O SONHO DE CHIQUINHA – Sei você em mim que sou desde lá de antes às voltas com
o pai militar que escolheu seu marido desesperado por não gostar de música e a
mãe escrava cuidava da sinhazinha, dama de salão inquieta e determinada, rebelada
pelo divórcio perpétuo, sua maldição familiar, condenação moral, desgostos
pessoais. Quase mata o general do coração por não ser uma dada da corte, porque
voluntariosa, namoradeira, avessa aos salões e a materna aos cuidados com a
afilhada do duque pelas rodas de lundu e umbigada, até ser expulsa de casa com
a natalina Canção dos Pastores. Sei você em mim pela Rua do Ouvidor na
companhia de boêmios, menina levada pela Confeitaria Colombo com a Nair de Tefé
e a vida na Guerra do Paraguai, ah, publicamente execrada e aos invejosos o
preconceito de seguir sozinha, de porta em porta, quem queria comprar partituras
no passeio pela Riachuelo, a alma de cigana pela Praça Tiradentes, às baforadas
para falação, fumante a pulsar pelas ruas de Santa Teresa, São Cristóvão,
Tijuca, Vila Isabel e no meu coração que sorria nas nuvens seus dotes revelados.
Sei você em mim e o choro Sabiá na Mata, uma centena de violões e A Filha do Guedes na frente da orquestra, pela liberdade
de escravos e fim da monarquia, firme transgressora e sem desistir de nada, porque
enamorados a gente seguia persistentes pelas Rosas de Ouro, mesmo você rechaçada
e todas as portas fechadas, ai de mim e de nós, a gente só queria se amar e Caramuru comprou a alforria da flauta e
a coragem para a opressora vizinhança e eu na sua luta pela liberdade sem
confins. Sei você em mim com suas formas esbeltas na paixão que não enxerga um
palmo além do nariz, nem mais nada na vida, senão o amor pelo Passeio Público
de mãos dadas, ouvindo aquela da Camila
e a Festa de São João, o fracasso e as rejeições, o engajamento e eu ao
seu lado porque o piano nu era sua alma nua e eu só queria que seu coração
ubíquo de Atraente ventasse um pouco
mais para minha banda e a gente fosse ao Forrobodó ou A
corte na roça, e a Confederação Libertadora para quem não tinha voz,
enquanto nos dávamos no escuro, exilados do mundo, só sabendo de nós dois, nada
mais. Sei você em mim e suas desilusões amorosas, ousou tanto, quanta audácia,
coragem determinada, a reputação em frangalhos e dona do próprio nariz, Cubanita, Sultana, Falena, era Manhã de amor na
modinha em que você raiava nua nos meus braços de amanhã e a gente podia
incendiar a madrugada com a nossa exumação, sem que houvesse qualquer forma de
jamais nos perder das mãos e olhos de tantos quereres. Sei você em mim,
a exploração abusiva de seu trabalho e A brasileira Machuca do jeito que se
gosta, castigando tudo por polcas e o teatro musicado, a gente
inventando tangos brasileiros e o idílio das nossas canções, valsas e habaneras,
fados e baladas, modinhas e mazurcas, dobrados e duetos, serenatas e peças
sacras, até Maria,
Juriti. Sei você em mim enquanto a
gente dançava nus na sala do paraíso onírico, os Passos no choro, e a gente se amava impunes sobre a mesa exposta e
em cada canto a pleno vapor, a saudar o Corta-jaca (Gaúcho) escandaloso num
tango para ajeitar você só para mim e minha, a me dizer baixinho, Plangente, Te amo, com A chinelinha do meu amor rondando o espaço que era todo azul no
nosso sonho mais que verdadeiro e era você linda e nua A Lua branca para que As
pombas dos meus beijos pousassem felizes na sua carne despida e ventre
flamejante de felicidade verdadeira. Sei você em mim enquanto as portas eram
arrimos pro ósculo dos corpos colados e a promessa de me adotar
companheiro eterno, quando anoitecia no meio da tarde e do dia, tempo algum nem
espaço o que era um castelo e a gente se aninhando só pra sermos felizes,
porque nunca
me importei com seus passados e futuros amantes, nunca! Nem com a desarrumação
da casa, a improvisão de tudo. Abri todas as alas do meu coração para você
desfilar exuberante e intensa protagonista em busca do sonho e Pudesse esta paixão nos fizesse um só e para
sempre, mas não, findou mesmo assim, você se foi e, apesar de tudo, sobrevive, nua
e diluviana, no meu coração. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais abaixo e aqui.
DITOS & DESDITOS: [...] A ideia de
que a leitura pode contribuir para o bem-estar é sem dúvida tão antiga quanto a
crença de que pode ser perigosa ou nefasta. Seus poderes reparadores, em particular,
foram notados ao longo dos séculos. [...] Todo ser
humano sente, de modo vital, necessidade de ter à sua disposição espaços onde
encontrar mediações ficcionais e simbólicas. [...] Tratava-se de um
verdadeiro "empreendimento de sobrevivência", em um contexto de
clausura familiar e de grande solidão. Em situações de crise, encontram-se tais
atos de resistência de homens e mulheres sob várias formas. Eles não economizam
meios, não economizam textos — ou, às vezes, imagens — capazes de abrir o
horizonte para resistir ao confinamento, aos constrangimentos e às eventuais
tentativas dos poderes — políticos, simbólicos ou domésticos — de entravar,
estreitar e controlar seus movimentos. Eles se esforçam para salvaguardar um
conhecimento próprio e do mundo, para preservar frente e contra tudo um espaço
de pensamento, uma dignidade e uma parte de liberdade, de sonho, de inesperado.
[...]. Trechos extraídos da obra A arte de ler: ou como resistir a adversidade (34, 2009), da antropóloga
e pesquisadora do do Centre National de la Recherche Scientifique, na
França, Michèle Petit, que coordena, desde 2004, um programa internacional sobre
"a leitura em espaços de crise", compreendendo tanto situações de
guerra ou migrações forçadas como contextos de rápida deterioração econômica e
grande violência social. Ela possui diversas obras, tais como Os jovens e a leitura (FNLIJ,
2008) e Leituras: do espaço
íntimo ao espaço público (34, 2013). Veja mais aqui e aqui.
O CINEMA DE TRUFFAUT
O filme de amanhã será um ato de amor.
TRUFFAUT – Já por diversas vezes aqui destacado, a obra
inesgotável do cineasta francês François Truffaut (1932-1984) merece
cada vez mais ser trazida à tona. Desta vez, começo pelo drama biográfico L'histoire d'Adèle H. (A História de Adèle H., 1975), que é baseado
no diário de Adèle Hugo e o livro de Frances Vernon Guille, contando a história
de amor obsessivo e não correspondido da filha do escritor francês Victor Hugo,
por um oficial inglês. Em segundo, o curta-metragem Antoine et Colette: L’Amour à 20 ans (O Amor
aos Vinte Anos, 1962), contando a história de um jovem adolescente que trabalha
em uma fábrica de discos e, durante um concerto musical, é atraído por uma jovem,
Colette. Depois de encontro, ele se muda para as proximidades da residência
dela, enviando uma declaração de amor, da qual ela não compartilha dos mesmos
sentimentos. O terceiro, é o drama La
mariée était en noir (A Noiva Estava de Preto, 1967), baseado no livro de William Irish, que conta a história de cinco homens, em um jogo
que dá errado, matam o noivo no final de uma cerimônia de casamento, história
de uma vingança, lenta, refinada e, especialmente, usando as diferentes visões
que os cinco homens carregam na mulher ideal. Todo mundo
vai morrer, não de acordo com sua culpa, mas de acordo com sua personalidade.
Por fim, o quarto, é o drama La peau douce (Um Só Pecado,
1964), que conta a história de um escritor de renome, ao viajar
até á cidade de Lisboapara palestrar sobre Balzac, conhece a hospedeira de
bordo, Nicole, por quem fica logo apaixonado. Eles rapidamente envolvem-se, mas
como Pierre é casado com Franca e com quem tem uma filha, Sabine, eles mantêm o
caso escondido de toda a gente. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui &
aqui.
A ARTE DE ARMAN
A arte do controvertido escultor e pintor francês Arman – Armand
Pierre Fernandez (1928-2005). Veja mais aqui.
A OBRA DE CHIQUINHA GONZAGA
A obra
da pianista, compositora e maestrina Chiquinha Gonzaga – Francisca Edwiges Neves Gonzaga (1847-1935) aqui & aqui.
CHIQUINHA GONZAGA – Autora de mais de 2 mil canções e 77
partituras para peças de teatro, ela foi uma dessas mulheres a frente do seu
tempo, engajada política em favor da abolição da escravatura e pelo fim da
monarquia no Brasil. Amou muitos homens e foi vítima de preconceito e execração
pública, tendo, inclusive, no seu último romance com um jovem de apenas 16
anos, adotado como filho para evitar os tantos de escândalos a que foi
submetida. Sobre sua vida e obra, algumas publicações merecem destaque, tais
como Chiquinha Gonzaga: uma história de vida (Rosa dos Tempos, 2005), de
Edinha Diniz; A jovem Chiquinha Gonzaga (Nova Alexandria, 2005), de
Ayrton Mugnaini Jr; Mestres da música no Brasil - Chiquinha Gonzaga (Moderna,
2001), de Edinha Diniz; e Chiquinha
Gonzaga - Sofri, chorei. Tive muito amor (Nova Fronteira, 1995), de Dalva
Lazaroni de Moraes. No cinema, ela foi retratada no filme Brasília 18% (2006), de Nelson Pereira dos Santos e no filme Xangô
de Baker Street, de Malu Galli, baseado no livro homônimo de Jô Soares. Foi
personagem da minissérie televisiva, Chiquinha Gonzaga, de Jayme Monjardim,
pela Rede Globo. Foi tema do carnaval da Mangueira, em 1985, com o enredo Abram
alas que eu quero passar e da
Imperatriz Leopoldinense, em 1997, com o enredo Eu Sou Da Lira, Não Posso
Negar... Em 1999, por meio do Projeto de Resolução 14/1999, foi criada a
medalha de reconhecimento Chiquinha Gonzaga, conferida às mulheres que militam
em prol das causas democráticas, humanitárias, artísticas e culturais no âmbito
da União, Estados e Municípios. Em 2012, no dia em que se comemora o seu
nascimento, 17 de outubro, foi oficializado, em sua homenagem, o Dia da MPB.