A
EDUCAÇÃO NOSSA DE CADA DIA
- Para todo lugar que a gente se vire, seja na esquina, nos auditórios, nos
holofotes, nas fofocas, onde quer que seja, uma unanimidade: a educação é
fundamental para melhorar o ser humano e a realidade no mundo em que vivemos. E
isso é repetido a torto e a direito: é preciso investir maciçamente na educação
para melhorar a humanidade. Por conta disso, como todo mundo fala, vou também
colocar o meu bedelho no assunto. Cá pra nós, é evidente que a educação não
será jamais a panaceia para todos os males da sociedade, mas indubitavelmente é
o alicerce fundamental para um melhor encaminhamento da humanidade, como também
para resolver um bocado de bronca oriunda de equívocos e desinformação no
Brasil. Nisso todos concordamos. Principalmente quando se procura saber qual o
problema da educação brasileira. Usualmente esse problema é visto de uma forma
maniqueísta e, diga-se de passagem, bastante reducionista, colocando-se como apenas
dois: os alunos não querem saber de pirocas nenhuma, quanto mais estudar; ou os
professores estão naquela do Vampeta: fingem que ganham altos salários,
fingindo que ensinam. Quer dizer, colocam a culpa do fracasso escolar ou no
aluno, ou no professor. E só. Quando muito, uma visão um pouco mais
esclarecida, ao que parece, grita a necessidade de maior investimento em
educação. Bem, ao que se sabe, oficialmente, o Brasil investe 5,7% do Produto
Interno Bruto (PIB), o que representa, segundo a Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econônico (OCDE), R$ 5,5 trilhões e que está acima da média
dos países mais desenvolvidos do planeta. Tá. É muito? Não, todo mundo está
careca de saber que é pouco. Todavia, melhor a gente dá uma olhada mais acurada
para ver se é isso mesmo o nó do problema. Analisemos friamente: o que os
alunos da educação básica até o ensino superior esperam da educação são
conteúdos importantes e diretamente relacionados com a sua realidade, aulas
dinâmicas e preparação para a vida, pro trabalho e pra vida. Sim. O que os
professores esperam da educação é uma valorização profissional, estabilidade e
condições dignas de existência, estrutura adequada pro desempenho de suas
funções, alunos aplicados e ambiente horizontal nas relações hierárquicas. Certo.
Quanto ao investimento governamental na educação pública brasileira é uma coisa
a se considerar, vez que a gente também está careca de saber que existe muita
tramoia desviando a finalidade das verbas públicas em tudo quanto é área de
responsabilidade governalmental. Não é à toa que o Brasil é o país da espórtula
e do vamos nos arrumar. Então, vamos colocar mais gente na roda para avaliação
melhor, ou seja, vamos colocar os pais, a comunidade e a sociedade nesse
contexto. Os pais depositam total responsabilidade pela educação dos filhos na
escola, esquecendo-se - para não dizer eximindo-se - das suas próprias
responsabilidades a respeito, se livrando dos filhos como se os sacudisse em um
turno ou tempo integral lá dentro, dizendo: tomem esse troço e dêem um jeito aí
nessa bronca, a responsabilidade é de vocês, se virem! Esse também é o desejo
da comunidade e, por tabela, de toda sociedade. Ninguém quer segurar no bico do
bule para ver o quanto está fervendo, joga a responsabilidade pros outros. Por
conta disso, os pais esperam que a escola faça dos seus presepeiros e
indomáveis pupilos, gente quieta, obediente, direita e promissora, capazes de
lhes proporcionar orgulho no futuro. Entretanto, há uma coisa a ser dita:
educação não é só depósito de conteúdo, condicionamento, reforço, aperto no
disciplinamento, meritocracia e religiosidade. Educação é muito mais. Já a
escola com seus altos muros quase impenetráveis, fechada e sem diálogo com a
comunidade, muito menos com a sociedade, precisa ser vista: é lá que estão os
alunos e os professores apontados como os dois principais problemas da
educação. Além de professores, a escola reúne outros tantos profissionais que
fazem o corpo de gestores e administração. Muito se fala por aí na eleição
direta de diretores nas escolas públicas em atendimento à gestão democrática,
mas todo mundo sabe que a maior parte, principalmente nas cidades interioranas,
as diretorias das escolas são ocupadas por pessoas ligadas ao prefeito ou de
suas relações políticas, muitas delas, inclusive, alheias a área. Essa direção
racha a escola em duas: a área pedagógica, que deve resolver as principais
broncas e fim de papo; e a área administrativa, que é a dos achegados na gestão
financeira. A bronca pedagógica é delegada aos coordenadores e supervisores; a
bufunfa fica nas mãos de quem passa a tratar a escola pública como um negócio
rentável que tem que dar certo e, se possível, lucro para o diretor e os seus,
mesmo em se falando de escola pública, observe. Assim não fosse, não apareceria
tantos problemas com a merenda escolar no noticiário. Epa! Mas dizem que isso é
problema da secretaria de educação. Sim, se a gente olhar quem é que ocupa as
secretarias municipais de educação no Brasil, constatará que em sua esmagadora
maioria, também, está ocupada por pessoas ligadas ao gestor público ou de suas
relações políticas e, provavelmente, de área alheia à educação, afora um quadro
de pessoal descomprometido com a questão, que está ali apenas para garantir sua
aposentadoria e ter o que fazer, salvo raríssimas exceções, atente pra isso.
Contudo, salvo melhor juízo, o caso das broncas da merenda escolar é doutra
esfera: da secretaria estadual de educação. Tá. Não precisamos perguntar quem é
o secretário de educação na maioria dos estados brasileiros, que seguem a
cantilena dos municípios, também ocupados por pessoas das relações políticas do
governador e que, em sua grande maioria, nada tem a ver com a educação, salvo
as raríssimas exceções, reitero. Todavia, esta secretaria coloca a culpa no
Ministério da Educação (MEC). Sim, também, se a gente for ver quem é o Ministro
dá pra sacar que o problema começa em cima, afora os gabinetólogos de bunda
quadrada que em Brasília querem fazer uma educação uniforme e homogeneizada
para o Brasil todo, desconsiderando a heterogeneidade regional do nosso
continental país. Em suma, uma primeira conclusão: há mais interesse individual
na educação pública brasileira que qualquer outra coisa. Sim, a tragédia está
tanto na educação pública como na rede privada: a diferença entre elas é só a
limpeza e disciplina. O resto é uma tragédia só. Isso faz com que a educação
não só tenha um ou dois problemas, mas muitos como uma corda de guaiamum bastante
complexa. Excetuando-se aqui, ali ou alhures alguma iniciativa louvável
raríssima e pontual, da educação infantil até o ensino superior, a educação
brasileira é no mínimo disfuncional, quando não contraproducente: preparam os
estudantes apenas e tão somente a serem serviçais do capitalismo. Trocando em
miúdos: o problema da educação começa pela negligência, descompromisso e
descomprometimento dos pais com o futuro dos seus filhos, ou por uma
compreensão equivocada acerca do futuro da humanidade. Das duas, uma. Não será
bastante alertar que o futuro pode ser no mínimo um abrigo pros pais
negligentes ou, de uma forma mais contundente, a consideração da covardia que
levarão nossos filhos a nos responsabilizar por não termos a competência, a
coragem e a seriedade de resolver os nossos próprios problemas a respeito,
transferindo-os como uma avalanche para uma realidade mais grave e trágica no
futuro. Pense nisso. E vamos aprumar a conversa & tataritaritatá! © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. PS: e por falar em Educação veja mais aqui, aqui e aqui.
Imagem:
a arte do
pintor, escritor e ocultista belga Jean
Delville (1867-1953).
Curtindo
o álbum da ópera Jupyra
(Biscoito
Fino), do compositor Francisco
Braga, com a cantora lírica Rosana Lamosa & a OSESP. Veja mais aqui.
PESQUISA
Cibercultura: tecnologia e vida social na
cultura contemporânea
(Sulina, 2007), do sociólogo e professor André
Lemos. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.
LEITURA
A ilusão da alma: biografia de uma ideia
fixa (Companhia das
Letras, 2010),
PENSAMENTO DO DIA
Quem se acha dono da razão, com certeza nunca teve educação.
Veja mais Osman Lins,
Adolphe Appia, Paul Éluard, Pedro Almodóvar, Alberto de Oliveira, José Malhoa,
Paulo César Pinheiro, Penélope Cruz &Valéria Pisauro aqui.
CRÔNICA
DE AMOR POR ELA
Deusa
Flora, da pintora Lygia Coelho.
CANTARAU:
VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Recital Musical Tataritaritatá