VARIAÇÕES SOBRE
UM TEMA QUALQUER - Imagem: arte da pintora e poeta mexicana Nahui Ollin (Carmen
Mondragón, 1893-1978). – A chuva esfria a
manhã e eu desperto a pensar o sentido da vida humana diante do noticiário às
voltas com o lucrativo e o útil, as variáveis econômicas e as decisões
políticas. Ah, quantas manchetes, nada mais chato e a me deixar encolhido sob
as cobertas. Cá comigo, coisas de quem joga bem a boca de forno e se valem pergíveis
pela praticidade do toma lá dá cá, jogos de contas, logro e usura, malogro e
embustes, nada mais, círculo visioso de ideias mortas no tempo, como força de
lei e não me dizem mais nada, repetições a abusar da tolerância. Tudo é muito
frio, meu coração inquieto, é domingo. Ouço o choro das águas já pela tarde
chuvosa de janeiro, enquanto vozes e pés molhados pela rua ecoam a fita batida,
do ouvido pra língua, a mesma ladainha duma saparia. Ah, não, já passou e ninguém
se deu conta, pleno agora com efeito no passado mais remoto, não pode ser, não
dá mais. É como se me dissesse do futuro agora e fosse um dialeto a significar
saudade de ontem, como aquela paixão arrebatadora da adolescência tida por
perene, como aquela idolatria por demais abjurada, ou aquela moda extravagante
que ficou bufenta, aqueles arroubos que viraram arrependimento, aquela euforia
nas fotos desbotadas, aquele prazer de ápice nem lembrável. Anoitece e revejo a
estrela da manhã que mergulhou nas profundezas do mar e ressuscita agora a me
dá a sensação de que é outra, sendo ela a mesma que vi quase cedo, eu reconheço
e fico feliz na minha solidão. Isso ocorre enquanto contratos celebrados são
implantados atravessando o tempo na compensação dos créditos para girar a roda
da fortuna, dos valores e papéis, dos ganhos e especulações, e eu aqui a
recolher do mel esborrado da abelha tão saboroso pro gosto, do leite que jorra
do seio materno e compartilhado pra quem dele necessita, e sou taça cheia que
se esvazia e torna a encher e secar, enchida e esvaziada tantas e muitas vezes
com minha sede e fome. Não entendo mais nada das calculadoras nas estratégias
das fortunas, títulos e rubricas que vão daqui para ali do enriquecimento, a
festa da acumulação e do consumo, porque sou um tolo no exercício da loucura pelas
encruzilhadas do desconhecido a provar o absurdo do mundo, como quem encontra a
sabedoria perdida de brincar com o que não existe. Sou sem gravata, o cinto frouxo
segura as calças nas camisas folgadas e me dou o prazer de sonhar por ideias
muitas, até as desconexas, a hora da vez senão agora, outra ao desencarnar para
reencarnar porque a vida é outra do nada, enquanto eu danço e a deusa comigo no
salto para o vazio, a ousadia de sonhar. © Luiz Alberto Machado.
Direitos reservados. Veja mais aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá é dia de
especial com o cantor, violonista e
compositor João Bosco: Obrigado, gente! & Galos de Briga; a cantora e
compositora Júlia Bosco: Dance com o inimigo, Pra gozar & Acredite no amor; &
muito mais nos mais de 2 milhões de acessos ao blog & nos 35 Anos de Arte
Cidadã. Para
conferir é só ligar o som e curtir.
PENSAMENTO DO DIA – É preciso criar um laboratório
de ideias focado no imaginário e uma audácia de pensamento para preencher, aos
poucos, o fosso que existe entre os que têm a responsabilidade de agir sobre a
sociedade e aqueles que simplesmente a vivem. Pensamento do
sociólogo francês Michel Maffesoli. Veja mais aqui.
ALGUÉM FALOU: O segredo maior da vida, do sucesso, da
felicidade, está no indivíduo atuar, viver, agir de acordo com as tendências
íntimas do seu ser, de executar a tarefa para a qual tem verdadeira vocação.
Pensamento do ensaísta, médico e professor Antônio da Silva Melo (1886- 1973).
A ALEGRIA DE ENSINAR – [...] a alegria de ser
professor, pois o sofrimento de se ser um professor é semelhante ao sofrimento
das dores do parto: a mãe o aceita e logo dele se esquece, pela alegria de dar
à luz um filho. [...] Os técnicos em
educação desenvolveram métodos de avaliar a aprendizagem e, a partir dos seus
resultados, classificam os alunos. Mas ninguém jamais pensou avaliar a alegria
dos estudantes – mesmo porque não há métodos objetivos para tal. Porqie a
alegria é uma condição interior, uma experiência de riqueza e de liberdade de
pensamentos e sentimentos. [...] A
verdade se encontra no avesso das coisas [...]. O absurdo é o avesso do mundo. [...]. aquilo por que nossas crianças e jovens são forçados a passar, em nome
da educação, me horroriza. [...] As
crianças são ensinadas. Aprendem bem. Tão bem que se tornam incapazes de pensar
coisas diferentes. Tornam-se incapazes de dizer o diferente. Se existe uma
forma certa de pensar as coisas e de fazer as coisas, por que se dar ao
trabalho de se meter por caminhos não-explorados? Basta repetir aquilo que a
tradição sedimentou e que a escola ensinou. O saber sedimentado nos poupa dos
riscos da aventura de pensar. [...] É
como nos catecismos religiosos: o mestre diz qual é a perguntar e qual é a
resposta certa. O aluno é aprovado quando repete a resposta que o professor
ensinou. Pois não é isto que são os vestibulares? Ao final existe o gabarito: o
conjunto de respostas certas. Claro que há respostas certas e erradas. O
equivoco está em se ensinar ao aluno que é disto que a ciência, o saber, a
vida, são feitos. E, com isto, ao aprender as respostas certas, os alunos
desaprendem a arte de se aventurar e de errar, sem saber que, para uma resposta
certa, milhares de tentativas erradas devem ser feitas. Espero que haverá um
dia em que os alunos serão avaliados também pela ousadia de seus voos! [...]
Acho que a educação frequentemente cria
antas: pessoas que não se atrevem a sair das trilhas aprendidas por medo da
onça. [...]. Feitiço é quando uma
palavra entra no corpo e o transforma. [...]. Educação é isto: o processo pelo qual os nossos corpos vão ficando
iguas às palavras que nos ensinam. Eu não sou eu: eu sou as palavras que os
outros plantaram em mim. [...] Meu
corpo é um corpo enfeitiçado: porque o meu corpo aprendeu as palavras que lhe
foram ditas, ele se esqueceu de outras que, agora permanecem mal... ditas... [...].
A gente fica poeta quando olha para uma
coisa e vê outra. É isto que tem o nome de metáfora. [...] E a sociedade não tolera a inutilidade. Tudo
tem de ser transformado em lucro. [...] Todas
estão transformadas numa pasta homogênea. Estão preparadas para se tornar
socialmente úteis. [...] Pois
formatura é isto: quando todos ficam iguais, moldados pela mesmo fôrma. Hoje,
quando escrevo, os jovens estão indo para os vestibulares. O moedor foi ligado.
Dentro de alguns anos estarão formados. Serão profissionais. E o que é um
profissional se não um corpo que sonhava e que foi transformado em ferramenta?
As ferramentas são úteis. Necessárias. Mas – que pena – não sabem sonhar... [...].
O corpo é o lugar fantástico onde mora,
adormecido, um universo inteiro. Como na terra moram adormecidos os campos e
suas mil formas de beleza, e também as monótonas e previsíveis monoculturas;
como na lagarta mora adormecida uma borboleta [...] Tudo adormecido... O que vai acordar é aquilo que a Palavra vai chamar.
As Palavras são entidades mágica, potências feiticeiras, poderes brucos que
despertam os mundos que jazem dentro dos nossos corpos, num estado de
hibernação, como sonhos. Nossos corpos são feitos de palavras... [...]. A este processo mágico pelo qual a Palavra
desperta os mundos adormecidos se dá o nome de educação. [...]. Pensar é voar. Voar com o pensamento é sonhar.
[...] Por isto que os adultos
práticos e sérios não gostam de brincar. [...] Porque o brinquedo, sem produzir qualquer utilidade, produz alegria.
Felicidade é brincar. E sabem por quê? Porque no brinquedo nos encontramos com
aquilo que amamos. No brinquedo o corpo faz amor com objetos do seu desejo. [...].
As professoras me ensinaram que o Brasil
estava destinado a um futuro grandioso porque as suas terras estavam cheias de
riquezas: ferro, ouro, diamantes, florestas e coisas semelhantes. Ensinaram errado.
O que me disseram equivale a predizer que um homem será grande pintor por ser
dono de uma loja de tintas. Mas o que faz um quadro não é a tinta: são as
ideias que moram na cabeça do pintor. São as ideias dançantes na cabeça que
fazem as tintas danças sobre a tela. Por isso, sendo um país tão rico, somos um
povo tão pobre. Somos pobres de ideias. Não sabemos pensar. Nisto nos parecemos
com os dinossauros, que tinham excesso de massa muscular e cérebros de galinha.
[...] É com as ideias que o mundo é feito.
[...]. Trechos extraídos da obra A alegria de ensinar
(Ars Poética,1994), do psicanalista, educador, teólogo
e escritor Rubem Alves (1933-2014). Veja mais aqui, aqui e aqui.
DOIS AMORES E UM RIO - [...] E quando chegou o momento
de cortejar a jovem esposa com palavras bonitas, de pôr a coisa em prática,
Ramesh descobriu um tanto assustado que os compêndios de Direito nada lhe
haviam ensinado a esse respeito. Mas acabou tudo dando certo, como manda o figurino,
e Ramesh aprendeu uma lição: erudição é uma coisa, e amar e fazer amor outra
bem distinta, e nem sempre as duas combinam. E depois, quem neste mundo
resistiria, fosse ele bacharel em direito ou não, a uma criaturinha tão cheia
de graça, tão cativante e charmosa como Susila? [...] Como o pintor que engasta no fundo do coração a imagem da bem-amada,
como o poeta que canta em versos unicamente a mulher que adora (e ambos
empregam todo o seu talento e toda a sua devoção nessa obra) assim se sentia
Ramesh. Só faltava mandar construir um altar e ai colocar sua jovem e graciosa
companheira, que passar a ser a única razão de sua existência, a doce alegria
do seu coração e prosperidade do seu lar. [...]. Trechos extraídos da obra Dois amores e um rio: o naufrágio (Mundo
Inteiro, 1975), do poeta e músico indiano, ganhador do Prêmio
Nobel de Literatura, Rabindranath Tagore
(1861-1941). Veja mais aqui.
DOIS POEMAS – A ALMA ESCOLHE A PROPRIA COMPANHIA: Sempre a
alma escolhe a companhia / e fecha a porta / pois a divina maioria / não mais
lhe importa. / Imóvel, de sege a parelha / ao portão baixo / imóvel e o
imperador se ajoelja / sobre o capacho. / Sei que escolheu na Legião / entre a
qual medra / fechou a valva da atenção / como uma pedra. TOMEI A FUNDA NA MÃO: Tomei a funda na mão /
parti contra mundo e gente, / Davi mais armado – eu não - / eu duas vezes
valente. / Lancei a pedra – caí. / Foi tudo o que aconteceu. / Seria maior Davi
/ ou muito menor sou eu? Poemas da poeta estadunidense Emily
Dickinson (1830-1886). Veja mais aqui.
RAGÚ
Capas das
edições da revista pernambuca de HQ, Ragú,
editada por Christiano Mascaro e João Lin. Veja mais aqui e aqui.
Veja mais:
Os dois
mundos de quem vive de um lado só, a arte de Angelo Agostini, a música de Juliette
Herlin, a arte de Hannah Wilke,
a pintura de Fernando
Botero & Nik Helbig aqui.
A mulher
na Idade Média, a música
de Johann Joachim Quantz & Verena Fischer, a literatura de Naoki Higashida
& Teolinda Gersão, Fritz Lang, a pintura de Georges Rouault & Siron
Franco, Marie
Dumesnil, Anne Baxter, Benita Prieto, Maisa Vibancos, A mulher
& a escravidão aqui.
Mahatma
Gandhi, Michelangelo Antonioni & Vanessa Redgrave, Educação, Carlos Zéfiro,
Phil Collins & Genesis, Jennifer R. Hale & Maria Luísa Mendonça aqui.
Marquinhos
Cabral & Poetas do Brasil aqui.
Responsabilidade ambiental aqui.
Riacho Salgadinho
& a arte de Eliezer Setton, Zé Barros, Naldinho, Wilson Miranda &
WebRadio Maceió aqui.
Hermilo Borba Filho & Sonia Van Dijck,
Teoria da Literatura, Solange Palatinik, Constituição, Psicologia,
Dialogicidade & Representações sociais aqui.
Nietzsche e a música, As raízes árabes na
tradição poético-musical do sertão nordestino, História da Música de Otto Maria
Carpeaux, O carnaval carioca através da música & a História da Música
Popular de José Ramos Tinhorão aqui.
A
vontade & a arte de Amanda Garruth, Deborah Rosa, Luciana Soler, Bete Sá,
Vanessa Morais & Cantora Sol aqui.
O teatro
de Augusto Boal aqui.
Poetas do Brasil: Carlos Gildemar Pontes,
Sandra Fayad, Paulo
Profeta, Gisele Lemos/Diana Balis, Luís Inácio Araújo, Helena Cristina Buarque
& Rita Shimada Coelho aqui.
Afetividade & a
arte de Lília Diniz, Lucinha Guerra, Thathi, Ezra Mattivi, Jualiana Sinimbu
& Anna Ratto aqui.
Quadrinhos,
a nona arte aqui.
O
catecismo de Carlos Zéfiro aqui.
&
A ARTE DE NAHUI OLLIN
A arte da pintora e poeta mexicana Nahui Ollin (Carmen
Mondragón, 1893-1978).