HÉLÈNE, A VIDA DE VOLTA – Foi o que fiz depois, as noites se tornaram maiores
que os dias de quase não ter fim, a escuridão imensa de olhos cansados a fio e nada
mais às voltas e já nem sabia das horas arrastadas, martelo no gongo em eco, e
passavam com tudo na mesma. Os dias se iam, a tarde, a noite e a madrugada
longa, imorredoura, e assim a semana, o mês, o semestre e o ano acabava e nunca
amanhecia. O que fiz nem sabia, já quase não suportava mais, não havia como
sobreviver à solidão de Isabella que se foi com a agourenta peste de mais de três
anos e nem sei se mais, calendário de um só dia em outros do mesmo e o que
seria de mim no meio desse sorvedouro imperecível, inalterável. Não havia o
palpável, uma distância imensa ao redor, nem sei se vivo de tão invisível,
paisagem comum de tão insensível saudação. Já nem era mais esperança no que
havia perdido e sucumbia aos estalos intermitentes e tardios de uma surpresa
adiada. Não restava mais nada, não emergisse imprevista aquela pele de
porcelana branca de caçula e daquela família quase irreconhecível de um rico mercador antuérpio,
jovem diva loura, irmã de uma concunhada, de uma hora para outra,
encantadoramente bela fonte inspiradora de um sonho real e eu fizesse o que deveria
ser feito na hora exata. Sim, ali o momento e seus olhos claros, seu jeito
inocente e divertida criatura, o sorriso encantador no brilho da vitalidade. Já
me via outro e esquecia tudo que vivi e passou. Disso fiz e refiz, ah, e como
fiz, a jovem bela para as ideias do
Het Steen, o
sonho projetado de The Rainbow Landscape.
Deveras, ela a minha Helena de Tróia no Garden
of love, a deusa do julgamento de Paris, a musa dos meus
rabiscos com esboços das suas poses de todas os gestos. Eu renascia no brilho
rosado de suas faces, na sua boca carnuda que me tinha como se fosse revivido saborosa
refeição; nos seus seios fartos a me darem o que faltava nas horas mais
deprimentes; nos seus quadris dançantes de todos os passos e ritmos estonteantes;
nas suas pernas inquietas e andejas das mais loucas travessuras de se dar e
receber. Era a Vênus Pudica nua com uma das mãos escondendo
o colo, e a outra ao braço que se delineava pela região pélvica apetitosa a me
chamar mais para perto e a convidar para o que fosse das mil e uma e outras de
jamais vivido; uma deusa fulgurante que desceu do panteão para premiar todos os
meus desejos, uma graça livre das outras para me fazer grato a tudo, uma ninfa
desgarrada a me dispor do que nunca tive, personificando a minha heroína
salvadora, a minha rainha de todas minhas reverências e decisões. Era ela,
aquela que foi criada para ser retratada em todos os meus versos de cores e
luzes em closes majestosos, nua e real no privado Het Pelsken que não se vende nem se exibe. Meus olhos são para ela
que vem com sua beleza jovem de coração e corpo, antecipando a cariátide
para minha salvação, à espera da carruagem, seminua de todos os trajes – até no
sonho do casamento, o ridículo para detratores! E renasci com seus beijos viciantes,
suas mãos inquietas de carinho, seus braços aconchegantes de pomares, suas
pernas acolhedoras de remanso, seu sexo vitalizado imantando meus sentidos,
arte e vida. Nela pude pela derradeira vez amar, trazendo a vida de volta para
quem morreu anteontem e eu pude viver para o tributo eternizado. © Luiz
Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.
DITOS & DESDITOS: Sou apenas um homem simples, sozinho, com seus velhos
pincéis, pedindo a Deus uma inspiração. Eu ainda não estava inclinado a viver a
vida de um celibatário. Tomei uma jovem esposa de família honesta, mas de
classe média, embora todos tentassem me convencer a fazer um casamento na
corte. Mas eu temia o orgulho, aquele vício inerente à nobreza, particularmente
naquele sexo, e foi por isso que escolhi alguém que não coraria ao me ver pegar
meus pincéis na mão. E para dizer a verdade, teria sido difícil para mim trocar
o precioso tesouro da liberdade pelos abraços de uma velha. Agora, pela graça
de Deus... Estou levando uma vida tranquila com minha esposa e filhos e não
tenho pretensões no mundo a não ser viver em paz. Pensamento do
pintor flamengo Peter Paul Rubens (1577-1640),
que se casou pela primeira vez com a Isabella Brandt (1591-1626), que morreu
vitimada pela peste. Três anos depois, conheceu Hélène Fourment
(1614-1673), que foi retratada em muito seus quadros e modelada para outras
pinturas religiosas e mitológicas. Veja mais aqui e aqui.
HUMBERTO
MAURO, O PATRONO DO CINEMA BRASILEIRO
O cinema é cachoeira.
HUMBERTO MAURO - Já tendo
sido destacado aqui anteriormente, hoje novamente, o Patrono do Cinema
Brasileiro, o cineasta Humberto Mauro
(1897-1983), merece ser mais uma vez homenageado, desta feita pelo filme O descobrimento do Brasil (1936), com
trilha sonora de Heitor Vila-Lobos, recuperado pela Cinemateca Brasileira, com
uma narrativa extraída da Carta de Pero Vez de Caminha, contando a chegada da
frota portuguesa às costas brasileiras, em 1500. Em segundo, o romance O canto da saudade (1952), com música de
Vila-Lobos e que conta a história da filha do coronel Januário, Maria Fausta e
o seu romance secreto com João do Carmo, quando o casal desaparece durante a
campanha para prefeito do pai dela. O terceiro, o drama romântico Argila (1942), contando a história de
uma moça rica e ilustrada, que, depois do retiro de luto por seu marido, retoma
as atividades como patrona das artes e reabre seu salão, tratando sobre as
diferenças entre ricos e pobres, a história de um amor impossível entre uma
jovem rica e um artesão. Por fim, o drama Ganga
Bruta (1933), contando a história de uma noite de núpcias e o noivo
descobre que a sua mulher não é virgem e a mata, sendo absolvido e se casando
posteriormente numa pequena cidade, retrato da vida brasileira com sua
violência urbana e repressão sexual. Veja mais aqui.
A ARTE DE LU LI RONG
A arte
da escultora e artista chinesa Luo Li
Rong, criadora de escultura realistas. Veja mais aqui.