DIÁRIO DE QUARENTENA – UMA PROCURA DA POESIA
- Houve um tempo em que o sorriso era a mata densa lá longe, com todas as
abusões escurecidas para fantasias e presepadas. Hoje, telhados e arranha-céus escondem
o azul do amanhã e os descampados de agora, antes ontens fantásticos. Poetar passos
no asfalto entre corações duros e olhares minguantes no concreto respirando
pelas frestas insalubres. Um verso de Arseny Tarkovski: Eu ergui todos os dias que
fizeram o passado / Com uma cadeia de agrimensor, eu medi o tempo / E viajei
através dele como se viajasse pelos Urais. Ainda tenho muitos sonhos de
olhos abertos, sonhar ainda é possível noutro verso dele: Eu prontamente trocaria a vida / Por um lugar seguro e quente / Se a
agulha veloz da vida / Não me puxasse pelo mundo como uma linha. Ademais,
tudo é afinal para viver.
DUAS OU MAIS SOLIDÕES - Estou só com a festa dos pássaros nos
amanheceres. Entre entardeceres, sou entre roncos de motores, gente apressada e
rumores inauditos pelas esquinas. Comigo anoiteceres longínquos de espera. Ouço
Ernesto Sábato: Estamos próximos, mas estamos a uma distância incomensurável, estamos
próximos, mas estamos sós. Viver consiste em construir memórias futuras. Horas
a fio, entre o cansaço e a insônia, me refaço e estou sempre pronto para viver.
TRÊS HUMILHAÇÕES POR DIA - Desapontamentos recheiam o dia nestes
tempos de duplo flagelo. Para a pandemia, o isolamento e dor solidária; mas,
para a babel coisonária é tudo muito vergonhoso. Nunca pensei que entre a minha
gente houvesse tantos alheios desalmados. É tudo muito escatológico, talvez um OVNI
apareça rasgando os céus em nosso socorro, quando na verdade é nossa a responsabilidade
de levar a bom termo os destinos da humanidade. Bem disse Milton Santos para minha maior consternação: A má índole associada a falta de educação leva ao racismo, ao
preconceito e até a marginalidade. A força da alienação vem dessa fragilidade
dos indivíduos, quando apenas conseguem identificar o que os separa e não o que
os une. Quem dera braços abertos e solidários numa só canção, mas não. Até
amanhã. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais abaixo e aqui.
DITOS & DESDITOS: [...] a
unidade na luta das mulheres em nossas sociedades não depende apenas da nossa
capacidade de superar as desigualdades geradas pela histórica hegemonia
masculina, mas exige, também, a superação de ideologias complementares desse
sistema de opressão, como é o caso do racismo. O racismo estabelece a
inferioridade social dos segmentos negros da população em geral e das mulheres
negras em particular, operando ademais como fator de divisão na luta das
mulheres pelos privilégios que se instituem para as mulheres brancas. Nessa
perspectiva, a luta das mulheres negras contra a opressão de gênero e de raça
vem desenhando novos contornos para a ação política feminista e anti-racista, enriquecendo
tanto a discussão da questão racial, como a questão de gênero na sociedade
brasileira. Esse novo olhar feminista e antirracista, ao integrar em si tanto
as tradições de luta do movimento negro como a tradição de luta do movimento de
mulheres, afirma essa nova identidade política decorrente da condição
específica do ser mulher negra. [...].
Trecho do artigo Enegrecer o
feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma perspectiva
de gênero (Portal Geledés, 2011), da filósofa, escritora e ativista
antirracista Sueli
Carneiro, fundadora
e coordenadora-executiva do Geledés – Instituto da Mulher Negra - São Paulo SP,
e considerada uma das principais autoras do feminismo negro no Brasil.
DESTAQUE: À LUZ DE VELAS – [...] Fui chamado às pressas para atender um
paciente em estado gravíssimo que estava se ultimando numa das enfermarias do
hospital. Enquanto eu tentava manobras reanimatórias que se revelaram
infrutíferas, o nosso herói correu à cozinha trazendo de lá uma vela acesa.
Procurava a todo custo que fosse segurada pelo moribundo que não tinha mais
forças para tal. Não conseguindo êxito, gritava: “segura na vela João, para não
morrer feito jumento”. Concluído o desenlace, ele ostentava uma cara de
tristeza, fracasso ou decepção por saber que apesar dos seus esforços o João
partiu para outra sem o conforto da luz de vela a iluminar o seu caminho. Trecho
da crônica extraída da obra E o tempo
passou (Bagaço, 2010), do escritor e médico Gentil Porto (1940-2019), membro da Academia Recifense de Letras e Academia
Pernambucana de Medicina.
PHIOCLES DE ABDALLES
[...] Diz a lenda que esse povo descende de Abdalles,
filho do deus Sol, e Phiocles, a primeira mulher. Phiocles tem a reputação de
ter sido concebida quando um raio de sol atingiu uma serpente e de ter sido
criada por uma raposa depois que a serpente morreu. Phiocles também manteve relações
com os irmãos de Abdalles [...]. Os
costumes matrimoniais dos Abdalles dão grande importância ao Ab-Soc-Cor, o
padrinho do noivo. No dia anterior ao casamento, ele visita a noiva; ao
anoitecer, fecha-se com ela numa sala escura, onde lhe ensina os deveres
físicos e sexuais de uma esposa e se assegura de que ela ainda é virgem. Ao amanhecer,
ele vai até o noive, saudando-o com estas palavras: “A criança está dormindo”.
O noivo responde: “Vamos acordá-la”. Somente então partem para o templo onde se
realiza a cerimonia de casamento propriamente dita. [...].
PHIOCLES DE ABDALLES - Trecho da lenda extraída da obra Lamekis, ou les voyages extraordinaires d’um
egyptien dans la terre intérieure avec la découverte de l’isle de Silphides,
enrichi notes curieuses (Haia, 1735), de Charles Fieux de Mouhy, recolhida
do Dicionário de lugares imaginários
(Companhia das Letras, 2003), de Alberto Manguel e Gianni Guadalupi. Veja mais
aqui.
SAMWAAD RUA DO ENCONTRO
Introduzimos gestos e danças de outras culturas no método “cidadão
dançante”, pois essas diferentes qualidades de movimento conduzem o aprendiz a
outras lógicas e formas de raciocínio. O ser humano possui os mesmos padrões de
movimento, seja a qual parte do globo pertença. Entretanto, desenvolveu modos muitos
diferentes de dançar, mais uma prova de que, ao consolidar os padrões motores
da espécie, o homem consegue também criar a diferenciação cultural.
SAMWAAD RUA DO ENCONTRO - Espetáculo
de dança Samwaad - Rua do Encontro (Sesc-SP,
2004), concebido e dirigido pelo coreógrafo e educador do corpo, Ivaldo Bertazzo, com elenco constituído
por 55 jovens de 7 ONGs de São Paulo, a maioria jovens com menos de vinte anos
de idade que, durante os 8 meses de ensaios, os aspirantes passaram por
consultas médicas e odontológicas e tiveram aulas de linguística, percussão e
origami. Dele recolhemos Ivaldo Bertazzo:
Arte também é educação (Comunicação & Educação, 2006) e Ivaldo Bertazzo: Além do movimento (UEP-Júlio de
Mesquita Filho, 2014), de Mariama Silva Gouvêa Barreto. Veja mais aqui.
PERNAMBUCULTURARTES
Minha história com a dança começou desde muito menina. Seguindo essa
vocação, me formei bailarina, mais tarde produtora, e nunca quis fazer outra
coisa. Fundei o Aria Espaço de Dança e Arte em 1991, que funcionou
comercialmente por 13 anos, em Jaboatão dos Guararapes, como escola de dança e
importante galeria. No entanto, sempre sonhei com um espaço que integrasse as
artes, a dança, a música, pinturas etc., ( durante 10 anos com Galeria de
Arte). Assim, comecei desenvolvendo ações pontuais e voluntárias na área de
dança e canto coral. Em 2004, fundamos a Oscip, nascendo assim o Aria Social,
que já atendia, voluntariamente, quase 100 crianças e jovens. Foi necessária
uma grande reforma em nosso espaço físico, pois, no ano seguinte, já dobramos
este atendimento, que veio num crescente até atingirmos os 450 educandos que
mantemos hoje, a partir dos cinco anos atuando na dança, iniciação musical,
canto coral, aulas de português e matemática.
A arte da bailarina, produtora, curadora e empresária Cecília Brennand, fundadora da
produtora Sopro do Zéfiro e do Ária Espaço de Dança e Arte, além de criar o
projeto social, Casa de Maria, que reúne mães de crianças que participam do Ária
Social.
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Casa-grande e senzala (Livros do Brasil, 1957), do sociólogo Gilberto
Freyre (1900-1987) aqui.
Orquestra Armorial & Quinteto
Armorial aqui.
A obra
da pintora, escultora e desenhista Maria Carmen (Maria Carmen de Queirós
Bastos – 1935-2014) aqui.
Eles Voltam, de Marcelo Lordello aqui.
Aminta, da
escritora Célia Labanca aqui.
Eu-poesias
em vias, de Adriano Sales
aqui.
Toada de peito aqui.
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