Simone me diz: Esse é o
mundo que vocês construíram, agora vão ter que viver nele. Guardo-a comigo
e ainda ouço a me embalar: Você tem que
aprender a levantar-se da mesa quando o amor não estiver mais sendo servido. Eu
te digo o que a liberdade significa para mim: não ter medo. E vou adiante
enquanto ela eterna e pronta pra cantar. DUAS:
NEC MORTEM EFFUGERE QUIS, QUAM, NEC AMOREM POTEST - Sim, pronto para viver!
Não poderia ser doutra maneira. Passos, dias, tudo segue uma trajetória
imprecisa pelo que foi e o que virá. Enquanto respiro, o meu coração incha de
amor, apenas. Mesmo que as cenas diárias sejam bolas para fora de campo, é
preciso viver e amar. Ou como diz Publírio Sírio: Ninguém pode fugir nem ao
amor, nem à morte. Vivo e persevero. TRÊS:
A PEITICA DE TODO DIA & O DIA TODO – Barulhada no pé do ouvido: Essa
ocupação de ler o dia todo só endoida. Escrever não é profissão, fazer arte não
é emprego certo! Esse negócio de música autoral é baboseira, não faz sucesso! Ganhou
quanto para passar o dia todo só tendo ideia? O cigarro fede, a bebida é pra irresponsável;
se sabe, não aprendeu direito, vá orar que é melhor. De que adianta estudar
tanto para não dar em nada! Ufa! Ah, quem aguenta tanta buzina no olho da insatisfação,
hem? Chatura braba, reclamações. Nem ligo. Vou de Mário Quintana: Das ilusões /
meu saco de ilusões, bem cheio tive-o. / Com ele ia subindo a ladeira da vida.
/ E, no entretanto, após cada ilusão perdida... /Que extraordinária sensação de
alívio! E o coração inchado de amor. © Luiz Alberto Machado.
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DITOS & DESDITOS: [...] XVIII
- Palomita, lembras-te que mergulhavas o meu pau na tua xícara de chocolate e
em seguida me lambias o ganso? Ahhh! tua formosa língua! Evoco todos os ruídos,
todos os tons da paisagem daquelas tardes… cigarras, os anus pretos (aves
cuculiformes da família dos cuculídeos… meu Deus!) e os cheiros… o
jasmim-manga, os limoeiros… e teus movimentos suaves, alongados, meus
movimentos frenéticos… Ahhh! Marcel, se te lembras, sentiu todo um universo com
as dele madeleines… Deve ter sugado aquela manjuba magnífica do dele motorista
com madeleines e avós e chás e tudo… Ah, irmanita, as cortinas malvas, a jarra
de prata, os crisântemos dourados, algumas pétalas sobre a mesa de mogno, tu
diluída nos meus olhos semicerrados, teu hálito de chocolate e de… “solução
fecundante” como diria aquele teu juiz. Ando me sentindo um escroto de um
escritor e quando isso começa não acaba mais. O que me faz pensar que eu talvez
os seja é toda aquela minha história-tara do dedão do pé do pai. Pulhices de
escritor. Outro dia contei ao Tom a história do dedão do pai, como se fosse a
história de outro cara, não a minha. Sabes o que me respondeu? “Se algum filho
meu tivesse a tara de me chupar o dedão eu dormiria armado.” Ciao. Petite
chegou. Apaixonou-se. Uma maçada. Continuo daqui a pouco. [...]. Trecho da
obra Cartas de um sedutor (Globo,
2001), da escritora e dramaturga Hilda
Hilst (1930-2004), que juntamente com A
obscena senhora D (Globo, 2001) e O caderno
rosa de Lori Lambi (Globo, 2001), integram a trilogia erótico-pornográfica
da autora. O volume das cartas conta o cotidiano de um homem rico, amoral e
culto, que busca a explicação para sua incompreensão da vida através do sexo. Ele
escreve e envia vinte cartas provocativas para sua casta irmã, textos que se
misturam à vida de Stamatius, um poeta que encontra no lixo os manuscritos dele.
Após a primeira leitura, percebe-se que ambos – o autor das cartas e o poeta
leitor - são a mesma pessoa em tempos e condições diversos, mas com posturas
diferentes diante dos mesmos questionamentos. Da mesma autora destaco o poema: Ama-me. Ainda é tempo. Interroga-me. / E eu
te direi que nosso tempo é agora. / Esplêndida de avidez, vasta ternura / Porque
é mais vasto o sonho que elabora / Há tanto tempo sua própria tessitura. / Ama-me.
Embora eu te pareça / Demasiado intensa. E de aspereza. / É transitória se tu
me repensas. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
EL HOYO – O POÇO
A ficção
suspense/terror El Hoyo (O poço,
2019), dirigido por Galder
Gaztelu-Urrutia, tem como cenário um grande Centro Vertical de Autogestão, em
estilo de torre, onde os moradores, que são trocados periodicamente
aleatoriamente entre seus muitos andares, são alimentados por uma plataforma,
inicialmente cheia de comida, que desce gradualmente pelos níveis . É um sistema destinado a causar conflito, pois
os residentes nos níveis mais altos podem comer o máximo que podem, deixando
cada vez menos para os que estão abaixo. Todo mês, as pessoas são
aleatoriamente transferidas para um novo nível. Cada residente pode trazer um
item, um deles, o protagonista, escolheu uma cópia de Dom Quixote e um outro
uma faca auto-afiável chamada Samurai Plus. O filme estreou e ganhou o People's Choice Award no Festival Internacional de Cinema de Toronto de 2019. As
críticas classificaram o filme como um thriller distópico inventivo e cativante.
Veja mais aqui.
A ESCULTURA DE AUGUSTA SAVAGE
Ouço tantas reclamações no sentido de que os negros não
aproveitam as oportunidades educacionais oferecidas. Bem,
uma das razões pelas quais mais da minha raça não se dedica ao ensino superior
é que, assim que um de nós coloca a cabeça acima da multidão, existem milhões
de pés prontos para esmagá-la novamente àquele nível morto do lugar-comum,
criando um prazo racial da cultura em nossa República. Pois como devo competir com outros artistas americanos se não tiver a
mesma oportunidade?
AUGUSTA SAVAGE - A arte da escultora e professora estadunidense
Augusta Savage (1892-1962), que
instruiu uma geração de artistas de reputação internacional e foi grande
ativista pelos direitos civis dos negros. Veja mais aqui.
PERNAMBUCULTURARTES
Não vi ciscar a terra o pintainho, / nem vi no
lago espreguiçar-se a lua. / Não vi num ramo balouçar-se o ninho, / nem no
dorso do mar vi a falua. / Não vi, em frente, o rumo ao meu caminho... / Vi
ruidosa e deserta cada rua... / Meu ser em toda a parte vi sozinho... / Não vi
o mato verde, a pedra nua... / Mas se não vi a graça de uma flor, / Nem
plumagem de pássaro cantor, / Bendigo o que não vi, para bem meu... / Não vi o
olhar de quem renega... / E a dor de minha mãe ao ver-me cega... / E o rosto de
meu pai, quando morreu...
Bendita cegueira, soneto da escritora e educadora Benedicta de Mello (1906-1991), que era
cega de nascença e fundou instituições sociais para cegos, tendo publicado diversos
livros de poemas.
A obra do
médico, professor catedrático, pensador, ativista político e embaixador do
Brasil na ONU, Josué de Castro (1908-1973) aqui, aqui, aqui & aqui.
A música
do o
saudoso arranjador, maestro, compositor e multi-instrumentista Moacir Santos (1926-2006) aqui
& aqui.
A poesia de Lelé Correia aqui.
O cordel
de Manoel Monteiro aqui.
Cantador
aqui.