A ESCURIDÃO DE HÄNDEL - Sempre me
vi só, um sonhador, apesar dos pesares: desajeitado e feio, o tamanho da minha
arte, quem me dera. Contrariei os desejos de meu velho pai que me queria estudante
das leis ou barbeiro de prol – desde criança, a minha arte era uma flor a céu
aberto, todavia um negócio improfícuo e vivia sob a ameaça de me cortar os
dedos caso teimasse. Não fosse o duque de Weissenfels e eu preferi ser suposto
célebre saxão ou o diabo, morrer de fome na sarjeta, como diziam. Minha mãe era
filha de um pastor protestante, tinha o coração jovem, o meu incentivo para
trabalhar árdua e constantemente no poço inexaurível que jorrava de dentro de
mim. Tive que ir para a terra da eterna primavera, seguindo os passos do guia
espiritual e artístico Steffani. O que vivi, foi da estreia de Almira, depois Nero ou o amor através do sangue e do assassino, Rodrigo, Agrippina, o oratório La
Resurrezione, o que me fazia um italiano e futuro inglês. Ah, fui embalado
com a vitoriosa Rinaldo, Tamerlano, Radamisto, Rodelinda, oratório
Esther e hinos de Chandos. Era eu tratado como o legendário
ciclope Briareu – o Egeão entre os hecatônquiros, centímano gigante dos cem
braços e cinquenta cabeças da Titanomaquia. Eu tinha um novo estilo, provei com
os oratórios Ester, Débora, O triunfo da verdade. Se eu era bom no que fazia, péssimo com os
negócios. Tive que encarar a situação entre ter o instrumento e a filha de
Buxtehude, ou nada. Nunca me interessaram honrarias nem dinheiro. Mas vieram as
injúrias, o público escasso, a acusação de imoralidade, intrigas políticas, as
disputas, meus bens foram sequestrados, a falência e ameaças de prisão, desventuras.
Roubaram-me tudo, se apoderaram de tudo que era meu sem pedir licença nem
cartão de agradecimento. Ah, lá estava eu na minha estranha melancolia diante do
fracasso. Um relâmpago nas trevas da noite e o oratório O Messias – quantas aleluias! Sei, sempre sentimental, da placidez
à explosão emocional. Muito emotivo; calmo ou tortuoso, generoso ou implacável,
dual por essência. A minha sensibilidade sempre superou as asperezas da
realidade, também me dei por terno ao longo da minha vida e me doei às turbulências
com disposição para o acolhimento, embora exigisse de mim o tempo inteiro autocrontrole
para tudo. Sei, sempre trabalhei muito, discreto, apesar do vigor e
tenacidade, achegado a um vinho e compulsivo aos prazeres da boa mesa, isso
para quem já foi de bela compleição, envelhecer obeso, caricaturado pelas
sátiras afiadas dos maldosos. O que mais me irritava era a ignorância – eu
deveria mesmo era me desculpar por apenas diverti-los, quando eu desejava
melhorá-los. Da minha parte, sempre
perdoei, não guardei rancores nem sou lá muito religioso. Cantoras que me
fascinaram se foram com as mulheres com o interdito familiar de jamais
contraírem núpcias com músicos, quando não, elas queriam que eu me divorciasse
da arte, que coisa! Era a minha irremediável solidão e apreciava a arte
pictórica, belíssimas gravuras, reservado, quem lá entenderia meu coração. Para
Newton eu era o virtuoso das teclas e sei,
se eu estava no meu corpo ou fora dele, não sei.
Deus sabe! Era o embalo dos três atos de Alcina - Gli evenimenti di Ruggiero, e a vida nublava
até ser a luz completamente aniquilada na minha profunda tristeza. Quantas dificuldades
para o oratório de Jephta. Eu via o
céu diante de mim, lá estava Deus na minha solidão. Era, então, sexta-feira,
a vida ia e voei. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais abaixo e aqui.
DITOS & DESDITOS: Nós merecemos a morte, / porque somos humanos
e a guerra é feita pelas nossas mãos, / pela nossa cabeça embrulhada em séculos
de sombra, / por nosso sangue estranho e instável, pelas ordens / que trazemos
por dentro, e ficam sem explicação. / Criamos o fogo, a velocidade, a nova
alquimia, / os cálculos do gesto, / embora sabendo que somos irmãos. / Temos
até os átomos por cúmplices, e que pecados / de ciência, pelo mar, pelas
nuvens, nos astros! / Que delírio sem Deus, nossa imaginação! / E aqui
morreste! Oh, tua morte é a minha, que, enganada, / recebes. Não te queixas.
Não pensas. Não sabes. Indigno, / ver parar, pelo meu, teu inofensivo coração.
/ Animal encantado - melhor que nós todos! / - que tinhas tu com este mundo / dos
homens? / Aprendias a vida, plácida e pura, e entrelaçada / em carne e sonho,
que os teus olhos decifravam... / Rei das planícies verdes, com rios trêmulos
de relinchos... / Como vieste morrer por um que mata seus irmãos! Poema Lamento do Oficial Por Seu Cavalo Morto,
extraído da obra Mar absoluto e outros
poemas (1945), da escritora, pintora,
professora e jornalista Cecília Meireles (1901-1964). Veja mais aqui,
aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
TEATRO
DE CAMUS
Compreendi que
não bastava denunciar a injustiça. Era preciso dar a vida para a combater.
Agora, sou feliz.
ALBERT CAMUS – A obra teatral do
escritor, dramaturgo e filósofo francês Albert
Camus (1913-1960) é destacada a partir da peça em 5 atos Les
justes (Os justos
– Galimard, 2008), que se passa no cenário czarista russo de 1905,
quando um grupo de anarquistas revolucionários planejam o assassinato de
grão-duque, discutindo a existência de amor e de limites
na ação e o ideal de justiça defendido. Em seguida, a peça teatral Estado de sítio (1948), que se passa em uma pequena cidade litorânea, assolada pela peste e dominada
pelo medo que era o mal do século XX, uma alegoria da ocupação, da ditadura e
do totalitarismo. Já a peça em 3 atos, Le Malentendu (O
malentendido, 1944), dramatiza
uma trama familiar com a revolta do homem contra o absurdo imerso na existência
e a falta de sentido na vida, tratando sobre o exílio e o reconhecimento do
outro, a defesa do amor como a única forma de impedir que todos se percam no
ódio contra a própria existência. A peça em 4 atos, Calígula (1941 – Galaxia, 2009), conta a história sobre a perversão
moral de Calígula (12 d.C.-41 d.C.), o terceiro imperador romano e um dos doze
césares, contando após a morte de sua irmã, com quem supostamente mantinha uma
relação incestuosa, apresenta sua faceta cruel, excêntrica e desajustada,
agindo de maneira absurda e desleal, cometendo assassinato de seus próximos e
de parentes de seus próximos, motivando a revolta destes. Por fim, a adaptação
dele para o romance de Dostoiévski, Les possédés (Os possessos, 1959), tratando sobre o pessimismo.
Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
A ARTE DE RITA LINO
Sou o que você quer ver, mostro o que não sou.
RITA LINO – A arte da fotógrafa e artista portuguesa Rita Lino, que estudou Design de Multimídia
da Universidade da Beira do Interior, pós-graduada em fotografia pela Elisava,
de Barcelona, na Espanha. Ela já realizou várias exposições individuais e
coletivas, tendo o nu como provocação e exteriorização do ego, assumindo
diferentes personagens. Ela atua também com vídeos e já publicou a série Protect me. Veja mais aqui.
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A OBRA DE HÄNDEL
A obra do compositor alemão Georg Friedrich
Händel (1685-1759) que possui uma diversidade de publicações
com desencontrados dados biográficos, merecendo destaque o espetáculo Haendel Gala, com texto escrito pelo
britânico Richard Armbruster, contando a vida do compositor, mesclando música e
elementos teatrais. Também merece destaque o álbum Amor
Oriental ~ Händel alla turca (Deutsche
Harmonia Mundi, 2011), com suas composições na interpretação de Juanita
Lascarro, Ahmet Özhan e Florin Cesar Ouatu, com a orquestra Pera Ensemble –
Ensemble l’arte del mondo, regida por Werner Ehrhardt. Veja mais aqui e aqui.