ANNINA DE VIVALDI – Annina, amada minha! Guardo comigo a sua inocência e formosura, uma escolha que não deve ser ignorada nesse
mundo cruel de intrigas, dramas, máscaras e carnavais. Tenho todos os meus
pecados, minha La Mantovana de Mântua, como seu Sacerdote
Vermelho sou levado pela verdadeira natureza do amor e
da esperança. A minha alma guarda a sua, minha prima donna do orfanato La Pietà, a sua alegria contagiante me salva
das frivolidades do mundo, dos rumores espúrios e do perfume dos escândalos. E
me livra mais do aperto no peito, a me inebriar com sua presença embaixo do mesmo
teto, onde celebro a nossa verdadeira missa. Quero estar ao seu lado em todos os seus triunfos e desesperos, incertezas e sombras.
Para tanto, dou-lhe todas as
árias para embalar seu sonho, minha musa e
companheira para todo o resto da minha vida. Por você sou vivo, vivace, escrevo e reescrevo a
minha loucura, retomo e refaço para buscar o lirismo no paraíso da sua paz. Dou-lhe
as quatro estações, toda a glória, tudo que é mais sagrado em meu coração. Dou-me
e tudo que tenho é a sua alegria. Estou cansado de
sacralizar a mentira cristã, profano a vida, a música e o seu corpo: Nulla in
mundo pax sincera. Não tenho
mais chão, nem vintém, só o inexplicável silêncio milenar. Deixo a minha obra escondida em uma despensa mofada e
acumulada de poeira secular. Sou em você mais que a vida, o meu desígnio; dou-me,
enfim, para que me tenha eternamente seu. © Luiz Alberto Machado.
Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.
DITOS & DESDITOS: Para livrar seus filhos desses vícios e
calamidades, faça-os dar virtudes e empregos quando crianças. Que seu coração
se endireita: ninguém aqui viverá para sempre. O guerreiro mais poderoso é
aquele que consegue se derrotar. Pensamento do filósofo e poeta asteca Nezahualcóyotl (1402-1472). Veja mais aqui & aqui.
ALGUÉM FALOU: [...] Para quem perdeu o que mais amava no mundo -
o filho, a mãe, o homem ou a mulher de sua vida...-, a ferida é, ao pé da
letra, insuportável, não pelo fato de que nos mata (embora às vezes mate), mas
pelo fato de que torna a própria vida atrozmente dolorosa, em seu âmago, a tal ponto
que o horror ocupa todo o espaço psíquico disponível, tornando a alegria (e até,
nos primeiros tempos, o repouso) como que impossível para sempre. Para sempre? É pelo menos esse o sentimento que se tem no
início, e que a vida desmente, claro, que a vida felizmente desmente. O trabalho
do luto, como diz Freud, é esse processo psíquico pelo qual a realidade prevalece,
e cumpre que ela prevaleça, ensinando-nos a viver apesar de tudo, a usufruir apesar
de tudo, a amar apesar de tudo: é o retorno ao princípio de realidade, e o
triunfo, por isso – a princípio modesto!-, do princípio de prazer. A vida prevalece,
a alegria prevalece, e é isso que distingue o luto da melancolia. Num caso,
explica Freud, o indivíduo aceita o veredicto do real -"o objeto já não existe"-,
e aprende a amar alhures, a desejar alhures. No outro, ele se identifica com aquilo
mesmo que perdeu, há tanto tempo, e ele era tão pequeno, e se encerra vivo no nada
que o obceca. [...]. Alguma
coisa se inverte aqui; o luto (a aceitação da morte) pende para o lado da vida,
quando a melancolia nos encerra na mesma morte que ela recusa [...].
Trechos extraídos da obra Bom dia,
angústia (Martins Fontes, 1997), de do filósofo francês André Comte-Sponville. Veja mais aqui.
O CINEMA DE RUY GUERRA
Queria
ser poeta ou escritor para cantar a vida,
não a
falsa vida dos salões de baile, do luxo, da riqueza,
nem é a
da minha alma em sobressalto,
porque
uma vida, nem vida é, e a outra a mais ninguém interessa do que a mim.
Queria
cantar a vida dura dos que trabalham pelo pão de cada dia,
a vida
dos sem lar, dos sem pão, dos sem conforto, a vida da pobreza e da miséria.
Queria
cantar essa Vida.
Queria
que esse canto mostrasse aos que a fingem ignorar
os seus
trabalhos, lutas, anseios e tristeza,
fazer
sofrer pelo pensamento aos que não a querem ver, o que aos outros marca a carne
também,
que lado
heroico da dor, revolta, desespero, esperança,
mas eu
não sou poeta, nem escritor.
Não sei
gravar no papel virgem os sentimentos, por vezes fatalista, dessa gente;
não sei
se iria sentir talvez aquilo que eles sentem, oh, não sei não,
mas se
soubesse esse hino seria belo como nenhum outro,
mas não
seria meu, seria deles todos
As suas
vozes seguras espalhadas aos quatro ventos,
mas
unidas nesse canto de resgate, de vida a apodrecer em vida.
Eu tinha
sido um porta voz apenas,
mas
podia então viver que já vivia, pude então morrer que não morria,
era
poeta, escritor e mais ainda tinha liberto a Vida.
RUY GUERRA – Poema Ode, (Mocidade Portuguesa, 1947), do
cineasta, escritor, dramaturgo e professor moçambicano radicado no Brasil, Ruy Guerra, que entre outros filmes, dirigiu
o premiado Os deuses e os mortos (1970), contando a história sobre a batalha
entre um Homem, um aventureiro sem nome, que se intromete na luta entre dois
clás de grandes coronéis pela posse da terra do cacau, uma luta sem vencedores,
um banho de sangue que também lhe custa a vida; Erêndira (1983),
baseado em narrativa de Gabriel Garcia Marques, contando que ela vivia com sua
avó, quando um descuido da menina fez com que a casa pegasse fogo, resolvendo a
ansiar puni-la pelas perdas prostituindo-a; o drama Kuarup (1989), baseado
na obra Antonio Callado, contando a história de um padre missionário no Alto
Xingu e deixa o sacerdócio para se tornar indigenista na luta contra o golpe de
1964; e o musical Ópera do Malandro (1985), adaptado da peça teatral de Chico
Buarque, contando a história de um malandro nos anos 40, explora uma cantora de
cabaré e vive de pequenos truques enganadores, até surgir a filha do dono do
cabaré que pretende tirar proveito da guerra de contrabando. O cineasta em
crônica publicada em jornal de grande circulação nacional, em 1996, assinalou
que: Um brasileiro
alegre é um pleonasmo.
Em parceria com Chico Buarque, ele escreveu a pela teatral Calabar: o elogio da traição (Civilização
Brasileira, 1976). Veja mais aqui & aqui.
ARTE DE LUO LI RONG
A arte da artista e escultora chinesa Luo Li Rong. Veja
mais aqui.
A OBRA DE VIVALDI
Chegou a
primavera e os pássaros o cumprimentam com um canto alegre, enquanto as fontes,
com as respirações do zéfiro, correm com doce murmúrio...
Os sentimentos humanos são difíceis de prever. Não há palavras, apenas
música.
PS: Grande
parte da obra de Vivaldi é dedicada à musa amada, a mezzo soprano italiana Anna
Girò (Anna Giraud La Mantovana que também se assinava Anna Maddalena
Tessieri– 1710-1748), para quem ele escreveu vários papéis de ópera,
tornando-se a prima donna em
apresentações ao longo de sua carreira. Sobre essa relação foi publicada a obra
The Red
Priest's Annina: A Novel of Vivaldi and Anna Girò (Bel Canto Pree, 2009), da escritora e historiadora Sarah Bruce Kelly.