DO QUE FUI PRO QUE SOU - É
festa no céu, tê teteretê tê teteretê! Não fui convidado: quem é coxo parte
cedo, nem pude como o sapo me esconder na viola do urubu. O passado quer falar:
caretas de bumba-meu-boi e do cavalo marinho no meu repente desentoado. Menino levado,
sou inteiro dentro das minhas próprias malas: sou como quem levasse o levado e
como querem o pé-direito duplo, sou da queda com meu estreito convívio com a mais
surda obscuridade da inquisição dos cínicos de nascença e delatores da moral e
bons costumes, irresponsavelmente mentirosa na caça às bruxas – meus esgares de
compaixão com as aflições ou júbilos da conduta vazia e equivocada humana com
seus vícios e virtudes na minha desencontrada e a gradativa existência. Não tenho
mais minha mãe para minimizar minhas travessuras e incoerências: cabra-cabiolé,
Cumadre Fulosinha, saci pererê. Falam-me da oração da cabra preta, do justo
juiz, de bentidos e excelenças: são todos indiferentes como a parede, porta ou
chuva. Na verdade, quase não tenho mais ninguém a favor, só algozes no que faço
de mim mesmo. Nem sou absolvido por mim. Sou amarelo, laranja, vermelho, verde,
azul anil índigo e violeta, sem ressentimentos, ajeitando os remendos
deliberados que me aparecem da tapeçaria do apocalipse entre utopias paradisíacas,
medos e esperanças. Fiz até o que não quis, fiz e me odiava no dia seguinte, coisas
da vida que nem sei como era e que aconteceu, como se a burrinha do padre se
desfizesse do encanto e me embalasse na sua nudez. Eu vou no meu voo, futuro algum,
esperança alguma, só rodeios, abatido ou eletrocutado, um precursor que errou seu
próprio caminho. Todo mundo erra, só errei demais. Até quando acertei foi um
erro, não era. Fui adiante e errei de novo, errei sucessivamente, cheguei tarde
demais e malsucedido entre os que fraquejaram pelos cinco continentes do
planeta: sou protagonista no lar do meu espólio, sou água na minha solidão sem
compensações, Prometeu agrilhoado na montanha. Lá se vão o garrote Jauaraicica,
o boi pintadinho, o boi Espácio, não sei mais o que perdi - Ulisses sem Ítaca,
pau pra toda obra. No meio do fugaz, tudo passou: pudera, tudo é idológico, há
incertezas demais – o risco, o limite – não há limites para fantasia, paciência,
não se pode abusar da insensatez. Até quero crer ser possível, como Berlioz, a
minha alma gêmea no Vesúvio. Sou meu próprio atelier, minha religião é a arte,
tenho espiritualidade. O passado quer falar e Cascudo exorta: elevai os corações!
Pra mim, tudo é continuidade. E vou voo. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais aqui.
Curtindo o álbum
Rapsódia Rock In Concert (EMI-Odeon, 1990), do guitarrista, compositor,
produtor musical e arranjador Robertinho
de Recife.
PESQUISA
[...] A interdisciplinaridade aqui, particularmente
pensada na relação texto e imagem, propõem-se a reforçar as possibilidades de
tornar o público leitor um criador, participante das ideais apresentadas,
potencializador de suas poéticas, proponente de novas questões. [...].
Trecho
extraído da obra Novíssima arte brasileira:
um guia de tendências (Iluminuras/MAC-USP/Fapesp, 2000), da escritora e crítica
de arte, PhD em artes interdisciplinares pela UNY e professora Katia Canton.
LEITURA
Tentarei ser os seus olhos, Jorge. Sigo o conselho
quevocê me deu, quando nos despedimos: “Escribe, yrecordarás”. Tentarei
recordar, com exatidão desta vez. Para que você possa enxergar o que eu vi,
desvendar o mistério e chegar à verdade. Sempre escrevemos para recordar a
verdade. Quando inventamos, é para recordá-la mais exatamente. [...] O corpo formava a letra V, disse eu não
tinha dívida. Mas qual era a sua posição? Estava com a bunda, ou o vértice do
V, encostada num dos espelhos que cobriam a parede do quarto. Era isso, a bunda
contra o espelho. [...].
Trechos extraídos da obra Borges e
os orangotangos eternos (Coampanhia das Letras, 2000), do escritor,
cartunista, tradutor, roteirista e autor teatral Luís Fernando Veríssimo. Veja mais aqui e aqui.
PENSAMENTO DO DIA:
[...] Sempre
que sinto na boca uma amargura crescente; sempre que é um novembro úmido e
chuvoso em minha alma; sempre que me percebo detendo-me involuntariamente
diante de empresas funerárias, ou aumentando a fila de todo funeral que
encontro; e especialmente sempre que minha hipocondria passa a me dominar de
tal forma que é preciso um sólido princípio moral para evitar que saia às ruas
e passe sistematicamente a atirar ao chão os chapéus de todos que vejo – então calculo
que é boa hora de fazer-me ao mar, o mais cedo possível. Com um floreio filosófico,
Catão atira-se sobre uma espada, eu calmamente vou para o navio. [...]
Trecho extraído da obra Moby Dick, ou a baleia em Londres (1851), do escritor e
aventureiro estadunidense Herman
Melville (1819-1891). Veja mais aqui, aqui e aqui.
IMAGEM
DO DIA
[...] Quem não
reage, rasteja. Era o lema. O velho acreditava no barulho dos maldizeres, aí a
vida ganhava um sentido mínimo, aí fazia‑se a luz, sua própria labareda bíblica,
o fulgor, o barato. [...].
Trecho
da obra Big Jato (Companhia das
Letras, 2012), do escritor e jornalista Xico
Sá, adaptado para o cinema com direção de Claúdio Assis e com a sempre
excelente arte do ator e diretor Matheus Nachtergaele. Veja mais aqui.
Veja mais sobre Nascente: Crônica de amor por ela, Claude
Debussy, Bertrand Russel, Dorothy Parker, Antonio Callado, Angela
Hewitt, Ruy Guerra, Marina
Lima, Francisco Rebolo, Contos árabes, Dançaterapia, Agostino Carracci, Claudia Raia, Teatro Espontâneo & Psicodrama
aqui.
DESTAQUE
Todo dia é dia da atriz e cantora Simone
Gutierrez.
CRÔNICA DE
AMOR POR ELA
Arte do pintor russo Andre Kohn.
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na Terra
Recital Musical Tataritaritatá - Fanpage.