DE HOMENS, BICHOS &
FERAS - Imagem: Diógenes (1860), do pintor e
escultor academicista francês Jean-Léon Gérôme
(1824-1904) - Ainda ontem eu vi o velho Diógenes com sua vigilância e inseparável
lanterna pelas ruas de Sinope e alguém lhe perguntou: pra onde vai, mestre, com
essa lanterna acesa em plena luz do dia? Procuro um homem com agá maiúsculo.
Virou gay, mestre? Não, pra sua mãe, gafanhoto. Mestre! E retirou-se
resmungando: melhor pedir esmolas às estátuas. Nesse contratempo, surge o
ameaçador e poderoso Xandão Pistola, com sua cara de mi bordão a indagar do
velho com ar de repreensão: o que espera do futuro, Diógenes? Para quem saiu do
barril e só tem um alforje, um bastão e uma tigela, só espero que não me tire o
que não me pode dar. Estranhou Xandão aquela resposta, só entendendo ao ser
empurrado pro lado, retirando a sombra que fazia para que o idoso pudesse
sentir a luz do Sol em sua pele. Prevendo a tragédia, o discípulo logo acorreu
para apaziguar: Não ligue, senhor Xandão, o velho não anda bem da cabeça. Se eu
não fosse Xandão, poderoso e rico, eu queria ser Diógenes, admiro a sua coragem.
E saiu como uma nuvem negra que vai atemorizar outras paragens. Ao se virar, o
discípulo flagra o mestre se masturbando diante da uma estátua nua em plena via
pública: mestre, o que é que é isso? Que porra é essa, mestre? O senhor
enlouqueceu? Indiferente, respondeu: que pena não se possa viver apenas
esfregando a barriga. Mestre, isso é crime! Ah, gafanhoto, quanta gente-lesma
se arrasta reprimida e desencorajada a se enojar dos seus próprios excrementos sem
se envergonhar dos seus imundos roubos do que é dos outros e querem tudo só pra
si; quanta gente-papagaio que é só tagarela repetindo o que bebeu na boca dos
outros e se torna pior que as cantigas de grilo remoendo no juízo só pro engano
que querem perpetuar; quanta gente-maribondo ferroando a paciência alheia a
ensinar o que já se sabe e tirar de quem nada mais tem; quanta gente-cupim a
corroer o erário público em nome de uma riqueza que diz ser de todos e que é só
pro gozo de si mesmo; quanta gente-vagalume que precisa de luz e plateia para
enganar a todos com seus pesadelos mais profundos e sua infelicidade na peçonha
que faz todos serem infelizes; quanta gente sangue de barata que não passa de um
bando de traiçoeiros tubarões wobbegong nas cruzetas dos sicários, a prear tudo
pros seus latifúndios infindáveis; quanta gente-louva-a-deus que se julga a
maior tropa de escolhidos dos céus para cometerem as maiores ignomínias em nome
da fé e da moral; quanta gente-escorpião com seu rabo homicida a promover
discórdias e confusões; quanta gente-lagartixa para servir de lambecus dos
dominantes; quanta gente-caranguejo aprisionados por cordas invisíveis, cada
qual puxando pra direções opostas na maior das confusões e equívocos; quanta
gente-urubu pra se servir da carniça dos miseráveis corrompidos; quanta
gente-abutre que abduzem desmiolados pra escravaria; quanta gente-serpente a
destilar veneno pra desunião; quanta gente-pavão tão camaleônica a ponto de
enganar a todos e a si mesmo; quanta gente-gambá que fede por dentro e por fora
e se entope dos aromas para perfumar sua fedentina na luxuria da sociedade
corrupta. O que pode ser pior, gafanhoto? Mas o senhor está colocando tudo num
mesmo balaio, mestre, ricos e pobres? Não há onde cuspir na casa de um rico,
senão na cara dele mesmo! Ah, mestre, existem pessoas boas no mundo! Não duvido,
gafanhoto, só não encontro uma, só Fabos. Quem são esses, mestres? Fabricantes de
bosta, só o que sabem fazer, comboio de patetas. Mestre! Um dia, os insetos que
empestam a vida de todo mundo se reuniram protestado por serem presas dos seus
predadores. O aniquilador respondeu: faço isso pra sobreviver e, ao mesmo
tempo, aproveitou pra protestar a cadeia alimentar, porque apareceu o homem e
fodeu com tudo, derrubando árvores, desmatando pra bagunçar com tudo, matando
bichos e feras pra se alimentar e comerciar, escravizando o próprio humano pra
se deliciar com a desgraça de tudo, Homo
homini lúpus. Mestre, mestre... ah, gafanhoto, prefiro o meu barril que
viver como todos: enrustidas lagartas que rastejam com a borboleta aprisionada,
por completa falta de coragem de libertá-la, dias piores virão. © Luiz Alberto
Machado. Veja mais aqui.
O que acreditamos saber, claramente ofusca o
que deveríamos saber.
Trecho
da obra A formação do espírito científico
(Contraponto, 1996), do filósofo, crítico literário e epistemólogo francês Gaston Bachelard (1884-1962). Veja mais
aqui, aqui e aqui.
[...] Para que memorizar, se máquinas podem
fazê-lo melhor e mais rapidamente do que nós? De que adianta conhecer um
teorema ou uma receita, se podemos acessá-los facilmente na web? Mas será que
devemos concluir que a sociedade da informação conduz a uma sociedade
caracterizada pela amnésia e ignorância? Não. A pergunta “quem sabe?” só terá
perdido a relevância se confundirmos informação com conhecimento [...] O conhecimento inclui dimensões sociais,
ética e políticas que não podem ser reduzidas à tecnologia. Uma sociedade que
fosse exclusivamente de informação seria um conjunto de enormes redes
interligadas, eficazes e ágeis, mas que não iria produzir inovações [...] Sem o intercâmbio do conhecimento não podem
existir avanços econômicos, científicos ou políticos de monta em nível local,
regional ou global. A partilha equitativa do conhecimento será a origem da
riqueza do amanhã.
Trecho do
artigo Quem sabe (Tendências e
Debates - Folha de São Paulo, 2003), do sociólogo alemão Jérôme Bindé e do
filósofo francês Jean-Joseph Goux. Veja mais aqui.
Veja
mais sobre:
Parece
que foi ontem ser pai no aniversário da filha, a literatura de Erza Pound, Enterrem meu
coração na curva de um rio de Dee Brown, a música de Percorso Ensemble & pintura
de Fernand Khnof aqui.
E mais:
Infância, Imagem e Literatura: uma experiência
psicossocial na comunidade do Jacaré – AL, a literatura
de Ítalo Calvino, Mademoiselle Fifi de Guy de Maupassant, Mandrágora de Nicolau
Maquiavel, Serge Gainsbourg & Jane Birkin, a música de Cole
Porter, os Poemas de amor de Ivo Korytowski, a arte de Maria de Medeiros,
a pintura de Odilon Redon & a coreografia
da Quasar Cia de Dança aqui.
A arte
musical de Ruthe London & outras dicas tataritaritatá aqui.
A honra dos sertões à morte, a
literatura de Euclides da Cunha, O julgamento de Frineia, Amarcord
de Federico Fellini, a música de Amedée Ernest Chausson, a pintura de Antonio Parreiras, a poesia de Ana Terra & Programa
Tataritaritatá aqui.
A filosofia
na alcova de Marquês de Sade, a necessidade
neurótica do amor de Karen Horney, O
tambor de Günter Grass, a música de Chico Buarque, o teatro de Maria Clara Machado, a pintura de Larry Vincent Garrison, a arte de Angela Winkler,
a poesia de Luiz Edmundo Alves & o blog de Monica & Monique Justino aqui.
O caso
Dora de Freud & Ida Bauer, Contos
do Panchatantra, O amante de Marguerite Duras, o teatro de Molière, a música de Muddy Waters, o cinema de Jean-Jacques Annaud
& Jane March, a pintura de Maurice
de Vlaminck & a Deusa Cibele aqui.
A
menstruação mental do Robimagaiver puto da vida, A realidade
e os sonhos de Muriel Spark, O mundo da vida cotidiana de Peter L. Berger &
Thomas Luckmann, A sociologia econômica de Mark Granovetter, a música de Han-Na
Chang, a arte de Marina Abramović, a
fotografia de Greg Gorman & Alfred
Cheney aqui.
A
correnteza do rio me ensinou a nadar, A flor azul de Penelope
Fitzgerald, A juventude e as tecnologias de Beatriz Polivanov e Vinicius
Andrade Pereira, Intereções e redes na
sociedade de Denise Najmanovich & Elina Dabas, a música de Karlheinz Stockhausen &
Suzanne Stephens, a arte de Yayoi Kusama & Robert
Rauschenberg, a coreografia de Anita Berber, a arte de Otto Dix & Sue
Halstenberg, Palmares & Rio Una aqui.
O amor
todo dia e o dia todo, O homem ativo & o intelectual de Antonio Gramsci, a
literatura de Samuel Rawet, A dialética do concreto de Karel
Kosik, a música de Madeleine Peyroux, a fotografia de Rory Banwell, a arte de Luciah Lopez, a pintura de Serge Marshennikov & Amélia
Toledo aqui.
Entre
topadas e escorregões, eu insisto, persisto, resisto e até persevero, A poesia
brasileira de Antonio Cândido, História de um louco amor de Horacio Quiroga, O
espelho da alma de Marilena Chauí, a música de Catherine Ribeiro, a coreografia de Caralotta Ikeda, a pintura de Anders Zorn, a fotografia de Spencer Tunick & Maureen
Bisilliat aqui.
Poesia
não deu, só noutra, o pensamento de Friedrich Nietzsche, a literatura
de Nadine Gordimer, A gaia ciência de José D 'Assunção Barros, a música
de Dulce Pontes, a fotografia de Kharlos
Cesar, a arte de Giovanna Casotto & Jeju Loveland aqui.
História
da mulher: da antiguidade ao século XXI
aqui.
Palestras:
Psicologia, Direito & Educação aqui.
A
croniqueta de antemão aqui.
Livros
Infantis do Nitolino aqui.
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O AMANTE DAS AMAZONAS, DE ROGEL SAMUEL
[...] Quando a
urutu pica, dói muito e incha a carne, que vai ficando escura e roxa, até o
aparecimento da hemorragia e da morte. Já a picada da cascavel ataca o sistema
nervoso central, a dor desaparece, a vista se perturba, vai ficando cega
lentamente, começa a perder os movimentos do corpo, a princípio os dedos. Aí
vêm dores na nuca, cada vez mais fortes, a paralisia vai subindo, a gente via
ferver o progresso da morte, das extremidades para o centro, o corpo ficando
rijo, duro, a morte vem pela rigidez viscosa, por asfixia, quando o diafragma
enrijece. A morte vence o corpo, e a coral, obra de ourivesaria, é linda,
vermelho-amarelo, cores vivas, e presas curtas, mas raramente pica. Mas não
seja enganosa esta beleza, pois picando, mata. Mas pior de todas é a surucucu,
grande, agressiva, forte e que, ao contrário das outras, vem e ataca. Tem muito
veneno e permanece na tocaia das margens escuras de rios e lagos [...].
Trecho do romance O
amante das amazonas (Itatiaia, 2005), do escritor, professor doutor em
Letras, webjornalista e colunista cultural, Rogel Samuel, que edita o blog Literatura e foi entrevistado por mim no Guia de Poesia – O referencial Humano. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
Terra: a arte da artista plástica neozelandeza Wendy Arnold.
Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.