A FRANCESA TANTAS
MULHERES... – Aquela filha de uma
bailarina inglesa e de um barman francês detestava a rotina e
estereótipos, uma múltipla mulher: de carne e osso, emoções e profundidade. Passou
pela Comédie-Française e pelo Teatro Nacional Popular (TNP) e foi pras telas
com beleza personalíssima, de nenhuma perfeição nem hipersensualidade: a medida
humana exata – inteligente, sensível, complexa, intuitiva. Foi Florence Carala
no Ascenseur pour l'échafaud, foi Jeanne Tournier no Les amants,
foi Anne Desbarèdes no Moderato cantábile - baseado no romance homônimo de
Marguerite Duras e o prêmio de Cannes. Foi mais: Lidia no La notte, Catherine
no Jules et Jim e cantando Le Tourbillon de la vie. Foi a
interesseira e sedutora Eva Olivier nas cenas de Losey, foi a criada astuciosa Céléstine
no Le journal d'une femme de chambre, foi a escolhida pelo mercador, Virginie
Ducrot, no The Immortal Story (1968), baseado no conto de Karen Blixen. Foi a
sedutora assassina Julie Kohler no La mariée était en noir, foi Maria no
Le
jardin qui basculhe, foi a Joana Francesa de Cacá, foi Amande, instrutora de Nikita (1990): As pessoas – e as
mulheres em especial – preocupam-se demais com o envelhecimento. Mas nós
parecemos mais novos se não nos preocuparmos com ele. Porque para lá da beleza,
do sexo, da titilação, da superfície, há um ser humano. E é isso que tem que
emergir... Afora ter sido a escritora Marguerite
Duras no Cet amour-là e quantas mais foi, afora ter dirigido o semibiográfico
drama Lumière. Muitas e ela: Viva a grande atriz e
cantora Jeanne Moreau (1928-2017). Veja mais abaixo e mais aqui e aqui.
DITOS &
DESDITOS - A expressão de
nossa sexualidade deve ser guiada por princípios de consenso, respeito e
cuidado mútuo. Nenhuma mulher pode se considerar livre
se não controlar seu próprio corpo. Nenhuma mulher pode se considerar livre até
que possa escolher conscientemente se quer ou não ser mãe. Um ato sexual mútuo
e satisfeito é de grande benefício para a mulher média, o magnetismo disso é
doador de saúde. Quando não é desejado por parte da mulher e ela não tem resposta, não deve
acontecer. Este é um ato de prostituição e é degradante para a sensibilidade mais fina
da mulher, apesar de todas as certidões de casamento na terra em contrário... Pensamento da sexóloga, enfermeira, escritora e ativista estadunidense Margaret Sanger (Margaret
Higgins Sanger ou Margaret Louise Higgins – 1879-1966), que no livro Woman and the
New Race (Cosimo
Classics, 2005), expressou que: […] A mulher deve
ter sua liberdade, a liberdade fundamental de escolher se será ou não mãe e
quantos filhos terá. Independentemente da atitude do homem, esse problema é dela — e antes que
possa ser dele, é somente dela. Ela atravessa o vale da morte sozinha, cada vez que um bebê nasce. Assim como não é direito nem do homem nem
do estado coagi-la a essa provação, também é direito dela decidir se ela irá
suportá-la. [...]. Em 1914, ela foi processada pelos Estados
Unidos, sob às leis do Ato Federal Comstock, de 1873. As leis do Ato Comstock
proibiam a circulação, venda e produção de toda literatura com qualquer tipo de
conteúdo sexual, erótico ou informações e ativismo sobre controle de
natalidade, seja sobre contraceptivos ou aborto. Com medo do que poderia
acontecer, Sanger se refugiou nos países britânicos até que fosse seguro
retornar aos Estados Unidos. Por sua ligação à organização Federação de
Paternidade Planejada da América, ela foi, e ainda é, alvo frequente dos
críticos do aborto. Entretanto, o Planned Parenthood Federation of America
passou a realizar abortos apenas em 1970, quatro anos após sua morte. A ONG,
fundada em 1916, funciona até hoje, e é responsável por metade dos abortos
legais nos Estados Unidos, além de globalmente oferecer serviços como educação
sexual e controle de natalidade, inclusive no Brasil. O trabalho de Sanger com
comunidades carentes também foi louvado por Martin Luther King, em seu discurso
de aceitação do prêmio Margaret Sanger Award, em 1966.
ALGUÉM FALOU: A sexualidade é uma fonte de alegria,
prazer e conexão, e não apenas de procriação. Não se pode decretar que as
mulheres sejam sexualmente livres quando não são economicamente livres. Temos
direito aos nossos próprios corpos. Onde há amor duradouro, há família. Pensamento da sexóloga e
feminista teuto-americana Shere Hite (1942-2020). Veja mais aqui e aqui.
NAÇÃO PROZAC - [...] Essa é a questão sobre a depressão: um ser humano pode sobreviver a quase
tudo, desde que veja o fim à vista. Mas a depressão é tão insidiosa, e se agrava diariamente, que é impossível
ver o fim. [...] Alguns amigos não entendem
isso. Eles não
entendem o quão desesperada eu estou para que alguém diga, eu te amo e te apoio
do jeito que você é porque você é maravilhosa do jeito que você é. Eles não entendem que eu não consigo me
lembrar de ninguém me dizendo isso. Eu sou tão exigente e difícil para meus amigos porque eu quero desmoronar e
desmoronar diante deles para que eles me amem mesmo que eu não seja divertida,
deitada na cama, chorando o tempo todo, sem me mover. A depressão é sobre Se você me amasse,
você faria. [...] É tudo o que eu quero na vida:
que essa dor pareça ter um propósito. [...] Eu sou a garota que está
perdida no espaço, a garota que está sempre desaparecendo, sempre desaparecendo
e recuando cada vez mais para o fundo. Assim como o gato de Cheshire, um dia eu irei embora de repente, mas o
calor artificial do meu sorriso, aquela curva falsa e palhaça, do tipo que você
vê em pessoas miseravelmente tristes e vilões em filmes da Disney, permanecerá
para trás como um resquício irônico. Eu sou a garota que você vê na fotografia de alguma festa em algum lugar ou
algum piquenique no parque, aquela que de fato logo irá embora. Quando você olhar para a foto novamente,
quero lhe garantir, eu não estarei mais lá. Eu serei apagada da história, como uma traidora na União Soviética. Porque a cada dia que passa, eu me sinto
me tornando mais e mais invisível. [...].
Trechos extraídos da obra Prozac Nation (Riverhead, 2002), da escritora e jornalista
estadunidense Elizabeth Wurtzel (1967-2020).
Veja mais aqui.
DOIS POEMAS - COISAS DE
MULHER - A primeira vez
\ o sangue, \ como uma filha, \ caminhou pela vida \ com a sua verdade, \ e foi
sempre \ até o fim \ anunciando \ a fertilidade \ e todos os seus tempos. GOLPE - Entendo o ar \ quando o empurro, \ da minha
boca levo \ até a concha do seu ouvido \ e ele fica estagnado como o mar \ para
ser ouvido. Poemas da escritora
e advogada panamenha Eyra Harbar, autora dos livros Burnt Paradise (Panamá, 2014), Mirrors (INAC,
2003), Where the Beetle Dwells (UTP, 2002), entre outros.
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