OS PECADOS DA
MARICICA DE TANACU... – Aquela jovem bela nasceu em Perieni e, ainda muito jovem na Romênia, teve sua
vida revolvida pela tragédia: o pai se suicidara e a família desfeita. Ela foi prum orfanato
em Arad. Ao adolescer começou a trabalhar de babá na Alemanha e, depois, para uma outra família de Banat. Uma
amiga do orfanato tornou-se freira e ela foi visita-la, ocasião em que foi
encorajada a seguir o mesmo caminho. Ponderou: a falta de trabalho e as
dificuldades materiais levavam os jovens à vocação religiosa. Ela precisava de
ajuda espiritual, afora comida e abrigo. Tornou-se então freira, o claustro em Tanacu - uma comunidade isolada de cerca de mil pessoas
em uma área montanhosa cultivada com vinhedos e milho. De repente os sussurros
começaram na sua mente acusando-a de pecadora. O seu estado mental se
deteriorou durante uma missa. Foi encaminhada a um hospital psiquiátrico, recebendo
tratamento de esquizofrênica por duas semanas, sendo liberada para os cuidados do
mosteiro. O irmão a condenava por sofrer de possessão demoníaca, dizendo,
inclusive, que viu o diabo entrar nela. Noutro dia ela insultou a
igreja durante uma missa e foi amordaçada sob a alegação de que seria salva
daquele temperamento incomum por meio de orações, a medicina não poderia
curá-la: Os demônios não
podem ser curados com pílulas. Se tratava do diabo e não de um distúrbio
psíquico... Ela teve uma recaída
e, na comemoração da Ascensão de Jesus, foi acorrentada e levada para o centro
da igreja para ser ungida, porque diziam: Ela poderia ter se matado ou
matado outra pessoa... Sua testa e pulso ungidos com óleo sagrado e mantida
ali por três dias, molhavam seus lábios com água benta, sob orações para
expulsar o diabo. Depois levada para o seu quarto e desamarrada, tida por
curada. Qual não, para quem foi sequestrada pelo padre para o monastério Santa
Trinidad e com a ajuda de quatro freiras, amarraram suas mãos e pernas, taparam
sua boca e foi mantida refém e torturada, completamente imobilizada, acorrentada
em uma cruz de madeira. Ela não aguentou os requintes de crueldade e desmaiou, sofreu
um infarto: brutalmente morta ao ser exorcizada. Diziam que ela estava possuída
por espíritos demoníacos: demonstrava constantemente comportamentos violentos,
rejeitando água benta e espumando pela boca. Tudo em nome da Ordem da Santíssima
Trindade em um quarto úmido do
convento por três dias sem comida. Diagnóstico: morte causada por insuficiência
aguda cardiorrespiratória e asfixia mecânica, com traumas físicos e
desidratação. Ela sofria de esquizofrenia e com uma letal overdose de
adrenalina durante o socorro na ambulância: um duplo assassinato. As marcas das
correntes em seus pulsos e tornozelos. O padre ouvira trovões no seu sadismo e
dissera: A vontade
de Deus foi feita... Foram seis dias
sem comida nem água, até que aos vinte três anos de idade, sucumbia de vez Maricica Irina Cornici (1982-2005). Veja mais abaixo e mais aqui
e aqui.
DITOS & DESDITOS - Sempre fico impressionada com o poder da mente humana de reter todos os
tipos de detalhes, enquanto situações e eventos que selam nosso destino são
completamente esquecidos... O melhor sabor da comida da vida é, sem dúvida, o humor... Pensamento da escritora romena Tatiana Niculescu
(Tatiana Niculescu Bran), autora da obra Deadly Confession - Spovedanie
la Tanacu (Humanitas, 2006), contando a tragédia da jovem Maricica Irina
Cornici, levado para o cinema sob o premiado título Beyond the hills
(2012), dirigido por Cristian Mungiu. Ela também é autora do romance As noites
do patriarca (2011) e Na terra de Deus (2012), este último uma história
africana sobre o ritual de mutilação genital de meninas.
ALGUÉM FALOU: Neuróticos constroem castelos no ar, psicóticos vivem neles. Minha mãe os
limpa... Algumas pessoas acham que ter seios grandes torna
uma mulher estúpida. Na verdade, é
bem o oposto: uma mulher com seios grandes torna os homens estúpidos... Pensamento da comediantescritora estadunidense Rita Rudner.
Veja mais aqui e aqui.
FALE COMIGO:
OUVINDO NAS ENTRELINHAS - [...] Acho que podemos
aprender muito sobre uma pessoa no exato momento em que a linguagem falha com
ela. No exato
momento em que ela tem que ser mais criativa do que imaginaria para se
comunicar. É o exato
momento em que ela tem que cavar mais fundo do que a superfície para encontrar
palavras e, ao mesmo tempo, é um momento em que ela quer muito se comunicar. Ela está
cavando fundo e projetando ao mesmo tempo.
[...].
Trecho extraído da obra Talk to Me: Listening Between the Lines (Random
House. 2000), da dramaturga e atriz estadunidense Anna Deavere Smith,
que na obra Letters to a Young Artist:
Straight-up Advice on Making a Life in the Arts-For Actors, Performers,
Writers, and Artists of Every Kind (Vintage, 2006), expressou que: […] Nós que
estamos nas artes corremos o risco de estar em um concurso de popularidade em
vez de uma profissão. Se esse fato lhe causa desespero... escolha outra
profissão. Seu desejo de se comunicar deve ser maior do que seu relacionamento
com as realidades caóticas e injustas... Temos que criar nossos próprios
padrões de disciplina […] Comprometa-se a
encontrar a verdadeira natureza da arte. Vá atrás
daquela coisa que ninguém pode lhe ensinar. Vá atrás
daquela comunhão, daquela comunhão real com sua alma, e da disciplina de
expressar aquela comunhão com os outros. Isso não vem
da competição. Isso vem de
ser um com o que você está fazendo [...] Até o ciúme é baseado em fantasias: a fantasia de que outra pessoa
tem o que lhe pertence. [...] Meu trabalho não é
adquirir poder; é questionar o
poder. [...]. Veja mais
aqui e aqui.
DOIS POEMAS - A BALADA DE BONNIE PARKER - Não, \ o que
você vê não é nem mesmo a sombra do meu lado selvagem \ Eu poderia ter sido
Bonnie Parker \ com essa vontade de espiar pela janela \ para fugir
constantemente, \ assistir o passado se destruir \ como as cidades noturnas
fazem \ quando o espelho retrovisor treme\ Eu também sonhei com uma vida
perigosa \ colecionando histórias \ Sonhei com as vezes que escapei da morte \ mostrando
as cicatrizes que os \ dias deixaram para trás\ Eu a vejo e me vejo \ com minha
altura média \ Eu me vejo escrevendo poemas ruins \ com saudades da minha mãe \
Eu me vejo saindo dos caminhos perigosos \ mirando o futuro na cabeça \ sempre
sorrindo\ Eu poderia ter sido Bonnie Parker \ se não fosse porque eu me agarro \
às costas daqueles \ que nunca \ andarão ao meu lado nas estradas\ A vida ainda
está lá fora \ e eu não a alcanço\ O que você vê aqui \ ainda não são
cicatrizes\ Dê-me um tempo \ e eu lhe contarei sobre como sobreviver \ sem que
minhas palavras se desintegrem. II - Minha mãe às vezes passa as tardes \ relembrando,
assistindo a fitas antigas \ que ainda funcionam em um aparelho \ que treme e
reclama como um velho \ antes de passar uma história de faz de conta.\ Aquela
menina \ que para momentaneamente \ diante das cenas vertiginosas \ que minha
mãe diz que sou eu \ ou pelo menos aquela que queriam que eu fosse \ cabelos
longos presos por duas tranças \ testa larga \rosto pequeno e limpo/ corado e
sardento \ os mesmos olhos \ fixos numa grande pinhata \ que prometia/ como a
vida promete \ algo que achávamos colorido e doce \ Um menino \ que eu não
consigo ver \ porque seus olhos estão cobertos \ balança primeiro \ e a piñata
balança\ outro balanço \ ele rasga\ mais um \ e transborda\ Eu teria corrido
como os outros \ se não fosse pela mão do meu pai \ e sua voz severa\ me
dizendo\ Não você\ você é uma menina grande agora \ ele abaixa a câmera \ e
nesse movimento minha confusão desaparece \ como a confusão dele vinte anos
depois \ quando ainda temos dificuldade \ em concordar. Poemas da escritora, editora e jornalista
guatemalteca Vania Vargas, autora de obras tais
como Cuentos
infantiles (Catafixia, 2010), Quizá
ese día tampoco sea hoy (Cultura 2010), Los habitantes del aire (Cultura 2014) e Señas particulares y cicatrices
(Catafixia, 2015).
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