VAMOS
APRUMAR A CONVERSA? PRECISO DE UM CULPADO! - Apesar de ser e estar cônscio de
que sou eu mesmo responsável por tudo que me ocorre na vida, preciso de um
culpado! Sempre tive comigo e por toda minha vida que sou o único responsável
por meus infortúnios, escolhas, naufrágios, derrotas, escorregadas, topadas e
reladas de venta. Sempre soube que são meus atos, palavras, ações, gestos,
atitudes e comportamentos que me fazem ganhar ou perder, ser feliz ou não,
alcançar êxito nas coisas ou ser defenestrado das oportunidades, sair
comemorando pra galera ou me esconder nos porões da vergonha nas horas de
apertura. Sempre soube disso e assim sei que tudo que tenho e sou é
responsabilidade exclusivamente minha e que sou eu mesmo o único culpado por
ser ou não merecedor do que tenho por resultado, pela lisura e liseu, pela
abastança ou miserê, pelo triunfo ou arrastado, pelo brilho ou apagão do que
sou e tenho. Mas como todo mundo coloca a culpa nos outros, vou na onda. E já
que coloquei a culpa na
Dilma por tudo que aconteceu e acontece hoje na humanidade, quero um
culpado pra minha situação! Preciso de um culpado para desafogar o peso que
carrego! Apesar de saber de Drummond: “Os ombros suportam o mundo e ele não
pesa mais que a mão de uma criança”, eu preciso de um culpado pra descansar o
peso dessa mão de criança gigante que eu carrego sobre meus ombros (ô mãozinha
pesada essa, viu?). Preciso de um culpado para abrir meu coração, afinal “A
boca fala do que está cheio o coração” e o meu tá entupido de coisas, fatos,
momentos e emoções. Preciso limpar minha chaminé, cortar minhas cebolas. Preciso
de um culpado (ou culpada, oxalá!) para que me diga que a culpa é dele ou dela e
que eu estou nessa por simples e exclusiva sacanagem dele (ou dela). Preciso
transferir tudo que me consome por dentro pra esse culpado. E aviso logo:
preciso desse culpado (ou culpada) que seja de grátis e na amizade pra pagar
minhas dívidas e resolver minha insolvência; para assumir meu karma e me deixar
na boa de férias por uns tempos; pra atender meus clientes chatos e
inadimplentes; resolver meus pepinos com meus credores quizilentos e
malquerentes, pra trazer meus amigos e amigas sumidas, pra me adiantar a
restituição do Imposto de Renda, pra me arrumar crédito porque estou sujo na
Serasa e no SPC; pra me deixar um automóvel, uma casa na praia e uma dinheirama
preu passar uns quinze dias desligados das braburas e só no bem bom; pra ir
pras filas quando eu precisar de qualquer órgão público; pra me trazer só
créditos dos meus feitos; pra me mostrar que não existe hora, nem distância,
muito menos duração na vida pra só ficar na sombra e água fresca; e que esteja
sempre alerta e vigilante para qualquer décimo de segundo que eu precisar.
Pronto. Por enquanto só preciso desse culpado pra isso – é o que me lembro, por
enquanto. Então, alguém se habilita? Vamos aprumar a conversa &
tataritaritatá! Veja mais aqui, aqui e aqui.
Imagem: Study of Olympe Pelissier as Judith (1830), do pintor francês Horace Vernet (1789-1863)
Curtindo Night School: An Evening With Stanley Clarke & Friends (2007),
do compositor estadunidense de jazz, funk, rock, pop e R&B, Stanley Clarke, com o objetivo de
levantar fundos para a Musicians Institute de Hollywood, que fornece bolsas de
estudo para jovens que desejam aprender Música.
PERI PHYSEOS – O
filósofo grego Anaxímenes de Mileto
(588-524aC), foi discípulo e continuador da obra de Anaximandro. Escreveu, como
seu mestre, também o livro Peri Physeos (Sobre a natureza), praticando o
materialismo monista dedicando-se especialmente à meteorologia. Foi o primeiro
a afirmar que a Lua recebe luz do Sol e, também, a analisar geometricamente
aspectos das sombras para medir as partes e a divisão do dia, desenhando o
relógio de sol denominado Sciothericon, em vista disso passou a ser considerado
a figura principal da escola de Mileto. Das suas ideias tem-se apenas
fragmentos encontrados em Plutarco, Simplício e Hegel, este último afirmando
que em lugar da matéria indeterminada de Anaximandro, põe ele novamente um
elemento determinado da natureza, destacando ser necessário para a matéria um
ser sensível e o ar possui, ao mesmo tempo, a vantagem de ser o mais liberto de
forma. Ele é menos corpo que a água; não se vê, apenas se experimenta o seu
movimento. Dele tudo emana e nele tudo se dissolve. Assim, para ele, o
princípio é o ar e o infinito e que do ar tudo se produz e nele se dissolve:
como nossa alma que é ar, nos mantém unidos, assim um espírito e o ar mantém
unido também o mundo inteiro; espírito e ar significam a mesma coisa. Com isso
o filósofo demonstra muito bem a natureza de seu ser pelo exemplo da alma,
caracterizando a passagem da filosofia da natureza para a filosofia da
consciência ou a renuncia ao modo objetivo do ser originário. Como a alma, o ar
é o meio universal: uma multidão de representações sem que esta unidade,
continuidade, desapareçam. Ele é tanto ativo como passivo, saindo da unidade as
representações, dispersando-as e sobressumindo-as, presente a si mesmo em sua
infinitude. Veja mais aqui e aqui.
A ARTE DE FURTAR – As
edições que tive acesso – e que foram muitas, tanto do Brasil, como de Portugal
- do livro Arte de Furtar: espelho de enganos, theatro de verdades, mostrador de horas
minguadas, gazua geral dos reynos de Portugal: offerecida a el Rey nosso Senhor
D. Joaõ IV, para que a emende (1625 – Lisboa, 1991), alguma davam conta
da autoria de Padre Antônio Vieira (1601-1667), outras de autoria anônima e,
por fim, a que convencionou a autoria como sendo do jesuíta Manuel da Costa.
Trata-se de um monumento da prosa barroca e uma obra emblemática dos costumes
dos séc. XVI a XVIII e o período da Restauração, inscrita como ironia das artes
de proposito didático, desmascarando as múltiplas espécies de ladrões,
denunciando que a roubalheira e a corrupção são gerais, desde o clero à
burguesia, da Inquisição, militares até a nobreza desvelando as unhas das
traças de ladrões. Compreende
denuncias de ladroagem que vão desde gastos inúteis, tributação excessiva e
guerras injustas, roubos, os que furtam com unhas bentas, política e a sua
genealogia diabólica, a cobiça universal, a ganância desenfreada e insaciável,
benesses e títulos, opressão, entre outros crimes. Da obra, destaco os trechos
seguintes: [...] De três maneiras pode um
rei ser ladrão. Primeira furtando a si mesmo. Segunda a seus vassalos. Terceira
aos estranhos [...] Clerigos, e mais
de cincoenta mil embaraços de consciencia em leigos ; e todos movem demandas de
lana caprina ; porque o Frade quer comer na mesa travessa ; a Freira quer
janela [...] tratou de o assegurar logo repartindo
igualmente com o seu moço que o guiava, e para isso concertou com elle que o
comessem bago e bago alternadamente; e depois de quatro idas e [...] que
pretendia das rendas de sua senhora, que ensaccou em ouro, para voar mais leve
; e com dez ou doze mil cruzados, que dois annos de serviço lhe deparárão, se
passou para outro hemispherio, sem dizer a ninguem: Ficae-vos embora. «Digão
agora os professores das sciencias e artes mais liberaes, se formárão nunca
syllogismos mais correntes.
[...] Ia o criado por essa ribeira com a
moeda de oiro de três mil e quinhentos, comprava aqui a perdiz, acolá o cabrito
eo leitão no dia de carne; e no dia de peixe a pescada, o sável, o linguado, ea
lagosta; comprava até a couve, o nabo, a alface, o queijo, o figo ea passa, e
todo o [...] Todos falam na política, muitos compõem
livros dela, e no cabo nenhum a viu, nem sabe de que cor é. E atrevo-me a
afirmar isto assim, porque, com eu ter poucos conhecimento dela, sei que é uma
má peça, e que a estimam e aplaudem, como se fora boa; o que não fariam bons entendimentos,
se a conheceram de pais e avós, tais, que quem lhos souber, mal poderá ter por
bom o fruto que nasceu de tão más plantas. E para que não nos detenhamos em
coisa trilhada, é de saber que no tempo em que Herodes matou os inocentes, deu
um catarro tão grande no Diabo, que o fez vomitar peçonha; e desta se gerou um
monstro, assim como nascem ratos ex
materia putridi, ao qual chamaram os críticos Razão de Estado. E esta
senhora saiu tão presumida, que tratou de casar, e seu pai a desposou com um
mancebo robusto e de más manhas, que havia por nome Amor Próprio, filho
bastardo da primeira desobediência. De ambos nasceu uma filha a que chamaram
Dona Política. Dotaram-na de sagacidade hereditária e modéstia postiça.
Criou-se nas cortes de grandes príncipes, embrulhou-os a todos. Teve por aios o
Maquiavelo, Pelágio, Calvino, Lutero e outros doutores desta qualidade, com
cuja doutrina se fez tão viciosa, que dela nasceram todas as seitas e heresias
que hoje abrasam o mundo. E eis aqui quem é a senhora Dona Política [...]
Veja mais aqui.
AS
ODES PÍTICAS – O poeta
grego Píndaro (533-443aC), é autor
de Epinícios – ou odes triunfais, que são divididos em quatro livros:
olímpicas, píticas, nemeias e ístmicas. Dele destaco a primeira ode pítica, na
tradução de Haroldo de Campos: Lira de ouro, bem comum / de Apolo e das
Musas de trança violeta: / os passos de dança, princípio de júbilo, / te
escutam, os aedos / obedecem teu sinal / quando pulsas vibrada os primeiros
compassos / dos prelúdios condutores de coros. / Consegues apagar o pontiagudo
raio / de fogo semprefluente. Sobre o cetro de Zeus / adormece a águia, / que
recolhe de um flanco e de outro suas asas rápidas, / rainha dos pássaros. / Toldas
sua cabeça em gancho de uma névoa escura, / doce claustro das pálpebras;
possuídas por teus sons / ela crispa no sono o dorso flexível. / E mesmo o
violento Ares / rejeitando a rudeza das armas / arrefece o coração que dorme.
Sábios, / teus dardos aplacam o íntimo da alma dos deuses / por arte do filho
de Latona / e das Musas vestidas de dobras sinuosas. Porém todos os que Zeus
desamou / estremecem ouvindo o clamor / sonoro das Piérides / na terra ou no
mar indomável. / Assim aos deuses adverso / Tífon o de cem-testas / jaz, no
terrível Tártaro. / Nutriu-o outrora a cilícia / gruta polinome / e agora as
escarpas que o mar rebatem / obre Cumas / e a Sicília / esmagam-lhe o peito de
saliente felpa. / O Etna, todo neve, nutriz dos gelos cortantes, / pilar do
céu, / o detém. / Fontes de um fogo inacessível / puríssimas rebentam-lhe / da
mais interna entranha. / E rios de dia vazam / abrasadas torrentes de fumaça. /
E púrpura na treva / uma chama rolando / repulsa ao mar profundo / um tumulto
de pedras. / O monstro ali está. Ele é quem jorra / os fachos de Hefesto,
aterradores. / Prodígio de se ver. Prodígio ainda / senão de ver, de ouvir de
quem já viu. / Assim no Etna entre o píncaro / (folhas negras) e o plaino / preso
/ ele jaz, / numa cama de pontas / descarnando as costas contrapostas. / Dá-nos,
Zeus, a graça de agradarmos / a ti, dominador dessa montanha / fronte e frente
de uma terra fértil: / a cidade vizinha um fundador ilustre / ilustrou-a em seu
nome / e o arauto o proclamou na arena pítica / celebrando Híeron na corrida de
carros / belo de vitória. / Ao navegante principiando a viagem / primeiro
prêmio é um vento favorável / que ao cabo prenuncia um propício retorno. / Pensar
no que passou promete a esta cidade / por igual um porvir glorioso de corcéis /
e coroas de festa / e um nome renomeado em canoros triunfos. / Dono de Lícia e
Delos, Febo, / amador da castália fonte do Parnaso, / que este augúrio te
agrade e faças desta terra / um solo fértil de heróis. / Da máquina dos deuses
/ procedem as virtudes dos mortais: / ciência, vigor dos pulsos, fala fácil,
tudo / eles engendram. / Meditando o louvor deste herói, / espero não lançar
fora da liça / o dardo de brônzeo topo suspenso em minha mão, / mas no extenso
arremesso ultrapassar os meus contrários. / Que o restante do tempo lhe promova
/ um próspero porvir, o pleno dom dos bens / e o olvido das penas. / Ele há de
rever-se nas batalhas / - coração de coragem - resistindo, / e pela mão dos
deuses vencedor. / Heleno algum colheu igual seara, / orgulhosa coroa de
conquistas. / Agora segue o exemplo a Filoctetes / quando se lança à luta. No
nó do necessário, / mesmo o soberbo suplica o seu favor. / Quase-deuses heróis
(dizem) a Lemnos / vieram e levaram o filho de Póias, / o arqueiro, que uma
chaga afligia. / E ele destruiu a cidade de Príamo, / pôs um fim aos trabalhos
dos Dânaos: / o destino movia-lhe os membros malseguros. / Assim a divindade / dirija
reto Híeron / pelos dias que avançam passo lento, / sempre a tempo lhe dando o
que mais queira. / Atende, Musa, e junto a Dinomedes / vem celebrar a
esplêndida quadriga / no prêmio de vitória. / Que não se alheia o filho ao
júbilo paterno. / Vem, inventa comigo / um canto caro ao soberano de Etna. / Para
ele Híeron fundou esta cidade / seguindo à risca os preceitos de Hilos, / com
liberdade, divino edifício. / Dorianos, / os descendentes de Pânfilo, / e
também os da estirpe de Hércules, / que habitam junto às penhas do Taígeto, / querem
preservar perenes os princípios de Egímios. / Levantando-se do Pindo, / afortunados
tomaram Amiclas, / agora - profundos de glória - / vizinhos dos Tindáridas de
cavalos brancos. / E floresceu a fama da ponta de suas lanças! / Zeus, / perfazedor!
/ Junto às águas do Amenas, / que a palavra dos homens para sempre assegure / aos
cidadãos e aos reis um tão nobre destino. / Com teu respaldo o príncipe / seguido
pelo filho / na honra dirija o povo para a concorde paz. / Filho de Cronos, / eu
te peço um aceno de cabeça: / aprova que o Fenício se aplaque em sua morada, / contém
o alarido de guerra do Tírseno, / Lamentando navios por seu desplante, / eles
revêem o infortúnio de Cumas. / Que revés! / Do alto dos navios de proa rápida,
/ seus jovens eram jogados ao mar, / domados pelo senhor de Siracusa / que
redimia Hélade da servidão mais dura. / Meu salário será por Salamina / a
glória dos Atenienses; / em Esparta cantarei a batalha de Citéron, / derrota
para os Medas de arcos recurvos; / mas à margem do Hímera de águas copiosas / cumpro
meu hino aos filhos de Dinomedes, / prêmio por seu valor / quando bateram o
inimigo. / Se falas o justo no momento justo / e tens as cordas do muito
retensas na curva do breve, / a censura dos homens pouco te persegue. / O tédio
saciado embota a ávida espera. / No ouvido de cada um, / no coração calado, / pesa
a demasia da ventura alheia. / Preferível porém o ciúme à compaixão: / por isso
não te detenhas no curso do que é belo. / Preciso no leme, governa o povo, / forjando
na bigorna da verdade uma linguagem de bronze. / Uma frívola faísca de nada / avulta,
vinda de ti. / Árbitro de muitos, muitos, / - no bem ou no mal - / atestam fiéis os teus atos. / Guarda em
beleza a flor do teu caráter. / Se amas sempre ouvir o que é doce de ouvir / não
te canses de ser generoso: / como o bom piloto, livra a vela ao vento. / Amigo,
não te iluda a isca do lucro fácil. / Aos oradores e poetas / somente o renome
além-morte ressoando / revela os fatos dos que foram. / Cresus, alma aberta,
não perece. / Mas Fálaris, coração cruel, / torrava suas vítimas no búfalo de
cobre; / por toda a parte o ódio cerca sua memória. / Nenhuma lira sob os
telhados / nenhuma o recorda, / para o suave acorde das vozes de crianças. / Primeiro
bem: boa fortuna. / Segundo: bom nome. / O homem que a ambos recolhe, / colhe a
suprema guirlanda. Veja mais aqui e aqui.
PLATÓNOV – A peça teatral em quatro atos Platónov (Órfão de Pai, 1881), do
dramaturgo e escritor russo Anton
Tchékov (1860-1904) é um drama com elementos realistas com aguda visão do
mundo e da sociedade russa no final do século XIX, quando ocorre a primavera
prestes às recepções típicas no verão, no qual uma jovem viúva de um general se
reúne com os amigos de diferentes classes sociais para esperanças e renúncias,
empréstimos e perfídias e que sonham com uma vida melhor. Da obra destaco a
Cena II do Ato 1: [...] Entram Glagóliv 1 e Voinítsev. Cena II Os mesmos,
Glagoliev 1 e Voinítsev. GLAGÓLIEV (Entrando.) Pois sim, meu caro Serguei
Pávlovitch. Nesse aspecto, nós, os astros descendentes, somo melhores e mais
felizes do que vocês, os ascendentes. E o homem não perdeu, como vê, e a mulher
saiu a ganhar. Sentam-se. Sentemo-nos, que estou extenuado… Nós gostávamos das
mulheres, como os melhores cavaleiros, acreditávamos nelas, adorávamo-las
porque víamos nelas pessoas melhores… E a mulher é uma pessoa melhor, Serguei
Pávlovitch! ANNA PETROVNA Para quê fazer batota? TRILÉTSKI Quem está a fazer
batota? ANNA PETROVNA Quem é que pôs aqui esta peça? TRILÉTSKI Foi a senhora
que a mudou. ANNA PETROVNA Ah, sim… Pardon… TRILÉTSKI Bem pode dizer pardon. GLAGÓLIEV
Tínhamos amigos… No nosso tempo a amizade não era tão ingénua e tão inútil. No
nosso tempo havia círculos literários, e clubes… A propósito, no nosso tempo
uma pessoa era capaz de se lançar ao fogo pelos amigos. VOINÍTSEV (Boceja.)
Bons tempos! TRILÉTSKI Nestes tempos horríveis existem bombeiros precisamente
para se lançarem ao fogo pelos amigos. ANNA PETROVNA Tolice, Nicolas! Pausa.
GLAGÓLIEV No Inverno passado vi em Moscovo, na ópera, um jovem chorar sob a
influência da boa música… Não é formidável? VOINÍTSEV Talvez seja até muito
bom. GLAGÓLIEV Eu acho que sim. Mas porque é que as senhoras e os cavalheiros
sentados ali perto sorriam ao olhar para ele? De que é que sorriam? E ele
próprio, ao notar que aquela boa gente via as suas lágrimas, agitou-se na
cadeira, corou, compôs um sorriso penoso no seu rosto e depois saiu do teatro…
No nosso tempo as pessoas não se envergonhavam das lágrimas honestas e não se
riam delas… TRILÉTSKI (para Anna Petrovna.) Esse meloso havia de morrer de
melancolia! Tenho horror a isso! Fura-me os ouvidos. ANNA PETROVNA Psiu…
GLAGÓLIEV Nós éramos mais felizes do que vocês. No nosso tempo as pessoas que
compreendiam a música não abandonavam o teatro, escutavam a ópera até ao fim…
Está a bocejar, Serguei Pávlovitch… Eu estou a maçá-lo… VOINÍTSEV Não… Mas
acabe, Porfírii Semiónitch! São horas… GLAGÓLIEV Ora bem… E assim por diante…
Para resumir agora tudo aquilo que eu disse, temos que no nosso tempo havia
pessoas que amavam e pessoas que odiavam, e por conseguinte, que se indignavam
e desprezavam… VOINÍTSEV Muito bem, e nos nossos dias não existem, é? GLAGÓLIEV
Acho que não. Voinítsev levanta-se e caminha para a janela. A inexistência
dessas pessoas é que faz a desgraça deste tempo… Pausa. VOINÍTSEV Isso é
conversa gratuita, Porfíti Semiónitch! ANNA PETROVNA Não posso! Ele deita um
fedor a esse perfume barato que até me sinto enjoada. (Tosse.) Chegue-se um
pouco para trás. TRILÉTSKI (Afasta-se.) Está a perder, e o pobre patchuli é que
tem a culpa. Que mulher espantosa! VOINÍTSEV É injusto, Porfírii Semiónotch,
fazer acusações baseadas apenas em suposições e parcialidades em relação à
passada juventude!... GLAGÓLIEV Pode ser que eu esteja enganado. VOINÍTSEV Pode
ser… Neste caso não há lugar para o “pode ser”… A acusação não é brincadeira!
GLAGÓLIEV (Ri-se.) Mas está a ficar zangado, meu caro… Hum… Isso prova que não
é um cavalheiro, que não sabe respeitar devidamente as opiniões do adversário.
VOINÍTSEV Isso prova que eu sou capaz de me indignar. GLAGÓLIEV Eu não condeno
todos, naturalmente… Também há excepções, Serguei Pávlovitch! VOINÍTSEV Naturalmente…
(Inclina-se.) Muito lhe agradeço a pequena concessão! Todo o encanto dos seus
meios consiste nessas cedências. Mas se encontrasse pela frente um homem
inexperiente, que não o conhecesse, e que acreditasse nos seus conhecimentos?
Era capaz de o convencer de que nós, isto é eu, Nikolai Ivánitch, a maman e em
geral todas as pessoas mais ou menos novas, somos incapazes de indignação e de
desprezo… GLAGÓLIEV Mas… Ora… Eu não disse… ANNA PETROVNA Quero escutar
Porfírii Semiónovitch. Vamos parar! Já chega. TRILÉTSKI Não, não… Jogue e
escute! ANNA PETROVNA Basta. (Levanta-se.) Estou farta. Acabamos o jogo depois.
TRILÉTSKI Quando eu estou a perder, ela fica sentada, como colada, e assim que
começo a ganhar, apetece-lhe escutar Porfíti Semiónovitch! (Para Glagóliev.) E
quem é que lhe pediu para falar? Só serve para incomodar! (Para Anna Petrovna.)
Faça favor de se sentar e continuar, se não considero que perdeu! ANNA PETROVNA
Pois considere! (Senta-se em frente de Glagóliev.) [...] Veja mais aqui e aqui.
WITH
A SONG IN MY HEART - O
drama With a Song in My Heart (Com
uma canção no meu coração, 1952), do cineasta Walter Lang, roteiro de Lamar
Trotti e música de Alfred Neuman, conta a biografia da atriz e cantora Jane
Froman, no início da sua carreira como cantora humilde que vagava por emissoras
de radio e que possuía um aleijão por conta de um acidente aéreo ocorrido em
1943. Ela, apesar das muletas, entretinha as tropas na II Guerra Mundial. O
destaque do filme vai para a atriz estadunidense Susan Hayward (1917-1975), uma das minhas primeiras admirações na
telinha. Veja mais aqui.
IMAGEM DO DIA
Imagem: Espetáculo de dança Un Peu de Tendresse Bordel de Merde!, do
coreógrafo franco-canadense Dave
Saint-Pierre.
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Laurentino Gomes, a música de Gustav
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Loren, a arte de Ekaterina Mortensen & Kiki Rainha de Montparnasse, Pavios curtos de José Aloise Bahia &
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Lampião & Ascenso
Ferreira, A música de Gustav
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As trelas do Doro & o
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Fecamepa: Quando um país vive só de nhenhenhém, não
dá outra: o pencó engancha na cornice e nada vai pra frente aqui.
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de Assis, Bagagem de Adélia Prado, o teatro de William Shakespeare, a música de Eumir Deodato, o cinema de Jean-Luc
Godard, a arte de Carlos Scliar, Decio
Otero & Ballet Stagium aqui.
Princípios de uma nova
ciência de Giambattista
Vico, a poesia de Anna Akhmátova, Hora e vez de Augusto Matraga de João
Guimarães Rosa, O cravo brasileiro de Rozana
Lanzelotte, Devassos no paraíso de João Silvério Trevisan, a pintura de Eliseo d'Angelo Visconti &
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Tataritaritatá aqui.
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Ascenso Ferreira, Terra de Caruaru de José Condé, Tratado da lavação da burra
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Dira Paz, Brincarte do Nitolino, a xilogravura de José Barbosa & Severino
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Podger, A arte maldita de Georges Bataille, a pintura de Jaroslav
Zamazal, a arte de Marcel Duchamp, a
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CRÔNICA DE AMOR POR ELA
(Imagem: Woman Reading, do artista plástico estadunidense Malcolm Liepke)
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
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Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.