quinta-feira, junho 17, 2021

JOHN UPDIKE, ARLETE SALLES, THOMAS CAMPBELL & XIRUMBA

 

 

TRÍPTICO DQP –- Uma vez e tantas... - Ao som dos Twelve Preludes for piano (1953), da Galina Ustvolskaya (1919-2006), na interpretação do pianista estadunidense David Arden. – Esta a minha vida, aqui o meu lugar. Das experiências de tenra idade ao quase desespero com o desgoverno do Fecamepa e a inação pandêmica, entre mortos e vivos, o espelho e o travesseiro. Se inusitadas ou inúteis, guardei o que me disse John Updike: São as ideias por trás do meu país, os conceitos de empreendimento e liberdade individual e como isso funciona na atualidade, que me interessam. Além do mais, foi o poeta britânico Thomas Campbell (1777-1844) quem me deu o estalo: Compreender que há outros pontos de vista é o início da sabedoria. Viver nos corações que deixamos para trás é não morrer. Sim, isso mesmo, o plural e o heterogêneo, o que sou e a outra. Certa feita, no íntimo da minha solidão, ouvi Sebastião Salgado: Minha maior esperança é provocar um debate sobre a condição humana do ponto de vista dos povos em êxodo de todo o mundo. Constatamos que o mundo está dividido em duas partes: de um lado a liberdade para aqueles que têm tudo, do outro a privação de tudo para aqueles que não têm nada. Isso me fez repensar tudo que já havia feito e o por fazer. Deparei-me com a minha própria carta de gratidão para quem tem uma história que dá para outra história sobre quase nada ou tudo, o que for. E sempre o meu convite braços apertos, mãos espalmadas: venha, junte-se.

 


Duas de uma (Que dizia: Eu sou o Alfa e o Ômega, o primeiro e o derradeiro; e o que vês, escreve-o num livro...) - Imagens do premiado fotógrafo e poeta Xirumba Amorim. - Mesmo que tudo se parecesse mesmice a cada dia, um sim outro não, algum talvez, quem dera ou sabe-se lá, nunca é a mesma coisa. Já passei por muitas e boas, sempre adiante. Teve uma vez, entre lá e loa, lá estava João, homem comum que saiu das grades depois da queda das drogas e tornou-se asceta pelas ruas, a discernir o duelo entre o bem e o mal. Dele pude perceber a perdição e que o pior não está por vir, já degenerou faz tempo e agora tudo está perdido no meio da loucura, quanto não de sórdido e escatológico, entre ladainhas religiosas e licenciosas risadagens: o grotesco nos espreita, o horror gratuito e ninguém sabe o que fazer da vida nem de nada, apenas mergulha a alma corrompida na lama da vileza escancarada. Ninguém é inocente. E não mais o vi, perdeu-se e me deixou no redemoinho do Apocalipse do Fernando Bonassi que me Sorria: Deposite aqui. Aguarde. Ficha no caixa. Leve três. Aceitamos todos os tíquetes. Só com RG. Não pise na faixa. Pague dois. Por quilo. Facilite o troco. Até o vencimento. Débito automático. Fila única. Não tem chave. Não insista. Crédito obrigatório. Confira. Buzine. Conforme instruções. Relaxe. É lei. Digite a senha. Silêncio. À vista. Visite nossa cozinha. Senha não confere. Obrigado. Atenção. Em jejum. Fale com nossas operadoras. Não desligue. Por favor. Não perfure. Cuidado. Não rasure. Pare. Não amasse. Bloqueado. Deseja salvar? Sorria! Você está sendo filmado. E só me restasse o dia estrada afora.

 


Três das muitas faces de Arlete... - Primeiro a radialista que começou como locutora na Radio Jornal do Comércio, isso depois de ter sido instrumentadora num consultório odontológico. Passou para os Diários Associados, trabalhou nas rádios Tamandaré e Clube de Pernambuco. Depois a atriz consagrada que integrou a companhia teatral de Barreto Júnior, sendo logo premiada como revelação na peça A cegonha se diverte – ou seja, aos 16 anos de idade. Estava dado o pontapé, integrando o elenco da TV Tupi e, daí, para a Manchete e Globo. Transitou pelo cinema, começando com Terra sem deus (1963) até Amigos de sorte (2021), muitos outros. Também pelo teatro, desde o prêmio de revelação em 1958, até a temporada de O que o mordomo viu (2014-2015), tantas mais. E fiquei maravilhado quando pude ver Evangelina no Todo mundo sabe que todo mundo sabe, a Rita em Veneza, a Velma Von Tussle em Hairspray, a Maria Lúcia em A Partilha e Mirta no O que o mordomo viu. Coisa de fã ficar muito mais tiete. Por fim, a mulher que saiu de Paudalho para o hiperestrelato: Eu adoro estar viva. Tenho pavor da velhice e da morte. E deu aquela gaitada nordestina: Tô tinindo! Hehehehehe! Em depoimento na tevê ela se mostrou: Eu até fico meio constrangida de falar, porque eu tenho boas condições pra fazer o isolamento. Eu moro numa casa, uma casa ampla. Tenho espaço pra me deslocar, pra evitar o tédio. Mas há quem mora num lugarzinho quatro por quatro, com seis pessoas – como já vi uma senhora que mora com 16 pessoas – e sequer tem água. A gente fica falando ‘lavem as mãos’, mas tem comunidade que nem tem água. Como é que a gente vai ficar falando ‘lave as mãos’? Espero que as autoridades, depois de tudo isso, prestem atenção nessa desigualdade imensa, esse descaso com a população mais carente, e corrija isso, que é muito cruel. Esta a maravilhosa Arlete. Até mais ver.

 

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