VAMOS APRUMAR A CONVERSA? A
POÉTICA ARISTOTÉLICA (Pubicado
originalmente no Guia de Poesia, em 2002)- Quando me vi às voltas com a poesia,
versejando desde menino, cheguei ao momento em que precisaria não apenas
colocar sentimentos, emoções e ideias nos versos rimados, mas aprofundar os
conhecimentos acerca da arte poética. Foi ai que pretendendo saber mais a
respeito da poesia e, ao mesmo tempo, descobrindo que poesia vai além de tudo
que eu imaginava ser, fui estudando métricas, estética, aprendendo e
trabalhando exaustivamente a respeito da arte. Indispensável se faz,
primeiramente, que se tenha conhecimento de uma obra de relevo: a Poética de
Aristóteles. É nela que se encontra o entendimento filosófico acerca da poesia.
Indubitavelmente é uma obra tão reveladora que é indispensável para quem
pretende militar na área, seja versejador, poeta ou estudioso da arte poética. É
com esta obra que a gente pode discernir o que é poesia, o que é poética e tudo
que está imanente ou transcendente a esta arte. O filosofo grego Aristóteles:
O filosofo grego Aristóteles, era realista, utilitarista e adepto do senso
comum. E conforme as bases fundamentais do realismo grego e talqualmente
Platão, considerava a arte como imitação direta da própria ideia, do
inteligível imanente no sensível, imitação da forma imanente na matéria. E no
entendimento de Ariano Suassuna, o pensamento aristotélico sente a arte como um
depoimento do mundo, contido numa outra realidade, transfigurada. Por esta
razão, é a arte é uma criação da beleza, sendo o imitar congênito no homem,
sendo ele o mais imitador. Isto quer dizer que Aristóteles considerava a poesia
de Homero superior à história e mais filosófica do que a história de Heródoto. Nascido
em 384 a.C, em Estagira, cidade da Calcidia, Aristóteles viveu no período da
história grega em que a hegemonia da Macedônia se estendia sobre toda a Grécia.
Ele vai para Atenas com 16 anos de idade, encontrando, de um lado, Isócrates
que pretendia ser a retórica a melhor preparação para a vida política. E de
outro, Platão, que em sua academia, mostrava que a preparação para a vida
pública exigia mais do que opiniões e recursos retóricos – deveria ter
fundamentos científicos. Aristóteles preferiu o caminho apontado por Platão e, durante
20 anos, frequentou a Academia. Quando morre Platão, Aristóteles deixa Atenas e
vai para Assos. E em 343 a.C., Filipe da Macedônia chama-o à sua corte,
confiando-lhe a educação de seu filho, futuro "Alexandre O Grande".
Morto Filipe, Alexandre sobe ao trono e prepara uma expedição ao Oriente. É o
momento de Aristóteles voltar à Atenas. Lá, próximo ao templo dedicado a Apolo
Liceano, abre uma escola, o Liceu, que passou a rivalizar com a Academia, então
dirigida por Xenócrates. Ao contrário da Academia platônica, voltada
fundamentalmente para investigações matemáticas, o Liceu se transformou num
centro de estudos mais dedicados às ciências naturais. Aí, Aristóteles
trabalhou, escreveu e ensinou durante 12 anos. Acusado de ateu, Aristóteles se
instalou, no ano de 322, em Cálcis (na Eusébia), onde no ano seguinte, morreu
aos sessenta e dois anos de idade. Decifrando a poética aristotélica: Entre
os escritos e obras, A Poética de Aristóteles é uma obra esotérica e terá por
base a fundamentação conceitual de imatação (mimesis) e de catarse (katharsis,
purificação, purgação). Mimesis, no sentido aristotélico, é ativa e criativa,
determina o modo de ser do poema trágico e estará sempre ligada à idéia de arte
(tecgné) e de natureza (physis), defendendo sempre que a arte imita a natureza.
Já a catarse para Aristóteles é uma força emotiva causada pela mimesis levando
a um efeito suscitado pela tragédia no público. No primeiro capítulo da obra
aristotélica, são abordados alguns aspectos da poesia e da imitação segundo os
meios, o objeto e o modo de imitação. Nesse sentido, apresenta-se como
propósito da obra a abordagem da produção poética em si mesma e seus gêneros,
da função de cada um desses gêneros e a maneira pela qual a fábula deve ser
construída com vistas à conquista do belo poético. A epopéia, a poesia trágica,
a comédia, a poesia ditirâmbica, a maior parte da aulética e da citarística
enquadram-se nas artes da imitação, havendo entre elas, contudo, a diferença de
que seus meios não são os mesmos, tampouco os objetos que imitam e a maneira
pela qual se dá essa imitação. Nas artes citadas, a imitação ocorre por meio do
ritmo, da linguagem e da harmonia, empregados em conjunto ou separadamente. A
epopéia utiliza a palavra simples e nua dos versos. No segundo capítulo
encontra-se uma abordagem acerca das formas pelas quais se utiliza a imitação.
Assim, afirma-se que a imitação aplica-se aos atos das personagens, as quais
podem unicamente ser boas ou ruins, dependendo da prática do vício ou da
virtude. Nesse sentido, as personagens são representadas como melhores ou
piores. No terceiro capítulo é tratado do refinamento da classificação
focalizada no capítulo anterior, afirmando ser possível imitar os mesmo objetos
nas mesmas situações e numa mesma narrativa, seja pela introdução de um
terceiro personagem, seja insinuando-se a própria pessoa sem a intervenção de
outro personagem. Uma outra forma de seria contar com a ajuda de personagens
que agem por si só. No quarto capítulo ocorre uma análise acerca da origem da
poesia e seus diferentes gêneros, que teria duas causas, ambas devidas à
natureza do homem. Tendo em vista que a imitação corresponde a um instinto
humano, característica que o distingue dos demais seres vivos, pela imitação
são adquiridos os primeiros conhecimentos e experimentado o prazer. A poesia,
então, teria sido criada pelos homens mais aptos à execução da imitação, por
meio de ensaios improvisados. A divisão em gêneros resultaria das diferenças
entre os caracteres dos sujeitos imitadores: aqueles mais propensos à gravidade
reproduziriam as belas ações e seus realizadores, ao passo que os menos
propensos se voltariam para as pessoas ordinárias com o objetivo de
censurá-las. Aponta-se Homero como o pioneiro dos gêneros dramático e cômico.
Defende-se, também, a superioridade da tragédia e da comédia em relação ao
iambo e à epopéia. Tal superioridade seria a responsável pela migração dos
poetas para os dois primeiros gêneros. No quinto capítulo é efetuada uma
comparação entre epopéia e tragédia. A primeira, assim como a tragédia,
focaliza os assuntos sérios, porém não inclui qualquer forma negativa e é menos
limitada quanto à duração em relação à tragédia. Ambas apresentam partes
constitutivas comuns e todos os caracteres presentes na epopéia encontram-se também
na tragédia. No sexto capítulo são focalizadas as diferentes partes da
tragédia, conceituando esta, entendendo-se que o pensamento é a arte de
encontrar o modo de exprimir o conteúdo do assunto de maneira conveniente e
busca provar a existência ou não de determinada coisa e realizar uma declaração
de ordem geral. Já o caráter torna possível a decisão após a reflexão, razão
pela qual o caráter somente se revela após a decisão dos personagens. A
elocução é a escolha dos termos, os quais apresentam o mesmo poder de
expressão, seja no prosa ou no verso. Já o canto é o principal tempero do
espetáculo. Defende-se a idéia de que a despeito do efeito de seu efeito sobre
os ânimos, a encenação em si mesma não pertence à arte da representação e não
guarda qualquer relação com a poesia. Dessa forma, a tragédia existiria por si
só, independentemente da representação e dos atores. O sétimo capítulo trata da
extensão da ação, parte primeira e capital da tragédia. Conceitua-se princípio
como sendo aquilo após o qual é natural haver ou produzir-se outra coisa; fim
como sendo o contrário, ou seja, ocorre após outra coisa e é algo após o qual
nada ocorre. Assim, para se ter uma voa composição na fábula, seria necessário
que o início e o fim não fossem obras do acaso, mas de condições indicadas.
Assim, afirma-se que para que algo seja considerado belo, deve não só
apresentar ordem em suas partes, como também comportar certas dimensões. Sob
essa ótica, um ser vivente muito grande ou muito pequeno não poderia ser belo.
Dessa forma, a dimensão dessa extensão seria dada pela duração dos concursos e
pelo grau de atenção do espectador, ponto este que não dependeria da arte. O
oitavo capítulo trata da unidade da ação e afirma que, ao contrário do que se
pode pensar, o que confere unidade à fábula não é a personagem principal.
Assim, o que importa é que a unidade da imitação resulte na unidade do objeto,
de forma que a supressão ou deslocamento de uma parte seja suficiente para
mudar ou confundir o conjunto. O nono capítulo versa sobre a competência do
poeta ao narrar exatamente o que acontecido, mas sim o que poderia acontecer, o
possível, a verossimilhança ou a necessidade. Assim, a diferença entre o
historiador e o poeta não é a forma da obra, mas o que ela relata. Assim, o
historiador relata o que ocorreu e o poeta, o que poderia ter ocorrido. Por
isso, a poesia é mais filosófica e de caráter mais elevado, pois permanece no
universal - o que uma categoria de homens diz ou faz em determinadas
circunstâncias segundo o verossímil ou necessário - ao passo que a história
focaliza o particular. Assim, a missão do poeta concentra-se em criar fábulas e
não em fazer versos, sendo poeta justamente porque imita ações. Neste capítulo,
atribui-se a maus poetas a criação de fábulas episódicas, obras em que a
conexão dos episódios não observa a verossimilhança e nem a necessidade. Assim,
a tragédia deve imitar a ação em seu conjunto e, além disso, imitar fatos
capazes de suscitar o terror e a compaixão, principalmente se tais sentimentos
nascerem de fatos que se encadeiam contra a experiência do espectador,
causando, assim, maior admiração do que se fossem devidos ao acaso e à fortuna.
No décimo capítulo traz tão-somente a noção de que as fábulas são classificadas
em simples ou complexas de acordo com as ações que imitam. No décimo primeiro
capítulo são apresentados os elementos da ação complexa, quais sejam peripécia,
reconhecimento e catástrofe ou patético. A Peripécia é um elemento de ação
complexa, que, segundo Aristóteles, consiste numa reviravolta das ações, o que
conduz a história a um rumo contrário ao que parecia indicado e natural. O uso
da peripécia é um dos instrumentos usados para que se chegue ao objetivo de
causar terror e compaixão, ou catarse, finalidade da qual se presta qualquer
tragédia. Como várias das peças já eram conhecidas do público, estratégias como
essa provocavam mais interesse do público, o prendia mais e o deixava ansioso.
Logo, essa reviravolta na história fazia com que o público ficasse mais curioso
e mais identificado com a história e, assim, a interação do público com a peça
aumentava. É com o uso da peripécia e de ações simples, diz Aristóteles, que se
alcança o fim que se propõe alcançar, a saber a emoção trágica e os sentimentos
da humanidade. No décimo segundo capítulo encontram-se as divisões da tragédia,
que são: prólogo, epílogo, êxodo e canto coral. O Prólogo é a parte que a si
mesma se basta e que precede a entrada do coro (párodo). O episódio é uma parte
completa da tragédia colocada entre cantos corais completos. O êxodo é uma
parte completa da tragédia, após há qual não há canto coral. No décimo terceiro
capítulo fala das qualidades da fábula em relação às personagens. A fábula bela
deve ser complexa e capaz de excitar temor e compaixão. Nelas, o infortúnio dos
personagens não são fruto de sua perversidade, mas sim das suas ações. Para ser
bela, a fábula necessita propor um fim único, oferecendo a mudança da
felicidade para o infortúnio em virtude de um erro grave. No décimo quarto
capítulo aborda os diversos modos de produzir o terror e a compaixão, os quais
podem nascer do espetáculo cênico, podendo, porém, derivar do arranjo dos
fatos, o que é preferível e evidencia maior habilidade do poeta. Na tragédia, o
temor e a piedade devem ser causados pelas ações. As ações que inspiram dor
devem ocorrer entre amigos ou inimigos, ou indiferentes. Numa boa tragédia, o
personagem não hesita em matar, saiba ou não quem é a vítima. No décimo quinto
capítulo ressalta-se a importância de que a representação e o entrosamento dos
fatos apresentem verossimilhança de modo que as ações e palavras da personagem
estejam de acordo com o necessário e verossímil. Assim, o desenlace das fábulas
deve nascer da própria fábula e não de um artifício cênico, não havendo,
tampouco, espaço nas ações para o irracional. Nos capítulos seguintes são
apresentados alguns conselhos ao poeta Diz-se que, ao organizar sua fábula, o
poeta deve sentir como se a tivesse diante de seus olhos e completar o efeito
do que é dito pelas atitudes das personagens, razões pelas quais a poesia exige
entusiasmo. Fala-se, ainda, que os assuntos devem conter primeiramente uma
idéia global, distinguindo os episódios a seguir. Então, devem ser atribuídos
nomes aos personagens, os quais variam em função da sua terminação em neutros,
femininos ou masculinos. No décimo oitavo capítulo afirma-se que em todas as
tragédias há o nó e o desenlace. O primeiro corresponde à parte que vai do
início ao ponto em que ocorre mudança e o desenlace é a parte que vai da
mudança até o final da peça. Uma boa peça deve conjugar adequadamente o lace e
o desenlace. O canto coral teria o papel de passagem entre uma peça e outra. Nos
dois capítulos seguintes são encontradas observações acerca da elocução e do
pensamento, dois dos elementos essenciais da tragédia. O pensamento tem como
objeto a retórica e é de seu domínio tudo aquilo que se exprime por meio da
linguagem, incluindo a demonstração, a refutação e a maneira pela qual se movem
as paixões, tais como compaixão, temor, e a cólera, os quais devem dotar de
importância e verossimilhança. A elocução é tratada a partir de seus elementos
essenciais: letra, sílaba, conjunção, nome, verbo, artigo, flexão e expressão. A
partir daí encontra-se o objeto e as formas dos nomes ou figuras. O nome
simples é desprovido de elementos significativos. Já a composição do nome duplo
varia pode ser de um elemento significativo com um elemento vazio de sentido ou
de elementos todos significativos. Os nomes usados podem ser da própria língua
ou estrangeiros. Faz-se uso também de metáforas e nomes forjados, que são
aqueles que em princípio não apresentam sentido, mas que passam a possui-lo
pela utilização do poeta. Os nomes alongados assim se chamam devido ao
alongamento ou abreviação. Os nomes masculinos terminam em N, R, S ou letras
compostas de S, que são as consoantes duplas Y e X. Os femininos terminam em
vogal sempre longa, como H, W e A alongado. Nenhum nome termina em muda ou
vogal breve. No vigésimo segundo capítulo observam-se as qualidades da
elocução. A principal dessas qualidades é a clareza, contudo sem constituir em
algo trivial, que é obtida a partir do uso da linguagem corrente. Para
manter-se nobre, a elocução vale-se de metáforas, alongamentos e tudo o que se
afasta da linguagem corrente, mas sem exageros. No vigésimo terceiro capítulo é
abordada a unidade de ação na composição épica. Diz-se que é necessário que a
fábula seja dotada de tom dramático, e que encerrem uma só ação, com princípio,
meio e fim. No vigésimo quarto capítulo trata das partes da epopéia, que deve
ser simples ou complexa, ou de caráter, ou patética. Assim, seus elementos
essências são os mesmos da tragédia, salvo o canto e a encenação, e também são
necessários reconhecimentos, peripécias e catástrofes, devendo, além disso,
apresentar pensamentos e linguagem bela. A diferença entre epopéia e tragédia
está na métrica. Assim, a epopéia deve apresentar limite exato, ou seja, seu
conjunto deve ser abarcado do início ao fim. No vigésimo quinto capítulo
apresenta a maneira pela qual deve se apresentar o que é falso. Diz-se que o
poeta deve dialogar o mínimo possível com o leitor. Nas tragédias, pode-se
apresentar aquilo que é maravilhoso, sendo que na epopéia pode-se avançar até o
irracional, para obtenção de um maravilhoso em grau mais elevado. Quanto à
verossimilhança, defende-se a idéia de que é preferível o impossível verossímil
ao possível incrível. Além disso, os assuntos poéticos devem ser racionais. O
vigésimo sexto capítulo traz algumas respostas às críticas feitas à poesia.
Defende-se a idéia de que é erro do poeta a tentativa de imitação do impossível
e o erro que provém de uma escolha mal feita não é intrínseco à própria poesia.
Contudo, o erro torna-se secundário se a finalidade da arte tiver sido
alcançada, a não ser que esse mesmo fim pudesse ter sido alcançado sem o uso de
eventos impossíveis. Pode-se justificar o erro, ainda, pelo argumento de que o
autor representou as coisas como elas deveriam ser, ou como a platéia acha que
é, ou como elas eram em uma outra época. Critica-se também o uso exagerado de
palavras estrangeiras. Admite-se, ainda, que possam ocorrer eventos aparente
inverossímeis e que esse acontecimento seja verdadeiro. O vigésimo sétimo
capítulo trata da superioridade da tragédia sobre a epopéia. Argumenta-se que a
menor extensão da tragédia proporciona maior prazer do que a diluição da
epopéia, sem, contudo, deixar de atingir o seu objetivo, que é o de imitar.
Além disso, a imitação da epopéia apresentaria menos unidade, pois trata de
muitas fábulas simultaneamente. Por fim, fica entendido que esta obra
constitui-se de importante e bastante esclarecedor manual para o entendimento
das tragédias, tornando-se base para a compreensão desse tipo de obra e,
inclusive, para o estudo da arte dramática e da História da Arte como um todo. É
preciso observar, ainda, que a poética no sentido aristotélico, segundo Massaud
Moisés, advem de talento poético, arte da versificação, designando, assim, o
seu tratado e teoria da arte de criar poesia. E para Daniel Delas e Jacques
Filliolet é consagrada à essência e à origem da poesia. Para Assis Brasil, a
poética é entendida hoje como a ciência da literatura, o que levou Jean Cohen a
dizer que é a ciência cujo objeto é a poesia. Afinal, para Aristóteles qual
o significado para a poesia? Para Aristóteles a poesia é imitação, um ato
congênito ao homem, ao lado do ritmo e da harmonia. Por isso, no sentido
aristotélico, a poesia, segundo Jean Cohen, designava um gênero literário, por
transferência da causa para o efeito, do objeto para o sujeito, designando a
impressão estética particular normalmente produzida pelo poema. Tal condução
levou-se a entender que a poesia, com base em Ariano Suassuna, está entre as
artes auditivas, e possui três espécies principais: a lírica, a épica e a
filosófica. Veja mais aqui, aqui e aqui.
Imagem: Female nude (oil on canvas, 2006), do
artista plástico húngaro Arthur
Braginsky.
Curtindo o álbum Ângulos: tudo está
dito (Copacabana, 1986), da
cantora e musa do movimento cultural Vanguarda Paulista, Eliete Negreiros.
O PRAZER COMO CRITÉRIO DE
VALOR – No livro Análise
do Homem (Zahar, 1978), do filósofo, sociólogo e psicanalista alemão Erich
Fromm (1900-1980), destaco os trechos da parte O prazer como critério de
valor: A ética autoritária tem a vantagem
da simplicidade; seus critérios para julgar o que é bom ou mau são as sentenças
da autoridade, e na obediência a eles está a virtude do homem. A ética
humanista tem de fazer face à dificuldade [...] ao fazer do homem o único juiz dos valores, poderia parecer que o prazer
ou a dor se transforma no árbitro final do bem e do mal. Se realmente esta
fosse a única alternativa, então o princípio humanista não poderia servir de
base a normas éticas. Pois vemos que alguns encontram prazer em embriagar-se,
em acumular riquezas, na fama, em magoar pessoas, ao passo que outros o
encontram amando, partilhando coisas com os amigos, pensando, pintando. Como
poderá nossa vida ser guiada por um motivo que se aplique igualmente ao animal
como ao homem, à boa ou à má pessoa, ao normal e ao enfermo? Mesmo que
moderemos o princípio do prazer, restringindo-o aos prazeres que não
prejudiquem os legítimos interesses das demais pessoas, ele não se presta a
orientar nossas ações. Todavia, essa alternativa entre submissão à autoridade e
reação ao prazer como princípios orientadores é falsa. [...] A significação da análise qualitativa do
prazer foi admitida desde os primórdios do pensamento ético humanista. A solução do problema, contudo, teve de
permanecer insatisfatória enquanto se carecia de uma percepção íntima da
dinâmica inconsciente da experiência do prazer. a pesquisa psicanalítica
oferece novos dados e sugere novas respostas a esse problema secular da ética
humanista. [...] O hedonismo sustenta
que o prazer é o princípio diretor da ação humana, tanto fatual quanto
normativamente. Aistipoo, o primeiro representante da teoria hedonista,
acreditava alcançar o prazer e evitar a dor eram a finalidade da vida e o
critério da virtude. Para ele, prazer é o prazer do momento que passa. [...]
Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.
MADAME EDWARDA (ilustração
de René Magritte para Madame Edwarda, 1946) – Com o pseudônimo de Pierre
Angélique, o polêmico escritor francês Georges
Bataille (1897-1962), publicou o livro Madame Edwarda (Pauvert,
1956), no qual ele prossegue sua obra erótica tributária de Sade, depois da
publicação de História do Olho. Trata-se de uma ficção erótica em que se
encontra eres angustiados e torturados por conflitos íntimos, que o autor utiliza para mostrar a perda do
indivíduo em torno de suas paixões até a morte. No prefácio do livro ele
expressa que: [...] para refletir um
instante sobre a atitude tradicional em relação ao prazer (que no jogo dos
sexos atinge a maior intensidade) e à dor (que a morte apazigua, é verdade, mas
que, antes disso, ela leva ao paroxismo). Um conjunto de condições nos conduz a
fazer do homem (da humanidade) uma imagem igualmente distante do prazer extremo
e da extrema dor; as interdições mais comuns atingem a vida sexual e a morte, a
tal ponto que uma e outra formaram o campo do sagrado quando um caráter sério
foi conferido apenas às interdições relativas às circunstâncias do
desaparecimento do ser, enquanto as que diziam respeito às circunstancias do
aparecimento – toda a atividade genética – foram consideradas levianamente. Não
está em questão protestar contra a tendência da maioria: ela é a expressão do
destino, que quis que o homem risse de seus órgãos reprodutores. Mas este riso,
acusando a oposição entre o prazer e a dor (a dor e a morte são dignas de respeito
enquanto o prazer é derrisório, destinado ao desprezo), marca também seu
parentesco fundamental. O riso não é mais respeitoso, mas é o sinal do horror.
A vida é a atitude de compromisso adotado pelo homem em presença de um aspecto
que repugna, quando este aspecto não parece tão sério. Da mesma maneira, o
erotismo considerado seriamente, tragicamente, representa uma reviravolta.
Antes de tudo, faço questão de precisar a que ponto são inúteis essas
afirmações banais, segundo as quais a interdição sexual é um preconceito, do
qual está na hora de nos desfazermos. A vergonha, o pudor, que acompanham o
sentimento forte de prazer não seriam nada além de provas de falta de
inteligência. É o mesmo que dizer que deveríamos fazer tábula rasa e voltar ao
tempo da animalidade, da livre devoração e da indiferença às imundícies. Como se
a humanidade inteira não resultasse de movimentos de horror seguidos de
atração, aos quais se ligam a sensibilidade e a inteligência. Mas, sem querer
nada opor ao riso do qual a indecência é a causa, é-nos admitido retornar – em
pane – a um ponto de vista que o próprio riso induziu. É, com efeito, o riso
que justifica uma forma de condenação desonrosa. O riso nos faz tomar esta via
na qual o principio de uma interdição, de decências necessárias, inevitáveis,
transforma-se em hipocrisia insensível, em incompreensão do que está em jogo. A
extrema licença ligada à brincadeira é acompanhada de uma recusa em levar a
sério – eu compreendo o trágico – a verdade do erotismo [...]. Veja mais
aqui, aqui e aqui.
EPIGRAMAS - Imagem
As Três Graças, escultura de António Canova (1757-1822) – Os famosos epigramas do poeta grego Rufino (200 ou 400 dC), destaco os
traduzidos por José Paulo Paes, primeiro o Epigrama 35: Três beldades me escolheram para julgar-lhes
as nádegas, a mim mostradas no esplendor
da nudez. As de uma, florescendo em alvura veludosa, estavam marcadas ambas por
covinhas graciosas; A nívea carne das de outra, a de pernas abertas, tinha
rubor mais forte que a purpura da rosa; As da terceira, calmaria sulcada de
ondas mudas, palpitavam suaves ao seu próprio impulso. Se o juiz das deusas,
Páris, tivesse visto estas nádegas, não queria saber de mais nenhuma. [...] Fui juiz num concurso de coxas de três mulheres. Foram elas que me
escolheram, me mostraram a nudez esplendorosa dos seus corpos. Marcada de
pregas arredondadas, a branca doçura das coxas de uma floria. A carne Nevada da
outra, de pernas afastadas, tinha uma corsanguínea, mais vermelha que uma rosa
purpura. A terceira mostrava-se serena como um mar tranquilo, com a pele
delicada apenas sacudida por estremecimentos involuntários. Se o árbitro das
deusas Tivesse contemplado estas coxas, não teria querido olhar as primeiras.
O Epigrama 60: A jovem de pés de
prata lavava os pomos dourados dos seios banhando-lhes a carne leitosa; a
carnadura das nádegas redondas palpitava, mais ondulosa e mais fluída do que a
água. Com a mão espalmada ela tentava encobrir o monte, mas não todo, não tanto
quanto poderia. Epigrama 94: Tens, Melite,
os olhos de Hera, as mãos de Palas Atena, os seios da deusa Páfia, os
tornozelos de Tétis. E feliz é quem te vê, mais sortudo se te escuta, um
semideus o que te ama, imortal se te desposa. Veja mais aqui, aqui e aqui.
A PRIMEIRA ESTÉTICA DA ARTE
DRAMÁTICA – Na obra Teatro Vivo (Civita, 1976), organizada
por Sábato Magaldi, encontro que: Baseado
na observação crítica das tragédias, Aristóteles construiu a primeira estética
da arte dramática: a Poética. Nela acham-se definidos o pensamento, a fábula, o
caráter, a linguagem, a melodia e a encenação – os seis elementos essenciais da
obra teatral. Todos eles deveriam estar subordinados à regra das três unidades
– ação, tempo e lugar -, observadas de certa maneira pelos autores gregos e
pelos clássicos franceses muitos séculos depois. Através do pensamento, o autor
firma sua posição diante dos valores da época e da sociedade em que vive. Por
isso, ele não é apenas próprio do teatro, mas inerente a todas as formas de
expressão artística. O pensamento condiciona-se à época, ao tipo de público a
que se destina, ao objeto da mensagem. Na Grécia do século V aC., Aristófanes
(448-380aC), escrevia uma comedia para denunciar a incompetência e venalidade
dos governantes da pólis, alertas contra os maus costumes da juventude
ateniense e proclamar os sofistas como corruptores das instituições. A
encenação de suas comédias parecia uma arena política, incentivando a constante
participação do público, interessado por esse gênero de problema. A fábula é
descrita por Aristóteles como a imitação da ação; toda a estrutura dos
incidentes. Constitui a trama, por meio a qual o dramaturgo expõe e desenvolve
os acontecimentos, estabelecendo também o clímax e o desenlace. Todas essas
partes variam de intensidade de peça para peça, mas geralmente são identificáveis
na maior parte dos textos tradicionais. Caráter é o elemento do texto referente
às personagens. O teatro grego inventou dois termos para designar caracteres
opostos: protagonista (herói) e antagonista (vilão). O primeiro pode ser
indicado no próprio título da peça, como em Britanicus (1969), de Jean Racine
(1639-1699), e Cândida (1895), de Bernard Shaw (1856-1950). Em algumas peças, o
conflito não se trava entre dois caracteres fisicamente presentes, mas na mente
de uma única personagem. Em O imperador Jones (1920), do dramaturgo
norte-americano Eugene O’Neill (1888-1953), a personagem título é seu próprio
antagonista. Aristóteles exigia que o caráter fosse bom a sua maneira,
apropriado, real e coerente, isto é, verossímil e, ao mesmo tempo, compreensível.
Os dois caracteres conflitantes (o antagonista e o protagonista) perduraram até
o século XIX,, quando se passou a considerar o homem um produto do meio; nem
inteiramente bom, nem inteiramente mau em si mesmo – apenas humano, ambíguo,
com qualidades e defeitos. O caráter é importante, mas não imprescindível.
Aristóteles dizia que sem ação não poderia haver tragédia, mas poderia havê-la
sem caracteres, e citava as tragédias da maior parte de seus contemporâneos
como exemplo. Partindo do interior do próprio verso, a melodia acompanhava toda
a tragédia, acentuando-se mais ainda no coro, que tecia comentários sobre as
cenas e o comportamento dos personagens. Daí a importância que Aristóteles lhe
atribuiu. Na verdade, a passagem entre a recitação de um poema épico e a
representação de um drama já se situava no canto dos rapsodos que visitavam a
casa dos nobres ricos, os festivais, as feiras e as oficinas. Os numerosos
diálogos da epopeia exigiam do recitador grande habilidade histriônica,
colocando-o entre o poeta e o ator (hypokrités). Por se constituir talvez no
mais grego dos elementos dramáticos, a melodia, na forma concebida por
Aristóteles, não sobreviveu à tragédia. Por mais de mil anos, passou a ser
utilizada no teatro do Ocidente somente como interlúdio musical entre atos e,
com exceção do melodrama, até o século XIX ela não se ligou à estrutura
dramática do texto. [...] Veja mais aqui, aqui e aqui.
O CONVITE AO PRAZER – O drama erótico O convite ao prazer (1980), dirigido pelo cineasta Walter Hugo Khouri, com trilha sonora
de Rogério Duprat e fotografia de Antonio Meliande, conta a história de dois
amigos de infância que conversam sobre as suas aventuras amorosas e o vazio que
se seque a cada nova conquista. O destaque do filme é para a belíssima e
sensual atriz de cinema e televisão Helena
Ramos, que atuou nos anos 1970/80 em diversas pornochanchadas com grandes
sucesso, o que a fez reconhecida como a musa da pornochanchada e uma das musas
da Boca, afora atuar em novelas televisivas. Veja aqui.
IMAGEM DO DIA
A arte do artista plástico, escritor,
ilustrador e publicitário argentino El Tomi Müller.
DEDICATÓRIA
A edição de hoje é dedicada ao poetamigo
e professor Fernando Fiorese &
Corpo Portátil. Veja aqui, aqui e aqui.