AD CAPTANDUM VULGUS - A patota
reunida na maior molecagem com os últimos acontecimentos na Patriamada, quando
Zé Corninho saiu com uma das suas: - Não acredito mais em nada, fui enganado a
vida toda! Robimagaiver, então, retrucou: - Também, pudera! Um corno cheio de
gaia feito tu, queria o quê? Foi feito só pra levar desacerto na vida mesmo,
ora! Aí Afredo se meteu na conversa: - Eu mesmo só voto em quem me der
dinheiro! Pra me enganar tem que pagar! Mamão aquiescente, opinou: - Eu tomém!
Insatisfeito, Robimagaiver reclamou: - Vendidos! Por isso estão eleitas todas
as trepeças e porqueiras pra governar no Brasil! Biritoaldo sarcástico
complementou: - Eu acho é bem empregado, otários! Se eu tivesse lá ou em
qualquer governo, faria o mesmo, ia era me arrumar que não sou besta!
Furiosamente Penisvaldo retorquiu: - Esse fala como se não fosse o mais bocó
dos alesados, não é brasileiro não, fidapeste? Tocando fogo, Rolivânio revidou:
- Ô Birito, de que lado você está, hem? Procurando organizar a conversa, Doro
entrou todo cheio de razão: - Desde menino que meu pai sempre dizia que
seguisse o governo, só é quem faz por nós, tanto que ele tinha os dois colhões
do lado direito da cueca pra se prevenir do comunismo. Aí, cresci e quando saí
da escola que quase entrei na faculdade, aprendi e virei pras esquerdas. Taí, hoje
tudo entronchado, o que votei deu na mesma desgraça, não tenho mais em quem
acreditar! Nisso ele foi interrompido pelo calor dos desaforos de uns pros
outros: - Ah, viado, vai tomar no centro do teu cu! Vai você, seu fidaputa! Vai
se lascar, fresco! Eis que nessa hora chega dona Marcialita com a fineza de
sempre: - Vocês são uns comboios de desocupados, só sabem reclamar e não fazem
nada! Vão arrumar o que fazer, seus encrenqueiros! E saiu do mesmo jeito que
chegou, de sopetão. Foi, então, que o Doro tentou apaziguar os ânimos, propondo
ter com o doutor Zé Gulu pra passar o papo a limpo. Lá se foi a cambada
tresloucada entre empurrões, dedadas e tapas, encher o saco do notável
intelectual: - Doutor, diga pra gente uma coisa: como é que é, hem? Como de
costume, o erudito ajeitou os óculos no pau da venta, respirou fundo e castigou
no verbo: - Ah! Aqui só se reclama em causa própria! Cada qual sua razão e os
outros que se fodam! Por isso, dissensos pros consensos, nenhuma solução.
Alguém tem que perder, ou todos saem perdendo. Ninguém reclama por todos, só
por si próprio, seus interesses ou infortúnios. Quem quer pensar no outro,
sentir o que sentem juntos, o que sofrem todos de uma rua, bairro, cidade,
estado ou na Nação? Quem? Ninguém. Cada um que puxe pra sua banda a corda de
guaiamum, uma zona! Na horagá: perdem tudo porque é só bloco do eu sozinho. Aí
os caras do poder, sabidos, políticos, capitalistas, autoridades, manietam
imprensa e tudo, jogam duro, prometem e não cumprem, decidem conforme o jogo
deles e só eles que saem ganhando no fim das contas. Ora, ora, lote de
truculentos beócios, é como diz o ditado: Ad
captandum vulgus! Tenho dito. E saiu invocado pra deixar os recalcitrantes
com o rabinho murcho entre as pernas a se entreterem noutro assunto pra novas
arengas. © Luiz Alberto Machado. Veja mais aqui.
APRENDER A VIVER DE LUC FERRY
[...] Aprender a viver,
aprender a não mais temer em vão as diferentes faces da morte, ou, simplesmente,
a superar a banalidade da vida cotidiana, o tédio, o tempo que passa, já era o
principal objetivo das escolas da Antiguidade grega. A mensagem delas merece
ser ouvida, pois, diferentemente do que acontece na história das ciências, as escolas
do passado ainda nos falam. Eis um ponto importante que por si só merece
reflexão. [...] Então, o que fazer senão esperar pela
catástrofe, pensando nela o menos possível? Talvez nada, de fato, mas talvez
também, apesar de tudo, desenvolver sem ilusão, em silêncio, só para si mesmo,
uma espécie de “sabedoria do amor”. Todos sabem muito bem que precisamos nos
reconciliar com nossos pais — quase que inevitavelmente, pois a vida cria
tensões — antes que eles desapareçam. Porque depois, o que quer que diga o cristianismo,
é tarde demais. Se pensamos que o diálogo dos seres que nos são caros não acabou,
é preciso chegar a uma conclusão. Eu lhe aponto uma, rapidamente, para lhe dar
uma ideia do que entendo aqui por sabedoria do amor. Penso que os pais nunca
devem mentir a seus filhos sobre coisas importantes. Conheço várias pessoas que
descobriram, depois da morte do pai, que ele não era seu pai biológico — quer
porque a mãe tenha tido um amante, quer porque tenha havido adoção secreta. Em
todos os casos, esse tipo de mentira faz estragos consideráveis. Não só porque
num momento qualquer a descoberta da verdade vira sempre um desastre, mas
sobretudo porque depois da morte do pai, que não o era efetivamente, é
impossível para a criança que se tornou adulto explicar-se com ele, compreender
um silêncio, uma observação, uma atitude que os marcaram e aos quais ele gostaria
de poder dar um sentido — o que se torna para sempre impossível. Não insisto —
já lhe disse que essa sabedoria do amor deve ser elaborada por cada um de nós
e, sobretudo, em silêncio. Mas acredito que devemos, à margem do budismo e do cristianismo,
aprender, enfim, a viver e a amar como adultos, pensando, se necessário, todos
os dias na morte. Não por fascinação mórbida. Ao contrário, para procurar o que
convém fazer aqui e agora, na alegria, com aqueles que amamos e que vamos
perder, a menos que eles nos percam antes. Estou certo de que, embora eu esteja
infinitamente longe de possuí-la, essa sabedoria existe e constitui o
coroamento de um humanismo, enfim, desembaraçado das ilusões da metafísica e da
religião. [...] O respeito pelo outro não exclui a escolha
pessoal. Ao contrário, a meu ver, ele é sua condição primeira.
Trechos
extraídos da obra Aprender a Viver: Filosofia para os novos tempos (Objetiva, 2012), do filósofo francês Luc
Ferry, tratando sobre o que é e para que serve a filosofia nos tempos
atuais.
Veja
mais sobre:
É
domingo nas mãos, A obra
de arte & reprodução de Walter
Benjamim, a poesia de Ascenso Ferreira, a música
de Chico Buarque, Enciclopédia do Cinema Brasileiro, a arte de
Nora Dorian, a pintura de Giuseppe
Cacciapuoti & Umberto Brunelleschi aqui.
E mais:
Big Shit
Bôbras: o big bode do Brasil, Os versos satânicos de Salman Rushdie, A miséria do homem de Blaise Pascal, A coroa submersa de Ludwig
Uhland, o cinema de Ridley Scott & Sean Young, a escultura de Antonio Canova & Paulina Bonaparte, a música de Paul McCartney, Teatro cordel de Cesar Obeid
& a pintura de Andre Derain
aqui.
Vamos
aprumar a conversa, Herzog de Saul Bellow, Ich -Traumnovelle de Arthur Schnitzler, a poesia de Ventura
de la Vega, o cinema de Rainer Werner Fassbinder & Barbara Sukowa, a
pintura de Jasper Johns, a música
de Quaternaglia & Dorothea Röschmann aqui.
Vamos aprumar
a conversa, Aventuras galantes de Rabelais, Toda a América de Ronald de Carvalho, A anarquista
feminista Maria
Lacerda de Moura, Pele de lobo de Artur Azevedo, a música de Iancu
Dumitrescu & Ana Maria Avram, o cinema de Mario Monicelli & Faith Minton, a pintura
de Alfred Pellan & Pierre-Paul
Prud'Hon aqui.
A fábula
do maior ninguém, Conhecimento & interesse de Jürgen Habermas, A República de Platão, a música de Antonio Soler & Maggie Cole, a
poesia de Zé Limeira – o poeta do absurdo, a fotografia de Howard Schatz, a
pintura de Ryohei Hase, a arte de Kurt Schwitters & a Companhia
do Ballet Eliana Cavalcanti aqui.
Ressonâncias
ávidas além do amor, Diáspora de Stuart Hall, O virtual de Pierre Lévy, a música de Daniel Binelli & Giselle
Boeters, a pintura de Eloir Júnior, a
arte de Doris Savard, a arte de Luciah Lopez &
a poesia de Ana Bailune aqui.
O
palhaço doido, A filosofia do não de Gaston Bachelard,
Rosa de Hiroshima de Vinicius de Moraes,
a música de Anton Webern & Christiane Oelze, Reflexões
econômicas de Jacques Necker, a
fotografia de Evelyn Bencicova,
a pintura de Nelina Trubach-Moshnikova, a
arte de Karin Vermeer & 6 de agosto de 1945 aqui.
&
O ÚLTIMO SUSPIRO DO MOURO DE SALMAN RUSHDIE
[...] Fugi da morte na escuridão da noite,
deixando uma mensagem pregada na porta. e desde então, ao longo do meu caminho,
junto com a fome e o calor, não têm faltado maços e folhas rabiscadas, e
marteladas, e interjeições secas de pregos de duas polegadas. [...] e eu num país longínquo, com a morte em meu
encalço e a história delas na mão, uma história que vivo a crucificar nos
portões, nas cercas, nas oliveiras, espalhando-a por esta paisagem de minha
última viagem, a história que aponta para mim. [...] sem a ajuda nem necessidade de nenhum Virgilio, no que deveria ser o
meio do caminho da minha vida, mas que acabou sendo, por motivos complicados, o
fim da linha, exausto, totalmente pregado. [...] Porém, após uma vida não muito longa (se bem que muito animada),
constato de repente que não tenho mais teses. De crucificação, já basta a vida.
Quando a gente está perdendo o fôlego, quando aquele sopro que nos impele para
a frente já quase se extinguiu, é hora de fazer confissões. Chame-se isso de
testamento, ou lá o que seja; o último suspiro da vida. Daí este “eis-me aqui”,
tendo pregado as sentenças da vida à paisagem, tendo as chaves de uma fortaleza
vermelha no bolso, nestes momentos de espera antes da rendição final. É hora,
pois, de cantar os fins – do que era e do que talvez não seja mais; do que
havia de certo e também de errado. Um último suspiro para um mundo perdido, uma
láguima final diante desta extinção. Mas um grito derradeiro de desafio, o
desfiar do último novelo de novelas escandalosamente estapafúrdias (palavras
hão de bastar, à falta de equipamento de vídeo) e muita cantoria barulhenta
durante o velório. [...].
Trechos
do romance O último suspiro do mouro (Companhia das Letras, 1995), do escritor
britânico de origem indiana Salman Rushdie, contando a história de um heroi
picaresco em cujas veias corre sangue português, judeu, árabe e indiano,
afirmação viva daquele que escapa às classificações estreitas de todos os
sectarismos nacionalistas, étnicos e religiosos, escrito quando da condenação à
morte do autor pelo fundamentalismo islâmico do aiatolá Khomeini, em 1988. Veja
mais aqui.
DOIS
POEMAS DE LÉA MARINHO
Fêmea até demais: Sou sua fêmea, preferida, / A mulher da sua
vida, / Aquela que te excita, / Da maneira mais explícita! / O meu prazer é
visível, / Assim que eu te vejo, / Sou uma mulher sensível, / e cheia de
desejo, / Uma Meretriz, na cama, / no dia a dia, uma Dama, / Até que sou
comportada,/ e adoro ser amada!
Nua: Nua estou, / nu, você ficou, / nu estava, /
e nua eu ficava, / e se te amava, / nua, eu delirava, / nu gozava, / e nua eu
brincava... / com seu sexo, nu, beijava, / e nua , em sexo, me realizava! / nua
na cama, eu também rolava, / porque nu, comigo, você transava! / e nú na hora
da gente ir, / nua reclamava, mas me vesti, / e você, nu, se preparava, / vestia
o terno e me levava...
Poemas da escritora Léa Marinho que reúne sua
produção literária no Recanto das Letras.
A ARTE
DE ALISSON DEBONA
A arte da bailarina e diretora estadunidense Allison
DeBona, solista do Ballet West de Salt Lake City, Utah-USA.
A
EXPRESSÃO FEMININA DE RENATA BRZOZOWSKA
A arte da pintora polonesa Renata Brzozowska