CARTA PRELÚDIO & EPÍLOGO - Órfão desde a infância nas montanhas de
Cumberland, travesso menino a subir no penhasco do corvo e o suicida boiava no
lago rasgando as minhas veias nórdicas ascéticas, a me dar conta do patíbulo
dos enforcados. Assim cresci até adolescer no redemoinho da revolução e tudo de
pernas pro ar: um verso rebelde diante do Reinado do Terror. Por isso cantei
Annette e o valor das paixões, o filho anônimo nos braços dela, a poesia
ardorosa do discípulo de Vênus nos mistérios do amor. Tive que desertar para
sobreviver e tudo se dissipou com a juventude no curso diurno da Terra. Por
isso cantei Dorothy, minha irmã, a quem dou graças por recobrar a minha
sanidade mental. Encostei a minha alma na relva e nas flores, cantei a beleza
de Mary e tudo era outro cenário: a poesia em comunhão. Foi daí que perdi a
amizade do mágico tecedor de versos na ablução emocional e na profunda
sublimação diante de toda deformidade do mundo humano: a face da humanidade é a
imperfeita e perturbada efígie de Deus. Um humano falava aos humanos, quem me
escutava apesar de nenhuma fraseologia aparatosa e inútil, só coisas comuns e
simples além da vida e da morte. Poucas palavras e um poema singelo: a solidão
do sobrevivente do passado e a mãe, coração na mão, esperava por décadas o
retorno do filho único que insistia em não voltar. Chorei por quem não
conhecia. As escritas da mudez e do silêncio, a esperança que não morreu nem
morrerá, porque algo sempre será: ou somos livres ou morremos! Renunciei a tudo
e fiquei mudo, imperturbável. Tudo arrefeceu das paixões obstinadas na
propensão do senso da honra e o do meu vergonhoso moralismo, me perdoem. Peço
perdão por me tornar indiferente e desinteressado, só eu sei: o líder perdido
pede reiteradamente perdão agora por não ter tomado ciência da minha decadência
palpável e disfarçada. Dei-me a grandes silêncios, calei de vez meu coração e
encontrei Deus nas selvas, o governo da quietude e era a minha peregrinação
pelos cenários nativos da serenidade na luz do Sol poente e a descoberta do que
estava por trás das folhas das árvores, das pétalas das flores, rochas e rios,
estrelas e astros: tudo é um grande poema épico e todas estas coisas eu canto nas
baladas líricas, o meu prelúdio e epílogo. © Luiz Alberto Machado.
Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.
DITOS & DESDITOS: [...] O que quer que
dissesse, parecia dizê-lo sempre alegremente. Gostava de rir, e por vezes, se
os alunos estavam cansados, suspendia a aula e mandava-os falar à toa, do que
quisessem, só por falar. A certa altura interrompia-os, no meio de uma frase, e
aí estavam de novo concentrados, prontos a seguir o seu raciocínio, para onde
quer que ele agora os levasse.
[...] Era verdade que o tempo parecia ter sido
terrivelmente encurtado (Kant, Platão, Wittgenstein em dezesseis minutos, prometiam
nas bancas livros magros como folhetos). Mas os livros aconteciam no tempo.
Como a música. Os romances, sobretudo. Eram, como a música, uma forma de medir
e de organizar o tempo. Poderia falar-se, pelo menos a prazo, da morte do
leitor? Ela gostaria de pensar que o leitor era como o escritor, de certa
maneira a sua outra face, disse a mulher: Aceitava os mesmos riscos, passava as
mesmas noites em claro […]
Reinventava o livro, como o intérprete
tocando a partitura. […] O leitor,
como o escritor, tornara-se uma personagem rara –ia continuar mas o
entrevistador interrompeu-a. Parecia agora fascinado pelas mãos: Havia pessoas
que conduziam máquinas, transportavam pedras, tratavam doentes, assentavam
ladrilhos – não seriam essas mãos mais úteis? […] Ela vivia debruçada sobre um teclado. [...]. O piano era uma armadilha que a apanhava de
surpresa. Julgava brincar com o teclado mas era o teclado que brincava com ela.
No meio de uma frase, um acidente reduzia a metade a distância à nota seguinte,
ou, pelo contrário, aumentava-a, uma diferença mínima, que no entanto arrastava
pesadas consequências, como se o bater de asas de um inseto fizesse rebentar
uma tempestade à distância. [...]. Trechos extraídos da obra Os teclados: três histórias com anjos (Sextante, 2012), da
escritora portuguesa Teolinda Gersão.
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OS AMORES DE WORDSWORTH - O poeta
romântico inglês William Wordsworth
(1770-1850) era irmão da poeta Dorothy Wordsworth que esteve sempre presente na
sua vida como equilibradora da sua vida emocional. Durante a Revolução
Francesa, ele teve sua primeira paixão: a jovem francesa Annette Vallon
(1766-1841) que foi romanceada em livro, por meio da obra Annette Valon (HarperCollins, 2007), de James Tripton. O casal teve
uma filha por nome Caroline. Problemas financeiros e as tensas relações da
Grã-Bretanha com a França obrigaram-no a retornar à Inglaterra, na esperança de
depois levá-las, mãe e filha, para lá. Anos se passaram e com a Paz de Amiens, Wordsworth
e sua irmã Dorothy visitaram Annette para que ele conhecesse a filha Caroline
em Calais e para quem ele escreveu o soneto É
uma noite bonita, calma e livre, recordando um passeio à beira-mar com
Caroline, de 9 anos, que ele nunca tinha visto antes daquela visita. Em seguida, ele casou-se com Mary Hutchinson (1770-1859), uma amiga órfã de sua irmã Dorothy,
com quem teve vários filhos. O poeta publicou a obra Lyrycal Ballads, em 1798,
e sua obra-prima é o The Prelude, um poema autobiográfico que faz referências à
sua vida e amizade com poeta Samuel Taylor Coleridge. Veja
mais aqui e aqui.
MÃO SANTA, DE FLORENCIO
SÁNCHEZ
ATO ÚNICO - No quarto de cortiço habitado por
Carlos e Luísa. Porta única ao fundo. Cama de casal de ferro, guarda-roupa,
criado mudo, lavatório e outros móveis amontoados quase à direita. A metade
esquerda, ocupada por uma mesa, uma cômoda com pratos e cristaleira, em cima
uma máquina de costura, cadeiras, braseiro e utensílios de cozinha. Nas
paredes, em lugar de honra, um grande retrato de Karl Marx e diversas figuras e
alegorias socialistas. CENA I - MARIA LUÍSA - MARIA LUÍSA (Com o cabelo solto a
ponto de enfeitar-se para sair, colocando com pressa alguns pratos e
recipientes com comida sobre a mesa.) Ai! Uma hora já... Mas esse Carlos não
pensa vir? Que aborrecimento!... (Indo às vezes até a porta. ) Menino!...
Torito!... Quer chegar até o armazém e ver se está meu marido? Sim, vamos.. Vou
te dar um níquel. Rapidinho, hein? Se estiver, diz-lhe que a comida se esfria...
Que faz uma hora que está servida. (Voltando-se.) E se não estiver, que se
dane. (Diante o espelho, terminando o penteado.) Eu é que não perco a consulta
hoje. Já me custou três vezes em vão, e todas por chegar tarde. (Buscando algo.)
Agora, onde deixei a peineta? Não digo? Se todos são inconvenientes! (Impacientando-se.)
Mas se agora mesmo a tive nas mãos... Aqui... Aqui mesmo a coloquei com os
grampos e o perfume... (Busca sobre a mesa, confere a cômoda, a máquina, cada
vez mais irritada.) Não digo? Se não é para perder a cabeça!... Ufff!... E
Carlos que não chega... Comerá tudo frio... Mas a peineta... Depois não querem
que a gente se adoeça... Senhor! Há duendes em casa? (Confere de novo por
diferentes lugares, jogando roupas e objetos no chão.) Ufff! Que raiva! (Compungida.)
E agora, com o que prendo o cabelo? Vamos ver! Com que?... Me dá vontade de
romper as mexas duma vez... e de não ir a lugar algum. (Leva as mãos à cabeça,
nervosamente.) Não digo? Depois dirão que não é coisa de irritar. Ela estava na
minha cabeça... E perdendo o tempo... (Com um gesto violento atira a peineta no
chão.) [...].
FLORENCIO SÁNCHEZ - Trecho da peça teatral Mão Santa Sainete
(1905), extraída da obra Florencio Sánchez –
Teatro (Montevideo, 1975),
do dramaturgo e jornalista uruguaio Florencio Sánchez (1875-1910),
considerado uma das principais figuras do teatro rio-platense e do anarquismo
uruguaio. Veja mais aqui.
A ARTE DE RAQUEL GLOTTMAN
Penso em minhas imagens como
fragmentos de um sonho que expressa reinos inconscientes simbólicos
arquetípicos.
RAQUEL GLOTTMAN - A arte
da fotógrafa estadunidense Raquel Glottman, que explora processos fotográficos
alternativos com exploração de sonhos, sexualidade,
natureza e mortalidade. Veja mais aqui.
A ARTE PERNAMBUCANA
A literatura
de José Condé (1917-1971) aqui.
A música
do maestro,
arranjador e oboísta Maestro Duda aqui
A arte
de Alice Vinagre aqui.
A poesia
de Edjane Leal aqui.
A arte
do artesão Epifanio Bezerra
aqui
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