INEDITORIAL:
LAVRATURA - Imagem: O
campo lavrado, do escultor, pintor, gravurista e ceramista catalão Joan Miró (1893-1983) - Eu
lavrei a minha vida com sangue e lágrima, luzes e trevas, sementes de nada e de
tudo. E o insidioso surpreendente mais acrescentou sangue e lágrima, luzes e
trevas e muito mais sementes de nada e de tudo. E o bom é surpreendente, tudo é
surpreendente no meu coração, Hy Breazil. Eu lavrei como quem planta chuvas no
coração e recolhe terras secas da carne de guerra no meio das decepções. Eu
lavrei o meu canto entre acenos de adeus e recepções no meio do meu momento
futuro em plena pretérita agonia. E restou tudo e nada. E eu fiquei ruminando nas
pedrarias de Pirangi onde as águas borbulham nos meus olhos e fazem a
correnteza braba que deságua de mim no incerto preciso. Eu lavrei o meu poema
no quebrar da barra quando eu varria os sonhos que as borboletas levavam do meu
coração incerto. E quadro cruzaram o arco-íris trouxeram tantas luzes de
mulheres nuas rondando meus sonhos com as tormentas da vida queimando meus pés
na hora chegada em Pirangi. Eu lavrei o meu canto e o meu poema no aceno dos
rostos presos na tarde da província onde a noite é insidiosa, as pessoas são
insidiosas, tudo é insidioso e a pressão da vida é imperativa nas mortes que
desabam para não fornecer vantagem para quem fala na calada da noite queimando
o pavio da esperança. Eu lavrei o meu canto e o meu poema queimando o pavio da
esperança quando eu perdia os sentidos no meio dos diálogos sombrios com as
minhas estrelas que quedavam muitas na minha cabeça pela estrada de volta. Eu
lavrei o meu canto no poema que se estirou na estrada do canavial onde eu
estava perdido no meu coração, Hy Breazil, e o planalto central dos anhangás
vociferavam a morte de sempre nas palavras suaves que não são a tônica para
quem vagueia errante. Eu lavrei o meu canto no poema do silêncio de armas, o
silêncio de vida, o silêncio capaz de revolver luzes porque não conhece a
primavera na confusão de inverno e verão quando maio é uma estrada empoeirada
com os filhos do barro incólumes escravos que não sabem o calor das pedrarias
solidárias na fineza de Pirangi. Eu lavrei o meu canto que caiu no chão como um
poema de chaga aberta no meio do esconjuro que o vento soprou no suor do meu
dedo sem direção. E no meu canto o poema exorcizou a América do meu peito e
conheci a direção de nada porque os sonhos de Bolívar estavam na América do
Soul dessas paragens que são a viela da América do Sul que sou. © Luiz Alberto
Machado. (In: Primeira Reunião. Recife: Bagaço, 1992). E vamos aprumar a
conversa nas novidades do dia: na edição de hoje destaque para o narcisismo de Antonio Quinet, o pensamento
de Francisca Paguer Fróes, os megálitos de Orens, a literatura de Nilza Amaral,
a pintura de Juan Miró, Peggy Bjerkan & Mário Zanini, a música de Hilary Hahn, a arte de Luciah Lopez, o Sarau
Poético de Curitiba, o show Por um novo dia & a croniqueta O que sei de mim
é só de você. Querendo mais é só aprumar aqui.
Veja mais sobre:
Maioridade
precoce, Elfriede Jelinek, Lera Auerbach, Diana
Vishneva,Pierre Alechinsky, Literatura de Cordel, Giulia Gam, Walter Huggo Khoury & Deus Ludens aqui.
E mais:
Sêneca, Nauro Machado, Antonio Carlos Nóbrega, George
Wald, Newton Moreno, Philippe Garrel, Clotilde
Hesme, Cidadania na Escola, Elizabeth Boott Duveneck, Distanásia &
Crimes contra a administração pública aqui.
A educação na sociologia de Durkheim aqui.
Cícero & A República, Besta Fubana, Trela do Doro, Tolinho
& Bestinha aqui.
Fecamepa: quando a coisa se desarruma, até na descida é
um deus nos acuda! Aqui.
A educação no Positivismo de Comte aqui.
DESTAQUE: O EU & NARCISISMO
[...] O
eu é como Narciso ama a si mesmo, ama a imagem de si mesmo que ele vê no outro.
Essa imagem que é projetada no outro e no mundo é a fonte do amor, da paixão,
do desejo de reconhecimento, mas também de agressividade e da competição.
[...].
Trecho extraído da obra A imagem rainha – O imaginário no ensino de Jacques Lacan (Escola
Brasileira de Psicanálise, 1995), do psicanalista, psiquiatra, dramaturgo e
doutor em filosofia pela Universidade de Paris, Antonio Quinet. (Imagem: Magical realism, masks by Peggy Bjerkan)
Curtindo o álbum Bach:
Violin & Voice (Deutsche
Grammophon, 2010), da violinista estadunidense Hilary Hahn, interpretando música de J.
S. Bach, com Matthias Goerne & Christine Schafer.
Pensamento do
dia: A maternidade é o magno sacrifício
da mulher; o seu desdobramento incondicional para a multiplicação da espécie, a
santificação do lar num sofrimento contínuo e imensurável. A inferioridade da
mulher não é fisiológica, nem psicológica; ela é social. Sua escravidão sexual
determina sua dependência econômica. Pensamento da médica e feminista Francisca Praguer Fróes (1872-1931). Imagem:
do artista plástico Mário Zanini
(1907-1971).
O QUE SEI DE MIM É SÓ DE VOCÊ (Imagem: arte da poeta,
artista visual e blogueira Luciah Lopez). Não sei do tempo, se ontem ou amanhã, tanto faz. Não
tenho relógio e os marcadores ou ponteiros estão soltos numa ampulheta vazia
que me sinalizam apenas que tudo passa e eu não sei a que horas ou momento isso
é possível e se perdeu do que eu possa apreender. O calendário é cego e eu nem
sei quando nasci, muito menos se vivo a contar de morrer, tanto faz. Não sei do
espaço, aqui ou ali, tanto faz, guio-me pelo trajeto solar, do leste ao oeste, alhures,
sem ter pronde ir ou chegar, apenas caminho na direção sem rumo no naufrágio do
que pudera ser tempo. Não sei de mim, nem de nada, só sei que amanheço na
escuridão, enquanto entardeço na manhã e tudo é tão cedo quando chega a noite e
toma conta do breu o luar no último brilho das estrelas que se apagam sob
minhas pálpebras cansadas. Se quer saber, o que sei de mim é só de você. © Luiz
Alberto Machado. Veja mais aqui.
O EROTISMO DA
NATUREZA NOS MEGÁLITOS DE ORENS –(Imagem: Vênus de
Dolní Věstonice) - As fadas
dos contos e lendas ocidentais são frequentemente associadas a construções
megalíticas, como o são a sítio naturais, colinas, cascatas, florestas, etc.
(variantes dialetais: fados, fades, fadas, fadettes). [...] É Johanneau que, num memorial à Academia
Céltica (1810), conta a lenda do dólmen: Os camponeses desse cantão acrdditavam
ainda, e me disseram seriamente, que foram três moças que construíram esse
castelo em uma noite (daí, provavelmente, seu nome de castelo, de casa ou de
gruta das fadas), que se morreria durante o ano se ele fosse destruído, que se
as pedras fossem retiradas elas retornariam durante a noite. [...] As fadas, no tempo em que viviam, honravam
depois de sua morte os que viviam, feito, outrora, alguma coisa boa durante sua
vida e construíam grutas indestrutíveis para colocar as cinzas, ao abrigo da
malevolência e da destruição do tempo. Elas vinham, frequentemente, conversar
com os mortos. E diz-se que sua influencia benfeitora espalhava na região um
encanto indefinível, ao mesmo tempo que abundância e prosperidade... Desde
muito tempo, as fadas, infelizmente, desapareceram, mas o monumento permaneceu.
Nas noites, quando a brisa sopra ao lado de fora, ouvem-se, como que
lamentações, na rocha-das-fadas, e diz-se que são os mortos que lá repousam,
que chamam as fadas protetoras, e que seus lamentos se renovarão até que elas
retornem. Há pouco tempo ainda, os jovens da região vinha à rocha-das-fadas
para interrogar o destino. Nas noites de lua cheia, viam-se namorados contornar
o dólmen, cada um num sentido, e contar as pedras. Se os números obtidos não
fossem diferentes de mais ou de menos de dois, era um bom presságio: o
casamento era para logo. [...] O
mágico Merlin, escreve Fernand Niel, transportou a Dança-dos-Gigantes que
compõem as pedras de Stonehenge, da Irlanda para a planície de Salisbury. Um
fantasma tinha-se domiciliado num dólmen de Noordsleen (Paises-Baixos). Saindo
de noite de seu esconderiho o fantasma errava no campo, entregava-se a
apavorantes brincaderias na colina vizinha. A avó dos diabos passeava, um dia,
levando sobre a cabeça a mesa do dólmen Há-Heun (Coréia) e embaixo dos braços,
os suportes. Achando a carga pesada demais, a diaba quis repousar. Colocou no
chão as lajes que mantinha embaixo dos braços, e estas ficaram em pé, enquanto
que, sentando-se, a laje que carregava na cabeça, colocou-se naturalmente sobre
os suportes. [...] É em Keloas, perto
de Plouarzel, que se ergue o menir de Saint-Renan, o mais alto e,
provavelmente, o mais notável de Finistère. [...] Os recém-casados, escreve em 1827, rendem-se devotadamente ao pé desse
menir e, depois de se terem em parte despojado de suas vestimentas, a mulher de
um lado, o esposo do outro, esfregam o ventre contra uma das saliências. O
homem pretende, através dessa cerimônia ridícula, e a mulher pretende, assim,
ter a vantagem de ser a dona absoluta da casa e governar inteiramente seu
marido. [...] O menir de Moelan, que
tem uma protuberância de um so lado, é objeto das mesmas praticas que o de
Kerloas. [...] Os que conseguiam
lançar uma moeda no cume do megálito eram assegurados de se casarem no mesmo
ano. Perto de lá, o menor de Saint-Genit era objeto de práticas fálicas.
[...] Até 1909 as jovens casadouras de
Crozon vinham montar num menir tombado perto da gruta de Morgat. Essas práticas
de escorregadelas com traseiro nu deviam ser frequentes. [...] As jovens da região praticavam esse ritual
sobre o menor de Locmariaquer na noite de primeiro de maio. Essas superstições
eram, seguramente, muito mal vistas pela igreja que mandou suprimir, por isso,
um certo número de megálitos. Foi o caso do menir de Saint Cado em Ploemel e do
menir tombado de Kerbénes do qual Guánin nos diz que era da parte das mulheres
e das jovens objeto de praticas tais, que foi destruído e serviu ao calçamento
das estradas.Nos alinhamentos do Ménec, em Carnac, encontrava-se um menor
chamado o navio que foi tombado e quebrado em 1815. Paul Sébilot, na sua obra
Folklore de France, conta que esse megálito dava lugar a uma estranha dança
ritual ainda praticada no fim do ultimo século. Nas noites de lua cheia, os
casais vinham dançar completamente nus em torno do menir. O homem perseguia a
mulher enquanto os pais dos esposos faziam a ronda vindo de um outro menir
chamado muito corretamente a sentinela. A mulher, supondo-se curada de sua
esterelidade, acabava por render-se ao marido. [...] Nesses lugares desenrolavam-se ritos pagãos, no decorrer da noite que
precedia a festa do perdão local, no mês de agosto. Os homens banhavam-se
inteiramente nus na fonte, pois acreditavam que sua água curava os reumatismos.
Torneios de luta bretã ocorriam, interrompidos por danças e fortes libações. As
mulheres deviam esperar o nascer do dia para irem banhar-se na água sagrada, de
um modo um pouco menos frívolo que o dos homens. [...] Satã leva o baile a Saint-Briac-sur-Mer, em Ille-et-Vilaine. No cume do
outeiro-Girault erguia-se um dólmen que hoje coroa o calvário de
cruz-dos-marinheiros. Jovens, conta a lenda, vinham dançar em volta do
megálito. O clero, considerando essas rondas como ocasiões de pecado, está na
origem da lenda que diz que, uma noite, Satã veio misturar-se aos dançarinos. O
diabo seduziu uma jovem pouco selvagem e levou-a com ele. Foi preciso a
intervenção do padre armado com seu hissope para fazer Satã fugir sob o efeito
da água benta. Mas o diabo agarrou-se desesperadamente pedras do dólmen e suas
garras lá escavaram as cupulazinhas curiosas que lá se encontram ainda hoje.
[...] Uma noite que, como de costume,
rapaes e moças dançavam entre as pedras, Satã misturou-se ao baile. Ao primeiro
canto do galo, a terra abriu-se. No meio dos gritos e das chamas, os dançarinos
foram devorados pelo inferno... Bela alegoria para renunciar a dança como fonte
de pecado e alimentadora do inferno. Na landa de Moulin, perto de Langon, em
Ille-et-Vilaine, cerca de 30 menires têm o nome de demoiselles: parece que são
moças que preferiram ir dançar na landa a ouvir a missa. Para puni-las, Deus
petrificou-as. Dançava-se, aparentemente sem perigo, nas noite de São João em
volta do dólmen de La Roque-Belan, em Guernesey. Não jovens pecadores, mas
fadas em Chateau-la-Valiére, Indre-et-Loire, onde estas últimas vem dançar toda
noite em volta do menir. [...] Alguns
estudiosos de hoje, escreve Denis Roche, admitem que o menir simbilizava o
duplo aspecto da sexualidae: ele teria sido macho, por sua ereção para o céu
(relacionando-se com os mitos do fogo/raio/pedras de raio), e fêmea por estar
afundado na terra (relacionando-se com a água, o que, por sinal, não é muito
claro). Visto que alguns menires estariam encarregados mais particularmente de
poderes masculinos, em dado momento de sua antropomorfização, poder-se-ia
logicamente supor que as outras pedras teriam recebido uma grande concentração
de encargos femininos. Aliás, alguns antropólogos admitem que certos menires
com caneluras verticais – por oposição ao sulco bálano-prepucial do fato
masculino – seriam falos femininos: assim como o raio de Goulien em Beuzec. Os
estudiosos, conclui mais adiante o autor, diem que talvez deva-se considerar o
falicismo apenas como um momento dentre todas as fases de evolução da pedra
erguida primitiva, apenas um aspecto da antopomorfização ritual das forças
elementares naturais (sol, raio, fecundidade, etc).[...] A mais celebre dessas figuras é a de
Saint-Sernin em Aveyron. Esse ídolo feminino é esculpido sobre dois lados de
uma laje de arenito vermelho de 1,20m de altura, 70 centimetros de largura e 20
centímetros de espessura. [...] O
corpo deste ser sobrenatural é cintado por uma tanga. Os membros são faixas
lisas, chapadas sobre o corpo e que findam em cinco espécies de franjas (os
dedos dos pés e das mãos). [...] Certamente
trata-se da grande deusa neolítica associada aos ritos da fecundidade, espécie
de Deméter pré-histórica considerada como força nutritiva benfeitora da
humanidade agrícola. [...]. Trechos extraídos da obra A civilização dos
megálitos (Ferni, 1977), do historiador Marc Orens.
AGENDA: SARAU POÉTICO – Acontecerá neste sábado, dia 22/10, a partir das 14hs, em Curitiba, o
Sarau Poético, organizado pelas poetas Conceição Gomes, Marinez Novaes, Vanice
Zimerman, Ione Perez e Luciah Lopes. Imperdível. Veja
detalhes do evento aqui &
mais aqui e aqui.
REGISTRO: POR UM NOVO DIA
Entre os
anos 1985/87, reuni alguns músicos e realizei o show Por um novo dia, evento
em que selecionei minhas canções e resolvi cantá-las no palco. A imagem acima é
o pôster do show realizado na arte do ator e artista plástico Rolandry Silvério. Veja detalhes aqui.
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
Tantos
são os dias que separam a tua existência da minha que as palavras perdem o
sentido, tornam-se indagações quando deviam ser carinho, um descanso, um
conforto de abraço, um sabor de beijo. O abando vai esfoliando a pele abrindo
caminhos, expondo a alma, que uma vez nua - se esconde - no silêncio e na
saudade que não sente vergonha de ser.
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.