terça-feira, maio 27, 2008

ASCENSO, SLAVOJ ŽIŽEK, BACH, BURGESS, JUNICHIRO, ALAGOINHANDUBA & LITERÓTICA


 
A arte do artista japonês Junichiro Sekino (1914-1988).

O DESBRAVADOR DE ALAGOINHANDUBA – Ao abrir os olhos, viu-se aos farrapos à beira-mar. Girou as vistas, lugar desconhecido e exótico, aparentemente inóspito, mas tinha que se virar. E se virou como pode. Zanzou para lá e para cá, contornando ínvia floresta. Logo divisou nativos hostis e começou a falar, blábláblá. Contava ter sido vítima de naufrágio e enfrentou dragões e monstros mar afora para sobreviver; havia nadado não se sabe ao certo quantos dias, fora atacado por toda espécie de horror marítimo e, corajosamente, os enfrentou com destemida perícia. Quase se encantara por sereias, uma delas levou-o ao fundo do mar e, na horagá, não era sereia, era uma baleia assassina. Tudo dissera do que vira e enfrentara, rogou clemência. Os autóctones indiferentes aos seus lamentos mais se aproximavam infensos e ele lá gesticulando como um louco, explicando-se. E apelava com macaqueação: pulou num pé só, plantou bananeira, salto solto, bundacanasca. Armados de todo tipo de cotoco de pau e dentes rangendo, ameaçavam esquartejá-lo, pelo jeito. Cercaram-no. Foi aí que ele se espremeu todo, ajoelhou-se, clamou aos céus, imolou-se e não resistiu: um peido fedorentíssimo rasgou seu furico, acompanhado da maior trovoada vinda dos céus. Os primitivos se assustaram, fizeram a maior careta e avistaram algo lá no horizonte, arregalaram os olhos e danaram-se a correr. Que é que houve? Ele virou as costas e viu no céu uma nuvem negra imensa que vinha diligente aos raios e trovões. Eita, porra! Vôte! Pernas pra que te quero! Seguiu, às carreiras, os aborígenes. Os relâmpagos atacavam seus pés, ele pulando num e noutro, vixe!, livrava-se como podia do ataque insistente. Viu-se cercado por descargas elétricas, perdeu-se no caminho. E agora? Fechou os olhos, benzeu-se e entregou-se: fosse o que Deus quisesse. Ao despertar, constatou-se vivo. O temporal havia passado. Assustou-se ao se certificar de que a tribo toda estava ao seu redor: os homens ajoelhados, as mulheres alisando as mãos, todos nus. Danou-se! Levantou-se desconfiado e fez o que podia. Explicava o que lhe ocorrera, quem era e coisa e tal. Nem davam ouvidos. Percebeu que ao lado havia um enorme tacho, pensou: Vou ser comido vivo! E começou a fazer maluquices, já que ia morrer mesmo, danou-se mais em todo tipo de macacada. Os machos levantaram-se e os tambores rufaram. É agora. Um grupo de mulheres viera lambê-lo: Vão me comer vivo. Elas faziam cócegas nele e, aos peidos, se defendia. Um deles falou-lhe: Caga-raio! E disse coisas incompreensíveis. Ele respondia como podia: gestos, mugangas e borborigmos. Logo nuvens reapareceram, a tribo toda mirou o céu, medrosos se afastaram dele. Começou um ritual, o tempo nublou. Os tambores soavam alto, parece suspenderem relâmpagos e trovões; com o tempo se certificaram apenas o nublado mormaço. Não haveria tempestade, então. Levaram-no para a mata e lá deram banho de flores e matos, reza demorada. É agora. Ouviu de novo: Caga-raio! E todos repetiam, ecoava: Caga-raio! Era como o chamavam, parece. Outra conseguiu entender, algo parecido com Alagoinhanduba. O que queriam dizer, não sabia. Pelo menos, pelo jeito, não era a sua hora. Serviram-lhe comestíveis estranhos, varado de fome, fartou-se. Alguma coisa estranha ocorria dentro dele, o mundo girava. Conduziram-no para a rede, aboletou-se de dormir pesadelos infindos. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui, aquiaquiaquiaquiaquiaquiaquiaquiaquiaquiaqui & aqui.


DITOS & DESDITOSEstamos presos em uma competição doentia, uma rede absurda de comparações com os demais. Não prestamos atenção suficiente no que nos faz sentir bem porque estamos obcecados medindo se temos mais ou menos prazer do que o restante. Não precisamos de profetas, mas de líderes que nos incentivem a usar a liberdade. Um homem só é rei porque os seus súbditos se comportam perante ele como um rei. Após o fracasso, é possível seguir adiante e fracassar melhor; em vez disso, a indiferença nos afunda cada vez mais no pântano de ser estúpido. Você não pode mudar as pessoas, mas pode mudar o sistema para que as pessoas não sejam pressionadas a fazer certas coisas. Não confio nas máquinas. A tecnologia não é neutra. Não sou um ingênuo nem um utópico; eu sei que não haverá uma grande revolução. Apesar de tudo, podem ser feitas coisas úteis, como indicar os limites do sistema. Pensamento do sociólogo, filósofo e crítico social esloveno Slavoj Žižek. Veja mais aqui.

ALGUÉM FALOU: Tive que trabalhar duramente. Quem trabalha assim duramente conseguirá chegar igualmente longe. Fui obrigado a ser esperto. Quem for igualmente esperto conseguirá… igualmente bem. O que consegui com a indústria e a prática, qualquer pessoa com talento e capacidade natural tolerável também pode alcançar. É fácil tocar qualquer instrumento musical: tudo o que você precisa fazer é tocar a tecla certa na hora certa e o instrumento tocará sozinho. A harmonia está próxima da piedade. Toco as notas como estão escritas, mas é Deus quem faz a música. A música é uma harmonia agradável para a honra de Deus e os prazeres permitidos da alma. Onde há música devocional, Deus com sua graça está sempre presente. Se eu decidir ser um idiota, serei um idiota com acorde próprio. Traga-me um pouco de café antes de eu me tornar um bode expiatório. Pensamento do compositor alemão Johann Sebastian Bach (1685-1750). Veja mais aqui.

LARANJA MECÂNICA – [...] Alguns de nós têm que lutar. Existem grandes tradições de liberdade a defender. Não sou homem de partidos políticos. Onde vejo a infâmia, busco erradicá-la. Os partidos políticos não significam nada. A tradição da liberdade significa tudo. As pessoas comuns deixarão isso passar. Elas venderão a liberdade por uma vida mais tranquila. [...] Um homem que não pode escolher deixar de ser um homem. A tentativa de impor ao homem, uma criatura evoluída e capaz de atitudes doces, que escorra suculento pelos lábios barbados de Deus no fim, afirmo que a tentativa de impor leis e condições que são apropriadas a uma criação mecânica, contra isso eu levanto minha caneta-espada. Será que eu serei apenas uma laranja mecânica? [...]. Trechos da obra Laranja Mecânica (A Clockwork Orange - Aleph, 1962), do escritor, compositor e critico britânico Anthony Burgess (1917-1993), levado para o cinema com direção de Stanley Kubrick. Veja mais aqui.


OROPA, FRANÇA E BAHIA

(Romance)

Para os 3 Manuéis:
Manuel Bandeira
Manuel de Sousa Barros
Manuel Gomes Maranhão

Num sobrado arruinado,
tristonho, mal assombrado,
que dava pros fundos da terra.
("Pra ver marujos,
Tirulilluliu!
quando vão pra guerra...")
E dava fundos pro mar.
("Pra ver marujos,
Tiruliluliu!
ao desembarcar").

...Morava Manuel Furtado
português apatacado,
com Maria de Alencar!

Maria era uma cafuza,
cheia de grandes feitiços.
Ah! os seus braços roliços!
Ah! os seus peitos maciços!
Faziam Manuel babar...

A vida de Manuel,
que louco alguém o dizia,
era vigiar das janelas
toda a noite e todo o dia,
as naus que ao longe passavam,
de "Oropa, França e Bahia"!

— Me dá uma nau daquelas,
lhe suplicava Maria.
— Estás idiota, Maria.
Essas naus foram vintena
que eu herdei de minha tia!
por todo o ouro do mundo
eu jamais as trocaria!

Dou-te tudo o que quiseres:
Dou-te xale de Tonquim!
Dou-te uma saia bordada!
Dou-te leques de marfim!
Queijos da Serra da Estrela,
perfumes de benjoim...

Nada.
A mulata só queria
que Seu Manuel lhe desse
uma nauzinha daquelas,
inda a amais pichititinha,
pra ela ir ver essas terras
de "Oropa, França e Bahia"...

— Ó Maria, hoje nós temos
vinhos da Quinta do Aguirre,
umas queijadas de Sintra,
só pra tu te distraíre
desse pensamento ruim...
— Seu Manuel, isso é besteira!
Eu prefiro macaxeira
com galinha de oxinxim!

"Ó lua que alumiais
esse mundo do meu Deus
alumia a mim também
que ando fora dos meus..."
Cantava Seu Manuel
espantando os males seus.

"Eu sou mulata dengosa,
linda, faceira, mimosa,
qual outras brancas não são"...
Cantava forte Maria,
pisando fubá de milho,
lentamente no pilão...

Uma noite de luar
que estava mesmo taful,
mais de 400 naus,
surgiram vindas do Sul...
— Ah, Seu Manuel, isto chega...
Danou-se de escada abaixo,
se atirou no mar azul.

— "Onde vais mulhé?"
— "Vou me daná no carrossé!
— "Tu não vais, mulhé,
mulhé, você não vai lá..."

Maria atirou-se n'água,
Seu Manuel seguiu atrás...
— Quero a mais pichititinha!
— Raios te partam, Maria!
Essas naus são meus tesouros,
ganhou-as matando mouros
o marido de minha tia!
Vêm dos confins do mundo...
De "Oropa, França e Bahia"!

Nadavam de mar em fora...
(Manuel atrás de Maria!)
Passou-se uma hora, outra hora,
e as naus nenhum atingia...
Fez-se um silêncio nas águas,
cadê Manuel e Maria?!

De madrugada, na praia,
dois corpos o mar lambia...
Seu Manuel era um "Boi Morto",
Maria, uma "Cotovia"!

E as naus de Manuel Furtado,
herança de sua tia?

— Continuam mar em fora,
navegando noite e dia...
Caminham para "Pasárgada",
para o reino da Poesia!
Herdou-as Manuel Bandeira,
que ante a minha choradeira,
me deu a menor que havia!

— As eternas Naus do Sonho,
de "Oropa, França e Bahia"...

CARNAVAL NO RECIFE

Meteram uma peixeira no bucho de Colombina
que a pobre, coitada, a canela esticou!
Deram um rabo-de-arraia em Arlequim,
um clister-de-sebo-quente em Pierrot!
E somente ficaram os máscaras da terra:
Parafusos, Mateus e Papanguas...
e as Bestas-Feras impertinentes,
os cabeções e as Burras-Calus...
realizando, contentes, o carnaval do Recife,
o carnaval mulato do Recife,
o carnaval melhor do mundo!
- Mulata danada, lá vem Quitandeira,
lá vem Quitandeira que tá de matá!
- Olha o passo do siricongado!
- Olha o passo da siriema!
- Olha o passo do jaburu!
- E a Nação-de-Cambinda-Velha!
- E a Nação-de-Cambinda-Nova!
- E a Nação-de-Leão-Coroado!
- Danou-se, mulata, que o queima é danado!
- Eu quero virá arcanfô!
Que imensa poesia nos blocos cantando:
"Todo mundo emprega
grande catatau,
pra ver se me pega
teu olho mau!"
- Viva o Bloco das Flores! - Os Batutas! - Apois-Fum!
(Como é brasileira a verve desse nome, Apois-Fum)
E o Clube do Pão Duro!
(É mesmo duro de roer o pão do pobre!)
Lá vem o homem dos três cabaços na vara!
"Quem tirar a polícia prende!"
Êh garajuba!
Carnavá, meu carnavá,
tua alegria me consome...
chegô o tempo das muié largá os home!
chegô o tempo das muié largá os home!
Chegou lá nada...
Chegou foi o tempo d'elas pegarem os homens,
porque chegou o carnaval do Recife,
o carnaval mulato do Recife,
o carnaval melhor do mundo!
- Pega o pirão, esmorrecido!

TREM DE ALAGOAS

O sino bate,
o condutor apita o apito,
solta o trem de ferro um grito,
põe-se logo a caminhar...
— Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...
Mergulham mocambos
nos mangues molhados ,
moleques mulatos,
vem vê-lo passar.
— Adeus!
— Adeus!
Mangueiras, coqueiros,
cajueiros em flor,
cajueiros com frutos
já bons de chupar...
— Adeus, morena do cabelo cacheado!
— Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...
Na boca da mata
há furnas incríveis
que em coisas terríveis
nos fazem pensar:
— Ali mora o Pai-da-Mata!
— Ali é a casa das caiporas!
— Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...
Meu Deus! Já deixamos
a praia tão longe...
No entanto avistamos
bem perto outro mar...
Danou-se! Se move,
parece uma onda...
Que nada! É um partido
já bom de cortar...
— Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...
Cana-caiana
cana-roxa
cana-fita
cada qual a mais bonita,
todas boas de chupar...
— Adeus, morena do cabelo cacheado!
— Ali dorme o Pai-da-Mata!
— Ali é a casa das caiporas!
— Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...

FOLHA VERDE

Folha verde – meninice,
deliciosa meninice das gentes de minha terra,
que eu tanto amei e senti...
Cavalos correndo,
engenhos moendo,
Japarandubas, Trombetas, Pirangi...
Banhos no rio!
Lavandeiras!
Jangadas de bananeiras!
Pescarias de covo e de jequi...
Os sinos sonoros que falam do céu!
A feira, o mercado, bananas, cajus!
Imbaúbas macias como veludo,
Ingás mais macios do que veludo!
Babá-do-Arroz-Doce, Sá-Biu-dos-Cuscus, “o homem dos caranguejo e dos siri”!
Lua cheia! Lua-pôr-sol! Desfazendo-se em luar...
-Manja Real!
-Saltar e pegar!
-Boca de forno!
-Forno!-
.......
Folha verde! Deliciosa meninice das gentes de minha terra,
que eu tanto amei e senti..."

A MULA DE PADRE

Um dia no engenho,
Já tarde da noite
Que estava tão preta
Como carvão...
A gente falava de assombração:
— O avô de Zé Pinga-Fogo
Amanheceu morto na mata
Com o peito varado
Pela canela do Pé-de-Espeto!
— O cachorro de Brabo Manso
Levou, sexta-feira passada,
Uma surra das caiporas!
— A Mula de Padre quis beber o sangue
Da mulher de Chico Lolão...
Na noite preta como carvão
A gente falava de assombração!
Lá em baixo a almanjarra,
A rara almanjarra,
Gemia e rangia
Oue o Engenho Alegria
É bom moedor...
Eh Andorinha!
Eh Moça-Branca!
Eh Beija-Flor. . .
Pela bagaceira
Os bois ruminavam
E as éguas pastavam
Esperando a vez
De entrar no rojão...
Foi quando se deu
A coisa esquisita:
Mordendo, rinchando,
As pôpas e aos pulos
Se pondo de pé
Com artes do cão,
Surgiu uma besta sem ser dali não...
— Atallia a bicha, Baraúna!
— Sustenta o laço, Maracanã!
E a besta agarrada
Entrou na almanjarra,
Tocou-se-lhe a peia
Até de manhã ...
E depois que ela foi solta
Entupiu no oco do mundo!
Num abrir e fechar d'olhos
A maldita se encantou...
De tardinha.
Gente vinda
Da cidade
Trouxe a nova
De que a ama
De seu padre
Serrador
Amanhecera tão surrada
Que causa compaixão!
....................................
Na noite tão preta como carvão
A gente falava de assombração

TRADIÇÃO

Terraço da Casa-Grande de manhãzinha, fartura espetaculosa dos coronéis:
— Ó Zé-estribeiro! Ó Zé-estribeiro!
— Inhôôr!
— Quantos litros de leite deu a vaca Cumbuca?
— 25, seu Curuné!
— E a vaca malhada?
— 27, seu Curuné!
— E a vaca Pedrês?
— 35, seu Curuné!
— Sóó? Diabo! Os meninos hoje não têm o qui mamar!

MINHA ESCOLA

A escola que eu frequentava era cheia de grades como as prisões.
E o meu Mestre, carrancudo como um dicionário;
Complicado como as Matemáticas;
Inacessível como Os Lusíadas de Camões!
À sua porta eu estava sempre hesitante...
De um lado a vida... — A minha adorável vida de criança:
Pinhões... Papagaios... Carreiras ao sol...
Vôos de trapézio à sombra da mangueira!
Saltos da ingazeira pra dentro do rio...
Jogos de castanhas...
— O meu engenho de barro de fazer mel!
Do outro lado, aquela tortura:
"As armas e os barões assinalados!"
— Quantas orações?
— Qual é o maior rio da China?
— A 2 + 2 A B = quanto?
— Que é curvilíneo, convexo?
— Menino, venha dar sua lição de retórica!
— "Eu começo, atenienses, invocando
a proteção dos deuses do Olimpo
para os destinos da Grécia!"
— Muito bem! Isto é do grande Demóstenes!
— Agora, a de francês:
— "Quand le christianisme avait apparu sur la terre..."
— Basta
— Hoje temos sabatina...
— O argumento é a bolo!
— Qual é a distância da Terra ao Sol?
— ?!!
— Não sabe? Passe a mão à palmatória!
— Bem, amanhã quero isso de cor...
Felizmente, à boca da noite,
eu tinha uma velha que me contava histórias...
Lindas histórias do reino da Mãe-d'Água...
E me ensinava a tomar a bênção à lua nova.

SUCESSÃO DE SÃO PEDRO

— Seu vigário!
Está aqui esta galinha gorda
que eu trouxe pro mártir São Sebastião!
— Está falando com ele!
— Está falando com ele!

GRAF ZEPPELIN

W Z! K D K A! U Z Q P!
Alô, Zeppelin! Alô, Zeppelin! Alô, Zeppelin!
Usted me puede dar nuevas del Zeppelin?
Dove il Zeppelin?
Where is the Zeppelin?
Passou agorinha em Fernando de Noronha.
Ia fumaçando!
Chegou em Natal!
(Augusto Severo, acorda de teu sono, bichão!)
Alô, Zeppelin! Alô, Zeppelin!
Rádio, rádio, rádio!
W Z - Q P Q P – G Q A A ... = Jiquiá!
Apontou!
Parece uma baleia se movendo no mar.
Parece um navio avoando nos ares.
Credo, isso é invento do cão!
Ó coisa bonita danada!
Viva seu Zé Pelim!
Vivôôôô!
Deutschland über alles!
Atracou!

OS ENGENHOS DA MINHA TERRA

Os engenhos de minha terra
Dos engenhos de minha terra
Só os nomes fazem sonhar:
- Esperança !
- Estrela d'Alva !
- Flôr do Bosque !
- Bom-Mirar !
Um trino… um trinado… um tropel de trovoada…
e a tropa e os tropeiros trotando na estrada:
- Valo!
- Êh Andorinha !
- Ê Ventania !
- Ê...
"Meu Alazão é mesmo bom sem conta !
Quando ele aponta tudo tem temor…
A vorta é esta: nada me comove !
Trem, outomove, seja lá que for…"

"Por isso mesmo o sabiá zangou-se !

Arripiou-se foi cumer melão…
Na bananeira ela fazia: piu !
Todo mundo viu, não é mentira não…"
- Bom dia, meu branco !
- Deus guarde suasenhoria, Capitão !
......................................................................
Dos engenhos de minha terra
Só os nomes fazem sonhar:
- Esperança !
- Estrela d'Alva !
- Flôr do Bosque !
- Bom-Mirar !

GAÚCHO

Riscando os cavalos!
Tinindo as esporas!
Través das cochilhas!
Sai de meus pagos em louca arrancada!
— Para que?
— Pra nada!

NOTURNO

Sozinho
nas ruas desertas
do velho Recife
que atrás do arruado
moderno ficou...
criança de novo
eu sinto que sou:

— Que diabo tu vieste fazer aqui, Ascenso?

O rio soturno,
tremendo de frio,
com os dentes batendo
nas pedras do cais,
tomado de susto
sem poder falar..
o rio tem coisas
para me dontar:

— Corrre senão o Pai-do-Poço te pega, condenado!

Das casas fechadas
e mal-assombradas
com as caras tisnadas
que o incêndio queimou
pelas janelas esburacadas
eu sinto, tremendo,
que um olho de fogo
medonho me olho:

– Olha que o Papa-Figo te agarra, desgraçado!

Dos brutos guindastes
de vultos enormes
ainda maiores
nessa escuridão...
os braços de ferro,
pesados e longos,
parece quererem
suster-me no chão!

Ai! Eu tenho medo dos guindastes,
Por causa daquele bicão!

Sozinho, de noite,
nas ruas desertas
do velho Recife
que atrás do arruado
moderno ficou...
criança de novo
eu sinto que sou:

— Larga de ser vagabundo, Ascenso!

ASCENSO FERREIRA – poeta pernambucano que nasceu na cidade de Palmares no ano de 1895. Dizem que começou a atividade literária enganado, compondo sonetos, baladas e madrigais. Depois da "Semana de Arte Moderna" e sob a influência de Guilherme de Almeida, Manuel Bandeira e de Mário de Andrade, tomou rumos novos e achou um caminho que o conduziria a uma situação de relevo nas letras pernambucanas e nacionais. Voltou-se para os temas regionais de sua terra que foram reunidos em seus livros "Catimbó" (1927), "Cana caiana" (1939), "Poemas 1922-1951" (1951), "Poemas 1922-1953" (1953), "Catimbó e outros poemas" (1963), "Poemas" (1981) e "Eu voltarei ao sol da primavera" (1985). Foram publicados postumamente, em 1986, "O Maracatu", "Presépios e Pastoris" e "O Bumba-Meu-Boi: Ensaios Folclóricos", em livro organizado por Roberto Benjamin. Distingue-se não pela quantidade, mas pela qualidade, atingindo não raro efeitos novos, originais, imprevistos, em matéria de humorismo e sátira. O poeta faleceu na cidade do Recife (PE), em 1965.

FONTES:
FERREIRA, Ascenso. Catimbó – Cana caiana – Xenhenhém: poemas de Ascenso Ferreira. Recife: Nordestal, 1981.
_________. Catimbó. Recife: Companhia Editora de Pernambuco, 1988.
LUNA, Luiz. Ascenso Ferreira: menestrel do povo. Rio de Janeiro: Paralelo, 1971.
MAGALHAES JUNIOR. Antologia de Humorismo e Sátira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1957.
SILVA, Jorge Fernandes da. Vidas que não morrem. Recife: Departamento de Cultura, 1982.

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LITERÓTICA
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CRÔNICA DE AMOR POR ELA
 Leitora comemorando a festa do Tataritaritatá!
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CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na Terra:
Recital Musical Tataritaritatá - Fanpage.
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EWA LIPSKA, SAMANTHA HARVEY, LENA HADES & PERNAMBUCO DO PANDEIRO

    Imagem: Acervo ArtLAM . Ao som dos álbuns Gema (2013), Live from Aurora (2016), Phenomena (2019) e Devaneio (2023), da banda instr...