terça-feira, março 31, 2020

OLIVE SCHRINER, SUZANA AMARAL, ANA MARIA PACHECO, TITINO & GALATEIA DO GOITÁ


GALATEIA DO GOITÁ – Galateia era uma matuta arrumada: boniteza de rosto, bem feita de corpo, tímida, pudica. Mesmo com os olhões chamativos, a dentadura de égua, a pele trigueira e a toda sua assimetria escultural pros ajeitados das mãos insolentes dos sonhadores e desenganados. Mesmo assim, se dizia desajeitada para o amor, por não saber lidar com a macharia obtusa. Era o que dizia: todos os homens só queriam tirar uma casquinha e pinotar fora depois das conchambranças. Ah, se era. Sabida, se precavia: Não vai ser uma conversa mole que vai me derrubar. Daí largava logo uns bregues graves nos pretensos pretendentes todos cheios de lábias e mimos, a ponto de ninguém querer nem mais chegar perto, só morriam na mão. Coitada, impune solitária desejada por muitos e tantos, recolhida na sua clausura. Foi na sua solidão que ela inventou de confeccionar, às escondidas, um boneco com proporções humanas. Com afinco na empreitada e nos mínimos detalhes, dedicada, a forma sonhada por ela. Depois de todo ajeitado, fez-lhe indumentária máscula e viril, adquirindo secretamente uma bimba de plástico, comprada numa loja do ramo, e escondida por baixo das vestimentas dele. Pronto: Quero ver agora precisar de mais macho nenhum, hora! Não havia mais aperreios para ela: na hora da apertura, reclusa, chorava na vela. Dava para o gasto, não falhava e ao dispor quando quisesse. As falações não perdoavam: diziam que ela ficara donzela pronta para o convento, ou sapatão enrustida. Ela morria de rir. A cochichada atrevida cheirava a vida dela com mexericos que ou pendia prum lado ou pro outro. E ela, nem nem. Assim passaram anos e décadas. Foi de uma hora para outra, ela ficou acamada de ser recolhida à emergência hospitalar. Diagnóstico: fora acometida de um vírus letal. Morre mas num morre. Estava lá estendida numa maca, abandonada. Os dias passavam dolorosamente na mesmice, até ser surpreendida por um cantador repentista que, repentinamente, encheu seus olhos: chistes e arroubos, num é que o cabra sapecou-lhe umas juras sentimentais libidinosas, dela ser salva depois duns arrojos aprumados na maior beijação. Pois foi, almas, pernas, sexo, o maior idílio e de verdade. O povo queimou a língua, quem diria. Mal quebrou o resguardo, saiu saltitante nos braços do vate para a alcova do amor: amaram tanto e sem limites de nunca mais perderem a esperança na vida. Para ela, o reencontro real da satisfação carnal, paz de espírito, entrega total. Todavia, depois de muita traquinagem de lábios, cochas e ventres, deu-se o maior bafafá ciumento: a descoberta do Pigmalião pendurado na porta do guarda-roupa. Que é isso? Uma briga sem precedentes, o boneco voou pelos ares todo estraçalhado e, na horagá, ela não pestanejou da escolha: preferiu a peiada real, não escondendo a saudade do totem escondido. Dias e noites, ninguém nunca mais soube dos enamorados. Amavam e muito, além da conta, escondidos no lar. É certo que na vida real não haverá nunca um final feliz, mas os dois vivem lá, trancados, entre beijos e colisões, amando como podem e vivendo. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.

DITOS & DESDITOS: [...] Há muitas reflexões morais na história, mas quando se leva uma vida completamente solitária podemos usar nosso trabalho como Gregory usou suas cartas, como um escape de todos nossos sentimentos mais desmedidos, sem perguntar se este é, artisticamente, o lugar de expressá-los [...] O homem, suas opiniões, sua constituição física e psicológica, as necessidades de sua natureza, sua função no mundo, sua dependência das circunstâncias sociais que o cercam – estas e as questões menores que destas derivam, não são sequer mencionadas! [...] Uma garota ignorante, trabalhando dez horas por dia, sem tempo para pensar ou escrever senão em algumas horas no meio da noite, escreve uma pequena história como An African Farm; um livro que deixa a desejar em muitos aspectos, completamente imaturo e cru, repleto de defeitos; um livro que foi inteiramente escrito para mim, em um momento em que vir para a Inglaterra, assim como publicá-lo, parecia impossível. E apesar disso conquistei algo, quase centenas de cartas comentando o livro, vindas de toda classe de pessoas – do filho de um Conde a uma costureira da Rua Bond, de um estivador a um poeta. [...] É o ritmo em que essas pessoas vivem, vidas pacatas como gado. Parece que as ruas estão todas repletas de vacas e de ovelhas. Todos os homens parados às portas com seus braços cruzados; se estão fazendo alguma coisa é como se nada fizessem, fazem-no tão vagarosamente que você mal vê o movimento [...]. Trechos de Olive Schreiner Letters – 1871-1899 (Oxford - Richard Rive, 1988), da escritora e feminista sul-africana Olive Schriner (1855-1920), que não possuía educação formal e, na Inglaterra, ganhou a vida como governante e escrevendo seus livros. Veja mais aqui.

A CINEMA DE SUZANA AMARAL
Cada vez que se faz um trabalho sem subir um degrau, não se aposta em si. E para subir o degrau é preciso arriscar.
SUZANA AMARAL – A arte da premiada cineasta e roteirista Suzana Amaral, autora de mais de 50 documentários de curta-metragens e que dirigiu, entre outros longas, o filme Hotel Atlântico (2009), contando a história de um ator desempregado que parte da cidade sem bagagens nem planos para o interior, baseado no livro de João Gilberto Noll; o drama A hora da estrela (1985), adaptado do romance homônimo de Clarice Lispector, contando a história da nordestina datilógrafa que sai órfã para São Paulo; a minissérie Procura-se (1992) e a interpretação O regresso do homem que não gostava de sair de casa (1996), entre outros. Veja mais aqui e aqui.

A ARTE DE ANA MARIA PACHECO
Manter viva a fonte de origem é fundamental em qualquer processo criativo. Minha infância e juventude são embutidas de imagens, experiências que são únicas. É como um rio profundo onde mergulho e sempre descubro tesouros infindáveis.
ANA MARIA PACHECO – A arte da escultora, pintora, desenhista, professora e gravadora Ana Maria Pacheco, que é bacharel em escultura pela Universidade Católica de Goiás (UCG), e em música pela Universidade Federal de Goiás (UFGO). Ela foi diretora titular de Belas Artes na Norwich School of Art, Norfolk, Inglaterra, além de ter sido professora visitante em universidades na Escócia, Inglaterra e Irlanda do Norte. Em 2000, recebeu o título de doutora honoris causa em Letras pela University of East Anglia, e, em 2002, doutora honoris causa em Filosofia pela Anglia Pulytechnic University, ambas em Norfolk, Inglaterra. Possui obras em importantes acervos no Brasil, Inglaterra, Alemanha, Japão e Estados Unidos. Veja mais aqui.

PERNAMBUCO ART&CULTURAS
A ARTE DE TITINO DE TRACUNHAÉM
A arte de Titino (Ailton Ferreira Brito).
A poesia do poeta, dramaturgo, engenheiro civil, desenhista, professor e editor Joaquim Cardozo (1897-1978) aqui.
A barlavento de Eduardo Diógenes aqui.
A arte de Marsa e Seu Pereira & Coletivo 401 aqui.
A exposição Com os olhos de náufrago ou onde fica o próximo ponto aqui.
Giomar verdureira aqui.
Ibirajuba aqui & aqui.
&
OFICINAS ABI – 2º SEMESTRE 2020
Veja detalhes das oficinas da ABI aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.


HIRONDINA JOSHUA, NNEDI OKORAFOR, ELLIOT ARONSON & MARACATU

  Imagem: Acervo ArtLAM . Ao som dos álbuns Refúgio (2000), Duas Madrugadas (2005), Eyin Okan (2011), Andata e Ritorno (2014), Retalho...