quinta-feira, outubro 15, 2015

NIETZSCHE, PESSOA, FOUCAULT, FELA KUTI, DENISE FRAGA, JULIE DELPY, VANDERLYN, AS TRÊS GRAÇAS & DIA DO PROFESSOR.

VAMOS APRUMAR A CONVERSA? O DORO NO DIA DO PROFESSOR - Doro chegou carregado de interrogações e, como sempre, de chofre, descarregou de forma enfática: - Quaiquié procê a prefissão mais importante do prâneta e do universo? Do inopinado, respondi-lhe: - A profissão, não, mas uma das mais importantes, pra mim, é a do professor. Ele franziu o cenho, coçou o queixo e largou um hummmmmmmmmm: - Hummm, prefessor! Isso mermo, prefessor! E vou ser um dele dagora indiante! E saiu enumerando com ar de sua peculiar mania de grandeza cada uma das suas autossuficiências! No maior blá blá blá lá foi ele demonstrando que fazer, asas à imaginação: - A-há! Vou insiná cuma s’insina! Vou discarregá minha sabedoria com fúria, eu sou tranchan! Quero vê aluno porqueira num virá doutô da noite pro dia! Vou pegá no pé e mostrá quem qui é o dono da verdade! Verão do que sou capaz, senão será a cega Dedé! -, e lá estava ele reproduzindo a ideia de professor que eu vi demais na sala de aula e não gostaria de vê-lo nunca mais. Ele, no esbanjamento de suas aptidões nem tão valorosas assim, estava sendo o protótipo de todas as resistências, de todas as acomodações pautadas tradicionalmente, os velhos hábitos do depósito pra fabricar gente de verdade! Eu que estive dos dois lados da corda, nem bom aluno e muito menos razoável professor, descobri naqueles que se encaixaram bem na minha afeição, por sua forma de ministrar as aulas e de angariar a simpatia das turmas, o exemplo digno de ser seguido. Adorava aqueles - e que foram poucos - os que ao invés de punir ou castigar, ofereciam uma opção de escolha, uma oportunidade, ajudando a como eu poderia melhorar e ser melhor, promovendo e valorizando a criatividade, sinalizando o caminho das pedras na resolução de problemas. Idolatrei até, confesso, aqueles que me encaminharam a ter o prazer do conhecimento e da descoberta do saber, ensinando a como aprendar a pensar, a imaginar, a criar e, ao mesmo, oportunizado o aprendizado de melhor me expressar, a apreciar a beleza, a aprender a me relacionar comigo mesmo e com os outros, a lidar com as minhas emoções e a dos outros, e a discernir sobre os meus direitos e os direitos humanos. Descobri quando estava do outro lado, que professor é aquele que trabalha sem apoio algum mas apoiando, que amanhece recheado de esperanças e vai adormecer entediado de sobrecarga, porém, pelos que devotam a profissão de ser e não estar nela, são sempre persistentes, resiliente, sempre desrotulando e desmitologizando, tornando-se familiar e envolvendo a família, mostrando o lugar do outro, exercitando a poesia como uma prática pedagógica do equilíbrio e do lúdico no valor do choro (o estar no mundo) e do riso (o triunfo da vida). Esses saíram e me ensinaram a sair da prisão da igualdade para a liberdade da compreensão e da cooperação, corroborando com um outro olhar capaz de contemplar a aceitação, o reconhecimento e o respeito pelo outro e seus sentimentos, se importando comigo e com todos, realizando uma verdadeira comunhão. A esses, a minha eterna homenagem de gratidão. Sim, mas e o Doro? Ih, quase esqueci. Mergulhado nos meus pensamentos, logo ele me trouxe de volta pro agora com uma barulhada macha. Ah, ele roubou meus pensamentos dizendo que ia ser professor de inglês e castigou com veemência: - Vamo aprendê ingrêis que purtuguêis nós já sabe! E foi-se! Vamos aprumar a conversa? Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui

 Imagem: Die schlafende Ariadne auf Naxos (1808-1812), do pintor estadunidense John Vanderlyn (1775-1852).


Curtindo o álbum Underground System (1992), do compositor & multi-instrumentista nigeriano, Fela Kuti (1938-1997), o pioneiro da Afrobeat, ativista política e dos diretos humanos.


ANTES DO NASCER DO SOL – No livro Assim falava Zaratustra (Companhia das Letras, 1993), do filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900), destaco o trecho Antes do nascer do sol: Ó! céu desenrolado sobre mim! Céu claro e profundo! Abismo de luz! Ao contemplar-te estremeço de divinos desejos! Elevar-me à minha altura: eis a tua profundidade! Cobrir-me com a tua pureza: eis a minha inocência! O deus oculto na sua beleza: assim ocultas as tuas estrelas. Não falas: assim me anuncias a tua sabedoria. Mudo surgiste para mim sobre o fervente mar: o teu amor e o teu pudor revelam-se à minha alma fervente. Belo, vieste a mim, velado na tua beleza; mudo, falas-te-me, revelando-te na tua sabedoria: ó! como pude eu não adivinhar todos os pudores da tua alma! Antes do sol vir até a mim, o mais solitário. Somos amigos de sempre: as nossas penas são o fundo dos nossos seres, são-nos comuns; até o sol é comum. Não falamos porque sabemos demasiadas coisas: calamo-nos e entendemo-nos por sorrisos. Não és tu a luz do meu fogo? Não és tu a alma irmã da minha inteligência? Tudo aprendemos juntos; juntos aprendemos a elevar-nos sobre nós, e a sorrir, sem nuvens, para baixo, com límpidos olhos, desde remotas paragens, quando a nossos pés se desvanecem, como névoa vaporosa, a imposição, o fim e o erro. E quando eu caminhava só, de que tinha a minha alma fome durante as noites e nos caminhos do erro? E quando eu escalava montes, a quem procurava nos píncaros senão a ti? E todas as minhas viagens e todas minhas ascensões não passavam de um expediente e recurso da inércia. O que a minha vontade toda quer é voar, voar para ti! E que odiava eu mais do que as nuvens e tudo o que te empana? E odiava até o meu próprio ódio porque te empanava! Tenho aversão às nuvens, a esses gatos monteses que se arrastam: tiram-nos a ti e a mim o que nos é comum: a imensa e infinita afirmação das coisas. Nós outros temos aversão às rasteiras nuvens, a esses seres de meio termo e de composições, a esses seres mistos que não sabem nem bendizer nem maldizer com todo o seu coração. Preferia estar metido num túnel ou num abismo sem ver o céu, a ver-te a ti, céu de luz, empanado pelas nuvens que passam! E muitas vezes tenho sentido desejos de as trespassar com fulgurantes fios de ouro e rufar como trovão na sua pança de caldeira: rufar de cólera, visto que me roubam a mim a tua afirmação - céu puro! céu sereno! abismo de luz! - e roubam-te a ti em mim. Que eu prefiro o ruído e o troar e as execrações do mau tempo a essa calma medida e duvidosa de gatos. E "quem não sabe bendizer deve aprender a maldizer!" De um luminoso céu me caiu, esta máxima luminosa: - até nas escuras noites brilha esta estrela no meu céu. Eu, porém, bendigo e afirmo sempre, contanto que me rodeies, céu sereno, abismo de luz! A todos os abismos, pois, levo a minha benfeitora afirmação. Eu cheguei a ser o que bendiz e afirma; tenho sido um lutador a fim de um dia ter as mãos livres para abençoar. E a minha bênção consiste em estar por cima de cada coisa com o seu próprio céu, a sua redonda abóbada, a sua abóbada cerúlea e sua eterna serenidade: e bem aventurado daquele que assim abençoa! Que todas as coisas são batizadas na fonte da eternidade e além do bem e do mal; mas o bem e o mal mesmo não são mais do que sombras interpostas, úmidas aflições e nuvens passageiras. Há bênção certamente, e não maldição quando eu predico: "Sobre todas as coisas se encontra o céu Azar, o céu Inocência, o céu Acaso e o céu Ufania." "Por azar" é esta a mais antiga nobreza do mundo; eu a restituí a todas as coisas; eu as livrei da servidão do fim. Essa liberdade e essa serenidade celeste coloquei-as como abóbadas cerúleas sobre todas as coisas, ao ensinar que acima delas, e por elas, nenhuma "vontade eterna" queria. Eu pus, em vez desta vontade, essa petulância, essa loucura quando ensinei: Há uma coisa impossível em qualquer parte, e essa coisa é a racionalidade. Um pouco de razão, um grão de sensatez, disperso de estrela em estrela, é a levadura indubitavelmente misturada a todas as coisas: por causa da loucura se acha a sensatez misturada a todas as coisas! Um pouco de sensatez é possível: mas eu encontrei em todas as coisas esta benfeitora certeza: preferem bailar sobre os pés do acaso. Ó! céu puro e excelso! A tua pureza para mim consiste agora em que não haja nenhuma aranha, nem teia de aranha eterna da razão: em seres um salão de baile para os azares divinos, uma mesa divina para os divinos dados e jogadores de dados. Mas, sorris-te? Disse coisas indizíveis? Maldisse-te querendo abençoar-te? O que te faz sorrir é a vergonha de ser dois. Mandas-me retirar e calar, porque chega agora o dia? O mundo é profundo, e mais profundo do que jamais pensou o dia. Nem tudo pode falar diante do dia. Mas chega o dia. Separemo-nos então! Ó! céu desenrolado sobre mim, céu pudico e incendido! Ó! felicidade antecedente à saída do sol! Chega o dia. Separemo-nos!. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.


O USO DOS PRAZERES – No livro História da sexualidade 2 – o uso dos prazeres (Graal, 1984), do filósofo, historiador, filólogo, teórico social e crítico literário francês Michel Foucault (1926-1984), destaco os trechos seguintes: Para compreender de que maneira o uso dos aphrodisia é problematizado na reflexão sobre o amor pelos rapazes é preciso lembrar um princípio que, sem dúvida, não é próprio da cultura grega, mas que ali teve uma importância considerável e exerceu, nas apreciações morais, um poder determinante. Trata-se do princípio de isomorfismo entre relação sexual e relação social. Deve-se entender por esse princípio que a relação sexual - sempre pensada a partir do ato modelo da penetra­ção e de uma polaridade que opõe atividade e passividade - é percebi­da como do mesmo tipo que a relação entre superior e inferior, aquele que domina e aquele que é dominado, o que submete-e o que é sub­metido, o que vence e o que é vencido. As práticas de prazer são refle­tidas através das mesmas categorias que o campo das rivalidades e das hierarquias sociais: analogias na estrutura agonística, nas oposições e diferenciações, nos valores atribuídos aos respectivos papéis dos par­ceiros. E pode-se compreender, a partir daí, que há, no comportamen­to sexual, um papel que é intrinsecamente honroso e que é valorizado de pleno direito: é o que consiste em ser ativo, em dominar, em pene­trar e em exercer, assim, a sua superioridade.Daí as várias consequências a respeito do estatuto daqueles que devem ser os parceiros passivos dessa atividade. Os escravos, evidente­mente, estão à disposição do senhor: sua condição faz com que sejam objetos sexuais a respeito dos quais não há nada a questionar; a tal ponto que acontecia de se achar surpreendente que a mesma lei proi­bisse o estupro dos escravos e o das crianças; para explicar essa estranheza, Ésquines diz que se quis mostrar, ao proibi-la até mesmo com relação aos escravos, o quanto era grave a violência quando ela se dirgia às crianças de boa origem. No que diz respeito à passividade da mulher, ela marca muito bem uma inferioridade de natureza" e de con­dição; mas ela não deve ser reprovada como conduta posto que é, pre­cisamente, conforme ao que a natureza quis e ao que o status impõe. Em compensação, tudo aquilo que no comportamento sexual poderia acarretar para um homem livre - e ainda mais para um homem que, por sua origem, fortuna, prestígio, ocupa ou deveria ocupar posições privilegiadas entre os demais - as marcas da inferioridade, da domina­ção sofrida, da servidão aceita, só poderia ser considerado como ver­gonhoso: e vergonha ainda maior se ele se presta a ser objeto compla­cente dó prazer do outro. Ora, num jogo de valores regulado segundo tais princípios, a po­sição do rapaz - do rapaz de origem livre - é difícil. É evidente que ele está ainda numa posição “inferior” , no sentido em que está longe de se beneficiar dos direitos e dos poderes que serão seus quando tiver ad­quirido a plenitude de seu status. Não obstante, seu lugar não se super­põe ao de um escravo, evidentemente, nem ao de uma mulher. Isso já é verdade no contexto da casa e da família. Uma passagem de Aristóte­les na Política o diz claramente. Ao tratar das relações de autoridade e das formas de governo próprias à família, Aristóteles define, em rela­ção ao chefe de família, a posição do escravo, a da mulher e a do filho (homem). Governar escravos, diz Aristóteles, não é governar seres livres; governar uma mulher é exercer um poder “político” no qual as relações são de permanente desigualdade; o governo dos filhos, em troca, pode ser dito “real” porque ele repousa “sobre a afeição e a su­perioridade da idade” .60 De fato, a faculdade de deliberação falta no escravo; ela está presente na mulher, mas não exerce nesta a função de decisão; no menino, a falta diz respeito somente ao grau de desenvolvi­mento que ainda não atingiu seu termo. E se a educação moral das mulheres é importante posto que elas constituem a metade da popula­ção livre, a dos filhos homens o é ainda mais; pois ela concerne aos fu­turos cidadãos que participarão no governo da cidade.61 Vê-se bem: o caráter próprio da posição de um rapaz, a forma particular de sua de­pendência, e a maneira pela qual se deve tratá-lo, mesmo no espaço onde se exerce o poder considerável do pai de família, encontram-se marcados pelo status que será o seu no futuro. O mesmo ocorre, até certo ponto, no jogo das relações sexuais. Dentre os diversos “objetos” que são legitimados, o rapaz ocupa uma posição particular. Certamente ele não é um objeto proibido; em Atenas, certas leis protegem as crianças livres (contra os adultos que du­rante um certo tempo, pelo menos, não terão o direito de entrar nas escolas, contra os escravos que fícam sujeitos à morte se procuram cor- rompê-las, contra pais ou tutores que são punidos se as prostituem);“ mas nada impede nem proíbe que um adolescente seja aos olhos de to­dos o parceiro sexual de um homem. Não obstante, existe como que uma dificuldade intrínseca nesse papel: algo que ao mesmo tempo impede de definir claramente e de bem precisar em que consiste esse papel na relação sexual e que, contudo, atrai a atenção sobre esse ponto e faz com que se atrjbua uma grande importância e muito valor ao que. deve ou não se passar nessa relação. Existe nisso tudo, ao mesmo tempo, como que um ponto cego e um ponto de supervalorização. O papel do rapaz é um elemento para o qual converge muita incerteza e um interesse intenso. 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TABACARIA – No livro O eu profundo e os outros eus (Nova Fronteira, 1980), encontro o poema Tabacaria, do engenheiro e poeta português Álvaro de Campos, um dos heterônimos criados por Fernando Pessoa (1888-1935): Não sou nada. / Nunca serei nada. / Não posso querer ser nada. / À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo. / Janelas do meu quarto, / Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é / (E se soubessem quem é, o que saberiam?), / Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente, / Para uma rua inacessível a todos os pensamentos, / Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa, / Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres, / Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens, / Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada. / Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade. / Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer, / E não tivesse mais irmandade com as coisas / Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua / A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada / De dentro da minha cabeça, / E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida. / Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu. / Estou hoje dividido entre a lealdade que devo / À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora, / E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro. / Falhei em tudo. / Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada. / A aprendizagem que me deram, / Desci dela pela janela das traseiras da casa. / Fui até ao campo com grandes propósitos. / Mas lá encontrei só ervas e árvores, / E quando havia gente era igual à outra. / Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar? / Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou? / Ser o que penso? Mas penso tanta coisa! / E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos! / Gênio? Neste momento / Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu, / E a história não marcará, quem sabe?, nem um, / Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras. / Não, não creio em mim. / Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas! / Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo? / Não, nem em mim... / Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo / Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando? / Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas - / Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -, / E quem sabe se realizáveis, / Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente? / O mundo é para quem nasce para o conquistar / E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão. / Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez. / Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo, / Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu. / Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda, / Ainda que não more nela; / Serei sempre o que não nasceu para isso; / Serei sempre só o que tinha qualidades; / Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta, / E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira, / E ouviu a voz de Deus num poço tapado. / Crer em mim? Não, nem em nada. / Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente / O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo, / E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha. / Escravos cardíacos das estrelas, / Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama; / Mas acordamos e ele é opaco, / Levantamo-nos e ele é alheio, / Saímos de casa e ele é a terra inteira, / Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido. / (Come chocolates, pequena; / Come chocolates! / Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates. / Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria. / Come, pequena suja, come! / Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes! / Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho, / Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.) / Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei / A caligrafia rápida destes versos, / Pórtico partido para o Impossível. / Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas, / Nobre ao menos no gesto largo com que atiro / A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas, / E fico em casa sem camisa. / (Tu que consolas, que não existes e por isso consolas, /Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva, / Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta, / Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida, / Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua, / Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais, / Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê - / Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire! / Meu coração é um balde despejado. / Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco / A mim mesmo e não encontro nada. / Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta. / Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam, / Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam, / Vejo os cães que também existem, / E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo, / E tudo isto é estrangeiro, como tudo.) / Vivi, estudei, amei e até cri, / E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu. / Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira, / E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses / (Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso); / Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo / E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente / Fiz de mim o que não soube / E o que podia fazer de mim não o fiz. / O dominó que vesti era errado. / Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me. / Quando quis tirar a máscara, / Estava pegada à cara. / Quando a tirei e me vi ao espelho, / Já tinha envelhecido. /Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado. / Deitei fora a máscara e dormi no vestiário / Como um cão tolerado pela gerência / Por ser inofensivo / E vou escrever esta história para provar que sou sublime. / Essência musical dos meus versos inúteis, / Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse, / E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte, / Calcando aos pés a consciência de estar existindo, / Como um tapete em que um bêbado tropeça / Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada. / Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta. / Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada / E com o desconforto da alma mal-entendendo. / Ele morrerá e eu morrerei. / Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos. / A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também. / Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta, / E a língua em que foram escritos os versos. / Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu. / Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente / Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas, / Sempre uma coisa defronte da outra, / Sempre uma coisa tão inútil como a outra, / Sempre o impossível tão estúpido como o real, / Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície, / Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra. / Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?) / E a realidade plausível cai de repente em cima de mim. / Semiergo-me enérgico, convencido, humano, / E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário. / Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los / E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos. / Sigo o fumo como uma rota própria, / E gozo, num momento sensitivo e competente, / A libertação de todas as especulações / E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto. / Depois deito-me para trás na cadeira / E continuo fumando. / Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando. / (Se eu casasse com a filha da minha lavadeira / Talvez fosse feliz.) / Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela. / O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?). / Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica. / (O Dono da Tabacaria chegou à porta.) / Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me. / Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo / Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu. Veja mais aqui e aqui.

DE OLIMPIA ATÉ HOJE - A trajetória da premiadíssima atriz de teatro, cinema e televisão Denise Fraga, começou no teatro, no qual possui formação de mais de vinte anos de palco, seis deles na pele da empregada doméstica "Olímpia", da peça Trair e coçar é só começar, o seu maior sucesso no teatral. Ela estreou na televisão em 1987, na Rede Globo, participando de novelas, quadros, séries, entre outros. No cinema ela estreou no filme Um casal chamado paixão (1992), seguindo-se O efeito ilha (1994), Sonho (1995), Até a eternidade (1995), Lembrança do futuro (1996), Lápide (1997), O cineasta da selva (1997), Boleiros – era uma vez o futebol (1998), Por trás do pano (1999), O auto da compadecida (2000), Cristina quer casar (2003), Como fazer um filme de amor (2004), Boleriso 2 – vencedores e vencidos (2006), Os porralokinhas (2007), O signo da cidade (2007), As melhores coisas do mundo (2010), Hoje (2011) e As aventuras do homem invisível em mundo invisível (2011). Além de atriz, ela é comediante e mantem uma coluna no jornal Folha de São Paulo. Entre os prêmios da sua carreira, estão Prêmio de Melhor Atriz pela atuação em Cristina Quer Casar - 7º Festival de Cinema Brasileiro de Miami (2003), Prêmio de Melhor Atriz pela atuação em Por Trás do Pano no Grande Prêmio Cinema Brasil (1999), Kikito de Ouro de Melhor Atriz pela atuação em Por Trás do Pano – Festival de Gramado (1999), Prêmio de Melhor Atriz pela atuação em Felicidade é... – Festival de Brasília (1995), Prêmio de Melhor Atriz pela atuação em Por Trás do Pano – Festival de Havana (1999) e Melhor Atriz Teatral no troféu APCA/2008 pela atuação no espetáculo A Alma Boa de Setsuan. Veja mais aqui.

BEFORE SUNRISE – O filme Before Sunrise (Antes do Amanhecer, 1995), dirigido por Richard Linklater e escrito pelo direitos e por Kim Krizam. Conta a história de uma jovem francesa e um rapaz estadunidense que se encontra na Europa. Eles se encontram casualmente em um trem e despertam para uma paixão repentina. No dia seguinte, a jovem irá para Paris e o jovem voltará aos Estados Unidos. Ele, então, a convida para descerem do trem em Viena para um passeio que durará a noite toda, até o amanhecer. O destaque do filme vai para a belíssima atriz, roteirista, cantora, compositora e diretora de cinema, Julie Delpy. Veja mais aqui.

IMAGEM DO DIA
 The Three Graces,as três deusas da mitologia grega antiga chamada Graças, conhecidas em grego como as Charites. Originalmente deusas da natureza, elas chegaram a ser geralmente consideradas como companheiras de Afrodite (Vênus), a deusa do amor e da beleza. De acordo com a tradição poética e literária, as Graças eram em número de três, e seus nomes eram Euphrosyne, Thalia e Aglaia. Eternamente jovens e adoráveis, elas representavam charme, beleza e criatividade humana, e foram retratadas nus, originalmente segurando atributos tais como maçãs, rosas e ramos de murta. As três deusas estão ligados entre si em um anel, abraçados pela cintura ou no pescoço para formar uma cadeia graciosa.


Veja mais no MCLAM: Hoje é dia do programa SuperNova, a partir das 21hs, no blog do Projeto MCLAM, com apresentação sempre especial e apaixonante de Meimei Corrêa. Em seguida, o programa Mix MCLAM, com Verney Filho e na madrugada Hot Night, uma programação toda especial para os ouvintes amantes. Para conferir online acesse aqui .


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CHRISTINA VASSILEVA, KATHERINE JOHNSON, MARTÍN-BARÓ, JOÃO CABRAL & MATA SUL INDÍGENA

    Imagem: Acervo ArtLAM . Ao som dos álbuns Mistérios do Rio Lento (The Voice of Lyrics, 1998), Santiago de Murcia: a portrait (Frame,...