A SOLIDÃO DE TRAKL - A infância
de um semi-nascido em Salburgo e os primeiros problemas emocionais: encarou as
estranhices comportamentais da mãe e a morte prematura do pai, ambos
protestantes. Arrimo de família muito jovem e a adolescência sustentada pela misantropia
de poemas, com doses de ópio, clorofórmio, veronal e cocaína, entre animais
azuis e o sono branco, um tempo remoto de terror e desalento. Os arroubos
incestuosos com a irmã, o seu grande amor. Suas cartas destruídas, entre poemas
refeitos e remontados a todo instante. A profunda angústia dos versos de Transfiguração. Outros como De Profundis,
Crepúsculo de Inverno, Calma e Silêncio, Maranas gatona, Nascimento, Aos
Emudecidos, e muitos que
sobreviveram entre declínios e ocasos, desintegração e ruinas, decomposição e
morte. Tornou-se farmacêutico profissional e atuou durante a guerra. Não
havia remédios, nada poderia fazer, só o nexo entre a loucura de Hölderlin e o
desespero de Celan. Presenciou o enforcamento de desertores e um suicídio. E
diante do tanto de mortos e feridos, cambaleou com seu espírito já debilitado, nos
versos de Grodek: À tarde soam as florestas outonais/ De armas
mortíferas, as planícies douradas. / E lagos azuis, por cima do sol/ Mais
sombrio rola; a noite envolve/ Guerreiros em agonia, o lamento selvagem/ De
suas bocas dilaceradas./… Todos os caminhos desembocam em negra putrefação...
Sua vida amargurada entre as drogas e poesia, a solidão e a doença do mundo, nos
versos de Lamento: Sono e morte, as tenebrosas águias/ Rodeiam noite
adentro essa cabeça:/ A imagem dourada do Homem/ Engolida pela onda fria/ Da
eternidade... Em medonhos recifes./ despedaça-se o corpo purpúreo/ E a
voz escura lamenta/ Sobre o mar./ Irmã de tempestuosa melancolia/ Vê, um barco
aflito afunda/ Sob estrelas,/ Sob o rosto calado na noite... A imagem dourada
e o corpo purpúreo, tudo despedaçado. Uma dose violenta overdose de cocaína aos
vinte e sete anos no ocidente poente, tombando em definitivo durante sua
internação na Cracóvia. Veja mais abaixo e muito mais aqui e aqui.
DITOS & DESDITOS - Tudo o que você
precisa para obter clareza, você deve começar com os olhos abertos. A maior
tarefa da filosofia é ampliar nosso senso de possibilidade. O tribalismo sempre
tornará o seu mundo menor; o universalismo é a única maneira de
expandi-lo. Crescer significa perceber que nenhum momento da vida é o melhor e
decidir saborear cada segundo de alegria ao seu alcance. Você sabe que cada
um passará e não considerar mais isso uma traição. Pensamento
da filósofa estadunidense Susan Neiman. Veja mais aqui, aqui e aqui.
ALGUÉM FALOU: Quando vozes únicas se unem por uma causa comum,
elas fazem história. A empatia é a mais radical das emoções humanas. O primeiro
problema para todos nós, homens e mulheres, não é aprender, mas desaprender. O
futuro depende inteiramente do que cada um de nós faz todos os dias; um
movimento é apenas pessoas se movendo. Pensamento escritora, jornalista e ativista estadunidense Glória
Steinem. Veja mais aqui, aqui e aqui.
VIAJANDO PARA O INFINITO –
[...] Claramente
aqui estava alguém, como eu, que tendia a tropeçar na vida e conseguia ver o
lado engraçado das situações. Alguém que, como eu, era bastante tímido,
mas não avesso a expressar as suas opiniões; alguém que, ao
contrário de mim, tinha um senso desenvolvido de seu próprio valor e teve a
ousadia de transmiti-lo. [...] Viver cada dia conforme ele acontecia,
em vez de projetar alguma miragem fantasiosa num futuro distante, estava se
tornando um modo de vida. [...] Digo a você o que sempre digo quando as
coisas não podem ser alteradas: conte suas bênçãos. [...] Durante
esses longos períodos de contemplação solitária num cenário de beleza tão
dramaticamente assustadora, fui dominado por ondas de solidão. [...] Depois
daquele dia decidi que nunca mais dependeria de outras pessoas. No entanto, colocar
essa resolução em prática foi mais fácil de falar do que fazer. [...] No meu
estado de espírito simples e pós-natal, estava convencido de que se o mundo
fosse governado pelas mães de bebés recém-nascidos, em vez de velhos
endurecidos que incitam jovens impetuosos à violência, as guerras cessariam da
noite para o dia. [...] Viva no presente, disse ele, e confie em Deus
através da escuridão, da dor e do medo. Então, como ele citou a passagem bíblica
de Coríntios "Deus não permitirá que você seja provado mais do que você
pode [...]. Trechos extraídos da obra Travelling to Infinity:
My Life with Stephen (Alma Books, 2013), da
educadora e escritora britânica Jane Hawking.
QUATRO POEMAS - MEU CORAÇÃO AO CREPÚSCULO - No crepúsculo ouve-se o
grito dos morcegos. \ Dois cavalos saltam no gramado. \ O ácer vermelho
sussurra.\ Ao andarilho surge no caminho a pequena taberna.\ Maravilhoso o
sabor de vinho novo e nozes.\ Maravilhoso: cambalear bêbado na floresta
crepuscular.\ Pelos galhos negros ressoam sinos aflitos.\ No rosto pinga
orvalho. DE PROFUNDIS - Há um restolhal, onde cai uma chuva negra.\ Há uma
árvore marrom, ali solitária.\ Há um vento sibilante, que rodeia cabanas
vazias.\ Como é triste o entardecer\ Passando pela aldeia\ A terra órfã recolhe
ainda raras espigas.\ Seus olhos arregalam-se redondos e dourados no
crepúsculo,\ E seu colo espera o noivo divino.\ Na volta\ Os pastores acharam o
doce corpo\ Apodrecido no espinheiro.\ Sou uma sombra distante de lugarejos
escuros.\ O silêncio de Deus\ Bebi na fonte do bosque.\ Na minha testa pisa
metal frio\ Aranhas procuram meu coração.\ Há uma luz, que se apaga na minha
boca.\ À noite encontrei-me num pântano,\ Pleno de lixo e pó das estrelas.\ Na
avelãzeira\ Soaram de novo anjos cristalinos. SALMO - Há uma luz que o vento
apagou. \ Há uma taberna, de onde à tarde sai um bêbado.\ Há um vinhedo,
queimado e negro com buracos cheias de aranhas.\ Há um aposento que caiaram com
leite.\ O louco morreu. Há uma ilha do mar do sul\ Para receber o Deus Sol.
Rufam os tambores.\ Os homens executam danças guerreiras.\ As mulheres balançam
os quadris em trepadeiras e flores de fogo\ Quando canta o mar. Oh, nosso
paraíso perdido.\ As ninfas abandonaram as florestas douradas.\ Enterra-se o
desconhecido. Então cai uma chuva cintilante.\ O filho de Pã surge na figura de
um trabalhador rural\ Que dorme ao meio-dia no asfalto em brasa.\ Há mocinhas
num pátio com roupinhas pobres que dilaceram o coração!\ Há quartos repletos de
acordes e sonatas.\ Há sombras que se abraçam diante de um espelho embaçado.\ Nas
janelas do hospital aquecem-se convalescentes.\ Um vapor branco no canal traz
sangrentas epidemias.\ A irmã desconhecida ressurge nos sonhos ruins de alguém.\
Descansando na avelãzeira, brinca com as estrelas dele.\ O estudante, talvez um
sósia, contempla-a longamente da janela.\ Atrás dele está o seu irmão morto, ou
desce a velha escada em espiral.\ Na escuridão dos castanheiros empalidece a
figura do jovem noviço.\ O jardim cai a noite. No claustro esvoaçam os
morcegos.\ Os filhos do guardião param de brincar e procuram o ouro do céu.\ Acordes
finais de um quarteto. A pequena cega atravessa a aléia tremendo,\ E mais tarde
sua sombra tateia frios muros, envolta em contos de fadas e lendas sagradas.\ Há
um barco vazio, que à noite desce o negro canal.\ Na sombriedade do velho asilo
desmoronam-se ruínas humanas.\Os órfãos mortos jazem no muro do jardim.\ De
quartos cinzentos saem anjos com asas sujas de excrementos.\ Vermes gotejam de
suas pálpebras amareladas.\ A praça da igreja está escura e silenciosa, como
nos dias da infância.\ Sobre solas prateadas deslizam vidas passadas,\ E as
sombras dos condenados descem às águas soluçantes.\ No seu túmulo o mágico
branco brinca com suas serpentes.\ Silenciosos sobre o Calvário, abrem-se os
olhos dourados de Deus. HUMANIDADE - Humanidade posta ante abismos de chama,\Um
rufo de tambores, frontes de guerreiros tenebrosos,\ Passos pela névoa de
sangue; negro ferro exclama;\ Desespero, noite em cérebros pesarosos:\ Aqui a
sombra de Eva, caça e rubra dinheirama.\ Nuvens que a luz atravessa, vespertina
refeição.\ Em pão e vinho deve um doce silêncio residir.\ E aqueles lá
reunidos, doze são.\ À noite sob ramos de oliveira gritam ao dormir;\ São Tomé
mergulha na ferida a mão. Poemas do
poeta expressionista austríaco Georg Trakl (1887-1914). Veja mais
aqui, aqui e aqui.