FARRA NO CEMITÉRIO – O Biriteiros
Esporte Clube finalmente foi criado. Depois de muita remoeta por assembleias
infindáveis, conseguiu-se quórum com todos os associados em pé e concordantes
do número inicial de membros: vinte apreciadores rigorosamente testados como
embeiçadores do aperitivo. Demorou um pouco, não só pelo número variado de
espécies que vão desde a pura e simples pinga, a todo e qualquer tipo de raiz
de pau, birita e pau de índio, principalmente a mais apreciada e principal
culpada pelo constante adiamento, a teibei
– essa, pra quem não sabe, quando o tomador não envulta por meses, fica pelo
menos aluado e com o juízo tostado por uns quinze dias de efeito. Explicada a
demora da fundação, era chegada a hora de eleger a mesa organizadora que o
negócio foi levado a sério e como manda o figurino. A primeira entre as
inúmeras exigências, estava a declaração assinada de próprio punho pelo cônjuge
do cachaceiro, reconhecendo, autorizando e admitindo que o portador da
carteirinha da agremiação, estava devidamente apto a tomar todas, ficar bicado
e protegido juntamente com as crianças e os doidos por Deus – o que valeria
dizer que nenhum deles seria jamais vítima de arengas, satisfações,
corneamento, ou de ataques de caçaroladas, mão-de-pilão, vassouradas, ou outros
indesejáveis artefatos que fossem capazes de denegrir a integridade física e
moral do afiliado -, bem como não fazer cara feia ou reprovar o envolvimento
dos portadores com saias e outras libidinosas conjugações – excetuando-se
viadagem que estava terminantemente proibida sob pena de exclusão automática do
quadro. Votada e aprovada, protestos emergiram pela discriminação contra
solteiros e separados, o que valeu muita hora de quebra-de-braço e insatisfação
até agora. Para tapear a celeuma, passaram para a segunda exigência, passar no
teste da goma para reiterar a cláusula anterior e entrar no cemitério meia
noite para encarar a Mulher da Sobrinha.
Como nem todo mundo tinha as devidas pregas do procto no devido lugar –, na
verdade, o problema era a aferição, ninguém enxergava direito de tão chumbado –
resolveu-se, depois de todo mundo imprimir o bocal da quartinha na terra para
conferência posterior, passar pra outra provando com a bunda cheia de terra, o
que, na horagá, nem todos, aliás, nenhum deles tinha homência suficiente de
encarar sozinho essa empreitada tétrica, decidindo-se unanimemente por uma
farra no cemitério. Assim, tanto fechavam questão, como deixavam tudo preto no
branco, já que não se podia mais recorrer da decisão, nem hoje nem nunca mais.
Já se organizavam na porta, quando Afredo que era doido por carne de bode, foi
excluído do clube, o que fez com que ele peiticasse com Mamão para se tornarem
cheleleus da trupe. Amuado, só depois de muito puxencolhe é que Mamão aceitou.
Então passaram a peruar o batalhão frouxo aparentemente destemido,
oferecendo-se por cobaias na prova dos comes e bebes para que nenhum sofresse
qualquer atentado. Por conta disso ambos angariavam alguns pedaços de bode,
discutindo se era mesmo de qualidade, ou se era carneiro ou cabrito: só passava
no teste aquela carne que mantivesse o gosto do mijo. Do contrário, era
rejeitada: Bode guisado ou assado que se preze tem que ter gosto de carne
mijada. Como não saciavam, Afredo atentou o juízo do Mamão a praticar pequenos
furtos no açougue de seu Pulinha, um ancião bem mão de figa. Esperavam descuido
ou saída do açogueiro e logo se apropriavam do que podiam: pedaços de costelas
ou outras partes. Não dava pro consumo dos dois famintos. No dia da farra dos
biriteitos, Mamão achou mole um bode estirado, sacudiu-lo na cacunda e saiu na
maior carreira pro local acertado. Era meia noite em ponto quando todos os
vinte associados presentes, todos torando o maior aço, esperavam pela Mulher da Sombrinha, fizeram uma
invocação conjunta pela presença da dita dama do outro mundo e, justo nessa
hora, Mamão sacudiu o bode sobre a mesa aos gritos pro Afredo: Corre que hoje
vai ser a maior comilança! Não deu tempo nem dele terminar a frase, até ele
mesmo partiu com mais de mil com a carreira dos outros, tudo de cabelo em pé e
de pelos arrepiados do gogó, braços, pernas, sovacos e até os pentelhos da
virilha, da bunda e do o osso do mucumbu. Não foi dessa vez o cumprimento da
tarefa, havia de desafogar os temores, limpar a merdaria toda e marcar uma nova
data para vigência total da sociedade. Passaram a exercitar a tripa gaitera
para que ela não afrouxasse na hora do susto e, assim, garantirem tudo limpinho
nos fundos da prova geral. Não é lá muito fácil, vai dias de treinamento para
poder aprumarem a conversa direito. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais abaixo e aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio
Tataritaritatá especial
com a música do músico, cantor, compositor, humorista e ator Adoniran
Barbosa
(1910-1982): Se Assoprar posso acender de novo, com Elis Regina ao vivo,
Quinteto Violado, Demônios da Garoa, Ney Matogrosso, Fernanda Takay, entre
outros & muito mais nos mais de 2
milhões &
500 mil acessos ao blog & nos 35 Anos
de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir. Veja
mais aqui e aqui.
PENSAMENTO DO DIA – [...] Dizia
meu avô que quando você encontrar um louco, deixe-o, pois sua própria loucura
vai levá-lo à destruição. [...] Cresci
e aqueles malucos sumiram [...] Já
não se distingue um doido autêntico no meio da multidão, como também não se faz
mais “malucos doidos-varridos e lunáticos” como antigamente. A arte de repente
ficou sã (e calva). Será? [...]. Trecho extraído da obra Ensaios sobre artes visuais na Paraíba
2005-2010 (2OV4, 2013), do artista visual, gravurista e designer Dyogenes Chaves Gomes.
CARÁTER DA CONTEMPORANEIDADE – [...] O
mundo contemporâneo transformou em princípio de funcionamento o que não existia
pouco: a diferenciação gratuita que não tem função (utilidade) nem sentido
(valor simbólico) e se torna um valor em si, sem outra razão de ser. [...] O modelo urbano dominante repousa sobre uma
diferenciação intensa, nas atividades, nos modos de vida, nas identidades, nas
crenças, mas sem respeitar a lógica da complementaridade: ela repousa,
sobretudo, na afirmação unilateral, na inovação, na gratuidade vibrante, uma
espécie de “jogo do jogo” (para tomar a expressão de Jean Duvignaud). Tudo pode
se tornar objeto de troca, exclusivamente monetária. A generalização das
seguranças introduz a troca em todos os domínios: são definidos esses termos
não mais a partir de uma realidade, de um objeto ou de um fato, mas de uma
probabilidade, aquela da ocorrência de um acontecimento. [...]. Trechos
extraídos da obra Du bom usage de la
ville (Descartes & Cia, 2009), do sociólogo francês Alain Bourdin.
O VEADO ENFERMO – Um
veado adoeceu. Seus amigos vieram visita-lo e comeram toda a erva que havia
perto da sua casa. Sarando, o veado procurou do que se alimentar, mas não achou
nada, e morreu de fome. Mais se tem parentes e mais se tem inquietudes. Do
fabulista persa de vida ignorada Loqman,
o sábio.
DOIS POEMAS - FLOR NA MURALHA FENDIDA - Flor na muralha fendida, / eu colho-te das
fendas, / seguro-te aqui, raiz e tudo, na minha mão, / pequena flor… mas se eu
pudesse compreender / o que tu és, raiz e tudo, e tudo em tudo, / eu deveria
saber o que Deus e o homem é. AS LÁGRIMAS DO CÉU - O
Céu chora sobre a Terra toda a noite até de manhã, / na escuridão chora como
todos os que se / envergonham de chorar; /porque a Terra tornou o seu estado
lastimoso / com o mal que se infligiu em anos inumeráveis / e fez por colher o
fruto da sua desonra. / E todo o dia o Céu recolhe as suas lágrimas / Para os
seus próprios olhos azuis tão claros e profundos, / e chuviscando a glória do
dia luminoso e leve / sorri na testa esgotada da terra para ganhá-la se ela
quiser. Poemas
do poeta britânico Alfred Tennyson
(1809-1892). Veja mais aqui.
HILDA HILST PEDE CONTATO
Acaba de
ser lançado o documentário sobre a poeta, dramaturga e ficcionista Hilda
Hilst (1930-2004), Hilda Hilst pede contato, de Gabriela Greeb e no elento com Luciana Fomschke,
Lygia Fagundes Telles, entre outras, reunindo arquivos pessoas, depoimentos,
encontros e intervenções, além de revelar a memória e presença na Casa do Sol.
Imperdível. Veja mais aqui, aqui e aqui.
AGENDA
I
Congresso Internacional de Direito Público dos Direitos Humanos e Políticas de
Igualdade – dias 3 a 5 setembro, Rua Sá e Albuquerque, 367 - A, Jaraguá, Maceió
– AL & muito mais na Agenda aqui.
&
A arte do artista visual e fotógrafo francês Guy Bourdin (1928-1991).
&
Paulo
Profeta: 40 anos de teimosia pela arte,
o pensamento de Josué de Castro,
Boaventura de Sousa Santos & Muniz Sodré, a literatura de Lou Andreas-Salomé & a poesia de Sylvia Beltrão aqui.