A SOLIDÃO DE
JOANA - Aquela angelical moça oriental se chamava Giliberta. Encantado por
sua beleza ela me revelou seus segredos: que veio de Constantinopla com o
anseio de passar por homem para escapar das interdições impostas: queria
estudar. E isso era proibido às mulheres. Durante os estudos me dissera que era
filha de ingleses de Mongúcia. Apaixonou-se por um monge que a levou para a
Grécia. Vi-a estudar diuturnamente até que deixou-se levar como escravo para
Atenas e lá se passou por rapaz inteligente, altivo. Chegou em Roma para
aperfeiçoar seus conhecimentos, chamando a atenção por sua radiante
inteligência de pessoa estudada. Havia adotado o nome de Johannes Angelicus, ingressando
no mosteiro de São Martinho. Tornou-se um monge surpreendendo os doutores com
sua sabedoria. Seu brilhantismo deu-lhe ascensão ao secretariado curial. Por
seus méritos foi purpurada entre os cardeais. Nas calendas de agosto ela subiu a
Santa Sé e reinou por dois anos, cinco meses e quatro dia. Tomou-me por oficial
da Guarda Suíça e pude privar dos seus secretos encantos. Mas, foi durante o desfile
da procissão de São Pedro para o Lateram, ela estava grávida e, ao cair da
montaria, seu cavalo trouxe a revelação. Depois disso sua história foi apagada
declarando-se vacância por todo o período. Foi excluída, abominada. Camuflaram
sua identidade como se fora um eunuco, tratada por um monstro venerado por ateus
e heréticos. Houve quem cultivasse seu busto talhado na Catedral de Siena, com
o seu nome trocado por Zacarias. Houve quem erguesse uma estátua segurando uma
criança ao colo: Parce Pater Patrum, Papissae Proditum Partum, no mesmo
local de sua queda fatídica. Foi defendida no Concílio de Constança. Tornou-se
desde então a crença de excomungados e heterodoxos, até a segunda lâmina dos
arcanos: a sabedoria, o conhecimento, a intuição e a chave dos grandes
mistérios. Veja mais abaixo e mais aqui, aqui e aqui.
DITOS &
DESDITOS – Estranho, o funcionamento do coração. Alguém poderia continuar
por anos, habituado à perda, reconciliado com ela, e então, em um momento de
pensamento descuidado, a dor ressurgia, aguda e crua como uma ferida fresca... O
que é a vida? A alegria dos abençoados, a tristeza dos tristes e uma busca pela
morte. E o que é a morte? Um acontecimento inevitável, uma peregrinação
incerta, as lágrimas dos vivos, o ladrão do homem... Pensamento da
escritora estadunidense Donna Woolfolk Cross, autora do livro Pope
Joan (Crown, 2009), no qual ela expressa: [...] Quanto à vontade, a mulher deveria ser considerada superior ao homem, pois
Eva comeu da maçã por amor ao conhecimento e ao aprendizado, mas Adão comeu
apenas porque ela lhe pediu. [...] Sempre havia um
jeito, quando se sabia o que se queria. [...] Mas ela sabia, melhor do
que ninguém, quais demônios ele havia enfrentado, ela sabia o quanto ele havia
lutado para se libertar deles. O fato de ele ter perdido a luta no final não
tornou a luta menos honrosa [...] A alegria dos bem-aventurados, a
tristeza dos tristes e a busca pela morte. E o que é a morte? Um acontecimento
inevitável, uma peregrinação incerta, as lágrimas dos vivos, o ladrão do homem.
O botão de uma rosa cresce na escuridão. [...]. Veja mais aqui.
ALGUÉM FALOU: As estrelas não estão nos filmando para ninguém... O que
você fará agora com o presente da sua vida restante?... Você me tem como um
desenho, apagado, colorido, sem título, assinado pela sua língua... Gosto de
usar palavras simples, mas de uma forma complicada. Os poetas escrevem sobre
sentimentos e tentam encontrar a linguagem e as imagens para sentimentos
intensos. Para mim, poesia é a música do ser humano. E também uma máquina do
tempo pela qual podemos viajar para quem somos e para quem nos tornaremos. Você
pode encontrar poesia na sua vida cotidiana, na sua memória, no que as pessoas
dizem no ônibus, nas notícias ou simplesmente no que está no seu coração. Pensamento da poeta, professora e dramaturga britânica Carol Ann Duffy, autora do
poema Pope Joan: Depois que eu aprendi transubstanciar \ pão sem fermento\ na
hóstia sagrada\ e balançou o incenso em chamas\ até que cobras verde-azuladas
de fumaça\ se enrolaram na bainha do meu manto\ e balançou através daquelas
multidões fervorosas\ no alto de uma cadeira papal \ abençoando e abençoando o
ar\ mais perto do céu\ do que cardeais, arcebispos, bispos, padres\ sendo
Vigário de Roma \ tendo feito do Vaticano minha casa\ como o melhor dos homens \
in nomine patris et filii et spiritus sancti amen, \ mas duas vezes mais
virtuoso que eles\ Cheguei à conclusão\ de que não acreditava em uma palavra\ então
eu digo a vocês agora\ filhas ou noivas do Senhor\ que o mais perto que me
senti \ ao poder de Deus\ era a sensação de uma mão\ me levantando, me jogando
para baixo\ me levantando, me jogando para baixo\ enquanto meu bebê saía\ de
entre minhas pernas\ onde eu estava deitado na estrada\ em meu milagre\ não um
homem ou um papa de forma alguma.