quarta-feira, fevereiro 17, 2016

O CIS, O EFÊMERO & EU



O CIS, O EFÊMERO & EU (Imagem: Em busca do efêmero, da série Coleta da Neblina, da artista plástica Brígida Baltar)– O tempo. Cada segundo, um triz, o cis e eu. E eu sou o que fui e já estou sendo sem ser nada e tudo. Serei nada, mesmo. Já passou. Tudo pode acontecer. E já foi. Um raio, eu vou e voo. Já não sou o mesmo. Fui. Serei, posso ser. E não sou. Algo aconteceu e eu não vi. Algo está acontecendo e não percebo. Os meus sentidos estão ativos, tudo sinto, nada vejo. Meus sentidos parecem dormir para o não visível. Estou acordado, penso. Sei que está acontecendo algo, isso é óbvio e não me dou conta. Apenas vejo o perceptível. Sinto o imperceptível. Subjacentes a tudo que vejo outras muitas tantas coisas estão em movimento contínuo. Não percebo. Não sei quando a digestão do meu estômago; respiro, mas não sou nem sei como a respiração dos meus pulmões ocorre. Sinto e não sinto. Sei que vivo, não sei como. Sei que nasci sem que saiba de onde tenha vindo. Estou aqui sem que saiba exatamente o que deve ser feito e o que fazer. Apenas faço o que sei e julgo, pelo que fui ensinado, que faço o certo. Ou errado, não sei. Há algo que não consegui saber e que não está no que foi ensinado. Algo mais profundo, como o desabrochar da rosa, como o parto de quem nasce, como a lagarta vira borboleta. Algo mais sutil como o processamento da fecundação. Algo mais denso que se encontra no vento e não percebo. Diante disso o tempo é nada. E o espaço não só o que habito, há muito mais além do horizonte. Só não sei. Nem sei se preciso saber disso, basto-me no que compreendo. Cada qual a sua compreensão. O incompreensível é estranho, além do que posso conceber. Se há algo além disso, eu não sei. Sinto que existe algo mais, não apenas o sensível, o além disso. Se não vejo, não quer dizer que não está ali. Apenas não vejo na minha cegueira objetiva. E sinto com o olho que não vê e ouço como o que não ouve, e toco o que não é tocável, e saboreio sem o sabor e cheiro o que não cheira. Algo que não existe pra quem pensa que tudo é apenas o que está na objetividade. E eu sei que nisso há algo mais que se move, se transforma e se realiza sem que se desconfie de nada disso. É como se fosse eu e o que está acontecendo escondido estivesse comigo e se fazendo comigo o tempo inteiro. E sinto que esse é um outro eu além de mim e que sou eu e todas as coisas, porque sei que todas as coisas sou eu e são como eu sou. E isso eu sei, não sei como, como não sei tantas outras coisas. Mas é um saber real e belo e aprazível. E me dá prazer saber o que não sei: a descoberta de que posso ser além do que imagino que sou. E isso é inexplicável. E é bom isso mesmo: não se explica. Não há necessidade de explicação: basta sentir. E eu sinto você. (Luiz Alberto Machado). Veja mais aqui.


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