A PEIXA DO AÇUDE – Era o maior açudão, meu! Num diga! Tinha até uma peixa! Como é que é? Era.
No começo tinha só uns três arruados com uma capela mirochinha no meio pros
fieis domingueiros. Dava muito peixe dos bons, não tinha como passar fome. Na fartura,
havia até festa com roda-gigante, barracas de fogos e serviço de som. Areia branca
à beira d’água, as roupas estendidas no varal, os peixinhos, o alagadiço, um
paraíso. Foi o pescador Tonésio quem viu-la pela primeira vez, nem acreditou da
maravilha ali boiando. Fechou olhos e ao abri-los, ela desaparecera. Só vista
depois, no pôr do sol, uma festa pros curiosos que engrossavam a fila arrodiando
o espetáculo. Dela Tonésio se afeiçoou de não sair mais da jangada, até dar um
timbungue e nunca mais dar as caras por essas bandas. Que coisa! Ah, os meninos
que viram e os moradores antigos dizem que foi mesmo, só ele pescava do muito,
ela não deixava entrar ninguém com rede de arrasto, afundava quem se atrevesse,
só pesca de vara e, ao que parece, com ela se casou para sempre. Falavam que ela
tinha os olhos de verão, um prateado na pele lisa, e Tonésio quando vinha tomar
umas e outras, pabulava que lá no fundo era como se tivesse no céu cheio de
estrelas e nadar com ela era como voar sobre abismos. Tinha até um jacaré que
guardava o reinado dela, isso todos viram. Com o sumiço dele, correu o boato de que tinha uma botija escondida, com muitos
tesouros guardados lá fundo. Além do mais, de 5 em 5 anos, a invernada botava o
rio para transbordar. Foi aparecendo gente, o bairro crescendo, o fuxico, os do
disse-me-disse aumentavam na pacutia. Arengas e estranhamentos, queriam tirar o
negócio a limpo: Vem ou não vem? Oxe, não deu outra, veio uma tropa do prefeito
com escafandro e tudo, vasculharam mais de 50 metros de fundura, dizem. Maior remoeta:
De hoje não passa! E o jacará? Ah, foi atraiçoado, repartido e venderam a carne
e o couro na feira. Nada de botija? As buscas só pararam depois que uns dois
mergulhadores morreram enganchado num redemoinho brabo que dava lá embaixo. Mesmo?
Por conta disso, se arretaram e tudo ficou para trás, chega dava pena. O que
fizeram? Ah, começaram a dizer que o açude estava podre, doença incurável,
essas coisas, nem jacaré, nem peixe dava mais. Findou no aterro e enterro do
açude, mais de mil casas em cima, gente até de um olho só. Lotearam, tudo
vendido caro que só. Danou-se! Era uma vez. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais aqui.
DITOS & DESDITOS:
[...] as ações contemporâneas [...] revelam profundas conexões entre os aspectos
culturais da cidade, as estratégias de comunicação de seus atores e a variável
política, pois nestas estratégias destacam-se ações que atuam na cidade visando
tornar hegemônica determinadas leituras de apropriação dos espaços,
domesticando os usos destes e promovendo a reprodução esperada dos traços
culturais do éthos do lugar. [...] Tal
aproximação entre classes é favorecida através da “retórica da paisagem”
“recolhida” dos artísticos e culturais da cidade, capazes de construir elos
efetivos que aproximam os diferentes grupos sociais da cidade numa retórica de
confluência dos espaços públicos. [...]
Trechos
extraídos de Pontes imaginárias sob o céu
do manguetown: influências do Mangue Beach sobre as políticas públicas no
entorno do Rio Capibaribe – uma análise do circuito da Poesia e do Carnaval
Multicultural (EdUFPE, 2012), do geógrafo doutorando pela UFRJ, David Tavares Barbosa, pesquisador
vinculado ao Laboratório de Estudos sobre Espaço, Cultura e Política da UFPE e
ao Grupo de Pesquisas sobre Política e Território da UFRJ. Veja mais aqui.
CUPIDO E PSIQUÊ
Imagem: Cupid and Psiche,
do escultor, pintor, desenhista, antiquário e arquiteto Antonio Canova (1757-1822).
Antigamente, vivia na Grécia um rei que tinha três filhas. Psique, a
mais nova de todas, era de formosura rara. Quando passava pelas ruas, todos a
cobriam de flores. Chegada a ocasião de se casar, o rei recebeu um misterioso
aviso: que a levasse para uma montanha selvagem e a deixasse lá. “Oh!”, pensou
o povo. “A nossa querida Psiquê vai ser sacrificada!”. E assim era, com efeito.
O povo tinha dito que Psiquê era mais formosa que a própria Vênis, e esta, que
era a deusa da beleza, quando isto ouvia, ficava irritadíssima. Tinha Vênus um
filho chamado Cupido, e ordenou-lhe que casasse Psiquê com o homem mais feio da
terra. [...] Em meio da
obscuridade da noite alguém foi dizer palavras ternas ao ouvido de Psiquê e ela
ficou tão encantada que consentiu logo em ser esposa daquele que assim lhe
falava. Então, ele lhe disse: - “Psiquê, podes viver como mais te agradar neste
palácio que construí para ti. Só uma condição te imponho? Que não queiras ver o
meu rosto”. [...] Certa ocasião, um
vento mágico levou-lhe lá as irmãs. Esta visita causou-lhe grande desgosto,
pois, disseram-lhe que, por ordem de Vênus, Cupido a tinha casado com um
monstro. E acrescentaram: - “Por isto é que ele não quer que lhe vejas o rosto”.
[...]. Na noite seguinte Psiquê acendeu
uma lâmpada e enquanto o companheiro dormia, foi ver-lhe o rosto. Era Cupido, o
espírito alado e radiante do amor. Na sua alegria, levantou ela tão alto a
lâmpada que deixou cair uma gota de azeite quente que o despertou. – “Ah,
Psiquê!”, exclamou. “Temos que nos separar. Agora saberá minha mãe que eu me
apaixonei por ti e me casei contigo em vez de te casar com um monstro. Adeus!”.
E espalmando as asas, voou e fugiu. [...] A pobre caiu sobre a erva; mas Cupido, que a tinha seguido, foi em seu
auxilio e, dissipando os vapores do rosto da jovem tomou-a nos braços, e,
batendo as asas, levou-a para a Terra da Imortalidade. E ali viveram juntos e
sempre felizes.
Trechos
de A filha do rei da montanha – a lenda
de Cupido e Psiquê, extraído da coleção Tesouro da juventude – reunião de
conhecimentos essenciais, oferecidos em forma adequada ao proveito e
entretenimento das crianças e adolescentes (W.M.Jackson, 1963). Veja mais aqui,
aqui, aqui & aqui.
A DANÇA DE LIA ROBATTO
O ensino de dança
– por tratar-se de uma prática artística, através da percepção do potencial do
próprio corpo e de suas implicações culturais e sensoriais, emotivas e
conceituais –propõe um conhecimento não só objetivo, técnico, mas também
significativo, a partir de uma educação sensível, que abrange aspectos
subjetivos e, ao mesmo tempo, coletivos, criativos, reflexivos e críticos. [...] Quando o
ensino de dança recorre à sensibilidade e à imaginação corporal do aluno,
produzindo movimentos, formas e gestuais numa perspectiva emocional, sensível e
intuitiva, em abordagens subjetivas promovendo a livre expressão de seus
sentimentos e ideias, com qualidade técnica e valor estético, essa prática está
atribuindo centralidade ao aprendiz, um dos princípios mais significativos da educação.
[...].
Trechos extraídos da obra A dança como via privilegiada de educação: relato de uma experiência
(EDUFBA, 2012), da coreógrafa, artista e educadora Lia
Robatto, reunindo sua experiência ao defender “o ensino da dança como educação para a vida”,
um volume dividido em duas partes e oito capítulos, a primeira trazendo
considerações gerais que definem e contextualizam a arte da dança e o
profissional da área, e a segunda dedicada ao relato da trajetória da autora no
Projeto Axé e ao debate de uma nova experiência – a tentativa de fusão entre a
dança contemporânea e a capoeira. Ela sempre se posicionou na defesa de que: “A dança se
apresenta como uma das formas de expressão coletiva mais fortes, trata da alma,
do espírito, da fantasia, da criatividade e do corpo. Ela trata do sujeito como
um todo une seu corpo com o seu sentimento e suas sensações. No momento que
você trabalha isso e elabora, você transforma o aluno, você faz com que tenha
consciência de si mesmo, tenha confiança, se descubra e se auto revele”. Veja mais aqui.
&
A OBRA DE EMILY DICKINSON
A palavra morre no momento em que é proferida
- dizem alguns. Eu digo que ela começa a viver naquele momento.