VAMOS APRUMAR A CONVERSA? QUANDO
OS ANJOS PAGAM O PATO PELO DESMANTELO NO CÉU – Os dois pariceiros, Tolinho e Bestinha, se espremeram na
junta trabalhista para receberem os direitos indenizatórios de oito anos de
litígio com uma usina-de-cana-de-açúcar dos cafundós de Judas. Amealharam, com
isso, até um montante bom, de chegar a tomarem uma e todas as outras, dois dias
encarreados. Pinguçada geral. Queriam tomar de aguardente o que o dinheiro
desse. Não era muito, não, mas dava para arrastar o solado do pé por aí. Ainda
compraram vestimentas mais decentes de curau numa tolda de feira do mercado; encheram
a pança de ficar arrotando aos peidos e ao léu; surrupiaram um retratinho dos
santos Cosme e Damião dum alesado que se passava por sortudo de plantão; calçaram
uma galocha sonhada e se embelezaram com uma volta de ouropel ao pescoço, e se
embebedarem de novo aprontando das suas por horas seguidas, sobrando, enfim,
depois de toda gastança, ainda, uns trocados bons no bolso. Até que mais tarde,
mais lavados que jipe ladeira abaixo, as ideias clarearam. - Tô cum vontade de
ir em Sumpaulo! - balbuciou Tolinho. - Minino, meu sonho é avoar de avião! -
avalizou Bestinha. - Rumbora comprar passage e avoar, bora? - Bora! Se
atreparam no cata-côrno e foram pro aeroporto. Chegaram no guichê da companhia
e se arrepiaram logo com o valor da passagem. - Eita negócio caro do cão, quage
vale mais que vinte anos de trabaio com sol graúdo no toitiço da gente, que
incaristia, doido! - Do jeito que a gente vai, num torna de jeito nenhum! Depois
do alinhamento das ideias na doidice, fecharam, pagaram em moeda corrente vigente
nacional e quase ficaram por não portarem bagagem alguma. - Ôxe, a gente vai
pissiar, meu, vorta já! Trupicaram na escada e quase relam a cara na pista de
pouso. Enganchados no comandante, se aboletaram na última fileira de cadeira da
aeronave e céu e mar. - Vumo ficar aqui no fundo, que quarqué coisa, nóis
inscapole fora! Na decolagem, Bestinha teve uma caganeira revoltosa de incensar
tudo. - Inté pareci cá cumida num se deu cum meu bucho! - E se esse bicho se
arvorá de cair, tamo frito! - Bota essa boca pra lá, lazarento! Tolinho ficou
rezando pros santos de sua predileção. Ôxe, num deu tempo de nada. O avoante
despencou pior que tomahawky, dando
cabo da vida deles e de outros tantos passageiros numa explosão de sobrar nem
cinzas. Foram direto pro céu. - Cagada da pôrra, meu, este bicho cair logo no
dia ca gente se asujeita a avoar nele! - É que tu tem pé frio, desgraçado. Boca
de praga! Não se entenderam e só se emendaram depois de uns bregues desferidos
por São Pedro. - Documentos? - sentenciou o santo porteiro do céu. - Quis
documento, santo? - ironizou Tolinho. - Todos! - Cuma assim? - RG, CIC, título
de eleitor, PIS/PASEP, carteira profissional, reservista militar, comprovante
de água, luz, telefone, FGTS, fator Rh, exames médicos, seguro-desemprego... -
Peraí, Sumpêdo, aqui é o céu ou o cadrastumenti do cartóro inleitorá? -,
perguntou Bestinha já decepcionado com a recepção. - Num seria, entonse caixa
de banco, não? – interrogou Tolinho, meio que sem jeito. - Ou crediáro de loja
ou coisa assim, é? - Bora, bora, passem logo os documentos! - Ô, santo Sumpêdo,
o sinhô já viu dizê por um acauso que boia-fria e faz-tudo qui só aveve de bico
andá endecumentado assim, é? Impasse brabo. Tanto fizeram que sacaram dos
bolsos uma CTPS já desmanchando, o título de eleitor rasgado, o RG desbotado,
restinho da grana, hem hem, tudo caindo em bandas, deteriorados de dar trabalho
pro porteiro juntar aquelas tranqueiras todas em estado mais que deplorável num
documento só. - Preenche aí o formulário de solicitação! - mandou o santo. -
Cuma é, mermo? Espia só que astuça desse home. - Vamos, se quiserem entrar no
céu tem que preencher! Apertaram os dedos, agarraram o lápis e saíram
desenhando por horas os garranchos no papel. São Pedro quase teve um troço
quando foi conferir a seboseira. Aí o santo achou por bem relevar nas
formalidades e partiu pra conferência dos pecados deles. Deu-se o maior arrepio
na cabeça do porteiro ao constatar que todos os mandamentos e todos os pecados
capitais eles já haviam infrigido. A serasa do céu pocou na hora com as léguas
de restrições. - ...Inadimplentes no mercadinho, na farmácia, armarinho de
miudezas, ora, com uma folha corrida dessas, vão pro inferno! - Pronto,
Bestinha, agora vamo tostá nas presepas do diabo! Defenestrados dali, estavam
eles assando nas profundas do inferno, sem saber o que podiam fazer. - Quem é?
- perguntou o endiabrado. - Sumo nóisis, eu e Bestinha! - Valei-me santo
demoníaco, bota esses dois pra lá que querem me destronar! Foi um corre-corre
da pêga de estornarem os dois a ficar entre o céu, o inferno e o purgatório,
sem poder adentrar em nenhum dos três. E agora? O diabo com medo que eles
golpeassem o estado, fez um acerto de contas: - Vocês voltem pra terra, que lá
ainda tem muita confusão por se fazer!! - Craro, a gente num pode é ficar aqui
no osso do mucumbú, sem saber pronde sadiantar! - reclamou indignado Bestinha.
- Ôba, vumo azucrinar os vivente mole de novo? - festejou Tolinho. - Êpa, maisi
prá disgrama de vida da gente, num vorto forma nenhuma! - embirrou Bestinha. -
Isso mermo, só so santo ruim aí, dé umas cumpensação! - O quê, por exemplo! -
Vida boa, mulé boa, dinheirama e foiga pra gente se infincar de nunca mais
querê vim pru cá. -, passou a régua, Tolinho. - Isso mermo! - afiançou
Bestinha. - Tá certo, mas vocês quando chegarem na terra tem que dizer que eu
sou o bom e que o céu é ruim. - Homi, seu minino, fechado! Meiór qui issos, só
dois diussos, oxente bichim! - Jurado com as cruizis na boca por palavra de
home! - S imbora, curau! Pois é, estão ralando até hoje na catação do lixo, no
maior revestrés de vida, reclamando da charlatanice do diabo e da chatice de
São Pedro. - Quar qui é a diferencia do paraíso pro inferno? - Nóisis inda vumo
ser rico, se vamo! Tirá o pé da merda, mesmo! - Nóisis tumém sumo fio de Deus,
num sômo? - Sômo. E vamos aprumar a conversa aqui e aqui.
Imagem: Female
nude study, do artista
plástico britânico Charles Knight
(1901-1990)
Curtindo dvd da ópera em quatro atos Aida (1871), do compositor italiano Giuseppe Verdi (1813-1901), com liberto
de Antonio Ghislanzoni, com direção do cineasta italiano Franco Zeffirelli, solistas Adina Aaron, Kate Aldrich e Scott
Piper, condutor Massimiliano Stefanelli com a Orquestra e Coro delaa Fondazione
Arturo Toscanini. Veja mais aqui.
COGNIÇÃO, NEUROPSICOLOGIA E
APRENDIZAGEM - O livro Cognição, neuropsicologia e aprendizagem:
abordagem neuropsicológica e psicopedagógica (Vozes, 2009), de Vitor Fonseca, aborda temas como a
modificabilidade cognitiva, avaliação psicopedagógica dinâmica, a pedagogia
mediatizada, as dificuldades de aprendizagem, a emergencia da cognição,
organização neuropsicológica da cognição na abordagem luriana, abordagem
cognitiva da aprendizagem humana, entre outros assuntos. Na obra destaco os
trechos: [...] A escola e a maioria das
instituições sociais envolvidas na formação e na qualificação dos recursos
humanos têm negligenciado as vantages da educação cognitiva, que basicamente
não ensina conteúdos disciplinares ou matérias de conhecimento, mas, ao
contrário, visa desenvolver e maximizar os processos de captação, integração,
elaboração e expressão de informação, no fundo, tudo o que se pode definir como
aprendizagem. A sociedade em geral e a escola em particular, assim como todos
os seus agentes que lidam direta ou indiretamente com o desenvolvimento do
potencial humano, ainda desconhecem as vantagens e os benefícios da intervenção
psicopedagógica no domínio da cognição. [...]. Veja mais aqui, aqui, aqui e
aqui.
SEGUNDA NATUREZA – No premiado romance Amor de Verão (One Summer, 1987), da
escritora estadunidense Nora Roberts,
encontro a narrativa Segunda natureza, na qual é contada a história de uma
repórter determinada a conseguir uma entrevista exclusiva com um solitário e
renomado escritor de livros de terror e que fica fascinado com o magnetismo
dela, abrindo uma exceção com uma exigência desafiadora: acampar com ele por
duas semanas numa paragem paradisíaca. Da obra destaco o trecho: [...] Satisfeito, Hunter caminhou na direção da
bem empilhada bagagem de Lee. Ela não acreditava em viagens leves, reparou ele,
examinando a mochila, a pequena mala Pullman e a pasta. Mas que mulher
acreditava nisso? Sua filha Sarah não levara duas malas para a curta estada de
três dias com a irmã em Phoenix? Era estranho que sua filhinha já fosse quase uma
mulher. Talvez não fosse tão estranho assim, refletiu Hunter. Os seres do sexo
feminino já nascem quase inteiramente mulheres, ao passo que os seres do sexo
masculino levam anos para sair da infância — quando saem. Talvez fosse por
causa disso que ele confiava muito mais nos homens. Lee o viu quando voltou
para o saguão. Estava de costas para ela, de tal forma que teve a impressão de
estar vendo apenas um homem alto, esguio e de cabelos pretos descuidadamente
encaracolados até a gola da camiseta. Bem na hora, pensou ela com satisfação e
o abordou.— Sou Lee Radcliffe. Quando ele se virou, ela enrijeceu, o sorriso
impessoal congelando-lhe o rosto. No instante inicial, não pôde definir por
qual motivo. Ele era atraente — talvez atraente demais. O rosto era estreito,
mas não tinha um ar acadêmico, tinha as feições duras, mas não rudes. Era, em
excesso, uma combinação dos dois, muito mais do que uma característica ou
outra. Tinha o nariz reto e aristocrático, ao passo que a boca era esculpida
como a de um poeta. Seus cabelos eram escuros, cheios e rebeldes, como se
tivesse dirigido em altíssima velocidade por horas a fio contra o vento. Mas
não foi nada disso que a fez perder a voz. Foram seus olhos. Ela jamais vira
olhos tão escuros quanto aqueles, tão incisivos, tão... perturbadores. Era como
se olhassem através dela. Não, não através, corrigiu de pronto Lee, dentro
dela. Em dez segundos, eles olharam dentro dela e viram tudo. Ele viu um
formidável rosto, branco como o leite, com olhos melancólicos escancarados pela
surpresa. Viu uma boca suave e feminina, com uma leve cor. Viu nervosismo. Viu
um queixo obstinado e cabelos cor de cobre que deveriam parecer seda ao toque
dos dedos. O que viu foi uma mulher equilibrada por fora e tensa por dentro,
que tinha um aroma das noites de primavera e parecia modelo de capa da Vogue.
Se não fosse a tensão interior, talvez a tivesse dispensado, mas o que ficava
por baixo da superfície das pessoas sempre o intrigou. Olhou para a organizada
bagagem de modo tão veloz que seus olhos deram a impressão de que jamais
abandonariam os dela. — Pois não? — Bem, eu... — Forçada a engolir as palavras,
ela baixou o tom de voz. O que bastou para enfurecê-la. Não começaria a
gaguejar por causa de um motorista de hotel. — Se você veio me apanhar — disse
Lee, bruscamente —, vai precisar levar minha bagagem. Ele ergueu as
sobrancelhas, mas não disse nada. O erro dela era simples e óbvio. Uma única
frase da parte dele corrigiria tudo. Mas o erro era dela, não dele. Hunter
sempre acreditou mais nos impulsos do que nas explicações. Pegou a Pullman e em
seguida encaixou a correia da mochila no ombro. — O carro está lá fora. Ela se
sentiu muito mais segura seguindo atrás dele com a pasta nas mãos. A sensação
de estranheza, disse para si mesma, vinha da ansiedade e do longo voo. Homens
jamais a surpreendiam; certamente nunca chamavam sua atenção daquela forma e
muito menos a faziam gaguejar. O que precisava era de um banho e algo um pouco
mais substancial do que um cachorro-quente para comer. O carro ao qual ele se
referira não era exatamente um carro, reparou ela, mas um jipe. Supondo que
fazia certo sentido, com estradas íngremes e invernos inclementes, Lee entrou
no veículo. Movimenta-se com desenvoltura e veste-se impecavelmente. Ele também
reparou que ela roía as unhas. — Você é da área? — perguntou Hunter, puxando
conversa enquanto acomodava a bagagem. — Não. Estou aqui para o congresso de
escritores. Hunter entrou, sentou ao lado dela e bateu a porta. Agora ele sabia
para onde levá-la. — Você é escritora? Ela pensou nos dois capítulos de seu
livro inacabado que levara caso necessitasse de um disfarce. — Sou. Hunter
contornou o estacionamento e pegou o caminho que dava na estrada principal. —
Sobre o que escreve? Lee recostou-se e decidiu que talvez devesse tentar testar
sua história nele antes de cair no meio de duzentos escritores e aspirantes a
escritores. — Já escrevi artigos e alguns contos — disse ela, sem mentir.
Depois acrescentou o que raramente contava para alguém. — E comecei um romance.
Ele entrou na rodovia numa velocidade que a surpreendeu mas não a inquietou. —
E vai terminá-lo? — perguntou ele, demonstrando um discernimento que a
perturbou. — Acho que isso vai depender de vários fatores. Ele deu uma nova e
cuidadosa olhada nela. — Tais como? Ela queria mudar de posição no assento, mas
forçou-se a permanecer parada. Este era exatamente o tipo de pergunta a que
talvez fosse obrigada a responder ao longo daquele fim de semana [...].
Veja mais aqui.
POEMAS DO DESEJO – No livro As palavras do corpo: antologia de poesia erótica (1937 – Leya,
2012), da poeta e editora portuguesa Maria
Teresa Horta, destaco, inicialmente, o Poema ao desejo: Empurra a tua espada / no meu ventre / enterra-a
devagar até ao cimo / Que eu sinta de ti / a queimadura / e a tua mordedura nos
meus rins / Deixa depois que a tua boca / desça / e me contorne as pernas de
doçura / Ò meu amor a tua língua / prende / aquilo que desprende da loucura.
Também o poema A vagina: É cálida flor / E
trópica mansamente / De leite entreaberta às tuas / Mãos / Feltro das pétalas
que por dentro / Tem o felpo das pálpebras / Da língua a lentidão / Guelra do
corpo / Pulmão que não respira / Dobada em muco / Tecida em água / Flor
carnívora voraz do próprio / suco / No ventre entorpecida / Nas pernas
sequestrada. Por fim, o poema Masturbação: Eis o centro do corpo / o nosso centro / onde os dedos escorregam
devagar / e logo tornam onde nesse / centro / os dedos esfregam – correm / e
voltam sem cessar / e então são os meus / já os teus dedos / e são meus dedos /
já a tua boca / que vai sorvendo os lábios / dessa boca / que manipulo –
conduzo / pensando em tua boca / Ardência funda / planta em movimento / que
trepa e fende fundidas / já no tempo / calando o grito nos pulmões da tarde / E
todo o corpo / é esse movimento / que trepa e fende fundidas / já no tempo / calando
o grito nos pulmões da tarde / E todo o corpo / é esse movimento / em torno / em
volta / no centro desses lábios / que a febre toma / engrossa / e vai cedendo a
pouco e pouco / nos dedos e na palma. Veja mais aqui, aqui e aqui.
O MONTA-CARGAS – A peça teatral O monta-cargas (Tempo, 1962), do dramaturgo, poeta e roteirista
britânico Harold Pinter (1930-2008),
conta a história de dois assassinos profissionais angustiados em um quarto de
hotel decadente na Inglaterra, preparando a execução de um serviço contratado
por uma organização misteriosa, num clima de tensão, silêncio, surpresas e
humor. Da obra destaco o trecho na tradução de Márcio Westphalen: Quarto em um sótão, em algum lugar de
Birmingham. É uma noite de outono. Há duas portas a direita e esquerda,
respectivamente, da parede do fundo do cenário. No centro da parede se vê uma
saliência, que logo resulta ser um monta-carga. Há duas camas, uma à direita e
outra à esquerda da saliência; a da direita pertence à Gus e a da esquerda
pertence a Ben. Ambas têm as cabeceiras colocadas contra a parede e os pés ao
público. Contra a parede da esquerda, à frente, há uma cadeira de encosto reto.
A porta da esquerda leva ao banheiro e à cozinha. As duas camas estão feitas,
mais algo as revira; em cada uma delas estão penduradas às gravatas, os coletes
e as bolsas respectivas de ambos os homens. De baixo de cada travesseiro, um
revolver e uma pistoleira) (Ao levantar o pano, Ben está deitado na cama da
esquerda, lendo o diário. Gus está sentado, no lado direito da cama da direita,
amarando com dificuldade os cadarços dos sapatos. Os homens vestem camisas de
manga, com calças compridas e suspensórios. Gus ata os cadarços, se levanta,
boceja, e começa a caminhar devagar até a porta da esquerda. Detêm-se, abaixa o
olhar e sacode um pé. Ben abaixa o diário e observa Gus. Gus se ajoelha e
desata o sapato; e o tira lentamente. Olha para dentro dele e tira uma caixa de
fósforos achatada, que sacode e examina. O olhar de ambos se encontra. Ben
agita o diário e lê. Gus guarda a caixa de fósforos em seu bolso e se agacha
para colocar o sapato. Com dificuldade amarra os cadarços. Ben baixa o diário e
o observa. Gus se ajoelha, desata os cadarços, e de novo tira lentamente os
sapatos. Olha dentro e tira um maço de cigarros amassados. O sacode e o
examina; novamente os olhares de ambos se encontram. Ben move o diário fazendo
um ruído e segue lendo. Gus guarda o maço no bolso, se agacha põe o sapato e o
ata. Logo se afasta para a esquerda. Ben atira com violência o diário sobre a
cama e segue a Gus com o olhar bravo. Pega o diário e se deita na cama de
barriga para cima, lendo. Segue um silêncio. Logo se ouve um ruído da corrente
do banheiro. Puxada duas vezes, mas sem que a água corra. Este ruído vem da
esquerda. Silêncio de novo. Gus volta a entrar pela esquerda e detêm-se na
porta, coçando-se a cabeça. Ben atira o diário com força) BEN – Uaajj!!! (pega
o diário) O que tu achas disto? Escuta. (Referindo-se ao diário) Um homem de
oitenta e sete anos quis cruzar a rua. Mas havia muitíssimo trânsito. Não
encontrava maneira de passar. Em vista disso, se mete de baixo de um caminhão.
GUS – Que fez? BEN – Se meteu debaixo de um caminhão. Um caminhão estacionado.
GUS – Não! BEN – O caminhão começou a andar e o passou por cima. GUS – Bah! BEN
– É o que diz aqui. GUS – É, as coisas que passam! BEN – É como fazê-lo se
vomitar, certo? GUS – Quem lhe recomendou que fez a coisa da semelhança? BEN –
Um homem de oitenta e sete anos se mete de baixo de um caminhão! GUS – Não é
para acreditar. BEN – Aqui está, em letras de fôrma. GUS – Incrível! (Silêncio.
Gus balança a cabeça e sai pela esquerda. Novamente, desde fora à esquerda, um
puxão da corrente do banheiro, mas a água não corre. Ben vaia diante a um
artigo do diário. Volta Gus) Quero te perguntar uma coisa. BEN – Que tu estavas
fazendo ali fora? GUS – Bom, estava... BEN – Que tem de chá? GUS – Ia
exatamente a preparar-lo. BEN – Bom, prepare-o. GUS – Sim, já vou. (Se senta na
cadeira da esquerda. Jogando com seus pensamentos) O que poço dizer é que desta
vez pus uma louça muito bonita. Com uma espécie de barras. Barras brancas. (Ben
lê) É muito bonita. Não tenho dúvida. (Ben volta à folha) Na xícara. Na borda,
ao redor. O resto é todo preto, sabe? O pires é preto, menos no meio, onde se
coloca a xícara. Ali é branco. (Ben lê) Os pratos são iguais, sabe? Só que tem
uma barra preta... os pratos, que os atravessa pelo centro. Sim, estou
encantado com a louça. BEN – (sem deixar de ler) Para que queres pratos? Não
vais comer. GUS – Eu trousse uns biscoitos. BEN – Bom, será melhor que os coma
logo. GUS – Sempre trago alguns biscoitos. Ou uma torta. É que... Claro, não
posso tomar chá se não como algo. BEN – Bom, nesse caso, quer preparar o chá?
Estamos perdendo tempo. (Gus tira o maço amassado de cigarros e o observa) GUS
– Tem cigarros? Acho que os meus terminaram. (Atira o maço para cima e logo se
inclina para pegar-lo) Espero que este trabalho não seja muito cumprido.
(Fazendo pontaria com cuidado, atira o maço debaixo da cama) Oh! Queria te
perguntar uma coisa. BEN – (arremessando o diário) Bahh! GUS – Que ouve? BEN –
Uma criatura de oito anos matou um gato. GUS – (Não acreditando) Vamos! BEN – É
verdade! O que tu acha? Uma criatura de oito anos que mata um gato. GUS – E
como o fez esse menino? BEN – Era uma menina. GUS – E como o fez essa menina?
BEN – E... (Levanta o diário e o observa) Não explica. GUS – Por que não? BEN –
Espera um momento. Diz somente... “O irmão, que tem onze anos, considerou o
incidente desde o galpão das ferramentas.” GUS – Oh! BEN – Isso é completamente
ridículo. (Pausa) [...]. Veja mais aqui.
GLEN OR GLENDA – O filme Glen or Glenda (1953), dirigido pelo cineasta estadunidense Ed Wood
(1924-1978), são considerados, tanto o autor como o filme como os piores já
existentes que se transformou em cult, abordando temas do travestimento
masculino e da transsexualidade, com uma narrativa tolerante aos fenômenos,
intercalando falas e fatos científicos com intervenções sinistras e
sobrenaturais, com narrativas orais que aludem a desvios sexuais, fetichismo,
estupro, sadomasoquismo. O destaque do filme vai para a atriz e compositora
estadunidense Dolores Fuller
(1923-2011), então namorada do diretor. Veja mais aqui.
IMAGEM DO DIA
A arte do escultor Richard Senoner.
Veja mais no MCLAM: Hoje é dia do
programa Noite Romântica, a partir
das 21 hs, no blog do Projeto MCLAM, com a apresentação sempre especial e
apaixonante de Meimei Corrêa. Em seguida, o programa Mix MCLAM, com Verney Filho e na
madrugada Hot Night, uma programação
toda especial para os ouvintes amantes. Para conferir online acesse aqui .
VAMOS APRUMAR A CONVERSA?
Dê livros de presente para as crianças.