A arte da cantora lírica mezzo-soprano italiana Cecilia
Bartoli, uma popular intérprete de óperas e recitais.
ASSIM ELA ME ESPERA... – Ela apareceu com uma placidez angelical, só muito
depois, conferindo melhor, é que percebi sua inquietação. Primeiro ela se expôs
com o vestido colado na carne esbanjando sedução no lascão da perna até a coxa,
a insinuar a delícia que me aguardava na sua intimidade. A maior provocação:
uma cobrança que estava ali de corpo e alma pronta pra ser devorada pela minha
loucura mais estabanada de cobiça priápica. Diante do meu delírio, ela então depôs
o decote de seios fartos: ali estavam dois apetitosos volumes de me dar água na
boca, recheados pelos desejos mais ousados e pecaminosos, prontos para serem
apalpados e saboreados pela minha gula mais que faminta. Diante da minha implacável
possessão ela mais se afastou arredia para se mostrar num baby doll ousado a
desmascarar sua farta lúbrica escultura corporal, estava mais que exultante a
ponto de incendiar meu membro se dilatando insinuante na minha região púbica. Não
havia como esconder e nem me fiz de rogado e acompanhando seus movimentos,
pronto estava para arrancar-lhe as vestes e assim tê-la completamente desnudada
na minha posse de vez de sua gostosura. Mais se distanciava como quem escapulisse
resoluta, a recuar instigante da minha perseguição, até que acuada sentou-se e mais
que desajeitada escancarou as pernas para que eu flagrasse seu ventre estufado
na calcinha sedutora pronta para explodir de volúpia. Ouso então açoitá-la esfregando
meu membro rijo na sua pele e por toda sua excelsa tentação. Ela se estreitou
como se tentasse recompor, porém, removeu lenta e provocantemente a calcinha
para que acompanhasse o trajeto dela ser removida deslizante pelas coxas e
pernas e pudesse, com isso, ganhar sua aquiescência e já prever ali o quão
disposta se encontrava para me abocanhar de paixão avassaladora, entregando-se
inteiramente para ser sacrificada por meu apetite insaciável de tê-la sob os
meus domínios. Assim se entregou para que eu atravessasse suas noites e quantos
dias orgíacos dentro dela. © Luiz
Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo, aqui e aqui.
DITOS & DESDITOS - Os homens não têm mais tempo de conhecer nada. Compram coisas feitas
nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais
amigos... Eis o meu segredo. É muito simples não se vê bem a não ser com o
coração. O essencial é invisível aos olhos. Pensamento do
escritor, ilustrador e piloto francês Antoine de Saint-Exupéry (1900 –
1944). Veja mais aqui e aqui.
ALGUÉM FALOU: O gosto
pela leitura difere muito do gosto pelos livros. As pessoas ociosas que, para
matar tempo, devoram jornais, revistas e romances, quase nunca têm um volume
predileto. Os amantes de livros possuem sempre muitas obras preciosas, mais
pela paixão da forma do que pela matéria que contêm.
Pensamento do escritor português Eça de
Queiroz (1845-1900). Veja mais aqui.
ESTÉTICA DA CRIAÇÃO – [...] A capacidade de
ver o tempo, de ler o tempo no todo espacial do mundo e, por outro lado, de
perceber o preenchimento do espaço não como um fundo imóvel e um dado acabado
de uma vez por todas mas como um todo em formação, como acontecimento; é a
capacidade de ler os indícios do curso do tempo em tudo, começando pela
natureza e terminando pelas regras e ideias humanas (até conceitos abstratos). [...]. Trecho extraído da obra Estética da criação verbal (Martins
Fontes, 2003), do filósofo e pensador russo teórico da
cultura e das artes Mikhail Bakhtin (1895-1975). Veja mais aqui e aqui.
ESPAÇO LITERÁRIO – [...] Só há, em literatura, espaço sobre o qual se possa falar, espaço que
seja percebido por um sujeito em sua presença no mundo. Assumo, diante disso, a
definição do espaço literário como conjunto de referências discursivas, em
determinado texto ficcional e estético, a locais, movimentos, objetos, corpos e
superfícies, percebidos pelos personagens ou pelo narrador (de maneira efetiva
ou imaginária) em seus elementos constitutivos (composição, grandeza, extensão,
massa, textura, cor, contorno, peso, consistência), e às múltiplas relações que
essas referências estabelecem entre si [...]. Trecho extraído de Espaço literário, percepção e perspectiva
(Aletria, 2007), do professor Paulo
Astor Soethe.
DIÁRIO, LIVING THEATRE – [...] tampouco
pode mencionar os gritos lancinantes no meio da noite durante as rotineiras e
repetidas sessões de tortura, com a intenção de extorquir delações, ou os
tristes relatos de cada um que retornava, se é que retornava, depois de ter
sido torturado tantas vezes. [...]. Trecho extraído da obra Diário de Judith Malina: O Living Theatre em
Minas Gerais (Ed UFMG, 2008), da atriz, dramaturga e poeta teuto-americana Judith Malina (1926-2015). Veja mais
aqui.
JANE & PRUDENCE - [...] Ah, mas era
esplêndido as coisas que as mulheres faziam pelos homens o tempo todo, pensou
Jane. Fazendo-os sentir, às
vezes não mais do que um olhar casual, que eram amados, admirados e desejados
quando não eram dignos de nenhuma dessas coisas – permitindo-lhes se enfeitar e
estufar sua plumagem como pássaros e aquecer-se ao sol de amor, real ou
imaginário, não importa qual. [...] Trecho extraído da obra Jane and Prudence (1953 –
Moyer Bell, 1999), da escritora britânica Barbara
Pym. Veja mais aqui.
MANIFESTO CRACK - III. setenario de bolso - 1. Cansaço e despejo: Se Pessoa conseguiu criar sozinho toda uma geração numa Lisboa ditatorial estéril de literatura, foi, ideias à parte, por cansaço. Certa manhã, depois de um sonho inquieto, Álvaro de Campos acordou para escrever: “Porque ouço, vejo. Confesso: está cansado.” E em sua insônia nasceu a grande poesia. Da mesma forma, acredito que todas as rupturas vêm, desde os delírios mais cotidianos até as revoluções mais sangrentas e radicais; não por ideologias, mas por fadiga. É por isso que aqui também é desnecessário procurar definições contundentes, teorias. Talvez apareçam apenas alguns "ismos" estranhos que são mais um jogo do que um manifesto. Há sim uma mera reação contra a exaustão; Cansaço que a grande literatura latino-americana e o duvidoso realismo mágico se tornaram, para nossas cartas, magia trágica; cansado dos discursos patrióticos que por tanto tempo nos fizeram acreditar que Rivapalacio escrevia melhor que seu contemporâneo Poe, como se proximidade e qualidade fossem uma e a mesma coisa; cansado de escrever mal para que se leia mais, não melhor; cansaço do engajado; cansado das letras que voam em círculos como moscas em seus próprios cadáveres. Desse esgotamento surge uma certidão de óbito generalizada, não apenas literária, mas até circunstancial. Não estou falando de pessimismo ou existencialismo falsificado ou ultrapassado. Talvez sempre tenhamos a vantagem de que o espírito da comédia, do riso e da caricatura se tornem alternativas. cansado de escrever mal para que se leia mais, não melhor; cansaço do engajado; cansado das letras que voam em círculos como moscas em seus próprios cadáveres. Desse esgotamento surge uma certidão de óbito generalizada, não apenas literária, mas até circunstancial. Não estou falando de pessimismo ou existencialismo falsificado ou ultrapassado. Talvez sempre tenhamos a vantagem de que o espírito da comédia, do riso e da caricatura se tornem alternativas. cansado de escrever mal para que se leia mais, não melhor; cansaço do engajado; cansado das letras que voam em círculos como moscas em seus próprios cadáveres. Desse esgotamento surge uma certidão de óbito generalizada, não apenas literária, mas até circunstancial. Não estou falando de pessimismo ou existencialismo falsificado ou ultrapassado. Talvez sempre tenhamos a vantagem de que o espírito da comédia, do riso e da caricatura se tornem alternativas. 2. Sobre o concurso ausente e outras definições no pensamento negativo O termo siciliano “geração sem luta” não é tão gratuito quanto alguns pensam. A ironia está aí para quem leu Ortega y Gasset, e sabe que entre as características que ele apontou para constituir uma geração estava o concurso. Bem, a ausência de contenção é um dos poucos elementos que nos unifica, gostemos ou não. E se algo está acontecendo com os romances do Crack, não é um movimento literário, mas simplesmente e simplesmente uma atitude. Não há mais proposta do que a falta de proposta. Deixaremos que outros mais piedosos o elaborem no devido tempo, o que sem dúvida o farão. Esta não é a única definição no discurso negativo, não é apenas a falta de contenção: como se fôssemos escolásticos definindo Deus ou inferno, só se poderia dizer que, mais do que "ser alguma coisa", os romances de crack "não são muitas coisas ”, são tudo e nada, essa expressão com que Borges definiu corretamente Shakespeare. Às vezes as definições matam o mistério, e não vale a pena escrever uma literatura sem mistério. 3. Criacionismo para escatologia - Não nos enganemos: não há originalidade escatológica nos romances de Crack, certamente apocalípticos. Seria injusto conceder-lhes esta linha, injusta com uma tradição muito longa que, aliás, não é exatamente mexicana. Como se isso não bastasse, o fim das ideologias e a queda do muro de Berlim já estavam bem à frente da escrita; Há algum tempo deixaram-nos como herança um mundo feito de sufixos, apenas sufixos que acrescentamos, às vezes com seriedade e quase sempre em tom de brincadeira, ao que já existia, ao que já existia. Beckett já previu uma situação do gênero há muito tempo, não com Godot, mas com seu Endgame. Como Hamm e Cov, não escrevemos a partir do apocalipse, que é antigo, mas de um mundo além do fim. Se parece haver um desejo criacionista nesses romances, não no sentido literal do tipo Huidobro, mas no mais amplo Faulkner, Onetti, Rulfo e muitos outros, é porque se julga necessário construir esse cosmo grotesco para ter um direito maior e mais crível de destruí-lo. E uma vez destruído, só então os romances de Crack começam a aparecer dentro do império do caos. 4. O cronotopo zero, ou em direção a uma estética do deslocamento - Este mundo além do mundo não aspira a profetizar ou simbolizar nada. Talvez haja às vezes armadilhas para um efeito de estranheza em homenagem a Brecht e Kafka, algo para o grotesco, algo para a paráfrase caricatural; Na realidade, o que os romances do Crack buscam é alcançar histórias cujo cronotopo, em termos bakhtinianos, seja zero: nenhum lugar e nenhum tempo, todos os tempos e lugares e nenhum. Do cômico extraímos o que foi feito acidentalmente, há mais de meio milênio e acidentalmente, pelos refundadores de Amadís de Gaula e o que, há apenas cinco anos, o austríaco Ransmayr fez ao colocar seu Públio Ovidio Nasón diante de um buquê de microfones. O deslocamento nesses romances do Crack não será, afinal, mas uma imitação de uma realidade louca e deslocada, 5. O nimbo e a palavra - O romance Crack, então, tem que renovar a linguagem dentro de si, ou seja, alimentando-a com suas cinzas mais antigas. Resta aos outros, aos que têm fé, tratar a linguagem com as gírias das bandas ou com o discurso roqueiro, que já tem gosto de velho. Há mais livros ainda a serem feitos. Para cortar há tecido na peremiologia, na oralidade do rapsodo, nos arcaísmos e na linguagem atávica, na oralidade e no folclore, na retórica menestréis-clerical. Esses recursos, pelo menos, têm demonstrado maior resistência ao tempo e, embora essa alquimia pareça mais difícil, seus resultados são mais ricos. 6. Em louvor aos monstros - Ninguém mais escreve romances, ou melhor: ninguém mais escreve romances totais. Mas, eu me pergunto, romances para quem?Totais para quem? Eles são escritos? Seria melhor falar de romances supremos e nomes como Cervantes, Sterne, Rabelais e Dante, com todos aqueles que os seguiram abertamente. São organismos que não devem nos assustar porque são gigantescos, nem devemos ser privados deles porque são monstruosos. Mais arrogante me parecerá o autor que se distancia desses gigantes alegando uma incapacidade duvidosa, do que nós – que os assumem abertamente, que chafurdam com eles. A literatura que nega sua tradição não pode e não deve crescer nela. Nenhum monstro nega suas sombras. Romance ou anti-romance, espelho contra espelho, só assim é possível romper com uma continuidade digna. 7. Ruptura e continuidade - Sacudir o pote de carrapatos não vale a pena. Este é um jogo, como tudo o que vale na literatura. A palavra é uma e a mesma; o romance, digam o que digam, vem de sempre e continua. Quebrá-lo, ele prevalece. De fato, se não há nada de novo sob o sol, é porque o velho vale a novidade. Trecho do Manifesto Crack escrito pelo escritor mexicano Ignacio Padilla (1968–2016), com os demais integrantes Eloy Urroz, Jorge Volpi e Pedro Angel Palou. Veja mais aqui.
QUATRO POEMAS – I - Tu, mulher,
criatura limitada como eu, / Recebes a melhor parte do meu culto. / Eu te amo
pela tua elegância, pela tua mentira, / pela tua vida teatral. / E nem ao menos
posso repousar a cabeça na / pedra do teu corpo. / Só tu, demônio, nunca me
faltas nem um instante. II - Eu te amei sem condições, por isso reinas / Sobre
minha alma incontida de poeta. / És, talvez sem querer, o laço enigmático / Que
me prende à idéia essencial de Deus. III - A POESIA ABANDONA A CIÊNCIA À SUA
PRÓPRIA SORTE: Eu e tu somos o duplo princípio masculino e / feminino / Encarregado
de desenvolver em outrem / Os elementos de poesia vindos do homem e da / mulher.
/ Nós somos a consciência regendo a vida física: / Atingimos a profundeza do
sofrimento / Pela vigilância contínua dos sentidos. / No nosso espírito cresce
dia a dia em volume / A idéia que fomos criados à imagem e / semelhança de Deus
/ E que o universo foi feito para nos servir de / cenário. IV - CAIM E ABEL: Sinal
de contradição / Posto um dia neste mundo / Tu és o quinto elemento / Agregado
pelo poeta / Que te ama e te assimila / E é bebido por ti. / Tu és na verdade,
mulher, / Construção e destruição. Poemas do
médico, escritor, tradutor e pintor Jorge de Lima (1893-1953). Veja mais
aqui e aqui.