VAMOS
APRUMAR A CONVERSA? – O
dia amanhece. Contemplo o Sol e o horizonte escancarado para minha realização. Então,
canto e entoando a canção sobre os versos de Fernando Fiorese – Porque
cantar já não muda em manhã -, mais incorporo o poder de insistir,
persistir, resistir e perseverar. Dedilhando os acordes da canção, recito Meimei Corrêa: "Minha palavra louca explode sem mesmo sair
da boca, sai do coração, é mina em explosão, sem conter silêncios, provoca cada
vez mais incêndios, não se reduz, porque reluz em sua direção. Sua palavra
apouca, o coloca em falta, ela se escorrega peralta e se perde no labirinto do
que eu sinto; se soa e ecoa, é canivete que corta, quando nem tanta coisa
importa, o erro se repete e nada descreve a sua ou a minha falta. E quando
surge a manhã, a palavra ainda está muda e se faz também surda, diante dos
gritos inauditos das madrugadas que se perderam... Sou dona do que calo,
escrava do que falo... E quero mais me escravizar mesmo pelo que não consigo
expressar; palavras são palavras, pequenas diante das verdades que me fazem
senhora do que não digo e se vou ou se fico, chego sem mesmo ir, me perco, me
acho, me encaixo nas manhãs do seu desejo a me possuir". Veja mais
aqui, aqui e aqui.
Imagem: Musidora, do célebre pintor do Arcadismo inglês Thomas Gainsborough (1828-1788)
Curtindo Live at Montreux (Havoc and Bright Lights – Guardian Angel Tour) – Montreux Jazz Festival, Switzerland (2013), da cantora, compositora, produtora e atriz canadense Alanis Morissete.
PENSAMENTO
COMPLEXO – A obra Introdução ao pensamento complexo (Sulina, 2005), do antropólogo, sociólogo e
filósofo francês Edgar Morin, aborda tema como a inteligência cega, a tomada de consciência, o problema da organização
do conhecimento, a patologia do saber, a necessidade do pensamento complexo, a
Indo-américa, a teoria sistêmica, o sistema aberto, o sujeito e o objeto, coerência
e abertura epistemológica, scienza nuova, a integração das realidades banidas
pela ciência clássica, a virada paradigmática, o paradigma complexo e simplificador,
ordem e desordem no universo, necessidade dos macroconceitos, o todo está na
parte que está no todo, da auto-organização à auto-eco-organização, viver e
lidar com a desordem, epistemologia da complexidade, os mal-entendidos, a
migração dos conceitos, entre outros assuntos. Destaco o texto introdutório: [...]
A palavra complexidade só pode exprimir nosso incômodo, nossa confusão,
nossa incapacidade para definir de modo simples, para nomear de modo claro,
para ordenar nossas idéias. O conhecimento científico também foi durante muito
tempo e com freqüência ainda continua sendo concebido como tendo por missão dissipar
a aparente complexidade dos fenômenos a fim de revelar a ordem simples a que
eles obedecem. Mas se resulta que os modos simplificadores de conhecimento mutilam
mais do que exprimem as realidades ou os fenômenos de que tratam, torna-se
evidente que eles produzem mais cegueira do que elucidação, então surge o
problema: como considerar a complexidade de modo não simplificador? Este
problema, entretanto, não pode se impor de imediato. Ele deve provar sua legitimidade,
porque a palavra complexidade não tem por trás de si uma nobre herança
filosófica, científica ou epistemológica. Ela suporta, ao contrário, uma pesada
carga semântica, pois que traz em seu seio confusão, incerteza, desordem. Sua
primeira definição não pode fornecer nenhuma elucidação: é complexo o que não
pode se resumir numa palavra-chave, o que não pode ser reduzido a uma lei nem a
uma ideia simples. Em outros termos, o complexo não pode se resumir à palavra
complexidade, referir-se a uma lei da complexidade, reduzir-se à ideia de
complexidade. Não se poderia fazer da complexidade algo que se definisse de
modo simples e ocupasse o lugar da simplicidade. A complexidade é uma palavra-problema e não uma palavra-solução. [...] Em toda a minha vida, jamais pude me resignar ao saber fragmentado, pude
isolar um objeto de estudo de seu contexto, de seus antecedentes, de seu
devenir. Sempre aspirei a um pensamento multidimensional. Jamais pude eliminar
a contradição interna. Sempre senti que verdades profundas, antagônicas umas às
outras, eram para mim complementares, sem deixarem de ser antagônicas. Jamais quis
reduzir à força a incerteza e a ambiguidade. [...] Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.
O
PIROTÉCNICO ZACARIAS – O
livro O pirotécnico Zacarias (Ática,
1974), do escritor, advogado, professor e jornalista Murilo Rubião (1916-1991), é composto de oito contos que se inserem
no gênero fantástico com narrativas que se dimensionam o onírico, situações
absurdas e valorização do sobrenatural. Da obra destaco trecho do conto
homônimo: [...] Ao clarear o dia, saí da
semiletargia em que me encontrava. Alguém me perguntava onde eu desejava ficar.
Recordo-me que insisti em descer no cemitério, ao que me responderam ser
impossível, pois àquela hora ele se encontrava fechado. Repeti diversas vezes a
palavra cemitério. (Quem sabe nem chegasse a repeti-la, mas somente movesse os
lábios, procurando ligar as palavras às sensações longínquas do meu delírio
policrômico.) Por muito tempo se prolongou em mim o desequilíbrio entre o mundo
exterior e os meus olhos, que não se acomodavam ao colorido das paisagens
estendidas na minha frente. Havia ainda o medo que sentia, desde aquela
madrugada, quando constatei que a morte penetrara no meu corpo. Não fosse o
ceticismo dos homens, recusando-se aceitar-me vivo ou morto, eu poderia abrigar
a ambição de construir uma nova existência. Tinha ainda que lutar contra o
desatino que, às vezes, se tornava senhor dos meus atos e obrigava-me a buscar,
ansioso, nos jornais, qualquer notícia que elucidasse o mistério que cercava o
meu falecimento. Fiz várias tentativas para estabelecer contato com meus
companheiros da noite fatal e o resultado foi desencorajador. E eles eram a
esperança que me restava para provar quão real fora a minha morte. No passar
dos meses, tornou-se menos intenso o meu sofrimento e menor a minha frustração
ante a dificuldade de convencer os amigos de que o Zacarias que anda pelas ruas
da cidade é o mesmo artista pirotécnico de outros tempos, com a diferença de
que aquele era vivo e este, um defunto. Só um pensamento me oprime: que
acontecimentos o destino reservará a um morto se os vivos respiram uma vida
agonizante? E a minha angústia cresce ao sentir, na sua plenitude, que a minha
capacidade de amar, discernir as coisas, é bem superior à dos seres que por mim
passam assustados. Amanhã o dia poderá nascer claro, o sol brilhando como nunca
brilhou. Nessa hora os homens compreenderão que, mesmo à margem da vida, ainda
vivo, porque a minha existência se transmudou em cores e o branco já se
aproxima da terra para exclusiva ternura dos meus olhos. [...] Veja mais
aqui.
AS
CRIADAS – A peça teatral
As criadas (Les Bonnes, 1946-47), do controverso escritor e dramaturgo francês Jean Genet (1910-1986), traz a
histórias de duas irmãs que empregadas domesticas que executam elaborados
rituais sadomasoquistas que levam a um jogo com desfecho trágico. Da obra
destaco o trecho: [...] CLAIRE:
Solange! Solange! Solange! SOLANGE: Berre à vontade! Pode até lançar seu grito
derradeiro, Madame! (Empurra Claire,
que fica agachada num canto) Enfim! Madame está morta! Estendida no
linóleo ... Estrangulada pelas luvas de lavar panelas. Madame pode permanecer
sentada! Madame pode me chamar de senhorita Solange. Justamente. É por causa do
que eu fiz. Madame, o doutor me chamará Senhorita Solange Lemercier ... Madame
devia ter tirado esse vestido preto, é grotesco. (Imita a voz de Madame) Eis-me aqui reduzida, por luto a minha
criada. A saída do cemitério, todos os empregados do bairro desfilavam diante
de mim como se eu fosse alguém da família. Tantas vezes fiz de conta que ela
pertencia à família. Vai ver que a morte levou esse gracejo até as últimas
conseqüências. Oh! Madame, sou sua igual Madame, e ando de cabeça erguida ... (Ri) Não, senhor inspetor, não ... o
senhor não saberá nada sobre o meu trabalho. Nada sobre o nosso trabalho em
comum. Nada sobre a nossa colaboração para esse assassinato ... Os vestidos?
Oh! Madame pode guardá-los. Minha irmã e eu tínhamos os nossos. Aqueles que
vestíamos a noite, escondida. Agora tenho meu vestido e sou sua igual. Estou
com a toalete vermelha das criminosas. Faço rir o doutor? Faço o doutor sorrir?
Ele pensa que as criadas devem ter bom gosto de não fazerem gestos que estão
reservados à Madame! Verdade que me perdoa? É a bondade em pessoa. Quer
competir comigo em grandeza. Mas a que eu conquistar é a mais selvagem ...
Madame começa a perceber minha solidão! Finalmente! Agora estou sozinha,
medonha. Podia lhe falar com crueldade, mas posso ser boa. Seu medo vai passar,
Madame. Vai passar completamente. No meio das suas flores, seus perfumes, seus
vestidos. Aquele vestido branco que a senhora usava à noite no baile da ópera,
aquele vestido branco que eu não deixo ela vestir nunca. E no meio das suas
jóias, dos seus amantes. Quanto a mim, tenho, minha irmã. Sim, ouso falar nela.
Ouso, Madame. Posso ousar tudo. E quem poderia me fazer falar? Quem teria a
coragem de me dizer: “minha filha”? Eu servi. Fiz os gestos que são necessários
para servir. Sorri para Madame. Me abaixei para lavar os ladrilhos, me abaixei
para fazer a cama, me abaixei para descascar legumes, para escutar atrás das
portas, colar meu olho nas fechaduras. Mas agora estou de pé. E firme. Sou a
estranguladora. A senhorita Solange, aquela que estrangulou a irmã! Me calar!
Madame é mesmo delicada. Mas tenho pena da brancura da Madame, da sua pele
acetinada, das suas orelhinhas, dos seus pulsinhos ... Eu sou a galinha preta,
tenho os meus juízes. Sou da polícia ... Claire? Ela gostava muito, muito mesmo
da Madame! ... Não senhor inspetor, diante deles não explico nada. Essas coisas
só interessam a nós ... Aquilo, minha filha, a nossa noite, nossa! (Acende um cigarro e fuma desajeitadamente.
A fumaça a faz tossir) Nem vocês nem ninguém vai saber nada, senão que
desta vez Solange foi até o fim. Vocês a estão vendo vestida de vermelho. Ela
vai sair. (Solange se dirige para a
janela, abre-a e sobe a sacada, de costas para o público, encarando a noite.
Dirá a retirada seguinte. Um vento leve faz ondular as cortinas) Sair.
Descer a grande escadaria! A polícia a acompanha. Saiam à sacada para vê-la
seguir entre os negros penitentes.É meio-dia. E, assim, leva na mão uma tocha
de nove libras. Logo atrás, o carrasco segreda-lhe ao ouvido palavras de amor.
O carrasco me acompanha, Claire! (Ri) Ela
será conduzida em cortejo por todas as criadas do bairro, por todos os
domésticos que acompanharam Claire à sua última morada. (Olha para fora) Levam coroas, flores, bandeirolas, tocam o
dobre de finados. O enterro desdobra sua pompa. Lindo, não. Vêm primeiro os
mordomos, de fraque, sem forro de seda. Trazem suas coroas. Depois os criados
de libré, os lacaios de culote curto e meias brancas. Trazem suas coroas. Vêm
depois os camareiros e depois as arrumadeiras, trazendo as nossas cores. Vêm os
porteiros e vêm ainda, as delegações do céu. E eu as conduzo. O carrasco me
embala. Todos clamam. Estou pálida e vou morrer! (Entra) Quantas flores! Deram-lhe um lindo enterro, não. Oh!
Claire, minha pobrezinha Claire! (Rompe
em soluços e se afunda numa poltrona. Levanta-se de novo) Não adianta,
Madame, obedeço à polícia. Só ela me compreende. Ela também é do mundo dos
réprobos. (Debruçada na ombreira da
porta da cozinha, Claire visível só para o público, desde há instantes ouve sua
irmã) Agora somos a senhorita Solange Lemercier. A mulher Lemercier. A
Lemercier. A célebre criminosa. (Cansada)
Claire, nós estamos perdidas. CLAIRE: (Dolente, com a voz da Madame) Fecha a janela e corra a cortina.
SOLANGE: Já é tarde. Todo mundo foi dormir. Não vamos continuar. CLAIRE: (Faz com a mão um gesto de silêncio)
Claire, você vai me servir um chá. SOLANGE: Mas... CLAIRE: Eu estou dizendo, meu chá. SOLANGE: Estamos mortas de cansaço. Temos de
parar. (Senta-se na poltrona) CLAIRE:
Ah! Absolutamente! Não! Então pensa, criadinha, que se safa assim à toa? Seria
fácil demais conspirar com o vento, ser cúmplice da noite. SOLANGE: Mas CLAIRE:
Não discuta. É a mim que compete dispor destes minutos finais. Solange, tu me
guardarás em ti. [...].
Essa peça foi adaptada para o cinema, The
Maids (1974) pelo diretor Christhopher Miles. Veja mais aqui.
O
CASAMENTO DE MARIA BRAUN
– O premiado drama O casamento de Maria
Braun (Die Ehe Der Maria Braun,
1978), do cineasta alemão Rainer Werner
Fassbinder (1945-1982), é uma das obras-primas do diretor que conta a história
de uma mulher cujo casamento se transforma numa longa espera pela reunificação
com o seu marido, que parte para a guerra, se perde na frente russa, é preso e
emigra para a América. A trama inclui várias metáforas cinematográficas sobre a
questão da identidade e as experiências do pós-guerra alemão, narrando o
percurso de Maria Braun, desde o seu casamento apressado em 1943 e contando as
várias fases da história da Alemanha, dos anos de guerra ao milagre econômico. Destaque
para a atriz alemã Hanna Schygulla
que arrebatou juntamente com o Urso de Ouro do filme, o Urso de Prata de melhor
atriz no Festival de Cinema de Berlim, de 1979. Veja mais aqui e aqui.
IMAGEM DO DIA
Hoje é dia da atriz, cantora,
modelo e musa mundial Marilyn Monroe
(1926-1962). Veja mais aqui.
Hoje é o Dia da Imprensa
Veja mais sobre:
Quando não é na entrada é na saída, O autor como produtor de Walter Benjamin, Antologia
Pornográfica de Alexei Bueno, Linguística &
Estilo, Fronteiriços de Anna Bella Geiger, a música
de Andrea dos Guimarães, Wunderblogs, a ninfa Carna, a
arte de Gilvan Samico & Matéria Incógnita aqui.
E mais:
Vamos aprumar a conversa, Pensamento complexo de Edgar Morin,
Pirotécnico Zacarias de Murilo Rubião, As criadas de Jean Genet, o cinema de
Rainer Werner Fassbinder & Hanna Schygulla, a arte de Hanna Schygulla,
Imprensa, a música de Alanis Morissete & a pintura de Thomas Gainsborough aqui.
Credibilidade da imprensa brasileira, A imprensa & Millôr Fernandes, a
música de Eduardo Gudin, História da Imprensa de Nelson
Werneck Sodré, Beijo no asfalto de Nelson Rodrigues, a literatura de
Cervantes & a arte da jornalista Enki Bracaj aqui.
Inclusão social pelo trabalho, Pitágoras,
José Louzeiro, Samir Yazbek, Jacques Rivette, Xue Yanqun, Ednalva Tavares, Lisa Lyon, Música Folclórica Pernambucana & A imprensa
na atualidade aqui.
A mulher do médico, Do sentir de Mario Perniola, a
fotografia de Alfred Cheney Johnston, a arte de Sandra Cinto.& Akino Kondoh, Sonhos graúdos na diversão da mocidade aqui.
Mil sonhos na cabeça e o amanhã nas mãos, A pedra do sono de João Cabral de Melo
Neto, a pintura de Omar Ortiz, a arte de Gary Jackson & Sean
Seal aqui.
A vida em risco e o veneno à mesa, O direito dos povos de Amartya Kumar
Sem, a pintura de Roberto Fernandez Balbuena & a arte de Kadee Glass aqui.
O brinde do amor, Pedagogia do oprimido de Paulo Freire,
a música de Vanessa da Mata, a arte de Luciah Lopez, Project Global Peace Art
& Havia mais que desejo na paixão feita do amor aqui.
Sexta postura, A arte de amar de Manuel Bandeira, a
música de Al Di Meola, a escultura de Ambrogio Borghi, arte de Juli Cady Ryan
& Quando amor premia o sábado aqui.
Desencontros de ontem, reencontros amanhã, Augúrios da inocência de William Blake,
a música de Gonzaguinha, a arte de Duarte Vitória, a poesia de Tony Antunes
& Alô, Congresso Nacional, ouça quem o elegeu aqui.
O que é ser brasileiro?, Sobre a violência de Hannah
Arendt, a arte de Alex Grey, a música de Carol Saboya & Quem faz e
não sabe o que fez é o mesmo que melar na entrada e na saída e nem se lembrou
de limpar. Que meladeiro aqui.
Pra quem nunca foi à luta, está na hora
de ir, a escultura
de Phillip Piperides, a música de Duo Graffiti,
a arte de Tracey Moffatt & Tanise Carrali aqui.
&
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
Art by Ísis
Nefelibata
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
Terra:
Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.