COM
QUANTOS DESAFOROS SE FAZ UMA ELEIÇÃO
- Quando Alagoinhanduba teve a sua primeira eleição pros cargos de prefeito e
vereadores, as lideranças políticas da região não davam muita bola, nem a menor
importância pro município. Era que o usineiro e os caciques da cana estavam
envolvidos com a política de outras cidades mais próperas, deixando a
localidade sem nenhuma representação no estado. Como foi emancipada no meio de
uma tuia de outros tantos distritos do Brasil afora, era chegada a vez dali
começar a ter a sua própria administração pública. E não podia ser diferente do
país do Fecamepa: em terra de bandido todo mundo é artista, até que se
prove em contrário. Assim foi. O primeiro candidato que apareceu foi,
evidentemente, o Doro. Todavia, foi rejeitado por não ter partido que o
legitimasse. – Tumém, eu quero é sê prisidente, coisa de prefeitura é pra
calunga! -, dizia ele minimizando a rejeição. Nas carreiras, dois partidos
foram arranjados na hora e com o resultado das pesquisas, as duas pessoas mais
conhecidas e populares do lugar, eram, justamente, os dois inimigos Zés: Peiúdo
e Corninho. É que Zé Peiúdo detinha o sistema de comunicação do lugar com a sua
rede de altofalantes que ele denominava de Alagoinhanduba FM, informando e
entretendo a mundiça, quando não inventando ocorridos para deixar tudo de
cabelo em pé. Já o Zé Corninho só tinha de serviço prestado à população as
gaias que levava das trocentas mulheres dele, sustentando uma tuia de filhos
que julgava seu, o que era um grande beneficio pra maioria dos marmanjos que
lavava a jega nas esponsais do distinto. Daí é travado o embate eleitoral.
Peiúdo se aproveita de seu aparato midiático, ainda arranhado pela rixa criada
no torneio de chimbras e outras barroadas de ânimos, pra descascar a alma de
Corninho. Sem saber o que fazer, Corninho devolvia no mesmo tanto todas as
infâmias e engalobagens do desafeto. Pra deleite da plateia eleitora, a guerra
de xingamentos estava travada sem previsão de trégua nem tão cedo. A turma
maloqueira apostava quem ganhava dos dois em desancar, um ao outro, com
infamantes ofensas, apelidos e pilhérias jogadas pra queimar mais lenha. Isso
até dois dias antes da eleição, quando o buruçu estava além de todos os limites
improváveis, um juiz ineivado foi designado pelo TSE para presidir o pleito,
chamando os dois em reunião de portas fechadas: - Vocês estão pensando que este
país não tem lei? Prendo os dois e não tem mais eleição! Os dois saíram murchos
com o rabinho entre as pernas. Bastou o magistrado dar as costas e o teitei da
esculhambação esborrou na primeira esquina. Juras de morte estavam acertadas
pra depois da apuração. Quando as urnas foram encerradas, um minuto depois saiu
o resultado: 85% dos eleitores foram pra praia e preferiram justificar o voto
lá mesmo. Dos 15% que botaram fé, 70% optaram por Zé Corninho, 20% votaram em
branco e os 10% restante sufragaram no Peiúdo. – Fui roubado! -, gritou na hora
o derrotado. E agarrou no palitó duns advogados que deram entrada na hora no
pedido de recontagem de votos. O juiz indeferiu. Requereu anulação da votação,
indeferido. Aí foi a hora do golpe baixo: deu entrada com uma queixa crime por
calúnia, difamação e ameaça de morte. Tudo feito numa celeridade nunca vista, a
ponto do juiz, já arrumando as malas pra zarpar, acatou o pedido, revogando a
vitória do Zé Corninho e dando por vitorioso do pleito, o segundo colocado: Zé
Peiúdo tornou-se o primeiro prefeito. Como antes, Corninho ganhou, mas não
levou de novo. Logo depois da posse, os sete vereadores eleitos requereram
reunião emergencial com ele. Do que se trata? Sem a menor cerimônia, ali mesmo,
o Robimagaiver, eleito na hora presidente da Câmara e representando os demais
parlamentares municipais presentes, sapecou: - Di tudo que rolá a genti qué
meio a meio! Cuma? Rachá cum a genti tudinho! Tá doido? Qué guverná? Dou vinte
do por fora! Metade de tudo, ou nada. Nada. Vamu impichimá-lo. O que? Destá. Passaram
o piche nele. Oxe, saíram pra uma reunião extraordinária na Câmara de
Vereadores e saíram com o pedido de impeachment
do prefeito na hora! Como os gaiatos da cidade não iam lá muito com a cara do
Zé Peiúdo, apoiaram na hora a causa e a troçada ganhou as ruas. Apareceu nego
até de um olho só pra dar vulto na manifestação. Lá vai o enterro voltando. E
não adiantou uma tuia de advogado pra barrar a desfeita. Ao cabo de uns três
meses depois, foi dado entrada um abaixo assinado com mais de um trilhão de
assinaturas no TSE. Até os defuntos saíram do cemitério injuriados e votaram
duas vezes no troço – afora todos os bichos de estimação que entraram na valsa
com seus escrutínios. O rebuceteio geral ficou feio e com mais uns dez meses Peiúdo
foi deposto por ordem da Justiça. Lá vinha Zé Corninho nos braços do povo pra
governar na maior ovação: - Toma o lugar que sempre foi seu! Contudo, meleca de
respeito não só fede na hora, deixa a inhaca indo e voltando no vento. Astuto
como sempre, Peiúdo não economizou nos ardis e saiu catando broncas do inimigo:
pensão alimentícia. Até mulher que nunca nem tinha visto Corninho deu entrada
em pensão alimentícia, afora uma penca de bruguelo que ele sequer sabia que
existia, impetrou uma série de ações de investigação de paternidade, exigindo o
reconhecimento e os respectivos alimentos. Quando o juiz viu o monturo de ações
judiciais contra o prefeito, não teve dúvidas: caçou o seu mandato e mandou
prender o desgraçado: - Isso não é gente, é um monstro irresponsável! Reassume
Peiúdo mangando dos vereadores e de toda população. O povo revoltou-se! E mesmo
que ele tivesse ganhado a maior bolada da loteria, não dava pra distribuir
dinheiro pra meio mundo de gente que queria esfolá-lo vivo, dele fugir às
carreiras dali pra nunca mais. Pronto! Vacância no cargo, assume Robimagaiver
que nunca imaginara tornar-se prefeito. Tanto que com tamanha alegria o cara não
se conteve e foi acometido de um aluamento dele parar por uns meses num
manicômio: - Eu sou prefeito! Eu sou prefeito! E os outros vereadores? Sumiram.
Ninguém quis pegar aquela batata quente! Final da resenha: os dois candidatos
depostos, o presidente da câmara endoidado, vereadores que picaram a mula, nova
eleição foi decretada. Como não tinha candidatos, foram bater atrás do delegado:
- Ah, ele só aparece aqui uma vez por mês, quem manda aqui é o escrivão que deu
entrada na aposentadoria. E o bispo? Esse só aparece uma vez por ano e olhe lá.
E agora? Todo mundo se livrava da bronca: bastava uma cara feia e quem
estivesse no poder era derrubado. Por conta disso, duas coisas aconteceram: os
partidos se organizaram e providenciaram uns paraquedistas que se estabeleceram
ali pro próximo pleito eleitoral e, enquanto isso, foi nomeado um juiz arretado
que só saía pela rua: - Teje preso! E vamos aprumar a conversa! © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais aqui.
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