TRÍPTICO DQP –- Uma
vez e tantas... - Ao som dos Twelve Preludes for piano (1953), da Galina
Ustvolskaya (1919-2006), na interpretação do pianista estadunidense David
Arden. – Esta a minha vida, aqui o meu lugar. Das experiências de
tenra idade ao quase desespero com o desgoverno do Fecamepa e a inação pandêmica, entre mortos e vivos, o espelho e o travesseiro. Se inusitadas ou inúteis, guardei o que me disse John Updike: São as ideias por trás do meu país, os conceitos de empreendimento e
liberdade individual e como isso funciona na atualidade, que me interessam.
Além do mais, foi o poeta britânico Thomas
Campbell (1777-1844) quem me deu o estalo: Compreender que há outros pontos de vista é o início da sabedoria. Viver
nos corações que deixamos para trás é não morrer. Sim,
isso mesmo, o plural e o heterogêneo, o que sou e a outra. Certa feita, no
íntimo da minha solidão, ouvi Sebastião Salgado: Minha maior esperança é
provocar um debate sobre a condição humana do ponto de vista dos povos em êxodo
de todo o mundo. Constatamos que o mundo está dividido em duas partes: de um
lado a liberdade para aqueles que têm tudo, do outro a privação de tudo para
aqueles que não têm nada. Isso me fez repensar tudo que já havia feito e o
por fazer. Deparei-me com a minha própria carta de gratidão para quem tem uma
história que dá para outra história sobre quase nada ou tudo, o que for. E
sempre o meu convite braços apertos, mãos espalmadas: venha, junte-se.
Duas de uma (Que
dizia: Eu sou o Alfa e o Ômega, o primeiro e o derradeiro; e o que vês,
escreve-o num livro...) - Imagens do
premiado fotógrafo e poeta Xirumba Amorim. - Mesmo
que tudo se parecesse mesmice a cada dia, um sim outro não, algum talvez, quem
dera ou sabe-se lá, nunca é a mesma coisa. Já passei por muitas e boas, sempre
adiante. Teve uma vez, entre lá e loa, lá estava João, homem comum que saiu das
grades depois da queda das drogas e tornou-se asceta pelas ruas, a discernir o
duelo entre o bem e o mal. Dele pude perceber a perdição e que o pior não está
por vir, já degenerou faz tempo e agora tudo está perdido no meio da loucura, quanto
não de sórdido e escatológico, entre ladainhas religiosas e licenciosas
risadagens: o grotesco nos espreita, o horror gratuito e ninguém sabe o que
fazer da vida nem de nada, apenas mergulha a alma corrompida na lama da vileza
escancarada. Ninguém é inocente. E não mais o vi, perdeu-se e me deixou no redemoinho
do Apocalipse do Fernando Bonassi que me Sorria:
Deposite aqui. Aguarde. Ficha no caixa. Leve
três. Aceitamos todos os tíquetes. Só com RG. Não pise na faixa. Pague dois.
Por quilo. Facilite o troco. Até o vencimento. Débito automático. Fila única.
Não tem chave. Não insista. Crédito obrigatório. Confira. Buzine. Conforme
instruções. Relaxe. É lei. Digite a senha. Silêncio. À vista. Visite nossa
cozinha. Senha não confere. Obrigado. Atenção. Em jejum. Fale com nossas
operadoras. Não desligue. Por favor. Não perfure. Cuidado. Não rasure. Pare.
Não amasse. Bloqueado. Deseja salvar? Sorria! Você está sendo filmado. E só me restasse o dia estrada afora.
Três das muitas faces de Arlete... - Primeiro a radialista que começou como
locutora na Radio Jornal do Comércio, isso depois de ter sido instrumentadora
num consultório odontológico. Passou para os Diários Associados, trabalhou nas
rádios Tamandaré e Clube de Pernambuco. Depois a atriz consagrada que integrou
a companhia teatral de Barreto Júnior, sendo logo premiada como revelação na
peça A cegonha se diverte – ou seja,
aos 16 anos de idade. Estava dado o pontapé, integrando o elenco da TV Tupi e,
daí, para a Manchete e Globo. Transitou pelo cinema, começando com Terra sem deus (1963) até Amigos de sorte (2021), muitos outros.
Também pelo teatro, desde o prêmio de revelação em 1958, até a temporada de O que o mordomo viu (2014-2015), tantas
mais. E fiquei maravilhado quando pude ver Evangelina no Todo mundo sabe que todo mundo sabe, a
Rita em Veneza, a Velma Von Tussle em
Hairspray, a Maria Lúcia em A Partilha e Mirta no O que o mordomo viu. Coisa de fã ficar
muito mais tiete. Por fim, a mulher
que saiu de Paudalho para o hiperestrelato: Eu adoro estar viva. Tenho pavor da velhice e da morte. E deu
aquela gaitada nordestina: Tô tinindo!
Hehehehehe! Em depoimento na tevê ela se mostrou: Eu até fico meio constrangida de falar, porque eu tenho boas condições
pra fazer o isolamento. Eu moro numa casa, uma casa ampla. Tenho espaço pra me
deslocar, pra evitar o tédio. Mas há quem mora num lugarzinho quatro por
quatro, com seis pessoas – como já vi uma senhora que mora com 16 pessoas – e
sequer tem água. A gente fica falando ‘lavem as mãos’, mas tem comunidade que
nem tem água. Como é que a gente vai ficar falando ‘lave as mãos’? Espero que
as autoridades, depois de tudo isso, prestem atenção nessa desigualdade imensa,
esse descaso com a população mais carente, e corrija isso, que é muito cruel.
Esta a maravilhosa Arlete. Até mais ver.
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