TRÍPTICO
DQP: Uma: Baião das encruzilhadas - O que sou de ressurreto entre ambívios e malogros, meus sentimentos
gotejam no caos, no meio de um torneio de ventos. Errei demais da conta e, da
jornada do herói, a única lição: errar sempre para acertar. Não há fórmula
mágica. Afinal, já dizia Umberto Eco: Nem todas as verdades são para
todos os ouvidos, nem todas as mentiras podem ser reconhecidas como tais...
Assino embaixo. Claro, viageiro das
estrelas nuas, com todos os escombros e precipícios: porque todo ato é imperfeito
e implora por ajuste – pior os casuísticos, já nascem natimortos. Resta ouvir Susan Neiman: O banal
não despedaça o mundo, o compõe... Há quem desespere da bifurcação e do ambíguo, o medo do sacrifício. Ah,
não! Encruzilhadas tantas quantas, prefiro adiante e pro leste, se possível;
senão, fazer por onde. Já me julguei preparado para o que nem
precisava. Aprendi o silêncio e me encontrei inteiro: uma vírgula e eu, outras a
mais... Estava pronto para ficar só, a emendar, ou
melhor, empiorando mais o já ruim. Pois é, ainda tem como ficar péssimo além da
conta. Torço pelo contrário, vambora...
Pelo
rio mais deteriorado... – (Imagem
Acervo ArtLAM) - Sim. É o caso do vizinho que vivia só no final de semana. Nos
dias de feira só o via às noites das sextas, não mais. Era casado, segundo ele
mesmo, com a Víbora da sobrancelha violinista, esse o apelido dela: a vozinha
aguda de rabeca desafinada aos resmungos das calçadas. Mantinha com ela uma quebra
de braço, dizia reiteradamente. É que pra ele ela era careca e viúva negra,
quando cerrava o cenho era a hora do golpe. Ele esperto, ora, não baixava a
guarda. Tomava umas e outras quase todas só para o exercício de esquentar a mão
no maluvido alheio e torcer que, com isso, surgisse, no mínimo, um canivete que
fosse para renovar o sangue. Para ele: sangue preso mata, tá doido! Ficava em
forma para enfrentar a megera! A filha do casal, a menina dos olhos dele. Sim,
até o dia em que ela brincou de escrever com uma pedra pontiaguda na lataria do
automóvel recém comprado, zero quilômetro. Oxe! Ela tinha apenas dois anos. Ele
chegou nela com um safanão bruto, pisou-lhe a mão com fúria, esmagando-a. No
pronto socorro: Por mim amputava! E foi isso mesmo. Quase três anos depois, separado
da esposa e morando longe, a filhinha chorosa foi visitá-lo e aproximou-se
dele: Papai, quando minha mão crescer de volta, eu vou trabalhar para comprar
outro carro novo pro senhor, viu! De soslaio, nenhum remorso, nem deu ouvidos,
indiferente como o Pirangi de Pelópidas.
Disfarçou o pior - ódio, cada qual seu jeito, como dizia Nuria Amat: Cada povo se comporta como se tivesse chegado ao fim da história...
Agora eu não sei quem você é. Se você existe, se você
não existe, se você é um homem fantoche ou pesadelo... Era a vez de Marie Under: Uma pessoa nunca repara o que foi
feito, mas sim o que ainda precisa ser feito... E Perse queria levar belas
palavras ao coração humano. Ah, o horror de viver passou da conta até a
exaustão do deus de todos na paz tumular dos inimigos insones com suas formas
de copular amálgamas levados pela desfiguração do cenário. Ademais,
como diz Caio Fernando Abreu: O resto é engano, meu filho, é perdição.
Nada demais, não são apenas os outros, cada um
de nós, coisa complicada...
Intermezzo...
– (Imagem: Acervo ArtLAM) - Havia o
intervalo e ela Chloé era o
improviso: ela havia chegado como se tivesse visto a esperança brilhar na rua
Sol. Mas não disfarçou a profecia: confusão das estações, corrupção dos homens,
decadência das classes sociais, maldade, relaxamento dos costumes. Eita, resumo
das manchetes do noticiário de hoje? Não, há milênios profetizou a deusa trina
da religião da Wicca e da guerra celta, Morrigu, durante a narrativa das vésperas
da Segunda Batalha de Moytura! Parece com os dias atuais, né! Sim, como nos
salvaremos, ora, o Doomsday Clock
está aí contando os segundos que restam. Ou façamos como o historiador romano
Sofrônio Eusébio Jerônimo, o Jeronimo de
Estridão: Quid salvum est si roma
petit... Ironicamente citou o epitáfio do Rubem Braga: De volta às
cinzas... Respondi-lhe Dorothy Parker: Desculpe a poeira... Ela
tentou disfarçar e recitou A mão – esse pássaro
digital, de Ladjane Bandeira: Te sou limite de exigências e ansiedades \ se
me constrange a servidão quando te afastas \ por meu domínio temporal. \ Minha
lucidez te fere e injusta sou\ se em confusão também me gastas.\ Se hesito,
vens a mim\ e na firmeza \ tenho inteira e súbita tua luz carnal \ no limiar do
acontecer de transgredir-me\ nessas tão nossa hegemonia instrumental... Parecia
um tanto desolada, não se conteve e me abraçou pressurosa sussurrando palavras
enlouquecidas para que eu a amasse ali mesmo, urgentemente. Tomei-a em minhas
mãos, e soletrei o seu nome infinito com todas as
minhas confissões à socapa. Suas mãos viçosas rondavam o que amanheceu em mim,
misturando suores e salivas, e tocou minha alma com o hausto de êxtase lambendo
o meu sexo na alvorada dos seus lábios de pajem magnífica, a me determinar levá-la
lauta ao ergástulo, confiscando-a, rechaçada e fausta pro meu apetite, enquanto
investia a dilapidá-la por baixo das suas vestes, desnudando-a
para ter-lhe a cachoeira de sua fonte
hibernando a volúpia – da vilegiatura ao êxtase, arqueando triunfal para que eu
me enterre na sua terra pura que hoje tem e depois também. Aí lavrei em sua
carne noturna o poema com meus versos mortais por suas margens curvas, o
convexo ventre e sua joia côncava rutilante, a brindar no seu cálice auspicioso,
o seu alvo imperecível, seu hangar - bendita seja a sua peçonha porque sou
viciado Príapo para acicatá-la plenipotenciária, destra e retesada, atravessada
adepta nas proezas que nunca envelhecerão, porque nela sou constante estado de
graça, amanhã eu não sei. Até mais ver.
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