OS AMORES DE BETTINA – Ah, ensolarada Bettina, o seu ser nunca tocou a terra, nem poderia com
tantos sonhos. No meu peito dança a sua graça espontânea de animal selvagem, um
bicho enjaulado para cuidar, raiz de Frankfurt na alegria de viver mais que a
vida desejada. Quem me dera o seu amor de livre pássaro pela
Karoline, aquela que se matou com a adaga no peito por paixão proibida: o mote para
seus afetos ao ver-me olhos grandes enamorados. Quem me
dera impelido pela paixão de um grande amor por sua amável mãe e tornar-me, com
isso, o seu desiderato. Quem me dera estar na sua fantasia de bailarina
Mignon apaixonada pelo velho poeta, a dançar a música oculta porque nada mais
lhe interessava. Só você podia ouvir a música e bem poderia me castigar e revitalizar
com a sua felicidade. Weimar não seria nunca a única cidade em que se poderia
viver. Sei que perseguiu o semideus músico – a música era a natureza, a
revelação: suas mãos sobre os ombros dele. Ele compôs o hino de Mignon e você
se libertou nas palavras cobertas de nuvem. Não é fácil construir o amor do
princípio ao fim: não há realidade mais elevada que o devaneio do amor. Não há
quem a governe e eu viveria a fantasia e a verdade de suas cartas, como se
fosse a própria revolta dos tecelões da Silésia cantada por Heine no meu coração.
Não me veria alarmado com sua exuberância, sou entusiasmo inflamado diante da
poética epistolária de sua loucura fascinante. Nunca a mandaria embora, jamais,
como fez o octogenário: seria o amado imortal das suas aspirações. Tenho comigo
todos os Colóquios com os demônios, O livro do rei, a correspondência e a
sua pregação aos humanos e à natureza: sou sua aura combatente e ativista das
causas dos perdedores, entre os
radicais estudantes que o despótico governo prussiano temia - sou o desfile à
luz de tochas só para você. Eu aprendi a amá-la do mesmo jeito: sua
escrita, aventuras e invenções, sua
aversão às danças artificiais dos elfos e os jogos nas copas das árvores e
palácios floridos. Minha pequena musa nua com sua lira, você
ressuscitou lindamente em mim após a morte de todos que a rodeavam. Eu direi
tudo, essa minha comunhão com a sua vida imortal inflamada de amor. Tenho o
mesmo empenho paciente e inquebrantável de anos inteiros, qual espírito
sussurrando a revolução dos tempos de quem escreveu livros que ninguém leu. Ouço
a Heróica e você está sempre viva em
minha mente: o tempo consolida as paredes mestras de um amor verdadeiro. Nada deteve
seus planos elaborados, nem a mim deterá, porque o velho mundo rangeria de
verdade suas enferrujadas dobradiças com a nossa entrega amorante. Comigo, sim,
você seria a razão dos meus poemas: musa e vidente, única, mesmo que se fizesse
bruxa ou anjo, casta ou devassa, borboleta ou lagarta. Sou mais um entre seus
ilustres admiradores, eu sei, só que em mim o amor ditou nenhuma regra. As minhas
respostas jamais serão circunspectas, porque no meu coração sitiado você será
sempre o memorial que encantou o velho poeta. © Luiz Alberto Machado.
Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.
DITOS & DESDITOS: [...] A história seguiu
diferentes rumos para os diferentes povos devido às diferenças entre os
ambientes em que viviam e não devido a diferenças biológicas entre os povos [...] A disciplina de história
geralmente não é considerada uma ciência, mas algo mais próximo de humanidades.
Na melhor das hipóteses, a história é classificada entre as ciências sociais, e
é considerada a menos científica. [...] A maioria dos historiadores não se vê como
cientistas e recebe pouco treinamento nas ciências reconhecidas e suas
metodologias. A ideia de que a história não passa de uma massa de detalhes é
captada em muitos aforismos: “A história é apenas um maldito fato atrás de
outro”, “A história é mais ou menos um palavrório”, “A história não tem mais
leis do que história um caleidoscópio”, e assim por diante. Não se pode negar
que seja mais difícil extrair princípios gerais estudando história do que estudando
as órbitas planetárias. [...] As
ciências históricas se preocupam com cadeias de causas imediatas e finais. Em
grande parte da física e da química, os conceitos de “causa final”, “propósito”
e “função” não têm sentido, mas eles são essenciais à compreensão dos sistemas
vivos em geral e das atividades humanas em particular. [...] As dificuldades enfrentadas pelos
historiadores para estabelecer relações de causa e efeito na história das
sociedades humanas são muito semelhantes às dificuldades com que se deparam astrônomos,
climatologistas, ecólogos, biólogos da evolução, geólogos e paleontólogos. Em
graus variados, cada um desses campos é atormentado pela impossibilidade de
realizar intervenções experimentais controladas e repetidas, pela complexidade
que surge de inúmeras variáveis, pela consequente singularidade de cada
sistema, pela impossibilidade de formular leis universais e pelas dificuldades
de prever propriedades emergentes e o comportamento futuro. [...]. Trechos
extraídos da obra Armas, germes e aço: os
destinos das sociedades (Record, 2013), do biólogo, fisiologista,
biogeógrafo e escritor estadunidense Jared
Diamond.
ALGUÉM FALOU: [...] devemos propor
outra metáfora e reconhecer que nós também temos de trilhar um caminho reto e
estreito, cercado de estradas para a perdição. Se começarmos a reprimir nossa
busca da compreensão da natureza, para saciar a nossa própria excitação
intelectual de uma tentativa equivocada de apresentar uma frente unida que não
existe e não deveria existir, então estaremos realmente perdidos. [...]. Trecho extraído do ensaio Evolução como fato e
teoria (Discover, 1981), do paleontólogo e biólogo estadunidense Stephen Jay Gould (1941-2002). Veja
mais aqui e aqui.
CITRALAKSHANA - Há muito tempo, quando os homens não morriam
antes de chegar a sua hora, um brâmane veio chorar junto de um rei santo e
queixou-se de que seu filho lhe fora arrebatado prematuramente. O rei
dirigiu-se a Yama, o deus da morte, que contudo recusou renunciar ao filho do brâmane.
Assim o próprio Brama apareceu e ordenou ao rei: “Fiel à sua forma e com a
ajuda de cores, pintarás o filho do brâmane, para que seja igual a ele”. O rei
pintou o rapaz, e deste modo Brama restituiu-lhe a vida e devolveu-o ao brâmane. Lenda
indiana originada da pintura referida no Citralakshana,
conservado apenas no Tanjur Tibetano, e recolhido da obra Lenda, mito e magia
na imagem do artista: uma experiência histórica (Presença, 1979), de Ernest
Kris e Otto Kurz. Veja mais aqui.
A ARTE DE MARIETTA BADERNA - A bailarina
italiana Marietta Baderna (1828-1892),
estreou no balé aos 12 anos de idade, passando, em seguida a fazer parte da
companhia de dança do teatro Scala, de Milão, tornando-se, aos 21 anos de
idade, a prima ballerina assoluta. Ela
obteve sucesso por toda Itália e em turnês por outros países europeus. Ela veio
para o Brasil, fugindo da repressão desencadeada pelas revoluções de 1848, encantando-se
e participando ativamente da cultura brasileira, com espetáculos miscigenados
com ritmos africanos que chocaria o público conservador e racista da época. Por
se tratar de uma mulher livre, bonita e talentosa, afora ser uma personalidade
rebelde, passou a se chamar Maria Baderna, causou furor e desafiava os
preconceitos moralistas, angariando uma legião de admiradores que passaram a
ser chamados de “badernistas” ou “baderneiros”. Por essa razão, o seu nome deu
origem ao termo baderna, significando confusão, desordem e bagunça. Ela era
considerada a Rainha das Fadas, transformada em divindade pagã, musa da
juventude romântica, admirada pelos intelectuais e desejada pelos aristocratas.
Além de namoradeira, ela às vezes dançava em bailes, praças e praias. Nessas
ocasiões, longe da rigidez dos palcos, preferia os ritmos calientes como o
sensual lundum, a cachuca e a umbigada, ritmos relegados aos lugares frequentados
apenas por escravos. Em Recife ela protagonizou um escândalo, em 1851, ao
encenar um lundum. Apesar dos protestos racistas, a temporada foi um sucesso e
marcou o início do abrasileiramento da artista, cujo primeiro contato com as
danças dos negros e mulatos tinha sido pela leitura das Cartas Chilenas, do poeta e inconfidente Tomás Antônio Gonzaga. Ela
foi amiga do ator João Caetano, contemporânea de cantoras famosas como Candiani
e elogiada por escritores e jornalistas como José de Alencar ou José Maria da
Silva Paranhos, o futuro Visconde do Rio Branco. Mesmo assim, ela foi
perseguida e marginalizada. Dela, o escritor José de Alencar se expressou: A graciosa sílfide que sempre aplaudimos
saiu de cena e entrou para os dicionários. Relatos extraídos da obra Maria Baderna: a bailarina de dois mundos
(Record, 2001), de Silverio Corvisieri, que assinala ser a bailarina o retrato
de uma autêntica heroína que, por trás de sua atividade de dançarina, conspirou
e enfrentou todo tipo de perigo por seus ideais revolucionários. Veja mais
aqui.
A OBRA DE NIETZSCHE
Os maiores acontecimentos e pensamentos são
os que mais tardiamente são compreendidos.
A obra do
filósofo alemão Friedrich Nietzsche
(1844-1900) aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
&
BETTINA BRENTANO
Quando nos sentimos dispostos a amar queremos
que nos amem, sem pensar que essa exigência afasta o gênio do amor.
A escritora,
compositora, cantora, artista, ilustradora e ativista social Bettina
Brentano (de nascimento Elisabeth
Katharina Ludovica Magdalena Brentano – 1785-1859), foi, também,
ativista dos direitos da mulher, tendo como suas obras mais populares os
apontamentos corrigidos da correspondência que manteve com Goethe, Karoline von
Günderode (que suicidou-se com um golpe de adaga no peito) e seu irmão, o poeta
Clemens Bretano. Ela utilizou o pseudônimo de Beans Beor, tendo cultivado paixões e amizades com
Goethe – por quem ela se apaixonou perdidamente, uma vez que a mãe dela foi o
grande amor do poeta -, Beethoven e Pückler, como também Schumann, Marx, Liszt,
Kinkel, Brahms, os Grimms e até Napoleão. Foi a musa suprema de um movimento
literário, figurando entre as mais singulares personagens e mais
representativas do século romântico.