O MUNDO DE CABEÇA PARA BAIXO – Cá comigo, na verdade: tudo é ilusório – o
que se vê, o que se fala, o que se sente. Não é mesmo. Nascemos para saber a
razão pela qual estamos aqui. E esquecemos isto. Impõem-nos identidade, família,
numa corda bamba entre consanguinidades e afetos. Tudo o mais, vale para isso,
não vale para aquilo. O falso e o autêntico, qual. Seguimos sem saber para
onde, o incógnito, a não ser morrer – como se fosse o fim de tudo, o destino. Nem
escolhemos nosso nome, quem somos, reduzidos aos afazeres, compromissos,
avenças e desavenças. Felizes com os êxitos, deprimidos com os fracassos e
incompreensões. Abrimos e fechamos braços, portas, janelas e sorrisos,
dependendo da ocasião. Quando não, plantamos ou destruímos árvores e
discórdias. De fato, tememos da morte o seu golpe. Ansiamos paz e felicidade
ignorando que para sermos felizes, precisamos fazer acontecer, considerar os
outros. No mais, arranjos e desarranjos. Sejamos otimistas, ora. A justiça que fruímos
é um estorvo, manipulação de interesses: poupa afortunados e, na lei do salmo
13:12, vitima deserdados. E toda prece é pela salvação, livrai-nos. Enganos de vida
e de morte. E se começa uma nova guerra por qualquer coisa de nada ou pequena
monta, ou sabe-se lá, por capricho ou honra, senão. Dá-se com uma mão e tira-se
com a outra. Diz-se amar e do amor, só egoísmo e dissimulação: se deu, deu; se
não deu, ao deus dará. Há sempre uma hora, isso eu sei. Não é toda vez. Qual a
deste momento, não se sabe, é só repetir: seja o que deus quiser. Reiterar: todos
estamos nas mãos de deus e que ele não nos leve na pior. É o que nos cabe
fazer, irresponsáveis, a menor culpa, nenhum remorso. Resta a apatia e torcer
para que tudo dê certo, pelo menos. Como se jogo de dados. Como se tivesse só
isso ou restasse fazer mais nada. Uma vez ou outra, reações; jamais tornar a
ver e jura, posto que ilusões de ótica: só logro ou malogro, momentos de
franqueza ou fraqueza, erros e desacertos a quem convinha fazer acontecer ou o
retrocesso, passou. Se foi, melhor assim, ou assado. Ou como melhor parecer,
seja feita a vontade. Impotentes, resignados. Apelar para o milagre dar uma
mãozinha. Desígnios no manual de instrução, todos os procedimentos por desiderato,
regulamento às mãos, essa a carta branca do arbítrio. Essa a lógica nos fatos, mesmo
que nem haja, ocorreu e pronto, nada a questionar: deus assim o quis. Ademais,
será que falta vergonha na cara, ou é cinismo, não o de Antístenes, mas da
impudência. De certo, tudo isso e no mais de resto é embuste, engodo,
simulacros, emulações, mimese. Na real, tudo é mentira. Do que me livrei e
sabia, ainda havia tempo e nem tudo está definitivamente perdido. Uma vez, só
uma vez a verdade. Lupa no denso. Que não seja perda de tempo, a estrada parece
longa no efêmero, ou vice-versa. Tudo isso é mentira mesmo. E há quem consiga
dormir com um barulho deste. Eu, sem qualquer razão aparente, insone. © Luiz
Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.
DITOS & DESDITOS: O
primeiro trabalho que publiquei provocou uma briga com meu chefe, que
discordava de alguns aspectos. Insisti em publicá-lo. Naquela época o pessoal
me gozava, acho que ninguém realmente me levava a sério, porque não existia na
literatura qualquer descrição da associação entre bactérias fixadoras do
nitrogênio e plantas superiores. Contrariando o saber estabelecido, acharam
estranho que no Brasil, uma região de clima tropical, houvesse bactérias
fixadoras de nitrogênio habitando as raízes das gramíneas. Mas havia uma razão
lógica para o fenômeno. Uma bactéria só cresce, em meio de cultura, a uma
temperatura mínima de 25ºC. Melhor sempre é uma temperatura de 30-35ºC.
Temperaturas dessa ordem não ocorrem nos solos de regiões temperadas, como
Estados Unidos e Europa. Nas regiões tropicais isso seria muito mais provável. Nunca
trabalhei para ficar famosa ou milionária. Talvez um dos segredos de nosso
sucesso tenha sido o de procurar conciliar o pessoal da bioquímica e da
genética com os agrônomos, tentando fazer uma ponte entre as disciplinas. Pensar
no futuro, pensar no presente. Cada criação, ela tem consequências, então, se
nós tratamos bem a natureza, se nós desenvolvermos bem a agricultura, que ela
seja sustentável, isso tem futuro. E nós precisamos do futuro. Pensamento da engenheira agrônoma
teuto-brasileira Johanna Döbereiner
(1924-2000), pioneira em biologia do solo e cientista entre as mais citadas
pela comunidade científica mundial, durante entrevista concedida à jornalista
Clara Lage, publicada na revista Papo de Homem.
HAJA PAU - [...] pelo vale do Catu, em Goianinha e Cangaretama, no Rio Grande do Norte,
ouvia-se uma voz comanda, incisiva e clara: “Pau! Haja Pau!”, espalhando pavor
e mistério, não possuindo outra forma além do grito. A curiosidade era a voz,
pura e simples, sem órgão transmissor visível. Todas as investigações foram
inoperantes. No sul do Piauí, nas últimas décadas do século XIX, um rapaz,
afoito derrubador de gado, sucumbiu numa sexta-feira da paixão com o cavalo, o
touro e o cão, por haver desobedecido ao preceito de “guardar o dia”. Tornou-se
alma penada na voz de ave noturna. “Na noite do mesmo dia, na sentinela
(velório do cadáver), aquele pássaro até então nunca visto nem ouvido, cantou
até madrugada alta. E daí em diante, por aquelas chapadas, à noite,
especialmente noite sem luar, ouve-se o canto feio e rouco daquela ave que diz
direitinho: “Pau! Haja Pau!”. [...]. Trecho extraído da obra Passarela
de Marmotas (Autor, 1975),
do advogado magistrado e escritor brasileiro Fontes Ibiapina
(1921-1986). Veja mais aqui.
IDA RUBINSTEIN – A arte da atriz e bailarina russa Ida Rubinstein (1885-1960). Órfã muito jovem, foi criada por
parentes, tendo educação refinada para as artes, notadamente teatro e mímica. Aos
dezenove anos montou com seus próprios recursos a peça Antígona, de Sófocles. A
partir de então, passa a ter aulas de dança com Isadora Duncan. Montou, em
seguida, Salomé, de Oscar Wilde. A partir de então, ingressa nos Ballets Russes
e segue apresentando-se com Nijinsky. Interessa-se pela ópera e funda sua
própria companhia. Durante a segunda grande guerra, exilada em Londres, passa a
prestar assistência aos soldados da resistência francesa, tendo sua residência saqueada
por forças nazistas e seu acervo de arte roubado. Ela escandalizou
sua época por sua beleza e bissexualidade, relacionando-se amorosamente com
diversos amantes. Veja mais aqui.
A OBRA DE JOÃO CABRAL
A vida não se resolve com palavras.
A obra do
poeta e diplomata João Cabral de Melo Neto (1920-1999) aqui, aqui, aqui,
aqui, aqui e aqui.