VAMOS APRUMAR A CONVERSA?
MACHETES DO DIA DE SEMPRE - Estava
eu à cata de um assunto para esta crônica e não me vinha nada à cabeça. Então,
com a experiência de escrever crônicas diárias por cinco anos seguidos e
ininterruptos, quando ocupava o respeitável cargo de chefe do departamento de
redação da Rádio Quilombo dos Palmares FM, todo dia, chovesse ou fizesse sol,
eu emplacava depois do Grande Jornal Quilombo, uma crônica fresquinha saída do
forno na hora. Isso foi, exatamente, no período entre 1986/1991. Essa prática valeu-me
apender o uso da criatividade, inventando recursos de todo tipo para não deixar
passar em branco. Era uma peleja vasculhar de tudo com o fito de tascar uma
ideia sapecada pras minhas palavras do dia. E como na vida do interior as
coisas chegavam atrasadas e eram digeridas apressadamente pros boi-de-fogo da
boataria, ou demoradamente retardadas até não valerem nada, desde então, fiquei
com uma impressão danada que não me abandonou até hoje. Vamos lá. Para bater
firme o centro todo dia com uma croniqueta, rebuscava notícias de jornais,
fatos históricos, intrigas atuais, descasos, até desatinos. Bastava o mote, eu
glosava, fosse o que fosse. Aí, dia após dias, quatro anos de pisada firme, fui
descobrindo duas coisas: a primeira, ou o mundo parou ou a gente faz a mesma
merda todo dia. Ou, então, ou os jornais se repetem todo dia ou copiam uns aos
outros. Foi. Primeiro peguei as manchetes do dia e, ao relê-las nos diversos
jornais que dispunha, tive o estalo de constatar que já havia dado essas
novidades. Peraí. Não pode. Fui ver noutros jornais do dia anterior. Eita! Fui pros
dos últimos dias, as mesmas; depois, semanas, deu no mesmo. Aí bem intrigado,
levantei-me e fui até o quartinho onde eu reunia monturos de jornais jogados de
dias passados e puxei um do primeiro monte: nossa, era de seis meses atrás. Ué,
a vida não passou não, foi? Puxei doutra pilha desarrumada, era de três anos
passados, nada de novo. E juntei uns dez e fui conferir detalhadamente.
Conclusão: oxe! Verdade, veja: rombo com desvio de verba pública em estatal
deixa população sem atendimento! Bullyin lidera nas escolas do país! Aumento da
gasolina encarece produtos e serviços! Desempregados aumentam as estatísticas
no Brasil! Estados Unidos lidera pesquisa! Apenas 8% dos homicídios são
solucionados na Justiça brasileira! Novela bate recorde de audiência! Assaltos
a banco crescem! Praia poluída causa problemas de saúde! Lixo é problema nos
Municípios! Tudo pronto para o clássico do final de semana! Escolas, seguros e
planos de saúde na mira dos Procons! Crise avassala todo mundo! Babau. Isso
tudo, em jornais da época, diferença de dias, semanas, meses e até anos. Hoje,
com as manchetes dos diários impressos, da internet, do rádio ou da televisão, que
matei a charada: basta só mudar a alternância da notícia que ela será sempre
nova porque tanto faz ser de 1986, 1996, 2006 ou 2016. Acredita? Então, confira
agora qualquer jornal escrito, falado, internetado ou televisado. Viu? Parece com
o de ontem? E anteontem? E anteantonte? Checou? Tanto faz! Jornal de hoje ou do
ano passado é a mesma coisa. Ou os caras copiam, ou o mundo parou. Será? A gente
está fazendo alguma coisa, ou tudo virou inútil e a gente não faz nada, só na base
do bem-bom. Ah! Acho que tem outra coisa. Sim, a segunda coisa que deixei
suspenso no ar. Incrédulo, digo de antemão: será? Lembro de uma crônica do
Fernando Sabino, O rádio, esse mistério,
em que ele fala que trabalhou alguns anos na BBC de Londres e que sempre foi
bastante ouvida, mas que nunca viu ninguém falar que ouviu nada do que ele fez
durante anos. Êpa! Eu também escrevi e locutei uma crônica do dia por cinco anos
seguidos e nunca, nunquinha, ninguém – e lembro de viva memória sã - sequer
disse ter ouvido uma frase que seja que eu tenha dito nas crônicas. Até quando
estive, poucos anos atrás, apresentando o Tataritaritatá
na Rádio Difusora de Alagoas, tive a
mesma sensação. Peraí! Será que as pessoas estão moucas? Cegas? Ou ouvem mas
não escutam, vêem mas não enxergam. Danou-se! Estou como Nietzsche: escrevendo
para todos e ninguém. Que coisa!?! Ora, ora, mas naquele dia, eu tinha que
escrever e a hora já azoava passando, quase tendo de entrar às pressas no
estúdio e mandar ver no jornal com a respectiva crônica. Ou eu ficava na
elucubração ou não escreveria nada. Ora, mesmo não sendo ouvido, ou melhor,
falando pra nada e ninguém, tinha que dar uma solução. E fiz a crônica como o
que ora expresso aqui. Sabia que, mesmo assim, tinha de ir pro ar, afinal ser
profissional tem que estar na responsa. E fiz, mesmo com as manchetes do dia
que, para mim, era de qualquer dia de antanho ou de amanhã, fiz um amálgama com
as manchetes escolhidas a dedo, redigi tudo às pressas, meti as catanas na
crônica e entrei no ar às sete em ponto para mais uma edição do matutino.
Quando findei, me veio a sensação dolorosa que me persegue mesmo até agora: de
que tanto faz ontem, hoje ou amanhã, dá no mesmo: a gente está tão mergulhado
no marasmo do reino da mesmice que nem se dá conta que a vida passa e a gente
vira só passado, acumulando ontens que nada mais representam pro presente quiçá
futuro. Nossa, que coisa! E vamos aprumar a conversa aqui.
Imagem: arte do pintor, escultor e
serígrafo pernambucano radicado nos Estados Unidos, Romero Britto.
Curtindo o álbum Internet Coco, do cantor, compositor e produtor musical Mácleim. Veja mais aqui, aqui e aqui.
COMO ENFRENTAR O CARÁTER:
PREVENÇÃO DA COURAÇA – O
livro O labirinto humano: causas do
bloqueio da energia sexual (Summus, 1980), do psicoterapeuta da escola
reichiniana, Elsworth F. Baker MD, trata
de temas como a formação do caráter e os fatores de encouraçamento, os tipos de
caráter e os efeitos do processo de encouraçamento, trabalho caracterológico e
a remoção da couraça e como enfrentar o caráter e prevenção da couraça, sendo
desta última parte os trechos destacados a seguir: [...] o labirinto é a estrutura emocional do homem, ou seja, sua estrutura de
caráter [...] O melhor que pudemos
fazer até os dias de hoje foi remover os bloqueios depois de estes terem se
desenvolvido. Ninguém escapa de bloqueios esporádicos mas, na medida em que
prevenimos a formação da couraça nas crianças pelo projeto descrito no último
capítulo, capacitamo-las a crescerem com uma independência considerável, com
autoconfiança e aptas a sentirem prazer em viver. [...] Os adolescentes sentem necessidade de serem
reconfortados em seus sentimentos e urgências, que são naturais, sendo também
preciso conhecimento e orientação para enfrentar a atitude antissexual da
sociedade. Os adultos tornaram-se temerosos dos sentimentos e sensações naturais,
por meio de sua própria necessidade de formarem uma couraça, e olham para esse
funcionamento natural como algo que deve ser controlado. Além disso, não
conseguem distinguir entre impulsos primários e secundários, tentando reprimir
ambos. Os secundários são antissociais e precisam ser manipulados, mas os
impulsos primários devem ser vistos com confiança, na sua qualidade de caminho
para o julgamento equilibrado e para a supressão de dificuldades. É verdade que
o adolescente saudável exije seus direitos sexuais, mas da mesma forma se
retrairá frente ao sexo destituído de amor, como também da promiscuidade, do
estupro, da perversão e da brutalidade. Não haveria prostituição. Os
sentimentos e sensações naturais são mais morais do que os da sociedade encouraçada,
mas evidenciam algumas importantes diferenças. Por exemplo, é impensável o
casamento onde acabou o amor. No entanto, a sociedade encouraçada recusa este
motivo “apenas” como razão suficiente para o divorcio. Um individuo que
funcione naturalmente não espera que a missa absolva seus pecados da semana; os
que funcionamento normalmente tampouco perseguem os que não são adeptos de suas
crenças. Nossa sociedade é construída com base no terror encouraçado. Suas leis
são erigidas e defendidas por esse mesmo terror. E são as leis da sociedade que
devemos seguir, não importando quão irracionais elas sejam e, assim,
continuarem a abafar nossos filhos e a esmagar nossos adolescentes para
destruir neles toda sua natureza “animal” e então podermos “civiliza-los”. Tudo
que nossa civilização pôde aprender foi a repressão e o amortecimento das
revoltas. Ela não consegue nem entender nem dar apoio à vida. Há alguns
milhares de anos vem o homem tentando libertar-se dessa armadilha, caindo
sempre de volta no mesmo começo, pois não sabe o que foi que o levou a entrar
nesse labirinto nem como o conseguiu. Sabemos hoje em dia que está preso dentro
dessas malhas da própria couraça muscular que dá ensejo à ansiedade orgástica e
inibe o funcionamento natural e liberto [...]. Veja mais aqui.
OS CABISBAIXOS – No livro Pela cidade (WMF Martins Fontes, 2004), do escritor, advogado,
jornalista, heraldista, tradutor e crítico de cinema, Guilherme de Almeida (1890-1969), destaco a crônica Os cabisbaixos:
Um dos muitos grupos de jovens estudantes
que me têm procurado para entrevistar-me – visitas essas, para mim, sempre
agradáveis pela sadia e contagiosa lufada de mocidade que me trazem –
dirigiu-me, entre as perguntas do seu inteligente questionários, uma que eu não
quis responder de improviso. Pareceu-me importante: e prometi-lhes refletir com
vagar e responder por este meu retalho de jornal, o que ora faço. A pergunta: -
Como vêem os poetas o mundo de hoje? A resposta: - Imagino, julgando-os por
mim, que há de ser apenas com a conformada humildade dos derrotados. Porque o
prático mundo de hoje venceu o teórico mundo de ontem, que era o nosso: o que
tinha o Mistério por princípio, a Imaginação por meio e a Beleza por fim.
Venceu. E, vencedor, visando à alma, primeiro, inventou a psiquiatria, que
devassou o hemisfério da nossa Loucura; e a psicanálise, que desencantou o
hemisfério do nosso Sonho. Insatisfeito com essas conquistas, inventou ainda a
parapsicologia que se propõe rasgar o nosso sagrado véu do Oculto. Depois,
mirando os Espaço Exteriores, por eles ordena que viagem seus engenhos, a
desvendar a face secreta da Lua, nossa amada proibida; ou espionar, viciosos
voyeurs, a gloriosa nudez de Vênus, rainha das nossas Musas; ou devastar o
campo mitológico das constelações a que demos nome e sentido. Vencidos, pois,
os poetas de hoje são cabisbaixos. Quer dizer: curvada a cerviz sob o jugo do
vencedor, resignadamente caminhando olhando o chão: esse chão bem baixo, com
seus rasteiros problemas étnicos, sociais, econômicos, políticos. E dizem-se
“participantes”, para consolar-se e mascarar o revés. Os cabisbaixos! Eu
mesmo... é verdade! Eu... ontem achei maravilhoso, um verdadeiro poema o áspero
roteiro, que acompanhei, de uma formiguinha aleijada tentando levar um pedaço
de folha ao longo de uma laje de pedra do meu jardim. Veja mais aqui.
AS TRÊS MENINAS &
BRANCA ROSA – No livro Pequeno romanceiro (Martins, 1957), do
escritor, advogado, jornalista, heraldista, tradutor e crítico de cinema, Guilherme de Almeida (1890-1969),
destaco inicialmente o poema As três meninas: Tres meninas na varanda, /com seu mister cada qual: / uma fiando fio
claro / como fio de cristal; / outra liando contas de âmbar / com trancelim e
torçal / a terceira, ponto a ponto, / bordando o seu enxoval. / Tres meninas na
varanda, / com seu mister cada qual. / Cavaleiro, que passava / no seu ginete
real, / uma rosa na manopla / tauxiada de ouro e coral, / lança a rosa às três
meninas / (qual das três é o seu ideal?), / finca esporas, vai-se e voa / no
seu corcel Vendaval. / Sustam logo as três meninas / o seu mister cada qual. /
Quem cortou meu fio claro / como fio de cristal? / - Quem deixou fugir as
contas / ao trancelim e ao torçal? / - Quem quebrou a minha agulha / com que eu
bordava o enxoval? / Tres meninas acenando / com seu lenço cada qual. / -
Volta, volta! Cavaleiro, / no cavalo Vendaval! / Vinde buscar vossa rosa, / que
essa rosa é flor de mal: / é um coração cada pétala, / e cada espinho, um
punhal! / Tres meninas na varanda. / Mais nada. Ponto final. E também
Branca Rosa: - Branca Rosa, Branca Rosa,
/ por que está tão branca assim? / É a neve, que caiu tanta / esta noite no
jardim. / Não será neve, que a neve / não pode ser branca assim. / - Vesti
minha cambraia lavada / com aguinha de alecrim. / - Cambraia, por mais lavada,
/ não chega a ser branca assim. / - Fiei-a em roca de prata / com meu fuso de
marfim. / - Não há marfim, nem há prata / que sejam brancos assim. / - O luar
dormiu comigo / no meu lençol de cetim. / Não houve lua esta noite, / nem há
luar branco assim. / - Branca Rosa, Branca Rosa, / por que está tão branca
assim? / - Má hora passou o conde / e o conde olhou pra mim. / Vesti vestido de
noiva, / branco do véu ao chapim. / Mandou que eu visse e esperas: / e por
isso foi que vim. / E, volte ou não volte o conde, / esperarei até o fim: / até
que daqui me levem / amortalhada, ai de mim! / Branca Rosa, Branca Rosa, / vai
tão branca, sem camim! / Rosa branca desfolhada / nunca foi tão branca assim. Veja
mais aqui.
O GUARANI & MARILYN
MONROE - A jovem e bela
atriz de teatro, cinema e televisão Samara
Felippo objetivava tornar-se ginasta quando decidiu estudar teatro,
conseguindo aos 17 anos uma vaga na oficina de atores da Rede Globo e, depois,
cursou cinema no Rio de Janeiro. Em 2001, ela estava participando do filme O
dono do mar (2006) e protagonizou o filme Concerto Campestre. No teatro ela
iniciou com O Guarani (1998), Comunhão de bens (2000) e Êxtase (2007), Hamlet
(2011), Mulheres alteradas e, em 2013, na peça teatral Orgulhosa demais, frágil
demais, ela interpreta Marilyn Monroe. Participou de outras peças como Comunhão
de bens e Intenções perigosas. Por seu talento, ela desenvolve uma trajetória
promissora, aplausos. Veja mais aqui.
BOLERO – O drama Bolero (1934), dirigido pelo cineasta estadunidense Wesley Ruggles
(1889-1972), conta a historia de um arrogante dançarino do teatrão de
variedades, em Paris, que tem por ambição ser o rei dos clubes noturnos da
Europa. Ele estava à procura de parceira ideal para atingir seus objetivos,
quando conhece uma bela mulher com quem faz um par de muito sucesso, sob a
condição de uma promessa: nunca misturarem sentimentos com trabalhos. A
promessa foi mantida até certo tempo, quando os dois se apaixonam e ela se
desilude porque ele só tem objetivo na carreira e quando a guerra surge, ele
alista-se ao exército, retornando mais tarde para reencontrá-la devidamente
casada com um conde, e ele dono de um clube, sem parceira e a convida. É quando
os dois dançam o ponto máximo do filme: a dança do Bolero, do compositor
francês Maurice Ravel (1875-1937). Nesse momento acontece o inesperado. O
destaque do filme vai para a atriz estadunidense Carole Lombard (1908-1942). Veja mais aqui.
IMAGEM DO DIA
A arte do pintor, gravador e litógrafo
austríaco Peter Fendi (1796-1842).
Veja mais no MCLAM: Hoje é dia do
programa Tataritaritatá, a partir das
21 hs, no blog do Projeto MCLAM, com a apresentação sempre especial e
apaixonante de Meimei Corrêa & com muitas atrações. Em seguida, o programa Mix MCLAM, com Verney Filho e na
madrugada Hot Night, uma programação
toda especial para os ouvintes amantes. Para conferir online acesse aqui.
VAMOS APRUMAR A CONVERSA?
Dê livros de presente para as crianças.