CARTA DE JULHO - Estou de
volta sem nunca ter ido. Essa a sensação das canções e versos imaginários:
nunca tomei conhecimento das minhas limitações, um tolo ousado à toa. No
máximo, privei apenas da companhia dos meus anônimos abantesmas que saltam do
inopinado para peiticarem, uns aos outros, e comigo, no estrelato das minhas
invencionices entre paredes, páginas e escuridades. Riem como se gozassem da
eternidade da minha criação. Ignoram que sucumbi ao ostracismo, beijado por
engano, saldo estornado, de parecer um ciclope sem nariz ou horroroso asco,
afinal tudo é tão patético, falso decepcionante, para quem é sempre tarde
demais e a verdade leva ao desespero. Grosso modo, abrir mão das minhas
doidices, nunca. Nem poderia ter sonhado tanto entre tragédias pessoais e
turbulências históricas. Sou tal o meu país: tudo para ser bem-aventurado, na horagá,
reduzido a flatulências, eructações, coprólitos, conspurcações. Posso ter
ficado tantã por amargar o fracasso ao ser mal recebido depois da aventura dos
sonhos, como se condenado ao esquecimento ainda em vida. Nem esperaram que eu
morresse de mesmo, uma lembrança sequer. Entre os meus detratores, tudo é
recusa e nem revelei o que sinto e já me estranham: a suspeita das minhas insanidades,
minhas exóticas preferências aos olhos dos outros, o caráter incomum, repugnante,
sei lá. Nunca tive receita para nada, nem me enquadrei direito no molde dos
ditos civilizados. Minhas obsessões, nem mesmo saberia. Fiquei de boca aberta
com os que se celebrizaram em reunir posses e fortunas, como se queimassem
dolosamente álbuns de recordações em que juraram eterno estreitamento, ah, isso
foi que não sabia, porque cultuam até hoje a banalidade de arrancar uma árvore
assim do nada, acabar com a vida do semelhante por vingança ou prazer, maldizer
de tudo: os do contra e, às vezes, até os a favor pregam tantas peças, os
reconheço malditos pregadores furiosos da fé, que se benzem aos mínimos sinais
de agouros, com suas fiéis nos céus que abominam minorias étnicas e sexuais dos
seus infernos. Ah, nada demais se só acumulei perdas, a travar conversas com
mortos ou distantes de décadas, não tenho a quem confiar pouquíssimas alegrias
ou abissais tristezas. A vida prossegue apesar de mim. Sei, pus tudo a perder
por amar demais, querer demais, escolhas que fiz na vida - mesmo ao acertar o
alvo, não era, findava fora de órbita completamente errado, como quem roda o
mundo sem sair do lugar, à procura o Homem de Java, quem sabe me diga algo de
primordial, mesmo que eu não saiba javanês, zeros e uns traduzem agora tudo,
qualquer código, vai que cola, a bronca a gente deixa para depois. Talvez
aprenda o riscado: para se dar bem não precisa ser o máximo tampa nisso ou
naquilo, hoje fazer de conta já basta, empurrar com a barriga, levar nas coxas,
é o suficiente. Sempre me disseram: saber demais endoida. Nunca soube nada,
precisava aprender, uma sombra movente sobre a Terra e o meu sangue pisado por
me ver responsável por certas coisas e tais, as quais nem sei se mesmo da minha
alçada, perplexo diante do amor degradado. E alguém me diz que sou ancião, nem
havia me dado conta disso. É. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais aqui.
DITOS & DESDITOS:
[...] Eles se
apaixonaram no país dela. Encontraram-se lá. O táxi em que ele estava derrapou
e bateu no carro dela. [...] Um bafafá por nada. – Disse isso como se
fosse algo que ele e ela, em suas categorias de cliente de táxi e proprietária
de carro, pudessem avaliar à vista do nível de indignação do paquistanês, ou
qualquer que fosse a nacionalidade do motorista do táxi [...] Um estranho passo na vida, muito longe do
que era esperado entre amigos e família. Entretanto, os poderosos países
europeus estão acostumados a todo tipo de invasão, tanto beligerante quanto
pacífica, e esse estrangeiro, que entrara legalmente, representava grandes
negócios e era a prova individual de que o mundo aceitara o arrependimento
alemão em relação ao passado [...] Sentia-se
feliz de ver que estava entendendo tudo o que se dizia na língua dele, ainda
que não pudesse usá-la com confiança suficiente para se fazer ouvir [...] Ao redor da esposa
as referências vão e voltam, num jargão de grupo – toda roda tem isso, algo da
experiência comum. Era a mesma coisa entre os amigos dela, em sua vida
pregressa na Alemanha. Piadas que você não entende mesmo que conheça as
palavras; que só entende se souber o que ou quem está na berlinda. Ela tampouco
sabe as frases, as palavras afetuosas, condescendentes, que são o meio de
expressão de gente que adapta e mistura línguas, exclamações, expressões
idiomáticas numa espécie de inglês eu não é usado por gente instruída como eles [...] Eles usavam a palavra em várias formas diferentes;
ela procurou no dicionário, mas á o significado era aquilo “que causa espanto,
que causa medo, que assusta, que causa admiração por ser muito bom ou
agradável” [...] Ela estava sozinha e riu – sem saber do quê. Continuava
sentada ao lado da mulher e do marido abraçados, celebrando um ao outro,
naquele jeito fácil dos que têm antigos laços de intimidade codificados em
diálogos na língua materna, libertados pelo vinho e pelos bons momentos vividos
por todos. Ela ria quando os outros riam. Depois sentava calada e ninguém
reparava nela. É que ela não conhecia a língua [...].
Trechos da obra Beethoven
era 1/16 negro e outros contos (Companhia das Letras, 2007), da
escritora sul-africana e Prêmio Nobel de Literatura em 1991, Nadine Gordimer (1923-2014). Veja mais
aqui.
A MÚSICA DE JULIA FISHER
Como violinista, tenho mais comunicação com a
orquestra; afinal, tenho atrás de mim outros 20 colegas de arco e posso tocar
os tutti sinfônicos com eles. Quando toco piano, penso de modo mais melódico do
que os pianistas, por causa da minha formação como violinista. E quando toco
violino, penso mais polifonicamente do que a maioria dos violinistas.
Curtindo
os álbuns Poème (Deccca, 2011),
Paganini (Decca, 2010) & Sarasate (Decca, 2014), da
violinista e pianista alemã Julia
Fisher, que é professora na Universidade de Música e Artes Cênicas de
Munique, Alemanha. Veja mais aqui.
A ARTE DE
VICTORIA MONTESINOS
Meu trabalho propõe um diálogo sobre uma mistura cultural
baseada em experiências pessoais vividas e compartilhadas com pessoas e
idiossincrasias diferentes. O objetivo é convidar o espectador a explorar e se
comunicar com um universo de memórias e emoções onde, em todas as formas
sensoriais e fusões de cores, há uma nova afirmação substancial.
A arte da artista visual mexicana Victoria Montesinos. Veja mais aqui.
A OBRA DE BOCCACIO
Os ignorantes julgam a interioridade a partir da exterioridade.
A obra
do poeta e critico literário italiano Giovanni
Boccaccio (1313-1375) aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
&
ESTAMOS NA ARGENTINA
Participamos
da Convocatória Internacional de Art-Mail que se encontra em exposição na
secretária universitária da Universidad Nacional de San Martin (UNSAM), em
Buenos Aires, Argentina. Veja mais aqui.
&
O MELHOR DO DIA DO HOMEM É SABER QUE TODO DIA
É DIA DA MULHER
Arte do artista visual
indiano Afsar Chandroth
Confira
aqui.