VAMOS APRUMAR A CONVERSA? DE
PERTO NINGUÉM É NORMAL –
Estava eu devida e confortavelmente aboletado e mais que maravilhado no maior
estado de graça com a competência e dedicação da professora Janne Eyre, quando
me passou pela memória um trecho duma canção de Caetano Veloso: - De perto
ninguém é normal! Nada mais teibei na constatação que isso! E eu lá num misto
entre curioso e espantado com um clássico caso de lobotomia acidental, ocorrido
em 1848, e denominado de Caso Gage, envolvendo o operário estadunidense Phineas
Gage (1822-1861). Seguinte: o cara era um daqueles sujeitos bem quisto por
todos. Pai de família correto, empenhado profissionalmente, atencioso e cordial
com conhecidos e desconhecidos, moral irrepreensível e amado por todos, mesmo
levando em consideração a nossa peculiar superestimação nas qualidades de
qualquer vítima do mais pavoroso infortúnio. No amiudado: o melhor cara do
mundo, um santo em pessoa que desfilava dando até pra imaginar a existência
duma a auréola beatífica na cabeça dele. É isso. E isso até o dia em que ele
saiu de casa cantarolando Cotidiano de Chico Buarque, não antes dar o
costumeiro beijo de despedida na mulher – só que nem ela nem ele sabiam que
poderia ser o último ou quase o último da vida deles -, e sair entre assobios e
bom dia na saudação com todos do trajeto de seu lar pro trabalho. Era um dia de
branco como outro qualquer. Organizou-se para o desempenho de suas funções
profissionais, apropriou-se dos apetrechos laborais e foi de corpo e alma para
mais um dia de labuta. Eis que a certa altura dos afazeres, dominando por
completo o seu metier, altivo senhor da situação, manipulava ele explosivos
solfejando uma cantiga de memória, quando, inadvertidamente, negligencia lá um
procedimento corriqueiro pra ele e quase sem nenhuma valia na hora e por isso,
sem mais nem menos, provoca um pipoco do estopô calango, de todo mundo correr e
esperar baixar a poeira para ver o que havia sucedido. Ocorre que num revestrés
do muito arretado, uma barra de metal atinge sua face esquerda e perfura o seu
cérebro, especificamente o lobo frontal. Um acidente grave, mas ele sobrevive,
graças! Corre corre da pega, levaram-no pro hospital ainda com o barrete
enfiado na cara, conseguindo, enfim, com meticuloso trabalho médico retirar-lhe
o entrave sem causar-lhe danos mais profundos e deixá-lo vivinho da silva pra
contar história. E contou mesmo. Ficou caolho, mas não quis ser pirata. Feioso,
assumiu a feiúra e, quase um Charlie Chaplin, ele não só contou como se tornou
autor e protagonista ao mesmo tempo da própria história. Bem. É que passado
alguns dias ele começou a apresentar sinais de violência progressiva nunca
antes verificado no seu comportamento do dia a dia. Passou a se irritar com
facilidade, sua moral abalada foi decaindo vertiginosamente, tornou-se
irresponsável com uma irreverencia nunca vista e perdeu completamente o
interesse pelas coisas espirituais. Quer dizer, esse não era mais o Phineas
Gage que todo mundo estava acostumado a conviver. Era outro depois do acidente.
E muito diferente. Era tão outro que, não sendo besta que nem eu, tirou
proveito da sua sina e começou a dar espetáculos, apresentando-se como o cara
que bateu as botas e foi pro Hades, encarou a morte e disse pra ela esperar por
ele noutra que agora ele queria mostrar como se safar dum baque raçudo e
tataritaritatá. Virou a maior atração do momento, o roliúde mesmo. Mas o que me
chamou muito mais minha atenção, não foi o caso em si. Foi tomar conhecimento
das mudanças comportamentais e de personalidade previstas quando da ocorrência
de danos ou lesões do lobo frontal do cérebro humano. Entre as consequências desses
danos ou lesões, pode acontecer a procura pela satisfação imediata. Êpa! Quem não
está? Conheço um punhado de gente com isso. Outra: tendência a culpar os outros
por seus problemas. Cuma? Tá piorando. Ora, ora, isso é mais comum que fazer
qualquer conta daquela bem grandona e, no final, dá tudo errado. Mais outras: perda
do sentido moral, irresponsabilidade, indisciplina, perda do sentido moral,
perda das ligações sociais... Vixe! Tá parecendo mais com os Fabos que viraram
políticos no Brasil. Mais: incapacidade de analise e de avaliação correta...
danou-se! O que tem de analfabeto funcional por aí não tá no gibi. E mais:
perda de sensibilidade e noção dos limites, como apresentação de agressividade,
antipatia, hostilidade... Ave! Tô perdido. Mas tem mais: capacidade diminuída para
cálculos matemáticos e de memória, em especial eventos recentes, afora a apatia
e indiferença perante a situação pessoal. Lascou. Minha nossa! Aí cheguei pra
professora e perguntei: - Professora, a senhora tirou meu retrato, foi? E ela,
coitada, com a sua inocente forma de ser, virou-se pra mim interrogativa: - Por
que? Ué, isso aí sou eu cagado e cuspido, ora. E mais: conheço uma tuia de
gente que é assim mesmo, talqualzinha. Será que tá todo mundo com o lobo
frontal danificado? Nossa! Ela sorria com o meu exagero, levando na conta do
amostramento, apenas. Mas não era só isso. Ué, reveja uma por uma das consequências
e diga se não é a certidão da gente hoje! Pra quem, como eu, é do tempo em que neurose
era pior que a frebe do rato - (sic), não é febre, é frebe mesmo, aquela que é
pior que câncer, aids e todas as maledicências de Pandora juntas num balaio só –,
imagine nesse tempo umbigocentrista de oniomania! Eu mesmo já assumi
publicamente: não tenho a menor sanidade mental. E ponto final. Veja mais aqui.
Imagem: Three Lovers (1817-20), do pintor e litógrafo francês Théodore Géricault (1791-1824)
Curtindo Rapsody in Blue (1924), do compositor estadunidense George Gershwin (1898-1938), with Eastman
Rochester Symphony Orchestra, Eugene List & Howard Hanson, Antal Doráti,
Minneapolis Symphony Orchestra. Veja mais aqui.
O NADA E O TÉDIO - No livro Que é metafísica? (Livraria Duas Cidades, 1969), do filósofo alemão Martin Heidegger (1889-1976), encontro
o trecho que o autor fala a respeito do nada e o tédio: [...] Primeiramente e o mais das vezes o homem
somente então é capaz de buscar se antecipou a presença do que busca. Agora,
porém, aquilo que se busca é o nada. [...] Seja como for, nós conhecemos o nada, mesmo que seja apenas aquilo
sobre o cotidianamente falamos inadvertidamente. Podemos até, sem hesitar,
ordenar numa definição este nada vulgar, em toda palidez do óbvio, que tão
discretamente ronda nossa conversa: o nada é a plena negação da totalidade do
ente. [...] A totalidade do ente deve
ser previamente da para que possa ser submetida enquanto tal simplesmente à
negação, na qual, então, o próprio nada se deverá manifestar. [...] Tão certo como é que nós nunca podemos
compreender a totalidade do ente em si e absolutamente, tão evidente é,
contudo, que nos encontramos postados em meio ao ente de algum modo desvelado
em sua totalidade. E está fora de dúvida que subsiste uma diferença essencial
entre compreender a totalidade do ente em si e o encontrar-se em meio ao ente
em sua totalidade. Aquilo é fundamentalmente impossível. Isto, no entanto,
acontece constantemente em nossa existência. Parece, sem dúvida, que, em nossa
rotina cotidiana, estamos presos sempre apenas a este ou àquele ente, como se
estivéssemos perdidos neste ou naquele domínio do ente. Mas, por mais disperso
que possa parecer o cotidiano, ele retem, mesmoque vagamente, o ente numa
unidade de totalidade. Mesmo então e justamente então, quando não estamos
propriamente ocupados com as coisas e com nos mesmos, sobrevem-nos este em
totalidade, por exemplo, no tedio propriamente dito. Este tédio ainda está
muito longe de nossa experiência quando nos entedia exclusivamente este livro
ou aquele espetáculo, aquela ocupação ou este ócio. Ele desabrocha se a gente
está entediado. O profundo tédio, que como névoa silenciosa desliza para cá e
para lá nos abismos da existência, nivela todas as coisas, os homens e a gente
mesmo com elas, numa estranha indiferença. Este tedio manifesta o ente em sua
totalidade. [...] Veja mais aqui, aqui e aqui.
ELA – No livro O nariz
e outras crônicas (Ática, 2003), do escritor,
cartunista, tradutor, roteirista e autor teatral Luis Fernando
Veríssimo, encontro a deliciosa crônica Ela: Ainda me lembro do dia em que ela chegou lá em casa. Tão pequenininha!
Foi uma festa. Botamos ela num quartinho dos fundos. Nosso Filho – Naquele
tempo só tinha o mais velho – ficou maravilhado com ela. Era um custo tirá-lo
da frente dela para ir dormir. Combinamos que ele só poderia ir para o quarto
dos fundos depois de fazer todas as lições. - Certo, certo.- Eu não ligava
muito para ela. Só para ver um futebol ou política. Naquele tempo, tinha
política. Minha mulher também não via muito. Um programa humorístico, de vez em
quando. Noites Cariocas… Lembra de Noites Cariocas? - Lembro vagamente. O
senhor vai querer mais alguma coisa? E me serve mais um destes. Depois
decidimos que ela podia ficar na copa. Aí ela já estava mais crescidinha.
Jantávamos com ela ligada, porque tinha um programa que o garoto não queria
perder. Capitão Qualquer Coisa. A empregada também gostava de dar uma espiada.
José Roberto Kely. Não tinha um José Roberto Kely? - Não me lembro bem. O
senhor não me leva a mal, mas não posso servir mais nada depois deste. Vamos
fechar. - Minha mulher nem sonhava em botar ela na sala. Arruinaria toda a
decoração. Nesa época já tinha nascido o nosso segundo filho e ele só ficava
quieto, para comer, com ela ligada. Quer dizer, aos pouco ela foi afetando os
hábitos da casa. E então surgiu surgiu um personagem novo nas nossas casas que
iria mudar tudo. Sabe quem foi? - Quem? - O Sheik de Agadir. Eu, se quizesse,
poderia processar o Sheik de Agadir. Ele arruinou o meu lar. - Certo. Vai
querer a conta? - Minha mulher se apaixonou pelo Sheik de Agadir. Por causa
dele, decidimos que ela poderia ir para a sala de visitas. Desde que ficasse
num canto, escondida, e só aparecesse quando estivesse ligada. Nós tinhamos uma
vida social intensa. Sempre iam visitas lá em casa. Também saíamos muito.
Cinema, Teatro, jantar fora. Eu continuava só vendo futebol e notícia. Mas
minha mulher estava sucumbindo depois do Sheik de Agadir, nao queria perder
nenhuma novela. - Certo. Aqui está a sua conta. Infelizmente temos que fechar o
bar. - Eu não quero a conta. Quero outra bebida. Só mais uma. - Está bem… Só
mais uma. - Nosso filho menor, o que nesceu depois do Sheik de Agadir, não saía
de frente dela. Foi praticamente criado por ela. É mais apegado à ela do que a
própria mãe. Quando a mãe briga com ele, ele corre pra perto dela pra se
proteger. Mas onde é que eu estava? Nas novelas. Minha mulher sucumbiu às
novelas. Não queria mais sair de casa. Quando chegava visita, ela fazia cara
feia. E as crianças, claro só faltavam bater em visita que chegasse em horário
nobre. Ninguém mais conversava dentro de casa. Todo mundo de olho grudado nela.
E então aconteceu outra coisa fatal. Se arrependimento matasse… - Termine a sua
bebida, por favor. Temos que fechar. - Foi a copa do mundo. A de 74. Decidi que
para as transmissões da copa do mundo ela deveria ser bem maior. E colorida.
Foi a minha ruína. Perdemos a copa, mas ela continua lá, no meio da sala.
Gigantesca. É o móvel mais importante da casa. Minha mulher mudou a decoração
da casa para combinar com ela. Antigamente ela ficava na copa para acompanhar o
jantar. Agora todos jantam na sala para acompanhá-la. - Aqui está a conta. - E,
então, acontecu o pior. Foi ontem, hora do Dancin´Days e bateram na porta.
Visitas. Ninguém se mexeu. Falei para a empregada abrir a porta, mas ela fez
“Shhh!” sem tirar os olhos da novela. Mandei os filhos, um por um, abrirem a a
porta, mas eles nem me responderam. Comecei a me levantar. E então todos
pularam em cima de mim. Sentaram no meu peito. Quando comecei a protestar,
abafaram o meu rosto com a almofada cor de tijolo que minha mulher comprou para
combinar com a maquiagem da Júlia. Só na hora do comercial, consegui recuperar
o ar e aí sentenciei, apontando para ela ali, impávida no meio da sala: “Ou
ela, ou eu!”. O silêncio foi terrível. - Está bem… mas agora vá para casa que
precisamos fechar. Já está quase clereando o dia… - Mais tarde, depois da
Sessão Coruja, quando todos estava dormindo, entrei na sala, pé ante pé. Com a
chave de parafuso na mão. Meu plano era atacá-la por trás, abri-lá e retirar
uma válvula qualquer. Não iria adiantar muita coisa, eu sei. Eles chamariam um
técnico às pressas. Mas era um gesto simbólico. Ela precisava saber quem é que
mandava dentro de casa. Precisava sabe que alguém não se entregava completamente
a ela, que alguém resistia. E então, quando me preparava para soltar o primeiro
parafuso, ouvi a sua voz. “Se tocar em mim você morre”. Assim com toda a
clareza. “Se tocar em mim você morre”. Uma voz feminina, mas autoritária, dura.
Tremi. Ela podia estar blefando, mas podia não estar. Agi depressa. Dei um
chute no fio, desligando-a da tomada e pulei para longe antes que ela
revidasse. Durante alguns minutos, nada aconteceu. Então ela falou outra vez. ”
Se não me ligar outra vez em um minuto, você vai se arrepender”. Eu não tinha
alternativa. Conhecia o seu poder. Ela chegara lá em casa pequenininha e aos
poucos foi crescendo e tomando conta. Passiva, humilde, obediente. E vencera.
Agora chegara a hora da conquista definitiva. Eu era o único empecilho à sua
dominação completa. Só esperava om pretexto para me eliminar com um raio
catótico. Ainda tentei parlamentar. Pedi que ela poupasse a minha vida.
Perguntei o que ela queria, afinal. Nada. Só o que ela disse foi “Você tem 30
segundos”. - Muito bem. Mas preciso fechar. Vá para casa. - Não posso. -Por
quê? - Ela me proibiu de voltar lá. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.
A CANÇÃO DE AMOR DE J.
ALFRED PRUFROCK – No
livro Poesia (Nova Fronteira, 1981), do poeta, dramaturgo, crítico literário
inglês e Prêmio Nobel de 1948, Thomas Stearns Eliot (1888-1965),
encontro o belíssimo poema A canção de amor de J. Alfred Prufrock, numa
tradução de Ivan
Junqueira: Sigamos então, tu e eu, / Enquanto o poente no céu se
estende / Como um paciente anestesiado sobre a mesa; / Sigamos por certas ruas
quase ermas, / Através dos sussurrantes refúgios / De noites indormidas em
hotéis baratos, / Ao lado de botequins onde a serragem / Às conchas das ostras
se entrelaça: / Ruas que se alongam como um tedioso argumento / Cujo insidioso
intento / É atrair-te a uma angustiante questão... / Oh, não perguntes:
"Qual?" / Sigamos a cumprir nossa visita. / No saguão as mulheres vêm
e vão / A falar de Miguel Ângelo. / A fulva neblina que roça na vidraça suas
espáduas, / A fumaça amarela que na vidraça seu focinho esfrega / E cuja língua
resvala nas esquinas do crepúsculo, / Pousou sobre as poças aninhadas na
sarjeta, / Deixou cair sobre seu dorso a fuligem das chaminés, / Deslizou
furtiva no terraço, um repentino salto alçou, / E ao perceber que era uma tenra
noite de outubro, / Enrodilhou-se ao redor da casa e adormeceu. / E na verdade
tempo haver á / Para que ao longo das ruas flua a parda fumaça, / Roçando suas
espáduas na vidraça;/ Tempo haverá, tempo haverá/ Para moldar um rosto com que
enfrentar / Os rostos que encontrares; / Tempo para matar e criar, / E tempo
para todos os trabalhos e os dias em que mãos / Sobre teu prato erguem, mas
depois deixam cair uma questão; / Tempo para ti e tempo para mim, / E tempo
ainda para uma centena de indecisões, / E uma centena de visões e revisões, / Antes
do chá com torradas. / No saguão as mulheres vêm e vão / A falar de Miguel
Ângelo. / E na verdade tempo haverá / Para dar rédeas à imaginação. / "Ousarei"
E . . "Ousarei?" / Tempo para voltar e descer os degraus, / Com uma
calva entreaberta em meus cabelos / (Dirão eles: "Como andam ralos seus
cabelos!") / - Meu fraque, meu colarinho a empinar-me com firmeza o queixo,
/ Minha soberba e modesta gravata, mas que um singelo alfinete apruma / (Dirão
eles: "Mas como estão finos seus braços e pernas!") / - Ousarei / Perturbar
o universo? / Em um minuto apenas há tempo / Para decisões e revisões que um
minuto revoga. / Pois já conheci a todos, a todos conheci / - Sei dos
crepúsculos, das manhãs, das tardes, / Medi minha vida em colherinhas de café;
/ Percebo vozes que fenecem com uma agonia de outono / Sob a música de um
quarto longínquo. / Como então me atreveria? / E já conheci os olhos, a todos
conheci / - Os olhos que te fixam na fórmula de uma frase; / Mas se a fórmulas
me confino, gingando sobre um alfinete, / Ou se alfinetado me sinto a colear
rente à parede, / Como então começaria eu a cuspir / Todo o bagaço de meus dias
e caminhos? / E como iria atrever-me? / E já conheci também os braços, a todos
conheci / - Alvos e desnudos braços ou de braceletes anelados / (Mas à luz de
uma lâmpada, lânguidos se quedam / Com sua leve penugem castanha!) / Será o
perfume de um vestido / Que me faz divagar tanto? / Braços que sobre a mesa
repousam, ou num xale se enredam. / E ainda assim me atreveria? / E como o
iniciaria? / ....... Diria eu que muito caminhei sob a penumbra das vielas / E
vi a fumaça a desprender-se dos cachimbos / De homens solitários em mangas de
camisa, à janela debruçados? / Eu teria sido um par de espedaçadas garras / A
esgueirar-me pelo fundo de silentes mares. / ...... E a tarde e o crepúsculo
tão .docemente adormecem! / Por longos dedos acariciados, / Entorpecidos...
exangues... ou a fingir-se de enfermos, / Lá no fundo estirados, aqui, ao nosso
lado. / Após o chá, os biscoitos, os sorvetes, / Teria eu forças para enervar o
instante e induzi-lo à sua crise? / Embora já tenha chorado e jejuado, chorado
e rezado, / Embora já tenha visto minha cabeça (a calva mais cavada) / servida
numa travessa, / Não sou profeta - mas isso pouco importa; / Percebi quando
titubeou minha grandeza, / E vi o eterno Lacaio a reprimir o riso, tendo nas
mãos meu sobretudo. / Enfim, tive medo. / E valeria a pena, afinal, / Após as
chávenas, a geléia, o chá, / Entre porcelanas e algumas palavras que disseste,
/ Teria valido a pena / Cortar o assunto com um sorriso, / Comprimir todo o
universo numa bola / E arremessá-la ao vértice de uma suprema indagação, / Dizer:
"Sou Lázaro, venho de entre os mortos, / Retorno para tudo vos contar,
tudo vos contarei." / - Se alguém, ao colocar sob a cabeça um travesseiro,
/ Dissesse: "Não é absolutamente isso o que quis dizer / Não é nada disso,
em absoluto". / E valeria a pena, afinal, / Teria valido a pena, / Após os
poentes, as ruas e os quintais polvilhados de rocio, / Após as novelas, as
chávenas de chá, após / O arrastar das saias no assoalho / - Tudo isso, e tanto
mais ainda? - / Impossível exprimir exatamente o que penso! / Mas se uma
lanterna mágica projetasse / Na tela os nervos em retalhos... / Teria valido a
pena, / Se alguém, ao colocar um travesseiro ou ao tirar seu xale às pressas, / E ao voltar em direção à janela,
dissesse: / "Não é absolutamente isso, / Não é isso o que quis dizer, em
absoluto." / Não! Não sou o Príncipe Hamlet, nem pretendi sê-lo. / Sou um
lorde assistente, o que tudo fará / Por ver surgir algum progresso, iniciar uma
ou duas cenas, / Aconselhar o príncipe; enfim, um instrumento de fácil manuseio,
/ Respeitoso, contente de ser útil, / Político, prudente e meticuloso;/ Cheio
de máximas e aforismos, mas algo obtuso; / As vezes, de fato, quase ridículo / Quase
o Idiota, às vezes. / Envelheci... envelheci... /Andarei com os fundilhos das
calças amarrotados. / Repartirei ao meio meus cabelos? Ousarei comer um pêssego?
/ Vestirei brancas calças de flanela, e pelas praias andarei. / Ouvi cantar as
sereias, umas para as outras. / Não creio que um dia elas cantem para mim. / Vi-as
cavalgando rumo ao largo, / A pentear as brancas crinas das ondas que refluem /
Quando o vento um claro-escuro abre nas águas. / Tardamos nas câmaras do mar / Junto
às ondinas com sua grinalda de algas rubras e castanhas / Até sermos acordados
por vozes humanas. E nos afogarmos. Veja
mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
POESIA, TEATRO, CINEMA &
TELEVISÃO - A poeta, jornalista,
cantora e atriz Elisa Lucinda,
começou sua carreira no teatro em 1986, no Rio de Janeiro, trabalhando em peças
como Rosa, um musical brasileiro e Nukowski, bicho solto no mundo. A partir
daí, passou a desenvolver sua carreira por meio dos inúmeros espetáculos e
recitais em teatros, escolas e empresas. No cinema, ela estreia no filme
Barrela (1990), depois participou do elenco de A causa secreta (1994), O
testamento do senhor Nepomuceno (1997), A morte da mulata (2001), Seja o que
Deus quiser (2002), As alegres comadres (2003), Gregório de Matos (2003) e foi
premiada na película A ultima estação (2012). Ela fundou e mantem a Casa-Poema,
em Itaúnas, no Espírito Santo, uma instituição socioeducativa de capacitação de
profissionais através da poesia falada, expressão e formação cidadã. Também
desenvolve em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o
projeto Palavra de Polícia, Outras Armas, ensinando poesia falada aos
profissionais de segurança com os princípios dos direitos humanos. Criou a
Companhia da Outra, grupo teatral em parceria com Geovana Pires, desenvolvendo
sua linguagem de teatral através da poesia. Por toda sua trajetória, aplausos
de pé pra essa atriz de teatro, cinema e televisão. Veja mais aqui, aqui e
aqui.
O NÃO SEI DAS MULHERES – O filme It (O não Sei que das Mulheres,
1927), é um longa metragem mudo comédia romântica, produzido e dirigido por
Clarence G. Badger e Josef von Sternberg, baseado no romance escrito por Elinor
Glyn, contando a história de uma jovem moça que se
apaixona pelo filho do seu empregador, que se torna gerente e herdeiro da maior
loja do mundo. Como eles pertencem a classes sociais diferentes, pra decepção
dela, ele está apaixonado por uma socialite. Ela consegue ganhar a atenção
dele, mas logo o esbofeteia quando ele tenta beijá-la e vai embora por isso. A
história vai se desenrolando que os desencontros entre eles, até que numa
viagem a trama chega ao ápice. O destaque do filme vai para a atriz estadunidense
Clara Bow (1905-1965), que se tornou
a estrela de maior magnitude, sendo conhecida como It Girl. Veja mais aqui.
VISITA INTIMA - Acontecerá no próximo dia 03 de
outubro, a partir das 15hs, no Auditório da Biblioteca de São Paulo (BSP), o
lançamento do livro Visita íntima, da
poeta, compositora e blogueira Sandra
Regina, pela Editora Reformatório e com apresentação de Luiz Alberto
Mendes. Segundo release do evento, "Visita
íntima" é um convite às sensações, aos desejos de plenitude cabíveis ou
não no corpo físico. Poemas que versam sobre esperas, contatos e ausência.
Amores incondicionalmente presos às convicções libertárias, com duração
limitada e restrições. Os poemas são apresentados como um roteiro, um guia. E
vão revelando a dor e solidão de quem vive à mercê das visitas que lhe são
feitas, alguém que vive à espera do ser amado enclausurado numa cela, seja de
uma cadeia, ou na imposta pelos limites do tempo/espaço. Ela edita os ótimos
blogs Feita em versos e De tudo fica um conto. Imperdível. Veja
mais aqui.
IMAGEM DO DIA
Medusa, do artista multimídia e fotógrafo
Sérgio Valle Duarte.
Veja mais no MCLAM: Hoje é dia do
programa Noite Romântica, a partir
das 21hs, no blog do Projeto MCLAM, com a apresentação sempre especial e
apaixonante de Meimei Corrêa. Na
programação: Em seguida, o
programa Mix MCLAM, com Verney Filho
e na madrugada Hot Night, uma
programação toda especial para os ouvintes amantes. Para conferir online acesse
aqui.
VAMOS APRUMAR A CONVERSA?
Dê livros de presente para as crianças.