terça-feira, agosto 07, 2018

HILDA HILST, TENNYSON, ADONIRAN, LOQMAN, BOURDIN & DYOGENES CHAVES


FARRA NO CEMITÉRIO – O Biriteiros Esporte Clube finalmente foi criado. Depois de muita remoeta por assembleias infindáveis, conseguiu-se quórum com todos os associados em pé e concordantes do número inicial de membros: vinte apreciadores rigorosamente testados como embeiçadores do aperitivo. Demorou um pouco, não só pelo número variado de espécies que vão desde a pura e simples pinga, a todo e qualquer tipo de raiz de pau, birita e pau de índio, principalmente a mais apreciada e principal culpada pelo constante adiamento, a teibei – essa, pra quem não sabe, quando o tomador não envulta por meses, fica pelo menos aluado e com o juízo tostado por uns quinze dias de efeito. Explicada a demora da fundação, era chegada a hora de eleger a mesa organizadora que o negócio foi levado a sério e como manda o figurino. A primeira entre as inúmeras exigências, estava a declaração assinada de próprio punho pelo cônjuge do cachaceiro, reconhecendo, autorizando e admitindo que o portador da carteirinha da agremiação, estava devidamente apto a tomar todas, ficar bicado e protegido juntamente com as crianças e os doidos por Deus – o que valeria dizer que nenhum deles seria jamais vítima de arengas, satisfações, corneamento, ou de ataques de caçaroladas, mão-de-pilão, vassouradas, ou outros indesejáveis artefatos que fossem capazes de denegrir a integridade física e moral do afiliado -, bem como não fazer cara feia ou reprovar o envolvimento dos portadores com saias e outras libidinosas conjugações – excetuando-se viadagem que estava terminantemente proibida sob pena de exclusão automática do quadro. Votada e aprovada, protestos emergiram pela discriminação contra solteiros e separados, o que valeu muita hora de quebra-de-braço e insatisfação até agora. Para tapear a celeuma, passaram para a segunda exigência, passar no teste da goma para reiterar a cláusula anterior e entrar no cemitério meia noite para encarar a Mulher da Sobrinha. Como nem todo mundo tinha as devidas pregas do procto no devido lugar –, na verdade, o problema era a aferição, ninguém enxergava direito de tão chumbado – resolveu-se, depois de todo mundo imprimir o bocal da quartinha na terra para conferência posterior, passar pra outra provando com a bunda cheia de terra, o que, na horagá, nem todos, aliás, nenhum deles tinha homência suficiente de encarar sozinho essa empreitada tétrica, decidindo-se unanimemente por uma farra no cemitério. Assim, tanto fechavam questão, como deixavam tudo preto no branco, já que não se podia mais recorrer da decisão, nem hoje nem nunca mais. Já se organizavam na porta, quando Afredo que era doido por carne de bode, foi excluído do clube, o que fez com que ele peiticasse com Mamão para se tornarem cheleleus da trupe. Amuado, só depois de muito puxencolhe é que Mamão aceitou. Então passaram a peruar o batalhão frouxo aparentemente destemido, oferecendo-se por cobaias na prova dos comes e bebes para que nenhum sofresse qualquer atentado. Por conta disso ambos angariavam alguns pedaços de bode, discutindo se era mesmo de qualidade, ou se era carneiro ou cabrito: só passava no teste aquela carne que mantivesse o gosto do mijo. Do contrário, era rejeitada: Bode guisado ou assado que se preze tem que ter gosto de carne mijada. Como não saciavam, Afredo atentou o juízo do Mamão a praticar pequenos furtos no açougue de seu Pulinha, um ancião bem mão de figa. Esperavam descuido ou saída do açogueiro e logo se apropriavam do que podiam: pedaços de costelas ou outras partes. Não dava pro consumo dos dois famintos. No dia da farra dos biriteitos, Mamão achou mole um bode estirado, sacudiu-lo na cacunda e saiu na maior carreira pro local acertado. Era meia noite em ponto quando todos os vinte associados presentes, todos torando o maior aço, esperavam pela Mulher da Sombrinha, fizeram uma invocação conjunta pela presença da dita dama do outro mundo e, justo nessa hora, Mamão sacudiu o bode sobre a mesa aos gritos pro Afredo: Corre que hoje vai ser a maior comilança! Não deu tempo nem dele terminar a frase, até ele mesmo partiu com mais de mil com a carreira dos outros, tudo de cabelo em pé e de pelos arrepiados do gogó, braços, pernas, sovacos e até os pentelhos da virilha, da bunda e do o osso do mucumbu. Não foi dessa vez o cumprimento da tarefa, havia de desafogar os temores, limpar a merdaria toda e marcar uma nova data para vigência total da sociedade. Passaram a exercitar a tripa gaitera para que ela não afrouxasse na hora do susto e, assim, garantirem tudo limpinho nos fundos da prova geral. Não é lá muito fácil, vai dias de treinamento para poder aprumarem a conversa direito. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especial com a música do músico, cantor, compositor, humorista e ator Adoniran Barbosa (1910-1982): Se Assoprar posso acender de novo, com Elis Regina ao vivo, Quinteto Violado, Demônios da Garoa, Ney Matogrosso, Fernanda Takay, entre outros & muito mais nos mais de 2 milhões & 500 mil acessos ao blog & nos 35 Anos de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir. Veja mais aqui e aqui.

PENSAMENTO DO DIA – [...] Dizia meu avô que quando você encontrar um louco, deixe-o, pois sua própria loucura vai levá-lo à destruição. [...] Cresci e aqueles malucos sumiram [...] Já não se distingue um doido autêntico no meio da multidão, como também não se faz mais “malucos doidos-varridos e lunáticos” como antigamente. A arte de repente ficou sã (e calva). Será? [...]. Trecho extraído da obra Ensaios sobre artes visuais na Paraíba 2005-2010 (2OV4, 2013), do artista visual, gravurista e designer Dyogenes Chaves Gomes.

CARÁTER DA CONTEMPORANEIDADE – [...] O mundo contemporâneo transformou em princípio de funcionamento o que não existia pouco: a diferenciação gratuita que não tem função (utilidade) nem sentido (valor simbólico) e se torna um valor em si, sem outra razão de ser. [...] O modelo urbano dominante repousa sobre uma diferenciação intensa, nas atividades, nos modos de vida, nas identidades, nas crenças, mas sem respeitar a lógica da complementaridade: ela repousa, sobretudo, na afirmação unilateral, na inovação, na gratuidade vibrante, uma espécie de “jogo do jogo” (para tomar a expressão de Jean Duvignaud). Tudo pode se tornar objeto de troca, exclusivamente monetária. A generalização das seguranças introduz a troca em todos os domínios: são definidos esses termos não mais a partir de uma realidade, de um objeto ou de um fato, mas de uma probabilidade, aquela da ocorrência de um acontecimento. [...]. Trechos extraídos da obra Du bom usage de la ville (Descartes & Cia, 2009), do sociólogo francês Alain Bourdin.

O VEADO ENFERMOUm veado adoeceu. Seus amigos vieram visita-lo e comeram toda a erva que havia perto da sua casa. Sarando, o veado procurou do que se alimentar, mas não achou nada, e morreu de fome. Mais se tem parentes e mais se tem inquietudes. Do fabulista persa de vida ignorada Loqman, o sábio.

DOIS POEMAS - FLOR NA MURALHA FENDIDA - Flor na muralha fendida, / eu colho-te das fendas, / seguro-te aqui, raiz e tudo, na minha mão, / pequena flor… mas se eu pudesse compreender / o que tu és, raiz e tudo, e tudo em tudo, / eu deveria saber o que Deus e o homem é. AS LÁGRIMAS DO CÉU - O Céu chora sobre a Terra toda a noite até de manhã, / na escuridão chora como todos os que se / envergonham de chorar; /porque a Terra tornou o seu estado lastimoso / com o mal que se infligiu em anos inumeráveis / e fez por colher o fruto da sua desonra. / E todo o dia o Céu recolhe as suas lágrimas / Para os seus próprios olhos azuis tão claros e profundos, / e chuviscando a glória do dia luminoso e leve / sorri na testa esgotada da terra para ganhá-la se ela quiser. Poemas do poeta britânico Alfred Tennyson (1809-1892). Veja mais aqui.

HILDA HILST PEDE CONTATO
Acaba de ser lançado o documentário sobre a poeta, dramaturga e ficcionista Hilda Hilst (1930-2004), Hilda Hilst pede contato, de Gabriela Greeb e no elento com Luciana Fomschke, Lygia Fagundes Telles, entre outras, reunindo arquivos pessoas, depoimentos, encontros e intervenções, além de revelar a memória e presença na Casa do Sol. Imperdível. Veja mais aqui, aqui e aqui.

AGENDA
I Congresso Internacional de Direito Público dos Direitos Humanos e Políticas de Igualdade – dias 3 a 5 setembro, Rua Sá e Albuquerque, 367 - A, Jaraguá, Maceió – AL & muito mais na Agenda aqui.
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A arte do artista visual e fotógrafo francês Guy Bourdin (1928-1991).
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Paulo Profeta: 40 anos de teimosia pela arte, o pensamento de Josué de Castro, Boaventura de Sousa Santos & Muniz Sodré, a literatura de Lou Andreas-Salomé & a poesia de Sylvia Beltrão aqui.