terça-feira, janeiro 21, 2020

ORWELL, GENEZIO GOMES, FEBRE DO RATO, MESSALINA & ARTE DE PERNAMBUCO


UM BRINDE, VALMESSA - Brindemos a primeira taça por sede e honra da imperatriz, aquela poderosa a quem tudo queria e em todos mandava. Salve, Valmessa, dona da noite e do dia. Que a temessem ou respeitassem, só a mim ela viveria. Quantos não a queriam deposta, subjugada, revoltados insones. Brindemos a segunda taça pela alegria da feliz dama que pela nobreza de estirpe, saiu do pedestal para diversão dos seus mortais súditos. Salve a senhora majestade, digna dos mais respeitosos cerimoniais e sacramentos. Que a exaltassem ou desejassem, só para mim ela se despia. Quantos não a queriam ultrajada, vencida e andrajosa. Tanto queriam, só a mim ela serviu. Brindemos a terceira taça pelo prazer da meretriz que é uma dríade enamorada e obscena, com sua extrema beleza, seios fartos, mãos feiticeiras, belas formas, ninguém jamais seria insensível aos seus encantos, a luxúria desenfreada de nascença. Salve a rainha destronada, a deusa dessacralizada, a mulher honrada que se fez puta e mais devassada. Que a maldissessem ou apenassem, só a mim ela se entregava. Brindemos a quarta taça pela felatriz de loucura escandalosa, dias doces de carnavalizante orgia, o ritmo louco das Mênades no rito de Baco e a lascívia de costumes. Éramos nós, eu e ela, e só. Salve aquela que me engoliu na noite sem fim e desmaiou na tarde com o meu gozo e que se comprazia em me abocanhar em todas as horas dos dias e meses a mais de ano e a vida toda. Que a condenassem ou sacrificassem, só a mim ela nua me levava. Quantos entraram na alcova e dela saíram mortos e ela radiante. Brindemos mais por Valmessa, a Valéria, Messalina, aquela a quem acusavam de muitos subjugar, quantos foram substituídos, desacreditados, quantos foram traídos, executados, todos os cadáveres que zanzavam atraídos por sua imponência e exuberância. Se amou, ela os consumiu e domou, preteriu e dispensou na primeira curva, todos odiavam, só eu a amei de verdade. E veneraram, apesar de a tratarem por pérfida, imaculada, preferida, mal afamada, louca devassa, e ela com todas as manobras de quem faz a guerra, deserta para se aventurar depravada na penumbra, impudica na noite para que os fluxos astrais trouxessem destino sorridente no jogo dos sentimentos e na vacuidade dos sonhos. De tanto amar, dissimulou e morreu. Apesar de tudo, ela foi o meu amor, o único amor, e tiramos todos os proveitos das duas mil e uma noites de nossos safaris eróticos, festa no nosso salão nupcial, e ríamos pelo que víamos e ouvíamos dos anais de Tácito e Suetônio, gargalhávamos com as narrativas patafísicas de Jarry, as cenas fílmicas de Guazzoni, Cottafavi e Gallone; e a sua morte consternada nas cenas dramáticas de Averkiev ou Cossa, com os acordes musicais de Pallavicino. Nus e embriagados, brindamos todos os goles, dançamos mais que a música dos orgasmos. Quase perdíamos a respiração, nos achamos entre um fôlego e outro, e nos perdemos sem saber como. A morte teve sua hora. Ela se foi na poeira da madrugada, ninguém jamais a amou. Só a mim esta graça e sina. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.

DITOS & DESDITOS: [...] Um dia, descobriu que o governo, diante da falta de quadros para cargos de importância intermediária, pretendia promover alguns pequenos funcionários como ele. A notícia iria se tornar pública dali a uma semana, mas uma das qualidades de Po Kyin era sempre conseguir as informações uma semana antes de todo mundo. Ele viu ali sua oportunidade, e denunciou todos os seus cúmplices antes que eles pudessem se precaver. A maioria foi mandada para a prisão, e Po Kyin acabou nomeado supervisor assistente municipal como recompensa por sua honestidade. Desde então, nunca mais deixou de subir. Agora, aos cinquenta e seis anos, era magistrado subdivisional, e tudo indicava que seria promovido ainda mais e nomeado comissário assistente, tendo ingleses como seus iguais e até mesmo sob suas ordens. Como magistrado, seus métodos eram simples. Mesmo pela maior dos subornos, ele jamais vendia a decisão de um caso, pois sabia que um magistrado que emite julgamentos errados acaba sendo descoberto mais cedo ou mais tarde. Seu modo de agir, muito mais seguro, era aceitar suborno dos dois lados e, depois, resolver o caso estritamente de acordo com a lei. O que ainda lhe valia uma muito proveitosa reputação de imparcialidade. Além da renda que auferia junto aos litigantes, U Po Kyin extorquia um tributo permanente, uma espécie de taxação particular, de todas as aldeias submetidas à sua jurisdição. Se alguma aldeia deixava de pagar seus tributos, U Po Kyin adotava medidas punitivas - bandos de dacoits atacavam a aldeia, os moradores mais importantes eram presos com base em falsas acusações, e assim por diante -, e não demorava muito a soma devida acabava sendo paga. Ele também recebia uma parte de todos os roubos de maior porte que ocorriam no distrito. Quase todo mundo, claro, sabia disso, menos os superiores de U Po Kyin (nenhuma autoridade britânica jamais acreditaria numa acusação feita contra seus próprios homens), só que todas as tentativas de denunciá-lo sempre fracassavam; os homens que o apoiavam e cuja lealdade era alimentada por uma parte do butim eram numerosos demais. Toda vez que alguma acusação era feita contra ele, U Po Kyin se limitava a desacreditá-la lançando mão de uma série de testemunhas subornadas, disparando em seguida contra acusações que o deixavam numa posição mais forte do que nunca. Era praticamente invulnerável, tal sua eficiência em julgar o caráter alheio e assim jamais escolher um intermediário errado, e também porque se entregava à intriga com tanta concentração que jamais cometia um erro por descuido ou ignorância. Podia-se dizer, quase com certeza, que ele nunca seria apanhado, que seguiria em frente, de sucesso em sucesso, e que por fim haveria de morrer coberto de honrarias, com uma fortuna de vários lakhs de rupias. E mesmo no além-túmulo seu triunfo haveria de continuar. De acordo com a crença budista, os que praticam o mal na vida passam à encarnação seguinte na forma de um rato, um sapo ou algum outro animal inferior. U Po Kyin era um bom budista e estava decidido a se prevenir contra esse risco. Havia de dedicar seus últimos anos a boas causas, graças às quais acumularia mérito suficiente para sobrepujar o que ocorrera no restante de sua vida. É provável que suas boas obras tomassem a forma da construção de pagodes. Quatro pagodes, cinco, seis, sete - os monges lhe diriam quantos - com adornos de pedra esculpida, toldos de orla dourada e sinetas que tocavam ao vento, cada toque uma prece. E ele voltaria à terra em forma humana e masculina - pois a mulher tinha mais ou menos a mesma importância hierárquica de um rato ou um sapo - ou, na pior das hipóteses, na forma de algum animal digno, como um elefante. Todos esses pensamentos corriam rapidamente pelo espírito de U Po Kyin, e quase sempre em imagens. Seu cérebro, embora astucioso, era bastante bárbaro, e só funcionava para determinadas finalidades; a mera meditação estava além de seus hábitos. [...]. Trecho extraído da obra Dias na Birmânia (Companhia das Letras, 2008), do escritor e jornalista britânico George Orwell (Eric Arthur Blair – 1903-1950). Veja mais aqui & aqui.

MESSALINA – Imagem do escultor francês Eugène Cyrille Brunet (1828-1921) – Valéria Messalina (17-48dC), foi uma imperatriz-consorte romana, poderosa e influente. A sua família possuía casamentos entre parentes próximos e, segundo Tácito e Suetônio, ela possuía uma reputação de promíscua e predadora sexual insaciável, conspirando contra o marido e executada com a descoberta desse seu plano. Há o hipotético de que o viés político com suas intrigas e conspirações, tenha sido a supremacia para sanções e vingança dos envolvidos contra ela, muito embora haja relatos de Plínio, o Velho, em sua História Natural, de uma competição sexual em que ela teve 25 parceiros diferentes, o que é reiterado pelo poeta Juvenal em sua sexta sátira, das noites dela no bordel Loba. Seu nome ficou na história por séculos de páginas e cenas artísticas. Veja mais aqui.

FEBRE DO RATO
FEBRE DO RATO – O premiado filme Febre do Rato (2012), dirigido por Cláudio de Assis, trata de uma expressão popular no Recife que se refere a perda completa de controle, contando a história de um poeta anarquista que publica um jornal que tem o mesmo nome do filme, e ele se interessa por uma jovem que o rejeita. Entre os destaques que são muitos, especialmente para a atriz, cantora e compositora Nanda Costa. Veja mais aqui.

A ARTE DE GENEZIO GOMES
A arte do escultor e artista plástico Genezio Gomes Barbosa, que possui licenciatura em Desenho e Artes Plásticas pela Universidade de Pernambuco (UFPE), Escultura e Modelagem (UFPE), Fundição de Metais pela Escola Técnica Federal de Pernambuco e História da Arte Barroca, em Minas Gerais. É especialista em esculturas de resina, concreto armado, gesso, cerâmica, sucata e pedra-sabão. Participou de inúmeras exposições coletivas e individuais, com ativa participação como curador e expositor. Veja mais aqui.

A ARTE PERNAMBUCANA
A música de Lucinha Guerra aqui e aqui.
A poesia & texto de Tony Antunes aqui, aqui, aqui & aqui.
A literatura de Gerusa Leal aqui, aqui, aqui & aqui.
A realidade social da ficção do sociólogo Sebastião Vila Nova aqui.
A arte do artista plástico José Duran y Duran aqui, aqui, aqui & aqui.
A xilogravura de Erik Lima aqui.
&
O município de Gameleira aqui e aqui.


CHRISTINA VASSILEVA, KATHERINE JOHNSON, MARTÍN-BARÓ, JOÃO CABRAL & MATA SUL INDÍGENA

    Imagem: Acervo ArtLAM . Ao som dos álbuns Mistérios do Rio Lento (The Voice of Lyrics, 1998), Santiago de Murcia: a portrait (Frame,...